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O “sentido da colonização” que permanece e as repercussões para a

Capítulo 2 A formação do Brasil como um país de capitalismo dependente

2.2 O “sentido da colonização” que permanece e as repercussões para a

O surgimento tardio do ensino superior no Brasil é apontado como uma

consequência dos interesses de exploração100 estabelecido com a chegada dos

colonizadores portugueses que buscavam o enriquecimento fácil e a acumulação de capital.

De acordo com Anísio Teixeira (1969) a primeira universidade no continente americano surgiu em 1538 em São Domingos (ilha onde Colombo teria chegado). Essa instituição durou pouco tempo e, em 1553 foi inaugurada no México a segunda

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Segundo Caio Prado (1992) a colonização tinha um sentido que estava entrelaçado aos objetivos da metrópole portuguesa de fazer do Brasil uma colônia de exploração. Isso se dava na medida em que a economia colonial era organizada para fora, para a exportação, gerando ganhos e acumulação de capitais na metrópole.

universidade da América, sendo que, na época da Independência do Brasil já havia 26 ou 27 universidades na América espanhola.

Na tentativa de explicar a implementação tardia do ensino no Brasil, Laerte Ramos de Carvalho (1968) aponta a intransigência de Portugal que desejava formar uma colônia incapaz de cultivar e ensinar as ciências, as letras e as artes. Ao invés de implantar um ensino de qualidade na colônia, a Coroa concedia bolsas para que alguns brasileiros estudassem em Coimbra.

Cunha (2007a) discorda da posição assumida por Carvalho (1968) afirmando que existem outros elementos capazes de explicar a implantação tardia do ensino no Brasil. Esse autor concorda com algumas posições de Faria (1952) que tenta explicar a diferença entre as colônias portuguesas e espanholas no que tange ao ensino, partindo de informações referentes à cultura dos povos colonizados e o avanço da Espanha em relação às suas universidades.

Para Faria (1952) a Espanha, diferente de Portugal, encontrou em suas colônias povos que conheciam a escrita e tinham uma organização social mais complexa, o que dificultou a disseminação da cultura dos colonizadores. Assim, as universidades receberam a função de preparar missionários que conhecessem os costumes dos nativos e que fossem capazes de pregar em seus idiomas. Além disso, a Espanha

tinha, já no século XVI, oito universidades101 famosas em toda a Europa, sendo a

universidade de Salamanca composta por 6 mil alunos e 60 cátedras. Portugal, ao contrário, tinha apenas uma universidade, a de Coimbra, e mais tarde a de Évora. A população espanhola chegava a 9 milhões e a portuguesa 1,5 milhão de habitantes. Por ter uma população maior e mais letrada, a Espanha podia transferir para as suas colônias recursos docentes sem prejudicar o ensino nas suas universidades, ao contrário de Portugal.

Mesmo levando em consideração as ponderações realizadas por Júlio Cezar de Faria (1952), acreditamos que não é possível refletir sobre a história da educação no

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Universidades de Salamanca, Valença, Lérida, Barcelona, Santiago de Compostela, Valadolid, Ovideo e Alcalá (FARIA, 1952).

Brasil sem levarmos em conta o "sentido da colonização" 102 aqui estabelecido. Ao ser "redescoberto" o Brasil foi integrado à divisão internacional do trabalho enquanto um país periférico, e produtor de bens primários segundo as necessidades da acumulação primitiva de capital nas metrópoles (FAUSTO, 2012). Dessa forma, a educação dos povos que aqui viviam foi algo secundário, e atrelado aos interesses da burguesia nacional e internacional.

O sistema econômico implantado no Brasil colônia, a partir das primeiras instalações

dos engenhos de açúcar e núcleos de povoamento, foi o mercantilista103, que se

fundamentava no monopólio comercial ou exclusivo metropolitano fazendo da colônia um mercado exclusivo para a burguesia da metrópole, seja para a venda ou para a compra de mercadorias (COTRIM, 1999).

De acordo com Fausto (2012) a colonização deve ser pensada de forma articulada a três elementos fundamentais: a empresa comercial, o regime de grande propriedade e o trabalho compulsório escravista. Esses elementos foram as bases para a

formação do Brasil, sendo o Estado e a Igreja Católica104 as duas instituições

organizadoras da colonização. O ensino que foi implantado pelos jesuítas105 teve

como objetivo a catequização dos indígenas106 e a preparação dos filhos dos

colonos brancos que completariam os estudos na Europa (FAUSTO, 2012; CUNHA, 2007a).

