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6.3 A UNIÃO EUROPEIA E O FLUXO DE CAPITAIS

6.3.4 Condições de concorrência

«Grande parte dos impostos que os Portugueses pagam estão a derreter em mecanismos de corrupção… mecanismos que são bem conhecidos… A diferença entre o custo real do trabalhador e o salário que recebe vai em parte para serviços que os cidadãos utilizam, mas também muito dele vai para mecanismos de corrupção.»

Paulo Morais117

Uma das conclusões da Troika de negociadores do memorando de entendimento com o Estado Português para o seu resgate, aponta a falta de concorrência em Portugal como um dos

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maiores estrangulamentos da economia Portuguesa.Para alguns, ideologicamente colocados, a conclusão da Troika118 entronca quase só nas acções “douradas”; para outros, os efeitos esperados prometem ser triplos: a harmonização por via da redução dos preços de venda; o desaparecimento dos factores de ineficácia na organização interna das empresas; a racionalização das estruturas produtivas.

Aspecto interessante da integração, esta redução de custos por efeito concorrência, parecendo remeter para a existência de uma forte componente ideológica, política ou “outra” na construção de um espaço de integração. E é o elemento “outra” o que mais estupefacção causa, já que significa preços mais altos ao consumidor final e stocks intermédios mais caros aos produtores. Em Portugal todos se queixam dos preços da electricidade, do gás, dos custos de contexto, dos próprios custos dos reguladores (que parecem mais interventores), dos custos do capital (da relação entre taxas activas e passivas da intermediação financeira) 119 e das “acções negras”120. Tudo custos, não a débito da EU mas dos Estados nacionais: em alguns sectores, mantendo esse controlo e essas práticas de restrições à concorrência interna com consequências desinteressantes para os consumidores. Ulteriormente a crédito da UE, esteve a criação de um sistema de pagamentos inter-europeu, com menores custos para a circulação dos bens e capitais no mercado interno Europeu.

Como sabemos, sempre houve na Europa duas visões distintas do modo de fazer Europeu. Uma que sempre defendeu a integração121 total e a Federalização, a outra que sempre pretendeu manter nas mãos dos decisores políticos nacionais uma não mitigada forma de soberania. Hoje na Europa, duas visões parecem opor-se na resolução da crise efectiva: uma dita mais liberal, que aponta para a necessidade de melhoria da competitividade do espaço Europeu face a outras áreas geográficas (principalmente as emergentes, com menores custos de contexto, questões sociais inaceitáveis e até com dumping declarado) com menores custos, sem explicar como se pode processar entre competidores e com armas diferentes essa competitividade122; uma outra, que aponta a excessiva financeirização como “rastilho” de mais crise, querendo preservar a custo da competitividade ou do proteccionismo um modelo social, o Europeu, que considera exemplo. Parecendo a primeira ter abdicado e considerado inevitável o reequilíbrio gerado pelo acesso ao consumo de massas imensas emergentes (mau grado o plasmado na agenda 2020123 Europeia, assumindo uma espécie de desvalorização social), a segunda parece apontar não só para questões de desigualdade e injustiça, como para

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a questão central da sustentabilidade ambiental e planetária do próprio crescimento baseado no consumo excessivo.

Aliás, é curioso como antes das consequências da globalização terem alastrado ao dito primeiro mundo e à sujeição a concorrência tão feroz, as apostas ainda se quedavam num paradigma de sentido contrário ao de algumas respostas actuais sobre o caminho a seguir: a diminuição da idade de reforma, a sustentabilidade ambiental como sustentabilidade do planeta, a diminuição da intensidade de exploração de recursos, o alargamento da sociedade do tempo livre e do lazer, a economia social. A política de concorrência no espaço Europeu baseia-se na teoria económica e nos efeitos benéficos de uma economia concorrencial de mercado. Suprimidos alguns entraves nacionais à livre circulação de mercadorias mantêm-se na Europa, no entanto, mecanismos informais de bloqueamento da concorrência, limitações e resistências que urge extinguir.

