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3. GOVERNANÇA CORPORATIVA

3.1. CONCEITOS E PRINCÍPIOS

Neste capítulo foram abordados os principais conceitos sobre governança corporativa, aspectos regulamentares abordados no Brasil, Estados Unidos e Inglaterra, assim como será discorrido sobre o termo Barreiras da Informação - Chinese Wall. Por fim, será apresentada síntese do capítulo.

3.1. CONCEITOS E PRINCÍPIOS  

Governança Corporativa pode ser entendida como um conjunto de princípios e mecanismos utilizados para proporcionar boas práticas de mercado e consequentemente possíveis retornos financeiros aos investidores. Tem papel fundamental no desenvolvimento das organizações, uma vez que a adoção de boas práticas aumenta a confiança dos investidores nacionais e internacionais, reduz o custo do capital, atrai fontes de financiamentos estáveis o que possibilitará uma melhor avaliação (rating) da empresa. O assunto foca na separação de gestão e propriedade, ou seja, conflitos de agência relacionados aos conflitos de interesse entre os proprietários e executivos das empresas, conhecido como “Teoria das Agências”.

O desenvolvimento e o crescimento das corporações em diferentes países favorecem situações onde profissionais executam as atividades de administração e gestão das empresas. Contudo, a delegação de responsabilidades a terceiros com foco principal em maximizar o valor da empresa aos acionistas, a necessidade de manutenção do emprego, e consequentemente a necessidade de defender os seus próprios interesses, favorecem ao surgimento do conflito de interesses, sendo desta forma, fundamental a adoção de boas práticas de governança corporativa.

Segundo o axioma de Klein, o conflito de agências é decorrente da inexistência de previsibilidade e das constantes mudanças nos ambientes econômicos e dos negócios, as quais impossibilitam a formalização de contratos que contemplem todas as ações a serem colocadas em prática pelos gestores e administradores das empresas, para que adequadas respostas às incertezas e riscos, sejam adotadas. Tal imprevisibilidade torna necessária a celebração de

contratos abrangentes, contendo direcionadores que possibilitam tomadas de decisões e assunções de riscos muitas vezes em benefício próprio e não do coletivo. Jensen e Meckling defendem que o conflito das agências decorre da ausência de agentes perfeitos, visto que a natureza humana apresenta como tendência defender as necessidades e vontades próprias.

A definição a respeito do termo Governança Corporativa varia de acordo com o foco onde o assunto é tratado. Para Andrade e Rossetti todas as definições e conceituações podem ser sintetizadas através dos cinco (5) P’s, representados pelos princípios, propósitos, processos, práticas e poder.

Para Andrade e Rossetti (2006, p.26):

Boas práticas de governança são fundamentais para controlar riscos dos investimentos nas empresas abertas – especialmente decorrentes do ambiente competitivo, dos processos de gestão de seus ativos físicos, financeiros e intangíveis e dos associáveis à qualidade das informações que orientam e sustentam as decisões dos investidores.

Conforme CVM a governança corporativa é o conjunto de práticas que tem por finalidade aperfeiçoar o desempenho de uma companhia ao proteger todas as partes interessadas, tais como os investidores e credores, facilitando o acesso ao capital. Monks e Minow (2002, p.1) definem como “a relação entre vários participantes existentes para determinar a direção e performance da empresa”, para o IBGC (2009, p.19) é o:

Sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle. As boas práticas de Governança Corporativa convertem princípios em recomendações objetivas, alinhando interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor da organização, facilitando seu acesso a recursos e contribuindo para sua longevidade.

A OECD defende que adequadas estruturas de governança desempenham papéis vitais nos mercados financeiros, uma vez que fornecem maior integridade e eficiência nos mesmos, em contrapartida, a adoção de práticas inadequadas, potencializam situações de dificuldades financeiras e fraudes, assim como prejudicam o desempenho das empresas frente a seus concorrentes:

Governança é sistema segundo o qual as corporações de negócio são dirigidas e controladas. A estrutura da governança corporativa especifica a distribuição dos direitos e responsabilidades entre os diferentes participantes da corporação.

