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PARTICIPAÇÃO GUIADA

4.1. Investigação Qualitativa

4.1.1. A Investigação Qualitativa Como Contexto de Trabalho Com Diários de Professores

4.1.1.1. Condições Metodológicas da Investigação Qualitativa

Nas condições de legitimidade metodológica inerentes à investigação qualitativa podem assinalar – se vários padrões de exigência.

Relativamente às Exigências quanto à representatividade, relevância e plausibilidade dos dados (validade semântica da investigação), Erickson (1986) assinala três aspetos importantes a ter em atenção no desenvolvimento (recolha e análise da informação) das investigações qualitativas:

 Identificar as diversas estruturas e perspectivas de significação;

 Delimitar as redundâncias nos diversos contextos;

 Prestar atenção aos sucessos que vão ocorrendo nos diversos níveis.

Segundo a ideia de Erickson, se for desenvolvida a dimensão negativa das exigências, as investigações qualitativas podem falhar, na medida em que:

 Apresentam uma quantidade inadequada de dados;

 Apresentam uma variedade inadequada de dados;

 Apresentam um nível defeituoso de interpretação das evidências;

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 Apresentam uma análise inadequada dos casos discrepantes.

Segundo Zabalza (1994), e tendo em conta estes argumentos, é necessário destacar três condições para uma boa investigação qualitativa:

1. Ampliar ao máximo o contexto de análise, para que se possa incorporar na situação analisada as variáveis, fatores ou personagens que possam ajudar – nos a entender o que se analisa.

Os diários correspondem apenas a uma parte e delimitam uma perspetiva do facto estudado. Relativamente ao estudo do pensamento do professor sobre os dilemas, os diários complementam – se com observações, gravações e entrevistas, alargando assim a perspetiva do professor à do observador na aula e à dos analistas dos documentos.

2. Descrever o próprio processo seguido na obtenção e análise da informação.

Ao longo do processo de investigação são tomadas decisões que afetam e reconduzem o dito processo. O investigador tem que se informar sobre o que delineou e desenvolveu em cada um dos passos da sua investigação, para que esta possa ser replicada noutros contextos.

3. Configurar a investigação como um autêntico processo de busca deliberativa.

A investigação, especialmente a qualitativa, é como um processo através do qual o investigador se vai exercitando com os dilemas que as próprias situações e dados lhe vão colocando a cada momento.

Os diários fornecem – nos muita quantidade de dados levando o investigador a entrar no dilema de saber como simplificar toda a informação, sem que para isso perca aspetos importantes que mais tarde possam ser relevantes em certas situações às quais a leitura do diário ainda não tenha chegado.

Seguem – se as exigências quanto à fundamentação teórica da investigação e das análises e interpretações que inclui (validade hermenêutica da investigação).

O problema da investigação e dos investigadores adquire caraterísticas especiais no trabalho qualitativo sobre o ensino. É necessário aplicar à investigação qualitativa sobre factos o modelo de condições formais e de procedimento que os teóricos da hermenêutica foram estabelecendo para assim legitimar os processos de atribuição de significados e de geração de interpretações (Hirst, 1967; Palmer, 1969; Preyson, 1971; Trankell, 1972).24

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64 A investigação qualitativa baseia – se essencialmente em interpretações, para assim dar significado às informações.

O que o investigador já conhece funciona como uma estrutura, na qual a nova situação ou informação podem ser compreendidas. Esta estrutura constitui um conjunto de componentes cognitivas e experienciais, que vão alterando os conteúdos e filtros analíticos. Assim sendo, as interpretações dos factos configuram uma estrutura dialética de conhecimento e a base dos processos de investigação que se apoiam na participação dos factos a estudar e a daqueles nos quais se trata de explicitar o significado da experiência.

O processo de investigação através dos diários deve começar por uma leitura inicial genérica sobre o campo, seguida de uma segunda leitura de identificação dos tópicos e situações de onde iam aparecendo os dilemas e, depois, uma terceira leitura de estabelecimento de relações semânticas e práticas entre cada uma das componentes dos dilemas e fases da sua evolução (Zabalza, 1994).