Para Roubini124 a zona Euro nunca cumpriu os seus desígnios, sendo que a solução passa por uma trilogia de diminuição dos custos unitários do trabalho, deflação, desvalorização da moeda. A afluência de grandes fluxos de capitais com consequências nas baixas taxas de juro e no aumento do crédito, não foram seguidas - em países como Portugal - de políticas orçamentais restritivas e reformas estruturais que fortalecessem a oferta nacional. Grandes fluxos de capitais tiveram para alguns países, assim, no processo de integração Europeia consequências de maior endividamento.

Como diz Silva Peneda (Peneda S. , 2011)125 “o mercado único Europeu, embora seja muito falado, não existe por completo”. Os fluxos de capital, fruto de incertezas quanto a acesso a crédito, em consonância com a instabilidade cambial e monetária, tornam mais interessante a especulação financeira que o investimento produtivo. Para além disso a inexistência de um sistema financeiro Europeu contrasta com a integração financeira desregrada mundial, sem falar na falta de articulação de políticas orçamentais, fiscais, monetárias, políticas anticíclicas e de modelo de financiamento da UE - baseado não em recursos próprios mas nos orçamentos nacionais dos estados membros.

Um dos motivos porque, na cimeira de Maastricht, se fundiram os dois projectos de Tratado126 num único tratado, o da União Europeia, deveu-se - como afirmado por Fausto Quadros - à necessidade de mostrar que a UEM (União Económica e Monetária) e a União

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Política eram incindíveis (Quadros, 2008, p. 45) - “concretamente, que a primeira só seria sustentável com a segunda.” Neste subtema da teoria da integração, que justapõe e relaciona União Europeia e fluxos de capitais, já vimos como essa incindibilidade se quedou numa construção de um edifício Monetário incompleto, que leva a que Estados membros, em zona monetária comum, sejam sujeitos de taxas de juro diferenciadas - tendo para se financiar de recorrer aos mercados, com base numa percepção de risco país não comum ou comunitarizada.

Não sendo a UE uma zona monetária óptima, por critérios não preenchidos como o critério da mobilidade do factor trabalho127, podemos concluir, entretanto, por algumas outras contradições de um não totalmente adquirido - no cruzamento da integração monetária Europeia: a política de concorrência Europeia.

Baseado na teoria económica - e nos efeitos benéficos de uma economia concorrencial de mercado - o processo de financiamento da economia (s) europeias (s) na actual crise parece esbarrar na dificuldade de aceitação do BCE como estabilizador monetário. Assuntos como as Bond Europeias128 debatem-se à mesa do Conselho, colocando-se segundo (Costa, 2004) a questão de saber se procedeu a assumpção da maior vantagem da UEM: a soberania monetária comum. Existe uma maior colegialidade nas decisões tomadas em matéria monetária que impeçam a Europa de se tornar numa imensa zona marco - permitindo alguma capacidade de influenciar as taxas de juro comuns? A criação do mecanismo para preservar a estabilidade financeira na Europa, o Fundo Europeu de Estabilização Financeira129, parece apenas um mecanismo tímido e incapaz de afastar a percepção de risco dos “humores” dos mercados - destas economias pouco homogéneas.

Outro dos problemas que se colocam à Europa pode ser perspectivado através das soluções de primeiro ou segundo óptimo de Pareto - nas situações de comércio. Para Pareto130, melhor que um espaço geográfico regional como alavancador do comércio, só um espaço económico livre mundial.

A pergunta que fica, no actual quadro Europeu e Global, é saber se a Europa afirmando-se como um espaço de comércio livre mundial, não deveria exigir na sua relação com os outros e na OMC131, condições de concorrência efectiva e uma clara afirmação da concorrência interna – sem subterfúgios ou “espertezas saloias nacionais”.

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Dado o ponto diferenciado das suas economias - na sua relação com os espaços exteriores - os interesses do posicionamento da moeda única face a outras moedas, parece divergir. Não foi, com certeza, por nada, que os diferentes “arquitectos” da Comunidade e União - consagraram o princípio da solidariedade, princípio corolário do princípio da integração. A aceitação deste autêntico “contrato social” deve significar, para os estados membros entre si e com a União, um interesse comum geral, um verdadeiro interesse comunitário, como sublinha Fausto Quadros132 - face aos “instáveis” fluxos de capitais, à procura dos melhores retornos, deste mundo globalizado e Euro descentrado.

7. A INTEGRAÇÃO EUROPEIA E A GLOBALIZAÇÃO DE