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horizontalidades na comunicação

No documento PORTCOM (páginas 44-49)

As noções de verticalidade e horizontalidade, trazidas por M. Santos, são dois recortes espaciais importantes para pensar a democratização da comunicação a partir do território usado. Para o autor, no atual período,

os arranjos espaciais não se dão apenas através de figuras formadas de pontos contínuos e contíguos. Hoje, ao lado dessas manchas, ou por sobre essas manchas, há, também, constelações de pontos descontínuos, mas interligados, que definem um espaço de fluxos reguladores. As segmen- tações e partições presentes no espaço sugerem, pelo menos, que se admitam dois recortes. De um lado, há extensões formadas de pontos que se agregam sem descontinuidade, como na definição tradicional de região. São as horizonta-

lidades. De outro lado, há pontos no espaço que, separados

uns dos outros, asseguram o funcionamento global da so- ciedade e da economia. São as verticalidades. (SANTOS, 2006, p. 284).

As verticalidades (SANTOS, 2006, p. 284–285) seriam vetores da racionalidade superior e do discurso hegemônico, que criam interdependências – que tendem a ser hierárquicas – “tanto mais numerosas e atuantes quanto maiores as neces- sidades de cooperação entre lugares”. Já as horizontalidades seriam tanto o lugar da finalidade imposta de fora, de longe e de cima, quanto o da contrafinalidade, localmente gerada. Conforme Santos (2006, p. 285), “o espaço se compõe de uns e de outros desses recortes, inseparavelmente”. A partir des- ses recortes, é possível compreender, de um lado, a tendência atual pela união vertical dos lugares, a partir do comando dos grandes grupos globais e nacionais de comunicação; de outro, a importância das dinâmicas horizontais para uma comunica- ção efetivamente democrática no território.

Desdobrando esse entendimento de Milton Santos, a ge- ógrafa Adriana Bernardes da Silva diferenciou círculos in- formacionais ascendentes e descendentes (SILVA, 2010). Os círculos descendentes seriam aqueles baseados na informação que atinge verticalmente os lugares, enquanto os círculos de informação ascendentes fariam referência às dinâmicas mais

André Pasti

arraigadas “ao lugar, ao dilema da sobrevivência, da resistên- cia e da reprodução” (SILVA, 2010, p. 2). Esses círculos ascen- dentes e descendentes coexistem no espaço geográfico.

Como afirma o autor (SANTOS, 2000, p. 174), “se a reali- zação da história, a partir dos vetores ‘de cima’, é ainda domi- nante, a realização de uma outra história a partir dos vetores ‘de baixo’ é tornada possível. E, para isso contribuirão, em todos os países, a mistura de povos, raças, culturas, religiões, gostos etc.”. Promover condições para a produção de informa- ções ascendentes seria, portanto, essencial para a agenda da democratização da comunicação no território, fazendo frente ao predomínio dos círculos descendentes de informações, co- mandados pelos grandes grupos de comunicação.

Contribuições de Milton Santos para pensar a democratização da comunicação

4. Diferenciações no território: pares dialéticos

Compreender a complexidade dessas desigualdades ter- ritoriais que constituem, historicamente, cada formação so- cioespacial (SANTOS, 1977) e sua diversidade regional é fundamental para pensar um planejamento territorial demo- crático e, em particular, a democratização da comunicação. Ampliar a capacidade de “fala” e de “escuta” dos lugares passa por transformar as condições materiais e imateriais, técnicas e normativas dos lugares.

Na obra Metamorfoses do Espaço Habitado, Milton San- tos destaca a importância de pensar o espaço a partir desses movimentos das contradições – entre interno e externo, novo e velho, Estado e mercado (SANTOS, 2008a, p. 103–110). Ele trabalha outros “pares” nas diferenciações do território no livro O Brasil: território e sociedade no início do século XXI, em coautoria com María Laura Silveira (SANTOS;SILVEIRA, 2001, p. 258–277). Analisando o território brasileiro, os au- tores propõem a compreensão de uma complexidade de di- ferenciações sobrepostas, entre as quais: áreas da fluidez e da viscosidade; espaços da rapidez e da lentidão; espaços que “mandam” e que “obedecem”; espaços luminosos e opacos da globalização; e zonas de densidade e rarefação.

