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COMO DEVE SE DAR A ATUAÇÃO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS NESTE CENÁRIO?

No documento VOLUME 3 COMPETÊNCIAS E REGRAS (páginas 145-154)

ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA DE COVID-

6. COMO DEVE SE DAR A ATUAÇÃO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS NESTE CENÁRIO?

Em primeiro lugar, com relação ao gestor mal-intencionado, é preciso atuação célere, em colaboração com os demais órgãos de controle, alguns deles detentores de meios de investigação mais invasivos que aqueles disponíveis aos tribunais de contas.

A conjugação das diferentes expertises dos órgãos de controle é que permite uma resposta rápida e qualificada para os desvios realizados ou tentados, com capacidade de promover algum efeito dissuasório nos demais gestores propensos à prática de corrupção.

Já quanto aos bons gestores, que constituem a imensa maioria, é preciso que os tribunais de contas adotem uma postura orientadora, respondendo com presteza às consultas que lhes são formuladas, e, na vertente fiscalizadora, uma atuação o quanto possível concomitante e que leve em consideração as circunstâncias fáticas envolvidas na gestão pública em meio a este ambiente extremamente desafiador.

Não há dúvida de que decisões tomadas rapidamente estão sujeitas a maior possibilidade de erro. A flexibilização de regras de proteção da administração pública, tais como a licitação e o pagamento posterior, expõe a administração e o gestor ao risco de decisões que podem se revelar

desastrosas, tais como a realização de pagamentos elevados a algum fornecedor que não entregue os produtos. Como será avaliada a conduta do gestor? Como poderá justificar a escolha daquele fornecedor, uma vez que não realizou licitação? Como lidar com o prejuízo potencialmente mi- lionário de compras cujas entregas não ocorram?

A legislação editada oferece as respostas. O gestor deve, além do dever de transparência, registrar no processo formal de compra todas as circunstâncias fáticas que o levaram a decidir por essa ou aquela empresa. Embora simplificados, a lei enumerou um conjunto de elementos que devem fazer parte do processo de compra e que vão revelar posteriormente quais eram efeti- vamente as circunstâncias fáticas presentes no momento da decisão. Aquele gestor que observar esse regramento mínimo certamente não enfrentará dificuldades para prestar contas de sua gestão. O conjunto de procedimentos que deve adotar consiste basicamente em demonstrar a relação da contratação com a pandemia; observar minimamente um planejamento para en- frentamento de uma situação diagnosticada, com motivação, ainda que simplificada, dos atos e decisões, dentro de um processo formalmente aberto, no qual deve constar, se possível, orçamento estimativo da contratação, que espelhe os preços de mercado. Não sendo possível esse orçamento, tal circunstância deve ser registrada. O preço de aquisição pode ser superior ao do orçamento estimativo em razão de oscilações do mercado fornecedor. Se isso ocorrer, também deve estar registrado no processo. Por fim, a lei limitou a vigência dos contratos a seis meses, admitidas prorrogações sucessivas enquanto durar a emergência no enfrentamento da pandemia.

O processo de contratação, com os registros acima referidos, constitui uma espécie de diário de bordo, no qual o gestor deixa anotado o cenário fático que foi objeto de sua avaliação. Esse diário de bordo será o principal meio de justificação de suas decisões se acaso alguma delas for questionada.

Como visto, a MP 966 (10) reproduzia regras já presentes na LINDB. Além disso, nada

inovava na prática de avaliação de condutas já de há muito adotada nos tribunais de contas. Com efeito, é da tradição dos tribunais de contas uma avaliação ampliada das condutas dos adminis- tradores, com a ponderação das circunstâncias fáticas envolvidas, desde que demonstradas. Daí a importância do adequado registro no processo de tudo que permeia um processo de contratação.

O TCU se destacou na pandemia pela adoção de uma postura de permanente abertura para o diálogo com a administração, para orientação e esclarecimento de dúvidas e, ainda, pelo início de mais de quarenta procedimentos de acompanhamento de ações governamentais, nas mais diversas áreas, com relação à pandemia, com o objetivo de evitar e corrigir o quanto antes qualquer erro ou ilicitude identificada, desde o pagamento do auxílio emergencial a pessoas físicas até as aquisições feitas pelo Ministério da Saúde, passando pelas medidas de segurança de fronteira e outras (1).

Certamente esses acompanhamentos reduzirão em muito as discussões futuras sobre a correção das medidas adotadas nesse período. A mobilização da instituição em torno desse ob- jetivo reflete o sentimento de que o controle deve se fazer cada vez mais presente e atual, em vez de julgar fatos ocorridos há vários anos.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As medidas legislativas adotadas pelo Congresso Nacional conferiram aos gestores pú- blicos elevado grau de segurança para adoção de medidas de enfrentamento da pandemia, seja no campo das aquisições e contratações, seja no das medidas econômicas e sociais com reflexos na gestão fiscal. Não obstante, cumpre ressaltar que não existe organização sem controle, tampouco decisões isentas de risco. A função de gerir implica aceitar conviver tanto com os riscos inerentes à função como com o necessário controle.

