3.2 A DIMENSÃO POLÍTICA DA IDENTIDADE DO PEDAGOGO
3.2.2 Concepção de Educação Escolar
Compreende-se a educação escolar como o processo de educação realizado
em um sistema escolar de ensino, ou seja, na escola ou em institutos e instituições
legalizadas para exercê-la. O surgimento da educação escolar está relacionado com
o surgimento da sociedade industrial, das escolas e das políticas públicas
educacionais.
O conceito de educação escolar surge para distingui-la do processo
de educação, em seu sentido amplo. A escola passa a ser o espaço de transmissão
de uma cultura, denominada de cultura escolar, com uma arquitetura, mobiliário,
tempos, ritmos, saberes e práticas específicas e peculiares.
A instituição escolar, como está organizada atualmente, surgiu com o
nascimento da sociedade industrial com o intuito de promover a educação laica e
Republicana, contrapondo-se ideologicamente à educação medieval que era
promovida pela Igreja.
Com a revolução burguesa e o Iluminismo no século XVIII, ocorrem as
primeiras tentativas de universalizar o ensino sob a responsabilidade do Estado. No
século XIX, com o aumento da urbanização e o desenvolvimento acelerado da
industrialização, a exigência de um trabalhador mais qualificado também aumentava.
Para atender às exigências econômicas, o Estado cria a escola elementar universal,
leiga, gratuita e obrigatória, “[...] passou a ser elemento de homogeneização cultural
e de contribuição para o exercício da cidadania, enfim, uma instituição cheia de
poderes.” (LIBÂNEO et al. 2003, p. 171).
Vale destacar que a escola não é o único espaço em que acontece a
educação. A educação, como prática social, possui diferentes modalidades:
educação informal, educação formal e educação não-formal. Conforme
caracterizadas por Libâneo (Idem, ibidem, p. 170):
- A educação informal, também chamada de não intencional, refere-se às
influências do meio humano, social, ecológico, físico e cultural às quais o
homem está exposto.
- A educação não formal é intencional, ocorre fora da escola, porém é pouco
estruturada e sistematizada.
- A educação formal é também intencional e ocorre ou não em instâncias de
educação escolar, apresentando objetivos educativos claramente
explicitados. É claramente sistemática e organizada.
No Brasil, de acordo com a LDB n. 9394/96, a educação escolar divide-se em
dois níveis, a Educação Básica e o Ensino Superior. A Educação Básica
compreende a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio.
A LDB institui, como prioridade da educação escolar, a garantia de acesso ao
ensino obrigatório, ou melhor, ao Ensino Fundamental da 1ª a 8ª série, independente
da idade. Os demais níveis de ensino (Educação Infantil, Ensino Médio e o Ensino
Superior) e modalidades (Educação Profissional, Educação de Jovens e Adultos e
Educação Especial) serão priorizados depois que o acesso ao Ensino Fundamental
estiver garantido.
A Lei n. 11274, de 6 de fevereiro de 2006, altera a redação dos artigos 29, 30,
32 e 87 da LDB, dispondo sobre a duração de nove anos para o Ensino
Fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 anos de idade. Portanto, a
partir desta lei, o ensino obrigatório passa a ser do 1º ao 9º ano.
O ensino público de qualidade para todos é uma necessidade e um desafio
fundamental. Atualmente é unânime o reconhecimento da importância da educação
escolar para o mundo da cultura, do trabalho, do lazer, para o desenvolvimento da
economia e para o desenvolvimento técnico-científico. Esse reconhecimento é
materializado nas reformas e políticas públicas educacionais.
No Brasil, a partir da década de 90, vê-se um amplo processo de ajuste do
sistema educativo às novas exigências do mercado de trabalho. A educação assume
a perspectiva de mercadoria e não de um direito universal.
Libâneo (et al. 2003, p. 117) reflete sobre esta questão afirmando que “[...]
Escola não é fábrica, mas formação humana. [...]”. O autor ainda esclarece sobre o
conceito de educação de qualidade:
[...] é aquela mediante a qual a escola promove, para todos, o domínio dos
conhecimentos e o desenvolvimento de capacidades cognitivas e afetivas
indispensáveis ao atendimento das necessidades individuais e sociais dos
alunos, bem como a inserção no mundo e a constituição da cidadania
também como poder de participação, tendo em vista a construção de uma
sociedade mais justa e igualitária. Qualidade é, pois, conceito implícito à
educação e ao ensino.
