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comunicação a partir do espaço banal

No documento PORTCOM (páginas 49-53)

Em O espaço do cidadão (SANTOS, 2007), Santos afirma que “o homem moderno é, talvez, mais desamparado que os seus antepassados, pelo fato de viver em uma sociedade infor- macional que, entretanto, lhe recusa o direito a se informar”. Só é possível cidadania de fato se houver amplo acesso à in- formação, descentralização do comando e da produção dessas informações e democratização das condições técnicas, norma- tivas e organizacionais necessárias para ampliar a circulação e o alcance das falas dos distintos agentes, representando a diversidade regional e os mais diferentes lugares.

Cabe, assim, recuperar o entendimento do espaço banal. Milton Santos defende uma análise espacial baseada na tota- lidade e no espaço banal, em oposição às análises territoriais econômicas dos pontos estratégicos, do espaço econômico, que analisa apenas o que interessa às grandes empresas: “pre- ferimos partir da noção de espaço banal, espaço de todas as pessoas, de todas as empresas e de todas as instituições” (SAN- TOS, 2006, p. 191). A tarefa, desafiadora, de democratizar a comunicação deve partir desse espaço banal, de todos os agentes, olhando para a totalidade do território. A partir daí, problematizar as desigualdades regionais e as distintas con- dições constituídas em cada parcela do território. Esse olhar para a totalidade exige o entendimento de que, ao mesmo tempo em que “cada lugar é extremamente diferente de outro, também cada lugar está claramente ligado a todos os outros por um nexo único, dado pelas forças motrizes do modo de acumulação hegemonicamente universal” (SANTOS, 1984). Assim, não se deve analisar os lugares por meio de lógicas par- ticulares e encerradas em si, sem a consideração da totalidade. E as políticas para a democratização da comunicação não po- dem desconsiderar essa totalidade em movimento.

As políticas para ampliar a densidade comunicacional nos espaços “do silêncio” devem partir de transformações técnicas e normativas. Nesse sentido, a expansão das bases técnicas de suporte à fluidez informacional e a ampliação da densidade técnica dos espaços opacos da globalização compõem uma

Contribuições de Milton Santos para pensar a democratização da comunicação agenda política de grande importância para a democratização

da comunicação, pois transformam as condições para a produ- ção e circulação de informações ascendentes e para a ampliação da densidade comunicacional dos lugares. Isso se dá em função da mediação crescente das técnicas na comunicação, da possibi- lidade de apropriação das novas técnicas pelos de baixo (SAN- TOS, 2000) e dos ganhos de escala do alcance das informações em circulação que são viabilizados por essas redes.

Ao mesmo tempo, se essas redes vem sendo usadas cada vez mais por agentes hegemônicos, conformando espaços da globalização funcionais ao capital (SANTOS, 2008b), seria necessário associar essas novas condições técnicas a outras condições normativas e organizacionais que possibilitem a ampliação da densidade comunicacional dos lugares. Ainda que não seja o objeto deste texto, cabe registrar que há casos onde essas transformações normativas tiveram início, como no caso da aprovação da Lei de Serviços de Comunicação Au- diovisual (n. 26.522/2009), na Argentina, que acompanhou um arcabouço de políticas para promover essa transformação nas condições de produção de informações (PASTI, 2017). As transformações normativas devem impor limites à monopo- lização e, consequentemente, à violência da informação. De- vem redistribuir o acesso ao espectro eletromagnético (para a radiodifusão) e estabelecer a comunicação como um direito. Essas normas devem criar condições para a produção e circu- lação de informações a partir das zonas de rarefação técnica, com ações que vão desde a ampliação da oferta de cursos e capacitações até o estabelecimento de cotas regionais e locais à programação, passando pelas condições de financiamento.

Em especial, devem ser políticas construídas a partir da participação efetiva de todos os agentes, sobretudo os “de bai- xo”, historicamente silenciados. Para Milton Santos (2000, p. 167), caso “os processos econômicos, sociais e políticos pro- duzidos de baixo para cima possam desenvolver-se eficazmen- te, uma informação veraz poderá dar-se dentro da maioria da população e ao serviço de uma comunicação imaginosa e emocionada”, com uma mídia que teria um papel oposto ao que lhe é hoje conferido. Pouco se fala, diz o autor, da possi- bilidade de assegurar uma mutação filosófica da humanidade, “capaz de atribuir um novo sentido à existência de cada pessoa

André Pasti

e, também, do planeta” (SANTOS, 2000, p. 174). Para esse fim, urge democratizar a comunicação a partir de um olhar territorial, levando novas condições aos espaços silenciosos que permitam a ampliação das vozes, sentidos e lugares repre- sentados. Disso depende a possibilidade de produzir outros sentidos à nossa existência e romper com o pensamento único.

Contribuições de Milton Santos para pensar a democratização da comunicação

Referências bibliográficas

1. NORA, Pierre. O retorno do fato. In: LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre. História: novos problemas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976.

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5. SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Edusp, 2006. .85-314-0713-3.

6. SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado. São Paulo: Edusp, 2008a. .

7. SANTOS, Milton. O espaço do cidadão. São Paulo: Edusp, 2007. 8. SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à

consciência universal. Rio de Janeiro: Editora Record, 2000. .85-01-05878-5. 9. SANTOS, Milton. Sociedade e Espaço: a formação socioespacial como teo-

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10. SANTOS, Milton. Técnica, Espaço, Tempo: globalização e o meio técnico- -científico informacional. São Paulo: Edusp, 2008b.

11. SANTOS, Milton; SILVEIRA, María Laura. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Editora Record, 2001. 471 p. .85- 01-05939-0.

12. SILVA, Adriana Bernardes. Círculos de informações e novas dinâmicas do território brasileiro. In: XVI Encontro Nacional de Geógrafos, 2010, Porto Alegre. Anais. Porto Alegre: AGB, 2010.

No documento PORTCOM (páginas 49-53)