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Condição social do alimentando

4.2 O caráter excepcional da obrigação avoenga de prestar alimentos

4.2.3 Condição social do alimentando

Difícil de harmonizar é a combinação dos artigos 1.694 e 1.695 do

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DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. 2.ª Turma Cível, Agravo de instrumento n.º 20000020015386, rel. Des. Edson Alfredo Smaniotto, publicado no D.O.U. em 21 mar. 2001. Disponível na Internet: http://tjdf19.tjdf.gov.br/cgi-bin/tjcgi1?NXTPGM=plhtml02&ORIGEM= INTER&TitCabec=2%AA+Inst%E2ncia+%3E+Consulta+Processual&CHAVE=20000020015386&SEL ECAO=1. Acesso em 19 jan. 2006.

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BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil comentado, v. II. Belo Horizonte: Francisco Alves, 1933, p. 390.

184

DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. 2.ª Turma Cível, Apelação Cível n.º 1998011345078, rel. Des. Getúlio Moraes Oliveira, publicado no D.O.U. em 25 out. 2000. Disponível na Internet: http://tjdf19.tjdf.gov.br/cgi-bin/tjcgi1?NXTPGM=plhtml02&ORIGEM =INTER&TitCabec=2%AA+Inst%E2ncia+%3E+Consulta+Processual&CHAVE=1998011345078&SEL ECAO=1&pesquisa=Pesquisar. Acesso em 19 jan. 2006.

Código Civil, que a doutrina185 entende como fonte de grande apreensão. Veja-se o porquê:

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social186, inclusive para atender necessidades de sua educação. (grifou-se)

§ 1.º. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

§ 2.º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.

Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento. (grifou-se)

As contradições são evidentes. Sim, porque o caput do art. 1.695, ao determinar que o prestador de alimentos deve fazê-lo "sem desfalque do necessário ao seu sustento", pode sugerir a leitura invertida e equivocada de que o alimentante deve prestar até o limite de suas posses, sacrificando-se ao extremo, reservando para si apenas o indispensável para sua sobrevivência. O caput do art. 1.694, por sua vez, dita a garantia de integridade da condição social do alimentando, ou seja, além do mínimo indispensável, o que lhe assegure a manutenção do status.

Ao reunir as obrigações alimentares de qualquer natureza num só subtítulo, na tentativa de simplificar a matéria, facilitando sua aplicação, o legislador caiu numa esparrela. Juntaram-se, indiscriminadamente, os alimentos de caráter

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COSTA, Maria Aracy Menezes da. A obrigação alimentar dos avós. In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 225.

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O Projeto de Lei n.º 6.960/02, de autoria de Ricardo Fiúza, acolhendo sugestão do Instituto Brasileiro do Direito de Família - IBDFAM, propõe a alteração do art. 1.694, para substituir a expressão 'compatível com sua condição social' por 'digno', "já que a primeira poderá ser interpretada como impossibilidade de diminuição do padrão de vida, sabendo-se que, a depender da situação econômica e financeira dos envolvidos, especialmente dentre aqueles com menos recursos, a diminuição do padrão de vida é inevitável". COSTA, Maria Aracy Menezes da. A obrigação alimentar dos avós. In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 227.

indenizatório-punitivo, decorrentes do casamento e da união estável, aos que se originam da solidariedade familiar, no parentesco, e do dever de sustento, em relação aos filhos menores.187

A solidariedade familiar está ligada aos alimentos naturais, enquanto o dever de sustento compreende, além desses, também os alimentos civis188. De uma interpretação lassa e fragmentada dos dispositivos em referência resultaria que, genericamente, o alimentante deve reservar para si apenas os alimentos naturais, enquanto o alimentado deve receber, além dos naturais, também os civis.

Transparece, no entanto, que a intenção do legislador foi proteger os filhos menores de um casamento ou união estável desfeitos, e a manutenção do padrão de vida e condição social seria para os filhos da família dissolvida.189 Mas não se pode olvidar que as obrigações decorrentes do parentesco e do poder familiar são diferentes. E a obrigação alimentar dos avós para com os netos decorre do dever de assistência entre parentes. Vem sendo o entendimento jurisprudencial:

Ao contrário do que sucede com os genitores, a obrigação alimentar dos progenitores decorre do dever genérico de assistência entre parentes, e não do dever de sustento, que é inerente ao poder familiar e, por isso, incondicionado. Assim, somente em situações excepcionais é que cabe a fixação de alimentos a serem pagos por avós, e isso sempre condicionado à demonstração de que o valor dos alimentos não ocasionará prejuízo ao

187

CAHALI, Francisco. Dos alimentos. In: DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Orgs.). Direito de família e o novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 182.

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Quando se pretende identificar como alimentos aquilo que é estritamente necessário para a mantença da vida de uma pessoa, compreendendo tão-somente a alimentação, a cura, o vestuário, a habitação, nos limites do necessarium vitae, diz-se que são alimentos naturais; todavia, se abrangentes de outras necessidades, intelectuais ou morais, inclusive recreação do beneficiário, compreendendo assim o necessarium personae e fixados segundo a qualidade do alimentando e os deveres da pessoa obrigada, diz-se que são os alimentos civis. CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 18.

189

COSTA, Maria Aracy Menezes da. A obrigação alimentar dos avós. In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen. Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 226.

sustento do próprio alimentante.190

A obrigação alimentar decorrente genericamente do parentesco é de menor intensidade do que o dever alimentar que decorre do poder parental. Este último é prioritário sobre o sustento do próprio prestador. O primeiro, no entanto, condiciona-se à possibilidade do prestador atendê-lo sem prejuízo, em primeiro lugar, da satisfação de suas próprias necessidades.191

A garantia de manutenção da condição social ou padrão de vida é ordenada aos pais em relação aos filhos, e não aos avós em relação aos netos. Donde, é inaplicável o dispositivo legal aos alimentos alcançados pelos avós, visto que o padrão de vida dos filhos é determinado e proporcionado pelos pais, em razão do poder familiar.192