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Como as Aposentadorias Afetam a Poupança Pessoal: Previsões com Base na Teoria Econômica

Infelizmente, não é possível prever o provável impacto das aposentadorias com base apenas no nosso entendimento da operação geral da economia. O raciocínio econômico revela que várias forças estão em jogo. Elas impelem em direções conflitantes e seu porte relativo não pode ser conhecido com antecedência. Importantes elementos da lógica econô- mica são delineados nesta seção. A evidência essencial é explorada em capítulo seguinte.

A teoria do ciclo da vida do consumo. Nas últimas quatro décadas o ponto de partida para o grosso das análises tem sido a teoria do ciclo de vida do consumo. Segun- do essa teoria o comportamento individual de poupança é voltado para fechar intervalos entre o momento da receita de rendimentos esperada e os das despesas desejadas no curso da vida. Em particular, as poupanças são acumuladas durante os anos de trabalho e gastas durante os anos de aposentadoria.

A teoria do ciclo de vida prevê que na ausência de intervenção governamental o estoque de poupança acumulado de um país (sua riqueza agregada) em qualquer momento dado será determinado em grande parte pela estrutura etária da sua população e pelos seus padrões de aposentadoria. A riqueza aumenta quando as pessoas poupam para a aposen- tadoria e diminui quando gastam suas poupanças para esse fim. O tamanho do estoque de riqueza em qualquer momento depende do tamanho relativo dos dois fluxos. Tenderá a crescer se a população em idade de trabalhar é grande em relação à população aposentada, mas diminuirá se esta crescer sem um aumento correspondente daquela.

Aumentos no índice de crescimento da economia também levarão a maiores ta- xas de poupança. Quando esperam níveis mais altos de ganhos no futuro, os trabalha- dores aumentam a quantia que põem de lado para a aposentadoria, a fim de garantirem um aumento correspondente da sua renda. Finalmente, se decidem aumentar a fração do seu tempo de vida passada como aposentados, aumentam suas taxas de poupança; se decidem trabalhar por mais tempo, as taxas de poupança caem2.

Outras teorias de poupança do consumidor. As implicações do modelo de ciclo da vida são muitas vezes ajustadas para refletirem o impacto de várias outras teori- as. Duas delas têm especial importância para discussões de política previdenciária na- cional. A primeira é que uma fração mensurável da poupança familiar agregada pode ser motivada pelo desejo de deixar herança. A segunda é que uma importante motivação para poupar é a incerteza sobre as necessidades de consumo no futuro, em especial sobre quanto tempo a pessoa viverá e que despesas extraordinárias (principalmente gas- tos médicos e com assistência a longo prazo) poderão surgir perto do fim da vida3.

O impacto potencial da introdução de um plano previdenciário nacional 4. O impacto de um plano previdenciário nacional depende de como as pessoas trocam seu comportamento de poupança quando ele é introduzido. Como ponto de partida os economistas admitem que as pessoas encararão um plano previdenciário nacional como o equivalente pelo menos em parte à sua própria poupança pessoal e o benefício futuro que esperam receber como o equivalente em parte ou no todo à despoupança da apo- sentadoria que de outra maneira ocorreria.

2 Ver Franco Modigliani, “Ciclo de Vida, Frugalidade Pessoal e a Riqueza das Nações”, em Revista Americana de

Economia 76 (junho 1986), 207-313; e “A Chave para a Poupança É Crescimento e não Frugalidade”, em Desafio, (maio-junho 1987), 24-29. Note-se que a teoria do ciclo de vida implica que é o crescimento maior que produz maior poupança, ao passo que a discussão popular parece admitir sempre o contrário, que a poupança maior está levando ao maior crescimento. Talvez ambas estejam certas.

3 Por exemplo, Laurence J. Kotlikoff, “Transferências Intergeracionais e Poupança”, em Revista de Perspectivas Econô-

micas 2:2 (Primavera, 1988), 41-58. Essas duas teorias suplementares podem explicar porque os idosos parecem despoupar menos e a riqueza parece ser distribuída menos equitativamente entre a população do que a teoria do ciclo de vida pareceria implicar.

4 Os planos previdenciários nacionais levantam dinheiro para financiar os pagamentos de benefícios mediante tributos ou contri-

buições obrigatórias. Para facilidade de exposição, a discussão aqui pressupõe um modelo de benefícios proporcionais aos ganhos financiado inteiramente por contribuições específicas de seguro social, embora os resultados se apliquem também a outros modelos.

Se as pessoas realmente procedessem assim, a lógica diria que a introdução do plano previdenciário não teria nenhum efeito sobre a poupança agregada nas seguintes condições:

1) as contribuições obrigatórias seriam inferiores ou iguais à quantia que cada pessoa teria poupado sem o plano;

2) a relação entre os benefícios pagos no plano, a cada pessoa, e suas contribui- ções (isto é, a taxa de retorno que pode ser esperada) reflete a relação que a pessoa teria obtido no mercado privado;

3) o plano previdenciário acumula e investe ativos da mesma maneira como a pessoa faria; e

4) a instituição do plano não tem efeito sobre a desejabilidade de a poupança atender a futuras incertezas.

