• Nenhum resultado encontrado

01 7 Comparação parcial com aspectos da experiência

socialista no séc. XX 01

8 Referência individual elogiosa 02

9 Outros 04

TOTAL 58

A ideia de revolução aparece nas construções discursivas de Lula como algo positivo, um indicador de qualidade das políticas públicas e das ações do governo. Acaso fosse uma ideia negativa, não seria usada com tanta frequência para adjetivá-las. Usualmente aparece como padrão de medida, o que se reflete na quantidade de eventos assim catalogados, como pode ser visto no discurso de abertura do 37º Congresso Nacional de Supermercados, no Rio de Janeiro/RJ, 15/09/2003:

Estamos promovendo uma revolução pacífica contra a força bruta do egoísmo social e da injustiça econômica. Muitos já arregaçaram as mangas e vieram reforçar as trincheiras abertas pelo governo e por entidades que apóiam o Fome Zero. No próprio setor público há exemplos encorajadores de como ir além do simples assistencialismo. [...] A dívida deste país com a grande maioria do nosso povo é tão grande que, por mais que façamos, só nos cabe fazer ainda mais. Estamos atacando a fome em várias frentes. Criamos mecanismos para incentivar a agricultura familiar e iniciamos uma revolução no microcrédito para estender, a milhares de brasileiros, o direito de ter conta bancária e financiamento. A Caixa Econômica Federal está abrindo 150 mil contas populares por mês (grifos nossos).

Encontramos a ideia de revolução na forma de adjetivação a essas políticas, porém, o mesmo não ocorre quando procuramos a ideia de revolução associada ao elogio de uma estratégia revolucionária, hoje ou ontem, no Brasil ou fora dele. Ao contrário, a revolução como processo é desqualificada de modo sumário em 04 (quatro) citações, como pode ser exemplificado em entrevista concedida à jornalista Insun Kang, do jornal Chosun Ilbo, em 20 de maio de 2005:

Jornalista: Depois que o senhor foi eleito presidente, qual foi a maior surpresa, o que foi mais difícil para o senhor, que não tinha imaginado antes?

Presidente: Primeiro, depois que eu ganhei as eleições, eu passei vários dias imaginando se era verdade que eu tinha ganho as eleições. Quando eu tomei posse, eu ficava imaginando como a democracia é uma coisa fantástica, porque na sociologia política brasileira não se imaginava que um operário pudesse chegar a presidente da República. Eu mesmo não acreditava. E, em 20 anos, organizamos um partido e ganhamos a Presidência, numa demonstração de que isso pode acontecer em qualquer país do mundo. Ou seja, a minha eleição é a demonstração viva de que a sociedade civil, os trabalhadores, podem governar qualquer país. Tem que se organizar. Essa é uma coisa extraordinária. Você, imagine, em tão pouco tempo, em 20 anos, eu perdi uma eleição para governador de São Paulo, aí fiquei decepcionado em 1982, fiquei decepcionado, que eu não ia ganhar nunca. Depois de um ano eu cheguei à conclusão que precisava continuar organizando os trabalhadores. Em 1986, fui o deputado mais votado da história do Brasil. Depois, eu não quis mais ser deputado. Depois, eu perdi a primeira eleição para presidente. Eu tive quase 47% dos votos. Fiquei vários meses decepcionado, achando que não valia a pena, pensando em desistir de tudo. Depois, eu fiquei pensando: não é todo dia que um operário tem 32 milhões de votos. Então, eu fiquei imaginando a dimensão do que significam 32 milhões de votos. Imagine 32 milhões de seres humanos se levantarem em um belo dia de manhã pensando em votar em você. Isso me estimulou e fui candidato em 1994. Até o mês de abril de 1994 eu estava certo de que eu ganharia as eleições. Os meus adversários, com medo de eu ganhar, diminuíram o mandato presidencial, proibiram colocar imagem externa na televisão, e eu perdi. Juntaram-se todos contra mim e eu perdi as eleições. Outra vez, eu pensei em desistir. Mas, chegou em 1998, eu não queria ser candidato. Eu não queria, porque era muito difícil a eleição, mas eu tive que ser candidato outra vez. Tive 32% dos votos. Aí eu pensei: “Bom, já perdi três eleições, eu acho que está na hora de parar”. Aí, chegou 2002, outra vez eu fui candidato e ganhei. Então, esse processo que aconteceu no Brasil é uma novidade, eu diria, extraordinária para o mundo. Nem na Revolução Russa os trabalhadores chegaram ao poder, nem na Revolução Cubana os trabalhadores chegaram ao

governo. E no Brasil, pela via democrática, com debate político, eu fui eleito. Então eu acho que isso pode despertar em outros trabalhadores, no mundo inteiro, a vontade de acreditar como eu acreditei (grifos nossos).

Por quatro vezes foi verbalizado o posicionamento frequentemente usado pelos defensores das estratégias gradualistas de que é necessário privilegiar a ação imediata, em detrimento de objetivos mais radicais em longo prazo. Por duas vezes na forma do argumento de ‘quem têm fome não faz revolução’.

Isto não é nenhuma surpresa dado o desenvolvimento histórico das posições de Lula em relação ao debate estratégico para se chegar ao socialismo. Muito menos tendo na memória o processo vivido desde o início da década de 90 de redefinição ideológica e política dos setores componentes do campo majoritário, que culminou no transformismo político amadurecido do PT de tempos atuais.