A chegada da família real em 1808, fugindo das invasões napoleônicas, quebrou o vínculo colonial. Nesse mesmo ano, Dom João decretou a liberação da atividade

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Expressão usada por Caio Prado Júnior (1992).

103

O mercantilismo foi uma doutrina econômica que vigorou entre os séculos XV e meados do século XVIII, a partir da Europa. Esse período demarca o surgimento e a consolidação do Estado moderno (séculos XVI ao XVIII), e essa prática tinha como objetivo fortalecer o Estado e a burguesia em momento de transição do feudalismo para o capitalismo. De acordo com Cotrim (1999, p. 166) “o sistema colonial desenvolveu-se como um desdobramento da política econômica do mercantilismo, que postulava o enriquecimento do Estado por meio das atividades comerciais”.

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Essas instituições eram ligadas e o catolicismo era reconhecido como religião do Estado (FAUSTO, 2012).

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Os jesuítas chegaram em 1549 na mesma expedição de Tomé de Souza fundador de Salvador como capital (COTRIM, 1999).

106

A catequização visava aumentar o número de fiéis perdidos pela Igreja Católica principalmente, a partir da Reforma Protestante na Europa. Outro fato a se destacar é que a Igreja não trabalhava na evangelização dos negros africanos porque não tinha uma posição muito bem definida se o negro tinha ou não alma (COTRIM, 1999).

industrial no Brasil, autorizando a instalação de fábricas. Entretanto a abertura dos

portos107 e a assinatura do Tratado de 1810 com a Inglaterra tornou inexequível o

desenvolvimento da industrialização no país, pois era impossível concorrer com a Inglaterra que não queria perder o seu mercado (COTRIM, 1999).

A necessidade da implementação de um sistema de ensino naquela época, era justificada em virtude da instalação da Família Real e, para satisfazer os anseios da elite branca que devido às guerras napoleônicas não podia enviar os seus filhos para estudarem no exterior (CUNHA, 2007a).

Assim, o sistema de ensino passou a articular-se explicitamente às necessidades do Estado nacional, sendo criados cursos para a formação de burocratas do Estado e

especialistas na produção de bens simbólicos108. Esse ensino estruturado a partir de

1808109 foi estabelecido em locais isolados, mesmo com sucessivas tentativas de

reuni-los em universidade (CUNHA, 2007a).

Se não interessava à metrópole a construção de universidades na colônia, e muito menos a produção de conhecimento capaz de romper com a sua condição

107

A abertura dos portos foi fundamental para o rompimento do pacto colonial que representava o exclusivismo do comércio das colônias com as metrópoles. Essa ruptura tornou-se necessária frente à emergência do capitalismo industrial em substituição ao capitalismo comercial, onde a existência de um comércio livre era essencial (PRADO JÚNIOR, 1992). Também é preciso destacar que Fernandes (1981) divide o desenvolvimento do capitalismo no Brasil em três “fases”. A primeira, chamada de neocolonial, ocorreu a partir da abertura dos portos até meados de 1860, sendo essa "fase" um momento de eclosão de um mercado capitalista e de estabelecimento de uma articulação entre a economia interna e a economia mundial, baseada, principalmente, no escravismo. A segunda, conhecida como “fase” de capitalismo competitivo, emergiu por volta de 1860 até 1950. Nesse período, o capitalismo competitivo foi formado e expandido com a emergência de um sistema econômico diferenciado que permitiu o processo de industrialização no país. O terceiro momento intitulado como de capitalismo monopolista, teve como marco o ano de 1950 em diante, com grande aprofundamento após o golpe de 1964. Essa “fase” tem como característica o despontamento do capitalismo monopolista marcado pelas operações comerciais, financeiras e industriais das grandes corporações no país. Essa divisão é utilizada apenas para fins didáticos, uma vez que esses processos não ocorrem de forma tão estanque.

108

Os cursos dos estabelecimentos militares (Academia Militar e Academia de Marinha) e os de medicina, cirurgia, matemática, agronomia, química, desenho técnico, economia política, arquitetura e direito eram os que preparavam os burocratas para o Estado. Mas, também foram criados cursos para a produção de bens simbólicos, para a satisfação do consumo das classes dominantes. Assim, além dos cursos novos (já citados) e dos antigos (como de filosofia e teologia) foram criados cursos superiores de desenho, história, música. Nesse ínterim o curso de arquitetura situado na Academia de Belas Artes, “também desempenhava a função de formar especialistas na produção de bens simbólicos” (CUNHA, 2007a, p. 63). Surgem dessa forma, a partir de 1808, vários cursos para a formação de profissionais liberais.