A primeira leitura (leitura geral), tem como objectivo permitir uma percepção global do campo que vamos analisar e dos seus contextos, evitando assim as análises descontextualizadas.

Os critérios de justificação das interpretações formularam – se sob diversas perspetivas. As perspetivas mais fechadas referem – se às condições lógicas e empíricas da interpretação, ou seja, a situação é analisada como sistema fechado. Nas perspetivas mais abertas refere – se o sentido geral da objetividade do facto, ou seja, as situações ultrapassam – se a si mesmas e são, de alguma forma, expressão da relação entre elas e o seu contexto.

As duas perspetivas de abordagem dos factos geram contextos de legitimação diferentes, a primeira exige a constatação da veracidade entre a interpretação e factos interpretados. Cada facto de interpretação é analisado como linguagens, em que cada uma constitui uma representação da outra. Na perspetiva aberta os factos consideram – se “nichos” de significados variáveis e com uma leitura cuja veracidade não depende dos factos em si mesmos. É nesta perspetiva mais aberta que os critérios de negociação aparecem como especificações mais relevantes de validade das interpretações (Zabalza, 1994).

Existem vários aspetos incluídos nas exigências quanto à dinâmica relacional da investigação, podemos salientar: condições metodológicas que representam a procura de estratégias de participação com os professores; condições axiológicas que estão relacionadas com a forma como se devem salvaguardar os direitos das pessoas que participem na

65 investigação; considerações relativas ao sentido da própria investigação e ao seu contributo para a optimização dos processos que estuda; evitar os contextos avaliativos e judiciários da investigação qualitativa e potenciar mais o seu uso formativo dirigido, configurado e gerido pelos professores e no qual o investigador só participa como colaborador técnico.

Citando Zabalza, 1994:

A nível pragmático, os três temas básicos são:

 O processo de negociação prévia com os participantes na situação a estudar e a explicitação que se lhes deve fazer dos objectivos do trabalho. A dar – se o caso de resultarem da investigação riscos para os participantes, estes devem conhecê – los, obviamente.

 O tema das audiências. Este é um tema comum aos vários modelos de investigação, mas poderia dizer – se que adquire um relevo especial na investigação qualitativa porque, neste caso, se concede uma importância especial à questão de responder às suas interrogações (antes de mais, às interrogações dos participantes enquanto audiência específica).

 O tema da estrutura relacional entre investigadores e actores da situação estudada (no nosso caso principalmente professores).

Segundo o autor, na investigação educativa em geral temos em consideração, normalmente, cinco audiências: a dos investigadores, a das administrações educativas, a dos profissionais da educação em geral, a do público em geral e a dos participantes no processo de investigação. Cada modelo de investigação realça mais uma ou outra, dirigindo – se a ela. O tipo de audiência a que a investigação se dirige condiciona a orientação que a investigação adopta e a forma como os resultados se tornam públicos. Cabe ao investigador decidir qual a audiência para a qual vai dirigir o seu trabalho. Os próprios participantes são a audiência favorita porque se trabalha com ela e para ela. No trabalho com os diários, as próprias caraterísticas do instrumento fazem com esta seja uma questão – chave e que tem que ficar esclarecida logo no início da investigação.

Relativamente à dupla estrutura relacional que Watzlawick (1981)25 apresenta pode – se

dizer que o investigador qualitativo recorre, de vez em quando, à relação simétrica mas, com mais frequência à relação complementar, em que cada um dos participantes participa na

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66 investigação a partir de posições que, embora diferentes, se complementam, ou seja, o profissional da prática e o especialista em estratégias de investigação cada um com o seu estatuto dado que nem um nem outro podem seguir com a investigação sozinho, ambos são precisos. Para integrar as perspetivas e complementar as contribuições dos investigadores e dos atores das situações o melhor é criar – se um contexto de colaboração (Florio e Walsh, 1980). Falando concretamente dos diários dos professores podemos dizer que este tema tem uma configuração especial dado que, a maioria das vezes, os professores convertem – se em investigadores do seu trabalho.