A surpresa, no entanto, não tarda a chegar, pois o resultado da amostra nos chama consideravelmente a atenção para a frequência do recurso ao adjetivo de ‘revolucionário’ para as políticas implementadas por seu governo: 42 citações de uma total de 58. O imaginário da revolução, eminentemente positivo, é constantemente reiterado em permanente associação às ações de governo, apesar de praticamente inexistir enquanto possibilidade de futuro, método para o presente ou de elogio de experiências do passado.

A adjetivação de revolucionária é utilizada para caracterizar diversas políticas públicas e diversos programas do governo, tais como: os ‘bio-combustíveis’, a política externa, as cooperativas, o crédito, o programa de saúde bucal, as reformas nos portos, nos aeroportos e na infra-estrutura de transportes em geral, no programa de saúde mental, implantação de cisternas, entre outras.

Mas, notoriamente, a área do governo mais qualificada dessa forma é a ‘revolução na educação’, como pode exemplificar o discurso na cerimônia de apresentação da proposta do Projeto de Lei de Educação Superior e posse do ministro de Estado da Educação, Fernando Haddad em 29/07/2005:

O companheiro Tarso Genro deixa o Ministério da Educação para assumir nova, honrosa e desafiadora missão. Assume, em seu lugar, o companheiro Fernando Haddad, até agora secretário-executivo do próprio MEC e, portanto, membro da equipe que o ministro Tarso montou e que, com ele, vem fazendo uma verdadeira revolução na educação brasileira. [...] O dado concreto é que nós conseguimos, com o ProUni, uma primeira pequena revolução na abertura de vagas para jovens

da periferia deste país que não poderiam estar na universidade. [...] Numa cerimônia como esta não poderia deixar de lembrar um dos marcos mais importantes da nossa revolução educacional, que é o projeto de emenda constitucional que cria o Fundeb. Estamos criando um sistema de financiamento muito mais abrangente do que o existente hoje, que vai atender não apenas o ensino infantil mas, também, a educação fundamental e o ensino médio (grifos nossos).

Dada a reconhecida perspicácia e competência política de Lula, reconhecida tanto por adversários quanto opositores em diversos momentos de sua carreira política – sem contar a existência dos aparatos de comunicação, assessoria e marketing no entorno petista e do planalto – é justo chegarmos à conclusão de que existe um motivo para tantas reafirmações.

Não possuímos os mecanismos de pesquisa qualitativa para avaliar a intensidade e as formas pelas quais se dá a recepção da ideia de revolução, e mesmo de socialismo, no discurso de Lula. Procuramos interpretar os sentidos adquiridos pela ideia de socialismo em seu discurso, tendo em vista o contexto político e ideológico mais amplo no qual Lula, seu partido e sua tendência interna a esse partido, estão inseridos como protagonistas.

Não nos parece factível que um autêntico plano revolucionário secreto, estivesse em operação, conectando os adjetivos ‘revolucionários’ com uma estratégia deste tipo para a construção do socialismo no Brasil. As políticas concretas do governo federal, o desenvolvimento recente do PT e de suas candidaturas no aspecto programático, nas políticas de alianças, nos financiamentos de campanha, na sua estruturação interna, nada nos autoriza a acreditar que exista uma conexão positiva com uma estratégia deste tipo.

Porém, algum sentido possui a associação das ações de governo com a ideia de revolução, seja ao nível do imaginário, nas formas ideológicas de compreensão da luta de classes e da disputa política no período, seja ao nível do cálculo pragmático petista na relação custo versus benefício; ou inclusive, na interação entre os dois elementos.

Nossa hipótese é que essas ocorrências estejam conectadas com a disputa politico- ideológica em torno do projeto societário socialista, não só internamente ao PT, mas em amplas parcelas das suas bases sociais e inclusive do seu eleitorado que almejava uma candidatura de mudança. Neste sentido, as reiteradas afirmações sobre o caráter revolucionário das ações do governo possuem dois aspectos centrais:

1. Reafirmar que este é o governo de esquerda, da mudança, da luta social, independente das inflexões programáticas operadas ao longo da década de 90 e, principalmente, depois da Carta aos Brasileiros.

2. Disputar no interior das bases sociais e políticas do projeto socialista no Brasil, o sentido da transformação desejada, pois se todas essas ações são de fato revolucionárias, o caminho para se alcançar o socialismo é o que já está sendo trilhado. Possuir uma prática revolucionária é defender essas ações de governo e qualquer crítica à esquerda é, não só inconcebível racionalmente, como pode vir a ter efeitos danosos ao processo de transformação.

Prosseguiremos as análises com os influxos decorrentes dos outros pronunciamentos presentes na amostra e coletadas em referência à ideia de reforma.

Tabela 8

Códigos interpretativos associados à ideia de Reforma.

Código Descrição Quantidade

1 Reformas como necessidade positiva, que o "Brasil

precisa" 15

2 Reforma do judiciário 28

3 Reforma da previdência social 23

4 Reforma tributária 22

5 Reforma trabalhista e sindical 07

6 Reforma agrária 26

7 Reforma política 18

8 Reforma universitária 03

9 Reforma da ONU e do seu Conselho de Segurança 09 10 Referência positiva à ideia de estratégia gradual

objetivando o socialismo

03