• Nenhum resultado encontrado

conhecimentos e tecnologias para a DiversiDaDe Da agricultura brasileira

No documento 7Mielitz (páginas 128-130)

Claro está, em função do exposto anteriormente, que a alteração do qua- dro atual passa, necessariamente, por uma maior democratização do acesso de amplos segmentos sociais aos benefícios do progresso tecnológico e das políticas públicas destinadas tanto para o setor agropecuário, de forma mais específica, quanto para o desenvolvimento rural, num sentido mais amplo12. 10. “Infelizmente, essa categoria dos ‘sem-sem’ vem crescendo rapidamente, em especial a partir da segunda metade dos anos 1990. Os dados da PNAD de 1999 permitem uma aproximação desse contingente de pobres rurais: são quase três milhões de famílias (ou 15 milhões de pessoas) sobrevivendo com uma renda disponível per capita de US$ 1 ou menos por dia (34,60 reais mensais ao câmbio de setembro/99). Mais da metade dessas famílias de pobres rurais tem suas rendas provenientes exclusivamente de atividades agrícolas: são famílias por conta própria (30% do total) com áreas de terras insuficientes e/ou com condição de acesso à terra precária (parceiros, posseiros, cessionários) ou famílias de empregados agrícolas (25%), a grande maioria sem carteira assinada. Um terço dessas famílias de pobres rurais mora em domicílios sem luz elétrica, quase 90% não tem água canalizada, nem esgoto ou fossa séptica. Em quase metade dessas famílias mais pobres, o chefe ou pessoa de referência nunca frequentou a escola ou não completou a primeira série do primeiro grau, podendo ser considerado como analfabeto” (Graziano da Silva, 2001).

11. “Se quiserem imitar o exemplo dos países desenvolvidos e optar pela agricultura familiar, as elites dirigentes precisarão integrar as políticas agrícola e fundiária, tendo como eixo a geração de novas oportunidades de expansão e/ou reconversão produtiva para o maior número possível de estabelecimentos que se encontrem na categoria transitória. Diversos progra- mas poderão ajudar a agricultura em geral. Mas seria ilusão imaginar que poderiam responder também às dificuldades dos dois milhões de famílias que vivem nos estabelecimentos da franja periférica (mais especificamente, 2,3 milhões de estabe- lecimentos agropecuários segundo a classificação do autor e captados pelo Censo Agropecuário de 1985). Estes necessitam de políticas públicas dirigidas ao combate à pobreza, que vão muito além da competência dos Ministérios da Agricultura e de Assuntos Fundiários” (Veiga, 1997).

12. Já se abordou essa questão em outros momentos, mas é bom reforçar “que o rural brasileiro não pode mais ser enten- dido como o espaço onde são desenvolvidas apenas as tradicionais atividades agrícolas e pecuárias. A profunda transfor-

129

a o B r a s il

Neste sentido, um primeiro ponto a destacar é que, tal como formulado em Sousa (2006), também se acredita que a tecnologia per se não é a pana- ceia para todos os males da agricultura brasileira. Decerto ela é fundamental para os incrementos na produtividade dos fatores (terra, trabalho e capital), mas deve estar acoplada a outros itens, tanto no interior dos estabelecimen- tos agropecuários (gestão, infraestrutura, assistência técnica e extensão rural) quanto no seu entorno (estradas, armazenamento, crédito, comercialização, oferta de máquinas e insumos, convencionais ou não).

Outro ponto importante é que se compartilha da proposição de que a tecnologia não é neutra (Silva et al., 2006)13. Ao mesmo tempo, é necessário admitir que são fundamentais os espaços e processos de interação com os dife- rentes atores sociais, em cada contexto e realidade, de tal forma que as proba- bilidades de novos conhecimentos e tecnologias se tornem, de fato, inovação para amplos contingentes. Nessa interação, o intercâmbio de conhecimentos e as relações dialógicas são relevantes para a busca de soluções reais para os reais problemas que afligem a sociedade e os(as) agricultores(as) brasileiros.

