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CAPÍTULO 3. A procura e oferta de turismo e recreação

3.3. A oferta de turismo e recreação

3.3.1. Conceitos e componentes

Em termos gerais, o sector da oferta é formado pelas empresas que fornecem e vendem os bens e serviços de que os consumidores têm necessidade e estão dispostos a adquirir. O conjunto das empresas de uma região ou área-destino formaria, nessa ordem de ideias, a base da sua oferta turística. No entanto, a par de bens e serviços, em turismo há um “consumo e experiência de lugares" (como lhe chama Paajanen, 2000: 46) e muitas empresas podem ser apenas atracções secundárias ou serviços de apoio, já que são, muitas vezes, os recursos naturais, culturais ou até a intangibilidade da fé que atraem visitantes. A oferta turística é, por isso, também função das características naturais, culturais e socioeconómicas da área-destino ou região (Gartner, 2000: 565) .

Devido a estas especificidades do turismo, embora alguns autores falem de indústria turística, significando o conjunto de empresas e organizações que oferecem e comercializam produtos turísticos; outros mostram-se relutantes na utilização deste termo25, como foi referido no ponto

2.4., Capítulo 2. Contudo, é reconhecido que a indústria turística não é o único fornecedor dos

produtos turísticos, quando estes ganham um sentido alargado de experiência e dependem de

outros elementos do sistema da oferta (a noção de produto turístico irá ser objecto de análise no ponto seguinte, 3.3.2.).

O sistema da oferta turística é assim composto por uma diversidade de entidades, recursos e produtores de subprodutos. Gunn e Var (2002: 40) defendem que, pelo “lado da oferta”, há três sectores envolvidos: empresas privadas, organizações sem fins lucrativos e sector público. No seu modelo do sistema funcional de turismo, exibido na Figura 3.2., a oferta turística é apresentada como um sistema de componentes reciprocamente interdependentes e interagentes.

25 A natureza predominantemente intangível do produto turístico, como veremos no ponto seguinte, é frequentemente apresentada como justificação para classificar a área do turismo como pertencendo ao ‘sector dos serviços’. Apesar da crescente discussão relativa à sobreposição entre indústria e serviços no sentido estrito dos termos, a classificação da oferta turística como uma ‘indústria’ pode ser discutível, como se explicitou na nota de rodapé 11, Capítulo 2.

Figura 3.2 І A oferta no sistema funcional de turismo de Gunn

Em face destas inter-relações dinâmicas entre diferentes entidades e agentes, com objectivos diversos, bem como as características da procura e do próprio produto turístico, a gestão do sistema de oferta é complexa e exige uma abordagem integrada. Se as componentes da oferta turística são múltiplas e variadas; por outro lado, é igualmente difícil distinguir os elementos da oferta que são usados pelos turistas, excursionistas e comunidades locais. Cooper et al. (2001: 142), referindo-se à área-destino, distinguem entre a infra-estrutura (de transporte, serviços de utilidade pública e outros serviços) geralmente utilizada por residentes e turistas e resultante do financiamento público, e a superestrutura (alojamento, atracções criadas intencionalmente para o turismo, lojas de recordações, outros serviços) normalmente resultado da actividade do sector privado.

Já Holloway (2002: 76-78) apresenta o sistema da oferta através de uma abordagem de “cadeia de distribuição” constituída tradicionalmente por produtores de transporte, alojamento e atracções,

grossistas e retalhistas que vendem aos consumidores finais, embora haja crescentes variações

na organização deste “canal de marketing”.

Muitos outros autores tentaram identificar as componentes da oferta turística26. Page et al. (2001:

74) adoptaram uma classificação, a partir de Inskeep, em colaboração com a OMT (1994), que integra os seguintes elementos: atracções e actividades, alojamento, transportes, elementos

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No aprofundamento desta e de outras questões relativas à oferta turística pode recorrer-se a uma grande variedade de autores, que a estudam a partir de diferentes perspectivas (Bull, 1995; Chadwick, 1994; Gartner, 2000; Hall e Page, 2002; Holloway, 2002; Kotler et al., 1999; Middleton e Clarke, 2001; Mill e Morrison, 1985, Smith, 1995).

PROCURA

O F E R T A

Atracções Transportes Serviços Informação Promoção

institucionais e outros equipamentos e serviços turísticos. Esta enumeração parece particularmente clara na identificação dos elementos centrais de resposta à procura turística. O elenco original de componentes de Inskeep e OMT (1994: 5) integra ainda outras infra-estruturas (fornecimento de água, electricidade, saneamento, recolha de lixo e telecomunicações) que alude à distinção [infra-estrutura/superestrutura] já referida (Cooper et al. 2001: 142).