Naturalmente, nenhum plano previdenciário nacional atende a todas essas quatro condições. Em verdade, nenhum objetivo seria alcançado pela instituição de um plano que atendesse a todas essas quatro condições. Um plano assim produziria um resultado que teria sido alcan- çado de qualquer maneira pelo mercado privado. Os planos previdenciários nacionais são intencionalmente destinados a se afastarem de uma ou mais dessas condições, preci- samente porque as sociedades desejam alterar o resultado do mercado privado. Mas que impacto poderiam ter sobre a poupança nacional esses afastamentos intencionais ?

Efeito de maiores contribuições obrigatórias. Presumivelmente, um plano previdenciário obrigatório exigirá contribuições maiores que as quantias que uma parte da população em idade de trabalhar colocaria de lado voluntariamente. Essas contribui- ções mais altas forçam as pessoas atingidas a reduzir seu consumo corrente e, sem algum efeito contrabalançador, seu consumo reduzido aumenta a poupança nacional.

Uma possível maneira de contrabalançar a maior poupança envolve a capacidade dos trabalhadores de tomar empréstimo. Se os mercados de crédito lhes permitem afundar-se em dívidas eles podem contrabalançar o impacto que de outra maneira o plano previdenciário nacional teria sobre seus níveis de consumo.

Uma possibilidade adicional é que a participação forçada no sistema previdenciário nacional anima as pessoas a planejarem aposentar-se mais cedo e com um rendimento total de aposentadoria maior do que de outro modo teria sido o caso. Isso as anima a aumentar sua poupança privada para complementar seu benefício previdenciário, o que aumenta a poupança nacional5.

5 O efeito só poderia ocorrer entre as pessoas (ou os países) cujos benefícios do sistema previdenciário nacional são insuficientes

para o pleno sustento dos aposentados, de modo que eles precisam complementar o benefício previdenciário para manterem os padrões de vida anteriores (por exemplo, Martin Feldstein, “Previdência Social, Aposentadoria Induzida e Acumulação de Capital Agregado”, em Revista de Economia Política 82:5 (setembro-outubro 1974), 756-66.

Efeito da relação entre benefícios e contribuições 6. Quase todos os sistemas previdenciários nacionais oferecem alguns benefícios individuais maiores do que teria sido possível obter no mercado privado com as mesmas contribuições. Trata-se tipica- mente de pessoas que ganham pouco e que já estavam na força de trabalho quando da instituição do plano. Pode também tratar-se de pessoas empregadas em ocupações es- peciais ou indústrias que já tiveram tratamento especial.

Outros podem esperar receber menos do sistema previdenciário nacional do que se tivessem contribuído na mesma base para contas individuais de poupança. Tipicamente, nesse caso se trataria de pessoas que ganham mais e passaram a maior parte de sua carreira de trabalho cobertas pelo plano. Em muitos planos previdenciários nacionais maduros a maioria dos trabalhadores que ingressam neles pode agora encontrar-se nessa situação7.

Os que, diferentemente, empregassem as poupanças de sua vida inteira segundo o padrão que a teoria do ciclo de vida implica mudariam de emprego caso se encontras- sem em um desses dois grupos. O primeiro grupo, dos que antevêem retornos superi- ores aos do mercado privado, pode-se esperar que aumentem seu consumo durante suas vidas de trabalho em função da maior renda de aposentadoria esperada. Consumo au- mentado implica poupança nacional reduzida. O outro grupo, dos que prevêem retorno abaixo da taxa do mercado privado, pode-se esperar que aumente sua poupança durante seus anos de trabalho a fim de substituir alguma porção da renda de aposentadoria que perde em conseqüência de ser forçado a participar do sistema previdenciário nacional.

O efeito líquido das diferenças na relação entre benefícios e contribuições depen- derá da força relativa das reações contrabalançadoras desses dois grupos. Em países com sistemas previdenciários nacionais maduros, o efeito nítido deve ser um aumento da poupança nacional devido ao maior tamanho e maior rendimento do último grupo. O efeito líquido é capaz de ser uma redução líquida da poupança quando os sistemas previdenciários nacionais são relativamente novos e estruturados de modo que a grande maioria dos atuais participantes pode esperar retorno acima do mercado.

Efeito de padrões diferentes de acumulação de ativos. Uma significativa diferença entre a grande maioria dos programas previdenciários nacionais e qualquer poupança privada por eles afastada é que aqueles tendem a operar mais ou menos em regime de repartição, ao passo que esta é, por definição, financiada com antecedência.