Em suma, a transformação da realidade clama por um processo inovador que esteja orientado e focado em várias dimensões: tecnológica, institucional, organi- zacional, cultural e de gestão (intra e extraestabelecimentos agropecuários)14. mação da estrutura de ocupação da população rural, com o forte crescimento das atividades não agrícolas, consolidou um quadro de grande heterogeneidade das famílias rurais, cujas estratégias de sobrevivência e/ou acumulação cada vez mais incluem outras atividades econômicas juntamente com a agricultura. Essas mudanças trazem consigo a necessidade de um novo olhar para a realidade rural brasileira neste início de século e de novos instrumentos para a elaboração das políticas de desenvolvimento rural” (Balsadi, 2001).

13. “Não se pode desprezar o vigor de uma crença social de que tudo que é desenvolvido pela ciência é necessariamente bom para todos na sociedade. Essa ideia ganhou força encobrindo as relações entre ciência e poder, por exemplo. Hoje, tal crença está sendo, aos poucos, eclipsada pelo simples entendimento de que, por ser uma atividade humana, a ciência é vulnerável à influência dos que a financiam ou ao poder de outros atores. Por isso, sem entrar na infindável polêmica sobre a neutralidade da ciência e tecnologia, o que se quer registrar aqui é que há diferentes contextos de inserção da agricultura familiar brasileira, que exigem soluções tecnológicas diferenciadas e adaptadas para cada realidade. Ou seja, que não há mecanismos automáticos a impor as mesmas demandas e necessidades para todos os agricultores, gerando a falsa ideia de que uma determinada tecnologia pode ser benéfica para todos, ao mesmo tempo e em todos os contextos de aplicação e implicações” (Silva et al., 2006).

14. Obviamente, o que está sendo colocado aqui não é novo; esse debate já nos acompanha há algum tempo, evidenciando que não é tão fácil romper com velhos paradigmas nas instituições, principalmente quando a elas está associado um histórico de relevância no processo de modernização da agricultura brasileira. Sobre isso, vejamos os comentários de Veiga (1997): “(...) diz-se que a Embrapa possui estrutura organizacional e recursos humanos capazes de levar adiante o processo de geração de tecnologias para a sustentabilidade da agricultura. O que se constata, entretanto, é que a mudança de paradigma científico embutida na valorização da sustentabilidade será um lento processo que mal começou. Os mandatos, estrutura organizativa, métodos, procedimentos e mentalidades do setor público agropecuário, do qual faz parte o sistema de pesquisa, surgiram em contexto no qual imperavam a substituição de importações, a reduzida valorização dos recursos naturais e as fortes inter- venções estatais. Por isso, a atual preocupação com a competitividade, a equidade e a sustentabilidade da agricultura exige a modernização do setor público agropecuário como um todo, com o propósito de adequá-lo ao novo contexto”.

130

P r o j e t o s P

Para influenciar (e ser influenciado por) este processo de inovação, é im- portante destacar que no Brasil o arcabouço institucional para a pesquisa agrope- cuária é amplo e capilarizado. Apenas para citar: a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) possui 47 unidades em todo o território nacional; em 17 estados operam ainda as Organizações Estaduais de Pesquisa Agropecuária (Oepas); há quase uma centena de unidades vinculadas aos Institutos Federais, que têm ou podem vir a ter cursos, em diversas modalidades, ligados às ciências agrárias; estimam-se cerca de 70 universidades (públicas e privadas) com cursos de Ciências Agrárias e formação de inúmeros profissionais para atuar na área. Ou seja, parece claro que o nosso principal problema não é de quantidade, nem de falta de estruturas (física, orçamentária e recursos humanos qualificados). A questão-chave parece ser reorientar, estrategicamente, toda essa competência e capacidade construídas ao longo de muitas décadas de investimentos públicos e privados para os novos desafios e oportunidades deste século.

No documento 7Mielitz (páginas 128-130)