A OECD estabelece princípios básicos de Governança Corporativa, que são de natureza evolutiva e devem ser revistos sempre que houver mudanças significativas e compreendem: Direitos dos acionistas; Tratamento equânime dos acionistas; Papel das partes interessadas (stakeholders) na governança corporativa; Divulgação e Transparência; Responsabilidades do conselho. Tais diretrizes são endossadas pelos princípios do ICGN, os quais afirmam que os padrões de governança adotados pelas empresas são considerados como fatores fundamentais na decisão dos investidores sobre a aplicação de seus recursos.

A Figura 6 a seguir, retrata as partes integrantes do sistema de governança corporativa das empresas, as quais compreendem: Sócios ou Proprietários da companhia; o Conselho de Administração, responsável pelo processo de decisão de uma organização em relação ao seu direcionamento estratégico, é a ligação entre os sócios e a gestão da empresa, é o órgão considerado o guardião do sistema de governança; a Auditoria Independente, cuja atribuição básica é verificar se as demonstrações financeiras refletem de forma íntegra a realidade da empresa; o Conselho Fiscal que apresenta como principais objetivos fiscalizar os atos dos administradores, verificar o cumprimento dos deveres legais e estatutários, opinar sobre o relatório anual da administração e sobre as propostas dos órgãos de administração, analisar e examinar as demonstrações financeiras da empresa assim como denunciar erros, fraudes ou crimes que prejudiquem ou interfiram os interesses da companhia; a Gestão da organização, a qual reflete a responsabilidade do diretor presidente pela gestão da mesma e a coordenação da diretoria, bem como a execução de diretrizes fixadas pelo Conselho de Administração; Conduta e Conflitos de Interesses referem-se ao código de conduta da organização, o qual deve refletir adequadamente a cultura da empresa.

Figura 6: Sistema de Governança Corporativa

Fonte: Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa – IBGE (2009)

Monks e Minow (2002) consideram que apesar das práticas de governança ser convergentes no que se refere aos objetivos finais, não há um padrão único entre os países e empresas, uma vez que os mesmos são diretamente influenciáveis pela cultura local, práticas e pressões.

O nível de governança, assim como os modelos adotados em cada país e empresa não são únicos, são influenciados pela característica de cada qual, onde se destacam os aspectos culturais e de formação histórica da respectiva economia, tipo de controle da empresa (companhias abertas, fechadas, familiares) e por fim pelo nível almejado pelos administradores e acionistas das organizações.

Na história da governança destaca-se o ativismo pioneiro de Robert Monks, o relatório de Cadbury e os princípios da OECD. Robert Monks foi um dos pioneiros a enfatizar a governança como sendo direcionador de prosperidade da sociedade, o qual destacou a necessidade de justiça e conformidade aos aspectos legais.

O Cadbury report19 espelhou a necessidade de responsabilidade e

transparência na divulgação das informações, enquanto que a OECD destacou a estrita relação entre as boas práticas de governança e o desenvolvimento econômico das nações. Em 1999 a OECD publicou o código internacional sobre boas práticas da governança corporativa, com objetivo de fortalecer os aspectos legais, institucionais e regulatórios, implementar nas empresas, mecanismos e ferramentas capazes de evitar eventuais conflitos de interesses, bem como assegurar o direito de todos os envolvidos.

Estes direcionadores configuram grande marcos para o início da disseminação e preocupação da implantação da governança, além disso, subsidiou o desenvolvimento de códigos de boas práticas desenvolvidos por entidades autorreguladoras, investidores institucionais e pelas instituições que operam nos mercados.

Tanto nos Estados Unidos como no Reino Unido os aspectos de governança são muito similares. Ambos centralizam o monitoramento dos gestores e administradores, evitando assim, a adoção de práticas contrárias aos interesses dos acionistas.