A atuação de órgãos como os tribunais de contas já há muito se caracteriza por uma avaliação ampliada das condutas dos gestores, com a ponderação das circunstâncias fáticas en- volvidas. Com muito mais razão, tal modo de proceder se dará com relação às medidas adotadas para combate à pandemia. Contudo, cabe ao gestor deixar registradas, nos processos de compras e outros que precedem sua tomada de decisão, tais circunstâncias fáticas.

A alegação genérica de tomada de decisão em tempo de pandemia não servirá de salvo- -conduto para isentar o gestor da responsabilidade pela prática de atos que se revelem desarrazoados ou desastrosos e que tenham ocorrido sem a observância dos requisitos mínimos de procedimento estabelecidos na legislação especial para enfrentamento da pandemia.

REFERÊNCIAS

1. Brasil. Tribunal de Contas da União [Internet]. [acesso 2020 out 13]. Disponível em: http:// www.tcu.gov.br.

2. Brasil. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988.

3. Brasil. Presidência da República. Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Reconhece, para os fins do art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República enca- minhada por meio da Mensagem nº 93, de 18 de março de 2020. Diário Oficial da União [Internet]. 20 mar 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm.

4. Brasil. Presidência da República. Lei complementar nº 173, de 27 de maio de 2020. Esta- belece o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19), altera a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, e dá outras providências. Diário Oficial da União [Internet]. 27 maio 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp173.htm.

5. Brasil. Presidência da República. Emenda constitucional nº 106, de 7 de maio de 2020. Institui regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento de calamidade pública nacional decorrente de pandemia. Diário Oficial da União [Internet]. 7 maio 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/emendas/emc/emc106.htm.

6. Brasil. Presidência da República. Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus responsável pelo surto de 2019. Diário Oficial da União [Inter- net]. 6 fev 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/ lei-n-13.979-de-6-de-fevereiro-de-2020-242078735.

7. Brasil. Presidência da República. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União [Internet]. 21 jun 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ l8666cons.htm.

8. Brasil. Presidência da República. Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias,

no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Diário Oficial da União [Internet]. 30 jun 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13303.htm.

9. Brasil. Presidência da República. Lei 14.065, de 30 de setembro de 2020. Autoriza paga- mentos antecipados nas licitações e nos contratos realizados no âmbito da administração pública; adequa os limites de dispensa de licitação; amplia o uso do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) durante o estado de calamidade pública reconhecido pelo De- creto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020; e altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Diário Oficial da União [Internet]. 30 set 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.065-de-30-de-setembro-de-2020-280529950. 10. Brasil. Presidência da República. Medida Provisória nº 966, de 13 de maio de 2020. Dispõe sobre a responsabilização de agentes públicos por ação e omissão em atos relacionados com a pandemia da covid-19. Diário Oficial da União [Internet]. 13 maio 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/mpv/ mpv966.htm.

11. Oliveira OC. O que é o erro grosseiro na LINDB? JOTA [Internet]. 14 out 2020 [acesso 2020 mar 27]. Disponível em: https:///www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/o-que-e-o- -erro-grosseiro-da-lindb-14102018.

12. Brasil. Controladoria-Geral Da União. Guia de integridade pública: orientações para a admi- nistração pública federal: direta, autárquica e fundacional [Internet]. Brasília: CGU; 2015. [acesso 2020 out 14]. Disponível em: https://www.gov.br/cgu/pt-br/centrais-de-conteudo/ publicacoes/integridade/arquivos/guia-de-integridade-publica.pdf.

Beatriz de Faria Leão1

RESumo: Este capítulo faz uma análise de como a informação e a informática em saúde impactam

o contexto da COVID-19. Mais especificamente, como as ações propostas para a implementação da Estratégia de Saúde Digital para o Brasil 2020-2028 (ESD28) contribuem para a criação de um ambiente de compartilhamento da informação para apoiar a promoção, a prevenção, a assistência e a vigilância em saúde. As ações da ESD28 são apresentadas com seus benefícios e desafios. As ações já desenvolvidas pelo Ministério da Saúde para o combate à COVID-19 são apresentadas. A importância de uma estratégia de Saúde Digital que oriente e coordene as ações é enfatizada.

PalaVRaS-ChaVE: Saúde Digital. COVID-19.

1 Médica - UFRGS, 1997; Doutorado Medicina Unifesp -1988; Pós-Doc Univ Erasmus Rotterdam; Es- pecialista em Projetos – Hospital Sírio Libanês, São Paulo, SP; http://lattes.cnpq.br/3263401403625735. beatriz.leao@hsl.org.br.

1. INTRODUÇÃO

A pandemia de COVID-19 trouxe a necessidade de ampliar a oferta de serviços de saúde qualificados à população, ao mesmo tempo evitando aglomerações e protegendo populações de risco, tais como idosos e portadores de comorbidades. Por esse motivo, em 20 de março de 2020, a Portaria nº 467 (1) do Ministério da Saúde autorizou o uso da Telemedicina durante a pandemia.