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O ensino estabelecido a partir de 1808 apareceu sob a forma de aulas e cadeiras (CUNHA, 2007a).

heterônoma, o processo de Independência não alterou essa condição. Como a Independência se deu "pelo alto" (COUTINHO, 2006) ela não modificou as bases de sustentação do regime, tampouco interrompeu os interesses elitistas, o que leva Fausto (2012) a afirmar que esse processo não aconteceu “pela via de um corte revolucionário com a metrópole, mas por um processo de que resultaram algumas mudanças e muitas continuidades em relação ao período colonial” (FAUSTO, 2012, p. 66).

A partir da Independência política e com a emergência do Império Britânico, a Inglaterra criou um sistema de dominação com base em operações financeiras e comerciais com os países da América Latina reforçando o papel dos países periféricos, na divisão internacional do trabalho, como fonte de exportação de riqueza para a acumulação de capital necessário para fomentar a Revolução

Industrial110. Segundo Cotrim (1999) o Brasil saiu dos laços coloniais de Portugal

para envolver-se na dominação capitalista da Inglaterra, inaugurando o que Fernandes (1973) chama de a era do capitalismo dependente na América Latina.

A Inglaterra mediou o reconhecimento internacional da Independência do Brasil, se colocando como interessada na consolidação de um novo mercado. Foi ao país britânico que o Brasil recorreu pela primeira vez para contrair um empréstimo com vistas a indenizar a Coroa Portuguesa pela perda da colônia brasileira. A mediação realizada pela Inglaterra foi complexa, uma vez que ao país interessava também a extinção do tráfico de escravos, atividade que ainda existia no Brasil (COTRIM, 1999; FAUSTO, 2012).

Nesse período o eixo econômico deslocou-se do Nordeste para o Sudeste com as plantações de café. O café tornou-se o principal produto agrícola de exportação,

superando o açúcar111. O Brasil continuou sendo um país rural onde grande parte da

população não tinha acesso ao ensino. Dados de 1872 mostram que entre os escravos, o índice de analfabetos atingia 99,9% e entre a população livre

110

Fernandes (1973) deixa explícito a relação existente entre a transferência do excedente produzido pelas economias periféricas para os países capitalistas centrais e o consequente subdesenvolvimento dos países latino-americanos.

111

O avanço da produção cafeeira e sua importância para o comércio exterior do Brasil pode ser visualizado pelos seguintes dados: no decênio 1821-1830, o café correspondia a 18% do valor das exportações brasileiras; no decênio 1881-1890, passou a corresponder 61% (FAUSTO, 2012).

aproximadamente 80%, subindo para mais de 86% no caso das mulheres. Mesmo levando em consideração que os dados se referem a população total (ou seja, não excluía as crianças nos primeiros anos de vida), já é possível constatar o elevado índice de pessoas que não tinham instrução. Esse mesmo levantamento mostra que somente 17% da população entre 6 e 15 anos frequentava escolas. Havia apenas 12 mil alunos matriculados em colégios secundários e cerca de 8 mil pessoas possuíam educação superior no país (FAUSTO, 2012).

Foi no período monárquico que despontou o grupo em favor da "liberdade de ensino" cuja pauta de reivindicações tinha como centro a expansão do ensino particular. A última reforma educacional do Império, realizada por Carlos Leôncio de Carvalho em 1879 (através do decreto nº 7.247/1879) refletiu esses acontecimentos. No primeiro artigo desse decreto, afirma-se que era completamente livre o ensino primário e secundário no município da côrte e o superior em todo o Império, salvo a inspeção necessária para garantir as condições de moralidade e higiene, ou seja, logo no início, percebe-se a autorização para a fundação de escolas particulares (BRASIL, 1879).

Mesmo com o decreto e os diversos posicionamentos favoráveis a "liberdade de ensino", o Estado tentou manter parte da responsabilidade com o ensino superior. Para Cunha (2007a) a razão disto era o interesse em manter o domínio sobre os

diplomas conferindo a poucas pessoas o privilégio da profissionalização112.

Também foi polêmico no Império os posicionamentos relacionados à implantação ou

não de universidades113. Os liberais eram a favor tanto da liberdade de ensino

quanto da criação da universidade. Mas, os positivistas eram favoráveis apenas à liberdade de ensino e desfavoráveis à criação da universidade (CUNHA, 2007a).

112

O aumento do número de pessoas diplomadas poderia gerar a perda do valor do diploma (em termos de poder, prestígio e remuneração) para os grupos corporativos das classes dominantes ligados aos níveis mais altos da burocracia do Estado (CUNHA, 2007a).