Nos Estados Unidos, observou-se entre os séculos dezenove e vinte, preocupação com os controles corporativos, principalmente aqueles decorrentes de ações hostis para tomada da propriedade. A partir da década de 80, a preocupação passou a ser voltada aos investidores institucionais, com destaque aos fundos de pensão, cujas decisões sobre os recursos de milhares de participantes, estavam concentradas em poucos administradores. Esta situação pode ser exemplificada pelo fundo de pensão California Public Employees’ Retirement System (CalPERS20),

que contava com a contribuição de mais de um milhão de participantes, e, em 1984, a decisão de realização de investimentos na compra de ações na oferta pública da empresa Texaco não foi efetivada, em virtude das decisões adotadas pelos gestores. Como resposta a esta situação foram adotadas mudanças no processo de governança, onde foi criado, em âmbito nacional o conselho de investidores institucionais ou Council of Institucional Investors (CIL), cujos principais objetivos       

19 Cadbury Report refere-se a relatório emitido como resultado de Comitê realizado no ano de 1992 e

presidido por Aldrian Cadbury.

20 CalPERS – California Public Employees’ Retirement System refere-se ao Sistema de

eram estabelecer boas práticas de governança e propor alterações nas legislações em benefício aos acionistas.

No século vinte e um no mercado norte americano, tem destaque à promulgação da Lei Sarbanes Oxley, que transformou parte das práticas de governança em obrigações legais, onde foram estabelecidas diretrizes no que se refere à estrutura e responsabilidade do Conselho de Administração, a obrigatoriedade pela divulgação de informações financeiras confiáveis, assim como atribuiu penalizações aos administradores por eventuais irregularidades. Estas modificações foram ações que tinham como objetivo, coibir as práticas indevidas de fraudes, como as adulterações dos resultados das empresas, que visavam atingir as altas expectativas dos acionistas por resultados positivos.

O Reino Unido caracterizado por forte participação de investidores institucionais no mercado e tem como grande marco da governança corporativa o período de 1992, quando houve a publicação do relatório do comitê de Cadbury, conhecido como Report of the Committee on the Financial Aspects of Corporate Governance, que enfatizou aspectos financeiros na governança corporativa e foi influenciador nos mercados ocidentais. Este relatório foi decorrente do comitê, presidido por Aldrian Caldbury, que teve como destaque as análises efetuadas sobre a qualidade das demonstrações financeiras das empresas listadas em bolsa e as alterações nas atuações dos Conselhos de Administração, que possuíam como responsabilidade, o monitoramento e orientação das decisões estratégicas das companhias.

Além disso, outros importantes comitês e ações estabelecidas no Reino Unido contribuíram para o fortalecimento e a adoção de boas práticas de governança nas empresas. No retrospecto cita-se em 1995, a realização de comitê voltado à remuneração e eficácia dos conselheiros da administração, conhecido como Remuneração dos Diretores, ou Director’s Remuneration: Report of a Study Chaired by Sir Richard Greenbury – Greenbury report. No ano de 1997, foi criado comitê para proporcionar segurança e transparência das demonstrações financeiras das companhias negociadas em bolsas de valores, assim como garantir a relação com os acionistas, conselhos e os administradores, o qual foi denominado Comitê de Governança Corporativa, ou Committee on Corporate Governance: Final Report – Hampel report. Em meados de 1998 foi adotado pela bolsa de valores de Londres - London Stock Exchange, o código de princípios e boas práticas de governança

corporativa, que englobava as definições propostas pelos relatórios Cadbury, Greenbury e Hampel. No ano de 1999, houve a publicação de um guia voltado aos controles internos e gestão de riscos das empresas, denominado Controles Internos: Guia para Diretores, conhecido como Internal Control: Guidance for Directors on the Combined Code – Turnbull guidance. Em 2001, foi finalizada a revisão da lei societária do Reino Unido. No período de 2003, houve a revisão do código combinado de governança o Combined Code on Corporate Governance, que foi inicialmente publicado em 1999, e que na nova versão foram explorados os papéis e efetividade dos conselheiros não executivos e dos comitês de auditoria.