As atracções (naturais, culturais, temáticas) e actividades com elas relacionadas que encabeçam a sistematização do sistema da oferta de Inskeep e OMT (1994: 5) e de Gunn e Var (2002: 34) constituem o centro e o factor motriz da actividade turística porque, como a própria designação indica, atraem os visitantes até si. Como escreve Turley (1997: 13) as áreas-destino e, em particular, “as atracções são responsáveis pelo factor pull da mobilidade dos visitantes”. Fundamentado o seu papel central em todo o sistema, as atracções merecerão obviamente uma análise individualizada adiante, no Capítulo 4.

Cooper et al. (2001: 255-54) faz um diagnóstico dos sectores individuais da oferta turística, evidenciando características e tendências:

• baixo nível de concentração - predominância de pequenas empresas apesar do mercado ser dominado por um pequeno número de empresas;

• alto nível de custos fixos em relação aos custos variáveis;

• alto nível de contacto com o cliente, exigindo formação profissional adequada;

• falta de especialização em marketing e recursos humanos como grande limitação da actividade turística;

• importância do acesso directo aos mercados;

• natureza perecível do produto, exigindo informatização das reservas e gestão da rendibilidade;

• ausência de fidelidade na procura e na cadeia de distribuição;

• padrões sazonais e irracionais da procura;

• adopção tardia de auditoria ambiental e técnicas de avaliação de impacto ambiental;

• grau crescente de integração horizontal e vertical;

• fragmentação do sector, aliada à dispersão geográfica, desencorajando associações empresariais;

• perspectiva tradicional do sector;

• no sentido inverso, crescente profissionalismo.

No que respeita à recreação, segundo Kreutzwiser (1989, citado por Hall e Page, 2002: 88) “a oferta refere-se aos recursos recreativos, tanto naturais como construídos, que fornecem

oportunidades de recreação” e é, sobretudo, a partir desta noção de recursos que tem sido analisada (Hall e Page, 2002; Pigram e Jenkins, 1999). Recurso recreativo é definido por Kreutzwiser (1989, citado por Hall e Page, 2002: 89) como “um elemento do ambiente natural ou humanizado que oferece oportunidade de satisfazer necessidades de recreação”, podendo abranger um vasto número de formas associadas ao espaço, topografia e características climáticas (Pigram e Jenkins, 1999: 59).

A relação entre a oferta de turismo e a oferta de recreação levanta as mesmas questões,

ceteris paribus, que se depararam no esclarecimento comparativo entre procura de turismo e

procura de recreação (ver ponto 3.1.2.). Por exemplo, Shaw e Williams (2002) referem-se às “indústrias do turismo e do lazer” no seu conjunto. Já Simmons (2000: 489) salienta que as actividades turísticas abrangem uma extensa lista de actividades de recreação: passiva (ver a paisagem, por exemplo), activa, entretenimento, etc. Estas oportunidades são oferecidas geralmente a visitantes, nacionais ou internacionais, e comunidades locais. Com efeito, a destrinça entre recursos recreativos e turísticos, ainda que fosse teoricamente possível, não se verifica na prática.

Pelo que ficou exposto, neste e no capítulo anterior, a recreação é um fenómeno mais difuso, pese embora o facto das actividades recreativas constituírem campo de estudo específico (veja-se, entre muitos exemplos, os já citados compêndios de Torkildsen e de Pigram e Jenkins27). O turismo porque implica sempre uma deslocação, apesar de tudo, é mais facilmente mensurável, nomeadamente através de registo estatístico e avaliação do seu impacto económico, físico e sociocultural. Nesse sentido, apesar das advertências quanto à sua relativa imaturidade científica (ver ponto 2.4., Capítulo 2) e pese embora o facto deste se encontrar somente agora a emergir como “disciplina de pleno direito” (Jennings, 2001: 4), o Turismo assume-se como campo de estudo e sector económico mais autonomizado do que o fenómeno da recreação, sendo as actividades recreativas, em grande parte, estudadas e quantificadas no âmbito da actividade turística. Este facto explica que, no decurso do enquadramento da questão em apreço, e designadamente no ponto seguinte, esta dissertação recorra, porventura com maior ênfase, às teorias relativas ao turismo, pela sua superior sistematização ou maior pertinência.

A forma mais comum e consensual de analisar a oferta turística é através da descrição das componentes físicas do produto oferecido pelas empresas e atracções que atraem visitantes à área (Gartner, 2000: 565). Este produto turístico, que como se viu não é separável da oferta recreativa, nos seus conceitos e características, será agora discutido.