Desses, três pares terão mais atenção neste texto: (1) flui- dez e viscosidade; (2) densidade e rarefação; e (3) espaços luminosos e opacos. A análise da fluidez territorial e da vis- cosidade compreende as condições para a circulação material e imaterial, que envolvem fatores que vão da disposição das materialidades à condição financeira, passando pelas normas, usos e costumes. Usualmente, as condições para a fluidez ma- terial e imaterial no território não tem relação direta “com o tamanho e a densidade da população, nem com a antiguidade do povoamento, nem com as urgências das sociedades locais, mas com os nexos econômicos, sobretudo os da economia internacional” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 261–262). Conforme Santos e Silveira, pode-se, também, distinguir a fluidez virtual (ou potencial) de uma fluidez efetiva do terri- tório. A fluidez virtual seria medida pela presença dos sistemas de engenharia, pelas materialidades e objetos técnicos neces- sários à circulação. No entanto, a fluidez efetiva depende do

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uso real do território. A agenda da democratização da comu- nicação deve considerar a necessidade de transformar as con- dições materiais para ampliar a fluidez potencial dos espaços isolados da circulação (sobretudo das informações). Todavia, deve-se lembrar que não bastam essas transformações de or- dem material para a mudança dos usos efetivos do território.

Nesse sentido, devem ser consideradas as distintas densida- des e rarefações no espaço geográfico. Milton Santos e María Laura Silveira (2001, p. 260) destacam que a cartografia tradi- cional enfatizava apenas a densidade populacional, enquanto é possível pensar as densidades e rarefações de diversas ques- tões. O território “mostra diferenças de densidades quanto às coisas, aos objetos, aos homens, ao movimento das coisas, dos homens, das informações, do dinheiro e também quanto às ações”. Eles destacam que é possível, para o território como um todo ou para uma de suas parcelas, “calcular densida- des técnicas, informacionais, normativas, comunicacionais etc.” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 261). Em A Natureza

do Espaço, Santos já havia desenvolvido essa relação entre as

distintas densidades informacionais, técnicas e comunicacio- nais dos lugares. Para ele, a densidade técnica seria dada pe- los graus de artificialidade, variando do espaço jamais tocado pelo homem até a prevalência dos objetos técnicos (SANTOS, 2006, p. 257). A densidade informacional nos indica o grau de exterioridade do lugar, já que a informação introduz uma intervenção vertical no espaço, que geralmente ignora seu en- torno. Já a densidade comunicacional resulta do tempo plural do cotidiano partilhado, estando ligada às dinâmicas do lu- gar, tendo em vista que a comunicação pressupõe a troca. Há espaços conectados às redes globais, espaços funcionais à glo- balização – de alta densidade técnica e informacional – que, no entanto, não possuem dinâmicas horizontais de troca, de comunicação efetiva.

Por fim, pode-se recorrer às noções de espaços luminosos e opacos da globalização. Os autores consideram “espaços lu- minosos aqueles que mais acumulam densidades técnicas e informacionais, ficando assim mais aptos a atrair atividades com maior conteúdo em capital, tecnologia e organização”. Por outro lado, “subespaços onde tais características estão au- sentes seriam os espaços opacos. Entre esses extremos have-

Contribuições de Milton Santos para pensar a democratização da comunicação ria toda uma gama de situações. Os espaços luminosos […] seriam os mais suscetíveis de participar de regularidades de uma lógica obediente aos interesses das maiores empresas”, afirmam Santos e Silveira (2001, p. 264). Dialogando com os conceitos de espaços luminosos e opacos da globalização, Rojas (2014, p. 151) sugere o entendimento de que os espa- ços opacos são espaços “silenciosos” ou espaços “do silêncio”. Romper com a violência da informação seria ampliar o alcan- ce das vozes desses espaços, criando condições para a amplia- ção da densidade comunicacional dos lugares.

André Pasti

5. Agenda da democratização da

No documento PORTCOM (páginas 44-49)