Adicionalmente, o Congresso Nacional sancionou, em 15 de abril de 2020, a Lei 13.989 (2), que

“dispõe sobre o uso da telemedicina durante a crise causada pelo coronavírus (SARS-CoV-2)”, autorizando o uso da telemedicina no território nacional, em caráter emergencial. Fica, portanto, liberada durante o período da pandemia a realização de teleconsultas, ou seja, a consulta médica remota mediada por tecnologias, com médico e paciente localizados em diferentes espaços geográ- ficos – conforme definição pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) na Resolução 2.227/2018, ainda em revisão (3).

A pandemia nos mostrou, também, que a falta de informação de saúde precisa, oportuna e global impede que governos, organizações de saúde e sociedade ofereçam res- postas mais seguras e afirmativas para enfrentar os desafios da Saúde. A escassa capacidade de identificação do estado e disponibilidade de leitos e respiradores, de equipamentos de beira de leito, de profissionais de saúde e, de forma mais relevante, a dificuldade de iden- tificação dos indivíduos que devem ser testados, de coleta de espécimes e distribuição dos resultados de exames têm sido um enorme desafio não apenas no Brasil, mas em todo o mundo, mesmo entre os países mais desenvolvidos (4).

Fica, pois, evidente a necessidade de que a saúde esteja conectada e de que a informação possa ser compartilhada de forma segura e íntegra nos diferentes níveis de atenção e para gestão.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem, desde 2005, encorajando os países-membros a criarem Estratégias Nacionais de Saúde Digital (5), adotarem padrões para promover a interoperabilidade

e utilizarem as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) para promover a saúde para todos, em todos os lugares (6). A sua proposta de Estratégia Global unifica, sob o termo Saúde Digital, todos os

conceitos de aplicação das TICs em Saúde, incluindo e-Saúde, Telemedicina, Telessaúde e Saúde Móvel. Além de reduzir a fragmentação das aplicações da tecnologia em saúde, o conceito de Saúde Digital amplia o entendimento caracterizando-a como área de conhecimento e prática, e absorve os conceitos da utilização avançada da tecnologia, incluindo o uso de dispositivos pessoais e de tecnologias emergentes.

A Saúde Digital brasileira tem acompanhado as tendências internacionais. Estratégia de Saú- de Digital (ESD) do Brasil vem sendo construída desde 2017, numa construção colaborativa com a participação de especialistas, academia, onselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Ministério da Saúde (7).

A metodologia utilizada para a construção da estratégia foi baseada no National eHealth Strategy ToolKit, da OMS, para a construção de estratégias de saúde digital (8). Essa metodologia tem

sido utilizada com sucesso por vários países (9).

Em 27 de agosto de 2020, na reunião da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), foi pactuada a publicação da Portaria da Estratégia de Saúde Digital para o Brasil com foco em 2028 (ESD28) (10).

Trata-se de um documento composto por três partes: (1) Visão Estratégica – revisão e atualização do documento anterior com os objetivos a alcançar até 2028; (2) Plano de Ação de Saúde Digital para o Brasil – descreve as ações para atingir os objetivos da visão; (3) Plano de Monitoramento e Avaliação de Saúde Digital – descreve como as ações serão monitoradas e acompanhadas. Adicionalmente, a Política Nacional de Informação e Informática em Saúde foi revisada e atualizada, e se encontra em fase de aprovação (11). Como parte das iniciativas estratégicas desenvolvidas, em maio de 2020, o Ministério

da Saúde instituiu o programa Conecte SUS pela Portaria 1.434 (12). O programa Conecte SUS está

voltado à “informatização da atenção à saúde e à integração dos estabelecimentos de saúde públicos e privados e dos órgãos de gestão em saúde dos entes federativos, para garantir o acesso à informação em saúde necessário à continuidade do cuidado do cidadão” (12). Nessa mesma portaria, a Rede Nacional

de Dados em Saúde (RNDS) é instituída como:

[...] uma plataforma nacional voltada à integração e à interoperabilidade de informações em saúde entre estabelecimentos de saúde públicos e privados e órgãos de gestão em saúde dos entes federativos, para garantir o acesso à informação em saúde necessário à continuidade do cuidado do cidadão (12).

Impulsionada pela necessidade de dar respostas à COVID-19, a RNDS colocou em prática a tão esperada interoperabilidade entre os sistemas públicos de informação e os laborató- rios privados de análises clínicas.

Neste trabalho, o Plano de Ação de Saúde Digital para o Brasil é discutido com a apresentação de seus potenciais benefícios e desafios, em especial em relação à ampliação do uso da Telessaúde no País.

2. OBJETIVOS

Analisar as ações propostas no documento ESD28.

No documento VOLUME 3 COMPETÊNCIAS E REGRAS (páginas 145-154)