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Mídias sociais são rupturas alternativas

No documento PORTCOM (páginas 160-165)

The disruptive power of social media: democracy and journalism permeated by

2. Mídias sociais são rupturas alternativas

Quando nos reportamos ao termo mídias sociais nos referi- mos ao conjunto de ferramentas de comunicação que surgiram a partir das possibilidades comunicacionais apresentadas pelo ecossistema digital. As diferentes perspectivas sobre o termo dificultam uma delimitação clara de mídias sociais, como afir- ma Primo. “O composto mídias+sociais é suficientemente pro- blemático, dificultando a delimitação de uma definição que as caracterize” (PRIMO, 2012, p. 635). Conforme o autor a apli- cação do termo, de uma forma geral, é excessivamente prescriti- va, entretanto, destaca que a utilização mais coerente é a que se refere a um conjunto de ferramentas digitais. “Não há nada de errado em utilizar-se “mídias sociais” como um termo “guarda- -chuva” para representar um certo conjunto de meios digitais. Contudo, é preciso estar alerta e não tomar a referência ao social como uma explicação determinística” (PRIMO, 2012, p. 635).

O entendimento das novas dinâmicas que envolvem as mídias sociais é preponderante para revelar possíveis aprimo- ramentos, adaptações e limitações que essas ferramentas co- municacionais podem atribuir às práticas jornalísticas. Essas possibilidades de comunicação apresentam uma série de pe- culiaridades que são evidenciadas por Shirky (2012).

Nossas ferramentas sociais não são um melhoramento da sociedade moderna; são um desafio a ela. Uma cultura com gráficas é de um tipo diferente de uma que não as possui. Novas tecnologias possibilitam novas coisas: em outras palavras, quando novas tecnologias aparecem, coisas antes impossíveis começam a acontecer. Se um número suficien- te dessas coisas impossíveis tem importância e ocorre em quantidade, rapidamente, a mudança transforma-se em re- volução. (SHIRKY, 2012, p. 93).

A possibilidade de participar da construção dos fatos e exercitar a sua consciência crítica em relação a determinados temas faz com que o cidadão, que anteriormente apenas re- cebia informações, sinta-se parte do processo comunicativo e possivelmente torne-se engajado nessas ações comunicativas. Cabe ressaltar a existência de limitações nas mídias sociais que são ratificadas por Picard (2015).

Ricardo José Torres

Por pura ingenuidade e ilusão, muitos defensores das mí- dias sociais – incluindo muitos dos nossos colegas em co- municação e estudos de mídia – têm retratado a internet e seus serviços como uma força autorizada, uma instituição democratizante, e um espaço livre das restrições que atra- palharam as mídias anteriores. Estes observadores apresen- tam um pensamento crítico e uma análise inadequada, ao

venerar a tecnologia, e caem na armadilha do tecnicismo.2

(PICARD, 2015, p. 35).

Picard (2015) lembra que as tecnologias contemporâneas de comunicação estão conexas às possibilidades sociais, mas também às oportunidades comerciais. As suas estruturas produzem arranjos de poder que modificam o processo de produção industrial de conteúdo da comunicação de massa, tornando-o mais centrado nas pessoas, porém, isso não deve ser interpretado como o desaparecimento das influências de poder das elites. Ao se referir à tecnologia o autor indica que ela é concebida como um meio para algum fim, podendo agir de diferentes formas na sociedade. “Ela pode ser cooptada para reforçar as elites e poder existentes. Ela pode diminuir arranjos de poder existentes, mas, em seguida, criar novas eli- tes e poder. É tudo menos benigna e igualitária”3 (PICARD,

2015, p. 36). Para Picard (2015), as mídias sociais são artefatos técnicos dignos de consideração e aprofundamento que geram efeitos sobre os indivíduos e a sociedade, entretanto, devem ser estudadas a partir de uma perspectiva crítica.

Dessa forma, mesmo que os indivíduos e as organizações da sociedade civil tenham a capacidade de usar estas novas ferramentas de comunicação com mais frequência e de dife- rentes formas, as estruturas e os processos do ambiente digital ainda são fortemente influenciados por aqueles que controlam suas infraestruturas e os sistemas necessários para o seu fun- cionamento. “Esses novos arranjos institucionais são baseados em interesses corporativos que determinam os aspectos funda- mentais das operações e práticas, em última análise, no encami- nhamento e no controle de conteúdos”4 (PICARD, 2015, p. 36).

Para Owen (2015), as empresas estabelecidas formalmente estão à frente no desenvolvimento de novas tecnologias que atendam às necessidades dos clientes, entretanto, essas empre- sas não podem ver além das estratégias que fizeram sucesso anteriormente. “Este ponto cego permite que novas empresas

2. No original: Out of sheer naiveté and wishful thinking, many proponents of and commentators on social media including many of our colleagues in communication and media studies – have portrayed the Internet and its services as an empowering force, a democratising institution, and a space free from the constraints that hobbled legacy media. These observers exhibit inadequate critical thought and analysis, venerate the technology, and tumble into the trap of technicism.