Durante a fase inicial de um sistema de capitalização as contribuições são recebi- das mas quase nenhum benefício é pago. Ao invés, as contribuições financiam a acumu-

6 Este tópico é analisado mais completamente no Capítulo 7.

7 Ver, por exemplo, Eugene Steuerle e John M. Bakija, Reinstrumentando a Previdência Social para o Século 21

(Washington, D.C.: Editora do Instituto Urbano, 1994) ou “Resumo de Questão 2: Repartição ou Capitalização? Qual Custa Menos?” em Banco Mundial, Evitando a Crise da Velhice (Oxford: Editora da Universidade Oxford, 1994), 297-302.

lação de riqueza. Só depois que o sistema amadurece é que o grosso da população aposentada pode sustentar-se sacando os recursos acumulados para a aposentadoria. Em contraste, num sistema clássico em regime de repartição as primeiras contribuições são arrecadadas a uma taxa mais baixa e são empregadas para financiar pagamentos mais altos de benefícios aos aposentados iniciais. À medida que o sistema amadurece a taxa de contribuição do regime de repartição cresce para se aproximar - ou até ir além - da taxa de contribuição necessária no regime de capitalização para o mesmo valor do bene- fício.

Em princípio a abordagem de regime de capitalização deve gerar poupança na- cional adicional durante a fase inicial, mediante dois mecanismos, a taxa inicial mais alta da contribuição cobrada dos empregados e os benefícios mais baixos pagos aos aposen- tados. Cada qual reduz o consumo agregado relativo à situação da abordagem de regime de repartição.

Várias teorias que poderiam estreitar substancialmente as diferenças entre a abor- dagem de regime de repartição e a de regime de capitalização já foram apresentadas. Uma envolve possíveis contrabalanços sob a forma de herança. Se a população em idade de trabalhar reage à introdução do regime de repartição aumentando o volume de legados, a poupança maior necessária para gerá-los pode contrabalançar em parte a pou- pança menor de outra maneira ligada ao lançamento de um sistema em regime de repar- tição8.

Uma segunda complicação pode surgir se, objetivamente, as alternativas para um sistema mantido pelo governo em regime de repartição são sistemas de gestão privada no mesmo regime, como os produzidos mediante esquemas informais intrafamiliares ou outros mais formais associados a organizações fraternais ou ocupacionais9.

Efeito sobre o incentivo para poupar para incertezas. Os programas nacio- nais de bem-estar social reduzem muitas das incertezas que as pessoas enfrentam ao planejarem a aposentadoria. Os planos previdenciários nacionais normalmente pagam benefícios como anuidades vitalíciasI, reduzindo a incerteza ligada ao desconhecimento de quanto tempo os recursos irão durar. Nas economias de mercado desenvolvidas esses benefícios são muitas vezes indexados para reduzir as incertezas ligadas à inflação futura. A grande maioria dos países oferece aos idosos, quando não à população inteira,

8 Por exemplo, Robert J. Barro, “Os Títulos do Governo Têm Valor Líquido?” 82:6, em Revista de Economia Política

(novembro-dezembro 1974), 1095-117.

9 Este ponto pode ter pouca importância para as modernas economias desenvolvidas, mas pode ainda ter aplicação em partes do

mundo em desenvolvimento onde os esquemas familiares e informais permanecem importantes. Após analisar as finanças dos esquemas previdenciários para cada atividade então existente, Pigou concluiu que a introdução de um esquema previdenciário nacional no Reino Unido provavelmente teria efeito modesto sobre a formação de capital por essa razão. Ver A. C. Pigou, A Economia do Bem-Estar (Londres: MacMillan, 1920). Ver também a discussão dos sistemas informais de rendimentos

I No Brasil não é assim. (N.T.)de aposentadoria em Banco Mundial, op. cit., Capítulo 2.

abrangente garantia da assistência médica necessária, reduzindo mais as incertezas da aposentadoria. E alguns países têm sistemas formais que atendem às necessidades de assistência a longo prazo da população carente. Todas essas políticas aumentam o bem- estar social, aumentando a segurança da população aposentada. Reduzem também o incentivo que sem isso as pessoas poderiam ter para poupar com antecedência a fim de cobrir essas contingências.

Sumário dos efeitos possíveis. Em resumo, o raciocínio econômico não con- duz a uma previsão clara do impacto de um sistema previdenciário nacional sobre a poupança individual.

É provável que a introdução de um plano previdenciário nacional aumente a pou- pança nacional na medida em que obriga as pessoas a pagar contribuições mais altas para seus programas de aposentadoria do que pagariam de outro modo, estimula as pessoas a se aposentarem mais cedo e lhes oferece retorno mais baixo do que teriam de poupança individual para aposentadoria.

É provável que tal introdução reduza a poupança na medida em que oferece às pessoas retorno maior do que teriam dessa poupança, substitui esquemas de regime de capitalização por outros de regime de repartição e efetivamente reduz os riscos associa- dos ao desconhecimento de quanto tempo se viverá e qual poderá ser a inflação futura. Finalmente, um plano previdenciário nacional pode ter pequeno efeito sobre a pou- pança na medida em que codifica os esquemas que teriam existido sem ele (inclusive esquemas privados em regime de repartição), as pessoas conseguem contrabalançar qual- quer poupança forçada que sem ele ocorra, tomando mais empréstimo, ou qualquer alteração na responsabilidade das futuras gerações é contrabalançada por alterações do volume de legados das gerações atuais.

Como a Previdência Social afeta