• Nenhum resultado encontrado

Seguindo-se a perspectiva morfológica portuguesa, sabe-se que as cidades do Brasil colonial “acusam dupla origem: a informal da Idade Média e a Formalizada da

Renascença”116. Contudo, são as características das cidades informais, que se

configuram com maior proximidade com a realidade da cidade do Natal, pois seguiam um método indutivo, partindo do particular para o geral, segundo Santos, “a própria toponímia concorria para dar calor e intimidade à cidade, associando a rua aos edifícios e à caminhada que se tinha de fazer”117. Justifica-se essa hipótese, com base nas nomenclaturas dos lugares observadas nas datas de terra analisadas nesta pesquisa e apontadas nos quadros e suas respectivas delimitações temporais, percebe-se que as ruas e caminhos da cidade do Natal eram nomeados conforme o uso e os equipamentos urbanos inseridos naqueles espaços. Portanto, e a partir das informações relacionadas à nomenclatura inicial dos lugares em que foram realizados os requerimentos por terra na cidade, é possível afirmar que Natal recebeu as particularidades de uma cidade informal portuguesa, no que tange à nomenclatura dos espaços de ocupação. As ruas eram identificadas por meio de seus equipamentos urbanos, as igrejas e a casa de câmara e cadeia, ou pelos confrontantes naturais, como o rio ou os sertões.

Por conseguinte, a cidade do Natal foi estruturada seguindo a perspectiva de ocupação portuguesa, que buscava fomentar o traçado urbano seguindo as características físicas do território que estava sendo explorado. Essa estrutura deveria corresponder a lógica de poder que regia a sociedade, logo, os núcleos de povoação eram desenvolvidos em “duas partes distintas: a cidade alta, local do poder político, institucional, militar e religioso e a cidade baixa dedicada às atividades comerciais e portuárias”118.

116 SANTOS, Paulo Ferreira. Formação de Cidades no Brasil Colonial 1904-1988, Editora UFRJ, Rio de Janeiro, 2001, p.17.

117 SANTOS, Paulo Ferreira. Formação de Cidades no Brasil Colonial 1904-1988, Editora UFRJ, Rio de Janeiro, 2001, p.22.

118 TEIXEIRA, Manoel C.A forma da cidade de origem portuguesa, São Paulo: Editora Unesp: Imprensa oficial do Estado de São Paulo, 2012. P.44-45.

58

Capítulo II

Vassalos Del’ rei: os requerentes de terra da cidade do Natal (1700-1785)

No período colonial, a Coroa portuguesa, por meio de seus vassalos, foi capaz de estabelecer uma nova ordem espacial, transformando o lugar em um espaço com conotações próprias de sua cultura. Foi possível observar no capítulo I deste trabalho, por meio da análise quantitativa realizada dos requerimentos de chãos de terra enviados ao Senado da Câmara da cidade do Natal, que os portugueses transplantaram para as conquistas a sua perspectiva de configuração morfológica do espaço, imprimindo valores e nomenclaturas às diferentes toponímias. Contudo, essa transposição de modelos estruturais estava também amplamente difundida em seu escopo social, traduzindo-se na forma com a qual a sociedade colonial se organizou nas mais diferentes zonas de conquista lusitana.

Buscou-se neste capítulo identificar no grupo amostral de requerimentos analisados os indivíduos que prestaram as solicitações, ou seja, os vassalos del’ rei que requereram ao Senado da Câmara, chãos na Natal setecentista. Assim, para além de identificar esses requerentes, pretendeu-se elaborar um pequeno esboço relacionado ao quadro humano que ocupou ou pretendeu ocupar a cidade do Natal, expressos nos seus diversos grupos sociais.

Constatou-se nos dados selecionados para esta pesquisa, 202 requerimentos, como alguns indivíduos realizaram mais de uma solicitação de chãos de terra, pode-se averiguar que apenas 189 indivíduos realizaram petições ao Senado da Câmara, entre 1700-1785. Na tabela abaixo, pode-se visualizar esses requerentes divididos por sexo.

59

Tabela I: Requerentes selecionados por sexo

Sexo Quantidades Porcentagens

Mulheres 23 12,16%

Homens 166 87,83%

Total 189 100%

Tabela 1: Requerentes selecionados por sexo. Fonte: Cartas e Provisões do Senado da Câmara de Natal119.

Assim, na primeira etapa dessa investigação, foram identificados na amostragem, os requerentes dos chãos de terra da cidade do Natal, e separados por sexo devido aos aspectos culturais e sociais pertencentes ao Antigo Regime em que homens e mulheres possuíam papéis distintos no escopo social. Quando divididos por sexo, o total de requerentes de chãos de terra corresponderam a 23 mulheres e 166 homens. Destarte, considera-se o total de 189 requerentes. Soma-se a este total, três requerimentos, realizados pela Irmandade do Rosário dos Pretos. Portanto, foram investigados nesta pesquisa, 190 requerentes de chãos na cidade do Natal entre 1700- 1785.

Neste estudo, trabalhou-se com a hipótese de que “o espaço é uma realidade construída e não uma extensão bruta e objetiva.”120, havendo inúmeros níveis de

construção dessa realidade, resultando na coexistência de “distintos espaços, organizados e hierarquizados diferentemente, correspondentes aos distintos planos da existência coletiva.”121 Segundo Ana Cristina Nogueira da Silva e António Manoel

Hespanha, nas sociedades tradicionais como a do Antigo Regime português, “era claro

que o espaço não era o mesmo para toda a gente nem para todos os efeitos.”122 Cada

grupo ou indivíduo dependendo do papel social que desempenhava “via um espaço diferente: diferentemente limitado, diferentemente organizado, diferentemente

hierarquizado”123. Esta realidade sugere a coexistência de práticas díspares em relação à

119Fontes analisadas para a elaboração da tabela: Cartas e Provisões do Senado da Câmara de Natal, IHGRN. Cx. 01, livro 04 (1702-1707), Cx.01, livro 05(1708-1713), Cx. 01, livro 06 (1714-1719), Cx. 02, livro 07 (1720-1728), Cx.06, livro 17(1728-1736), Cx. 02, livro 09 (1743-1754), Cx. 03, livro 10 (1755- 1760), Cx.03, livro 10(1760-1762), Cx. 03, livro 12 (1762-1775), Cx. 03, livro 14 (1775-1788).

120 SILVA, Ana Cristina Nogueira da. HESPANHA, António Manoel. O quadro Espacial. In:

MATTOSO, José (Dir.), HESPANHA, António Manoel (Coord). História de Portugal: O Antigo Regime. Vol. 4, Lisboa, Ed. Estampa, 1998. p. 35.

121 Ibidem. 122 Ibidem. 123 Ibidem.

60 apropriação do espaço/territorial, vinculadas aos diversos grupos sociais. Tendo em vista as dissonâncias que pautavam as dinâmicas cotidianas e existências entre mulheres e homens na sociedade do Antigo Regime português, considerou-se estudar esses dois elementos em momentos diferentes ao longo deste trabalho, priorizando-se neste capítulo o estudo sobre os homens que perfizeram a amostragem.

Todavia, apresentar-se-á, o que neste trabalho entende-se por um requerente de terra, e as prerrogativas para concessão do foro. Ademais, identificou-se quais eram os grupos sociais representados na cidade do Natal, e por fim quem eram esses indivíduos.