113

A primeira Constituição brasileira, que data de 1824, fez previsões para que fossem criados colégios e universidades no país (BRASIL, 1824).

Segundo os liberais a universidade teria um papel fundamental para a formação da

burguesia e os positivistas114 acreditavam que essa instituição serviria apenas para

conceder privilégios aumentando o parasitismo burguês. Além disso, sob a ingerência do Imperador seria previsível o predomínio das doutrinas católicas. Então, apontavam que o enorme recurso que a universidade iria consumir deveria ser usado para a instrução popular (CUNHA, 2007a).

Cunha (2007a) ressalta que durante o Império a Assembleia Legislativa não aprovou 42 projetos de criação de universidade. Dessa forma, “defendida por uns, e criticada por outros, a universidade não surgiu no Império, embora não faltassem projetos e recomendações para tal” (CUNHA, 2007a, p. 90).

Certamente o aumento da procura pela instrução influenciou o surgimento e

crescimento das Escolas Superiores Livres (independentes do Estado)115

impulsionadas pela facilitação do ingresso no ensino superior. A ampliação e

constituição da burocracia pública na República116 instigou o desejo pela diplomação

uma vez que interessava à burguesia inserir-se no âmbito estatal (CUNHA, 2007a).

A pressão para a entrada no ensino superior mesmo sem a finalização do ensino de segundo grau se constituiu em grave problema na medida em que resultava na inserção de candidatos possivelmente não habilitados neste grau de ensino (CUNHA, 2007a).

Assim, além do movimento chamado por Cunha (2007a) de desoficialização do ensino houve também diversas tentativas de contenção da entrada no ensino superior. As medidas foram tomadas principalmente por meio de cinco decretos, aos quais relataremos a seguir.

114

Os principais representantes dessa corrente no Brasil eram Miguel Lemos e Raimundo Teixeira Mendes (CUNHA, 2007a).

115

O movimento de desoficialização do ensino (entendido por Cunha como a retração do setor estatal no campo da educação) estava ocorrendo desde o Império podendo ser visto de forma cabal no decreto de Leôncio de Carvalho, mesmo que parcialmente rejeitado pelo Congresso. A República Velha herdou não só esse processo, mas, contraditoriamente, proporcionou condições para o surgimento das primeiras instituições de ensino superior do Brasil com o nome de universidade, sendo a do Rio de Janeiro (1920) e a de Minas Gerais (1927) as que vingaram (CUNHA, 2007a).

116

Durante a República Velha, com a emergência do regime federativo, os governos estaduais passaram a ter encargos maiores e muitas repartições foram criadas oferecendo várias oportunidades de emprego, principalmente para advogados e engenheiros (CUNHA, 2007a).

O primeiro decreto foi o de número 981 de 1890 onde Benjamim Constant tentou implementar um ensino seriado, com obrigatoriedade e gratuidade. Ele reafirmava que era completamente livre aos particulares o ensino primário e secundário desde que respeitassem as condições de moralidade e higiene definidas na lei. Outro ponto importante do decreto, é que ficou estabelecido que ao final da última série os estudantes seriam submetidos a um exame de madureza e, se aprovados, poderiam se matricular, sem outros exames, em qualquer escola superior do país (CUNHA, 2007a; BRASIL, 1890).

Em 1901 foi lançado o decreto nº 3.890 que instituiu o que muitos conhecem como a Reforma Epitácio Pessoa. Esta reforma priorizava a formação secundária e estabelecia seis anos para a sua conclusão (FRANCISCO FILHO, 2004).

Compondo esse cenário houve em 1911 uma reforma geral do ensino secundário e superior. O Presidente da República Marechal Hermes da Fonseca promulgou o decreto nº 8.659 que estabeleceu a Lei Orgânica do Ensino Superior e do Fundamental na República, redigida por Rivadávia da Cunha Corrêa. Para conter a entrada de alunos não preparados no ensino superior este previa que os estabelecimentos de ensino do Governo Federal não gozariam de qualquer espécie de privilégio para matricular seus estudantes no ensino superior, o que valia também

para o Colégio Pedro II, e instituiu os exames de admissão117 que deveriam constar

de uma prova escrita sobre conhecimentos e uma prova oral sobre línguas e ciências. Contudo, essas ações não produziram os resultados almejados, pois, se de um lado houve a redução do número de estudantes que entraram nas instituições oficiais por causa do exame de ingresso, por outro, as escolas livres continuaram facilitando a entrada (CUNHA, 2007a; FÁVERO, 1997).