Para a Pedagogia Histórico-Crítica, a escola tem a finalidade pedagógica
ligada à apropriação do conhecimento sistematizado e à socialização do saber
elaborado que definem a especificidade da educação escolar.
Segundo Saviani (2009) o objetivo da educação escolar é a socialização do
saber sistematizado, enfatiza que não é qualquer saber, e sim o saber elaborado,
sistematizado e não se trata de um saber fragmentado. Afirma ainda que não basta
a existência do saber sistematizado, é preciso transformá-lo em saber escolar: “[...] É
necessário viabilizar as condições de sua transmissão e assimilação, isso implica
dosá-lo e sequenciá-lo de modo que a criança passe gradativamente do seu
não-domínio ao seu não-domínio.” (SAVIANI, 2009, p. 8). O autor aponta para a necessidade
de se distinguir o que é principal e o que é secundário no currículo da escola.
Partindo dessas reflexões, a questão da responsabilidade da educação em
mudar a sociedade vem à tona. Franco (2012), refletindo sobre as contribuições de
Saviani para educação, aponta que o referido autor nos convence que a escola
sozinha não irá resolver os problemas da educação, pois não é um anexo da
sociedade, ou seja, não é uma parte isolada, ela faz parte da sociedade, é parte
integrante da dinâmica e da prática social. Portanto, para Franco (Idem, ibidem,
p.87):
[...] os problemas educacionais só podem ser enfrentados pelo coletivo
social que determina as necessidades sociais expressas no jogo das
contradições da realidade educativa. Não é possível mudar a escola ou
seus processos educativos; o que pode mudar é a lógica que a preside.
Mas isso exige um pacto social entre os diversos setores da sociedade
política e civil.
Evidentemente que essas contradições são fruto dos tensionamentos sociais,
os quais são produzidos pelos indivíduos e pelos coletivos. Os coletivos são
emergência das interações que os indivíduos produzem no âmbito das suas
relações multidimensionais, permeadas de aspectos econômicos, culturais,
ideológicos, psicológicos etc.
Morin (2012, p.100) reflete sobre a seguinte questão: “[...] como reformar a
escola sem reformar a sociedade, e como reformar a sociedade sem reformar a
escola?” Aponta que há um circuito recursivo entre a escola e a sociedade, uma
produz a outra (princípio da recursividade), qualquer intervenção que modifique uma,
apresenta grandes chances de modificar a outra. Para Morin (et al. 2003) o princípio
da recursividade é aquele no qual os efeitos ou produtos são, ao mesmo tempo,
causadores e produtores do próprio processo.
Pode-se compreender a escola como uma organização complexa que se
constitui organizacionalmente a partir das relações, interações e retroações entre os
agentes educativos que lhe dão “vida”: professores, estudantes, pedagogos, diretor,
servidores técnicos e a comunidade. Cada “agente educativo” pode-se considerar
uma parte da organização, com suas especificidade e características. Essas partes
estão em constante “tensionamento”, num movimento de “diálogo” que incorpora
complementaridade e antagonismos. Essa dinâmica vai construindo um todo, que se
torna uma “emergência” que é a escola, aquela escola, com suas características e
especificidades próprias, as quais, não se confundem com as “partes” que lhe dão a
configuração organizacional. O todo é dinâmico, transforma-se, modifica-se o tempo
todo, modifica-se porque as partes se modificam e estas modificam o todo que
retroage sobre as partes num processo contínuo.
Em relação à sociedade, a escola pode ser compreendida como um
holograma que contem em si, enquanto singularidade, a presença da sociedade que
lhe dá origem. “O princípio hologramático está presente no mundo biológico e no
mundo sociológico. [...] A ideia do holograma vai além do reducionismo que só vê as
partes e do holismo que só vê o todo” (MORIN, 2005, p.74).
Essas reflexões possibilitam compreender a ligação do conhecimento das
partes com o conhecimento do todo e vice-versa; considera que o todo não é a
soma das partes, pode ser mais que a soma das partes ou menos. O todo é uma
unidade complexa. À luz do Pensamento Complexo a escola pode ser considerada
como uma organização complexa, uma unidade complexa que também está atrelada
a outras unidades complexas: “[...] a ideia hologramática está ligada à ideia
recursiva, que está ligada, em parte, a ideia dialógica” (Idem, ibidem, p.75). Para
Pascal, é: “[...] impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, assim como
conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes.” (MORIN, 2012, p. 33).
No documento
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
(páginas 66-70)