A história do Brasil é marcada pelas movimentações no mercado e que ressaltaram a importância das boas práticas, dentre as quais as privatizações ocorridas entre as décadas de 70 e 80, que movimentaram cerca de US$ 98 bilhões de dólares e acarretaram a transferência do controle das empresas do Estado para grupos de consórcios, formados principalmente por grandes empresas privadas, investidores institucionais e empregados. Aumento de investimentos estrangeiros no mercado brasileiro, em meados da década de 90, quando houve a abertura do mercado, favorecendo a onda de fusões e aquisições das empresas brasileiras, com destaque para o representativo investimento de capital estrangeiro, aproximadamente 50% das transações e do capital investido foram provenientes de empresas internacionais. Aliados a estes fatos, as mudanças nos macroambientes globais, fortaleceram a necessidade dos padrões e estruturas de governança estabelecidas no Brasil, uma vez que o mercado brasileiro além de configurar rota dos investimentos estrangeiros, também começou a ter seus papéis negociados nas bolsas dos mercados estrangeiros, especialmente no mercado de capitais norte- americano.

Tais acontecimentos induziram ao aprimoramento dos padrões de governança adotados pelas empresas, devido a forte influencia de investidores de outras localidades do mundo e que estão adaptados às regras rígidas dos mercados internacionais, e que tendem a garantir qualidade das demonstrações financeiras e maior severidade quanto às funções desempenhadas pelos Conselhos de Administração. Outro fator que merece destaque no Brasil é o crescimento dos fundos de pensão ocorridos também a partir de meados da década e 90, e que são predominantemente concentrados em empresas estatais, cujos ativos são aplicados no mercado de capitais.

Como consequência foram adotadas algumas medidas, visando fortalecimento destas práticas, com destaque para as atualizações da Lei das Sociedades por Ações, e do Código Civil, ocorridas respectivamente no ano de 2001 e 2002 e a adoção da Lei Sarbanes Oxley pelas empresas brasileiras, listadas na Bolsa de Valores do mercado norte americano.

Além disso, é importante destacar a criação do Novo Mercado e dos níveis diferenciados de governança corporativa, o mercado tradicional, Nível 1, Nível 2 e o Novo Mercado, instituídos pela Bolsa de Valores de São Paulo. Na estrutura da governança no Brasil merece destaque as responsabilidades atribuídas ao Conselho de Administração, responsável principalmente por decidir sobre conflitos existentes entre acionistas majoritários e minoritários, assim como entre gestores e acionistas (conflitos de agência), a definição de critérios e limites de forma a proporcionar a melhor relação custo e benefício (custos de agência), direitos assimétricos de voto e alinhamento geral de interesses da organização.

Diferentemente das características identificadas nos Estados Unidos e Reino Unido, no Brasil, há concentração da propriedade acionária, na média estão centradas em poder de três controladores, com predomínio de empresas familiares. Realidade esta que proporciona conflitos entre os acionistas majoritários e minoritários.

Outro fator marcante e que mudou o rumo da governança no Brasil, foi à criação do IBGC, em 1999, sociedade civil e sem fins lucrativos, que tem como foco, difundir os melhores conceitos e práticas, formação de profissionais, promover pesquisas e contribuir para perpetuação do assunto nas empresas, o instituto é responsável pelo lançamento do código das melhores práticas de governança corporativa.

3.2. BARREIRAS DA INFORMAÇÃO – CHINESE WALLS  

Assim como a muralha da China, que foi construída com o objetivo de proteger-se de países invasores, em 1929 a ideia de proteção e segregação física foi expandida para o Mercado Financeiro, com objetivo de separar e isolar fisicamente as áreas que desempenhassem atividades conflitantes, como exemplo, bancos de investimentos versus áreas responsáveis pela negociação (compra ou