A Reforma Rivadávia Corrêa foi a primeira legislação no Brasil que englobou o termo autonomia no que tange ao ensino superior, compreendendo três dimensões: didática, administrativa e financeira. Observa-se desse modo, que a autonomia

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Os exames não foram suficientes para a contenção da entrada no ensino superior. Para que as faculdades não ficassem sem alunos as exigências dos exames diminuíram, livres de fiscalizações; os professores que participavam das bancas examinadoras ministravam aulas particulares aos futuros candidatos; e os programas de ensino eram encurtados conforme as conveniências de alunos e professores (CUNHA, 2007a).

surgiu na legislação brasileira antes mesmo da criação da primeira universidade. O artigo 6º deste decreto referia-se a autonomia didática explicitando que cabia aos institutos a organização dos programas de seus cursos. Todavia, esta competência era relativa, pois a própria lei determinava que a cada ano o diretor da instituição deveria encaminhar ao Conselho Superior do Ensino um relatório, cabendo a este Conselho realizar as reformas que achasse necessárias (FÁVERO, 1997).

A autonomia administrativa também era restrita relacionando-se a gestão dos patrimônios e à eleição interna do diretor. De acordo com Fávero (1997) a lei não mencionava a quem cabia a elaboração e a aprovação de estatutos ou regimentos das instituições, embora estes últimos fossem mencionados diversas vezes na lei. O artigo 139 aventava a possibilidade de liberdade total às Faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro; às Faculdades de Direito de São Paulo e de Pernambuco; à Escola Politécnica do Rio de Janeiro e ao Colégio Dom Pedro II, caso elas possuíssem recursos próprios e suficientes, ou seja, essas instituições ficariam isentas de toda e qualquer dependência ou fiscalização oficial se contassem com recursos próprios.

A tentativa fracassada de controlar a inserção no ensino superior fez com que surgisse o decreto nº 11.530 de 1915, conhecido como a Reforma de Carlos Maximiliano, que extinguiu a autonomia prevista na Lei Orgânica Rivadávia Corrêa e criou o exame de vestibular para os cursos superiores, além da obrigação da conclusão do curso secundário para o ingresso nas faculdades (FÁVERO, 1997).

A última reforma antes do governo Vargas ocorreu com a promulgação do decreto nº 16.782A de 1925 (conhecido como Lei Rocha Vaz). Esta lei emergiu após a instalação da primeira instituição de ensino superior no Brasil que vingou com o nome de universidade que foi a Universidade do Rio de Janeiro criada em 1920 (CUNHA, 2007a). Segundo Francisco Filho (2004) esta legislação conservadora completou o ciclo de educação elitista; cerceou e manteve o policiamento dos afazeres de professores e alunos, criando, inclusive, moral e cívica como disciplina obrigatória nas escolas primárias e secundárias (FRANCISCO FILHO, 2004).

Antes da reforma Rocha Vaz de 1925 todos os estudantes aprovados tinham o direito de se matricular no ensino superior. Após a reforma, ficou estabelecido que as faculdades deveriam fixar um número de vagas todo ano. Os estudantes aprovados deveriam ser matriculados por ordem de classificação até completarem as vagas. Essa medida tinha por objetivo diminuir o número de estudantes em alguns cursos e direcionar a escolha para cursos menos procurados, na perspectiva do movimento de contenção do ensino (CUNHA, 2007a).

O surgimento da Universidade do Rio de Janeiro em 1920118 não alterou

substantivamente a situação do ensino no país, pois, foi uma instituição criada a partir da agregação de três faculdades, o que não agradou a alguns educadores e estudiosos críticos da época. Uma pesquisa realizada pelo jornalista Fernando de Azevedo e publicada em 1926 no jornal "O Estado de São Paulo" afirmava que em relação ao ensino superior no Brasil ainda não existiam instituições dedicadas a “alta cultura” e que realizassem pesquisa “livre e desinteressada” (CUNHA, 2007a, p. 199).

Essa situação parece-nos ser de fácil compreensão em uma conjuntura onde o

moderno se une ao arcaico. A revolução burguesa ocorrida no Brasil119 foi incapaz

118

A Universidade do Rio de Janeiro (URJ) criada em 1920, foi designada Universidade do Brasil (UB) pela lei nº 452/37 e em 1965 recebeu o nome de Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). De acordo com Fávero (s/d) a pesquisa era uma atividade quase inexistente. Até os anos 50 as condições para fazer pesquisas na universidade eram precárias. Essa situação sofreu significativa alteração quando a reivindicação por tempo integral e pela dedicação exclusiva foi atendida pela universidade, além da ampliação dos recursos financeiros com a criação do CNPq. Todavia, há de se considerar que nem todas as áreas dispunham das mesmas condições para a realização de