3. No original: It can be co-opted to reinforce existing elites and power. It can diminish existing power arrangements, but then create new elites and power. It is anything but benign and equalizing.

4. No original: These new institutional arrangements are based on corporate interests that determine the

fundamental aspects of operations and practices, ultimately channelling and controlling content.

O poder disruptivo das mídias sociais possam inovar nas margens. Tecnologias disruptivas primeiro encontram um nicho de audiência, e uma vez que seu valor é comprovado, elas alargam o seu mercado, derrubando o que está estabelecido”5 (p. 7). A possibilidade de inovação às mar-

gens pode ser empregada no panorama atual que envolve a comunicação, e em particular o jornalismo. As características das mídias sociais, relacionadas à produção e disseminação de informações em larga escala em formatos antes inimaginá- veis, têm um potencial disruptivo.

As tecnologias de comunicação podem ser utilizadas para ações construtivas, mas também para fins ilícitos6 e desones-

tos7, influenciando de forma singular determinados contextos

sociais. As mídias sociais apresentam elementos que promo- vem mutações nas relações sociais, nas formas de troca e cir- culação das informações entre atores que podem ter múltiplas afinidades dependendo da natureza do seu interesse. Essas relações são regidas por um conjunto de normas e valores, e por uma cultura compartilhada que dá origem a um ecossis- tema onde existem possibilidades e ações que pressupõem o deslocamento e a distribuição da centralidade do poder das instituições tradicionais, não substituindo o seu espaço de po- der político, mas diminuindo o seu protagonismo a partir de novos elementos apresentados no ambiente comunicacional.

O conjunto de elementos presentes nos movimentos em rede origina o que Heimans e Timms (2014) chamam de novo poder. Para eles, atualmente nos deparamos com duas visões extremas sobre as perspectivas das novas possibilidades de empoderamento. Existem aqueles que nutrem visões ver- tiginosas de uma nova utopia tecnológica na qual a crescen- te conectividade produz instantaneamente democratização e prosperidade, onde as grandes corporações serão desconstitu- ídas e as multidões tomarão o poder. Em contrapartida, exis- tem os que já viram tudo. Para esse grupo as coisas não estão mudando tanto assim e os episódios que envolvem as mídias sociais, como, por exemplo, a utilização do Twitter, que auxi- liou na derrubada de um ditador no Egito, são subestimados pelos reflexos posteriores e a instalação de outra forma de dita- dura naquele país. Esses indivíduos também menosprezam a ascensão das startups8 de economia colaborativa com a afirma-

ção de que as empresas e as pessoas mais poderosas parecem 5. No original: This blind spot allows

new companies to innovate on the margins. Disruptive technologies first find a niche audience, and once their value is proven, they widen their market, taking down the establishment. 6. Redes sociais como ferramenta do terrorismo. Disponível em https://goo. gl/RNLVqR. Acesso em: 20 de janeiro

de 2018. 7. O que é ‘pós-verdade, a palavra do ano segundo a Universidade de Oxford. Disponível em https://goo. gl/VxFho6. Acesso em: 20 de janeiro de 2018.

Ricardo José Torres

ficar cada vez mais poderosas.

O velho poder e o novo poder produzem efeitos de manei- ras distintas. Os novos modelos são ativados pela coordenação entre pares e pela ação da multidão: sem a participação não obtêm êxito. Já a forma tradicional de poder é ativada pelo que as pessoas ou organizações possuem, sabem ou contro- lam: se perderem isso perderão as suas vantagens. Os autores ilustram os aspectos que, para eles, explicitam as diferenças entre as duas formas de poder.

Figura 1: Reprodução do site Harvard Business Review – Brasil

Fonte: Harvard Business Review – Brasil (2014)

O surgimento de novos formatos de distribuição e cober- tura dos fatos públicos têm ocasionado a emergência de um reforço de atenção sobre temáticas políticas alternativas. O fortalecimento do interesse por esses casos, somado à possi- bilidade de propagação das informações, por meio do com- partilhamento, gera uma capacidade de alcance no ambien- te digital e dão origem a um fator disruptivo oferecido pelas mídias sociais. No entender de Shirky (2012), as mudanças nas maneiras de nos comunicarmos mudam também a so- ciedade, pois as ferramentas de comunicação são dispositivos sociais que moldam e são moldados pela vida dos cidadãos. As possibilidades comunicacionais relacionadas às mídias so- ciais potencializam a disseminação de formas de interpreta-

8. Startup é uma empresa recém-criada que está em fase de desenvolvimento e que normalmente tem base tecnológica. Está constantemente buscando um modelo de negócio inovador, uma maneira de gerar valor e transformar seus esforços em resultado.

O poder disruptivo das mídias sociais ção, reinterpretação e um conjunto de “novas” informações políticas que emergem do espaço público. Esses aspectos po- dem fomentar a pluralização e a ampliação da compreensão do ambiente político compartilhado e criado pelo conjunto da sociedade ou na sua polarização e na disseminação de con- teúdos falsos.

Ricardo José Torres

No documento PORTCOM (páginas 160-165)