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Ao final desse capítulo, faz-se necessário estabelecer relações entre os conceitos e noções apresentados e o tema do presente estudo. De certa forma essas conexões irão se justificar com mais detalhes no discorrer do restante do texto.

As comunidades open source que se caracterizam pelo desenvolvimento de software livre são coleções de entusiastas conectados pela internet, compartilhando um ethos de que o software deve ser livre, enquanto se esforçam para construir alternativas abertas que substituem a Microsoft e outras corporações que tem frustrado muitos usuários e desenvolvedores quanto a suas práticas de produção de software. Peça por peça, vão provendo alternativas de softwares, muitas das quais acabam por melhorar suas contrapartes comerciais.

O Python, sendo uma linguagem de programação aberta, tem uma lógica de produção e fluxo de trabalho com abordagens técnicas, culturas e expectativas de trabalho colaborativas, com listas de tarefas, gerenciamento de e-mails e organização de documentos de forma a alcançar o maior número possível de pessoas,colocando os usuários em primeiro lugar. Para isso concede-lhes a liberdade de controle na execução e adaptação a sua computação e processamento de dados às suas necessidades. A maior parte dessas práticas tem restrições no modelo corporativo e em negócios comerciais elaborados em torno do software.

Em Pernambuco os desenvolvedores e usuários de Python se esforçam para levar essa tecnologia da universidade para o mercado ao mesmo tempo em que tentam reverter

os discursos que apelam para a pouca experiência do mercado das comunidades, as dificuldades em lidar com o software livre e o próprio fato do software ser, em geral, gratuito, geram dúvidas sobre a viabilidade econômica ou a qualidade do software. Nesse embate discursivo, o PUG-PE tem tomado partido em favor do SLCA diante do tema da produção de software.

As justificativas e motivos para tal posicionamento frente a essa questão são os mais variados. Vão desde científico e técnico até justificativas políticas e econômicas. A compreensão de tais motivações e justificativas pode se dar de muitas formas, partindo de várias posições de observação e estudo. A teoria do discurso de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe nos parece um arcabouço conceitual apropriado para a observação e discussão a fim de responder as questões formuladas e o problema de pesquisa. Assim, o processo de construção desse discurso será analisado, tendo por ponto de partida os discurso sustentados pelos elementos-momentos frente a questão em discussão.

A maneira singular como as noções de antagonismo, hegemonia e significantes vazios, e outros conceitos centrais usados no texto,são apresentados permite que sejam apropriados de forma adequada nessa pesquisa, ao buscar estabelecer relações que fixam a comunidade PUG-PE como contrária à lógica estrita do mercado de produção de software, ao mesmo tempo se colocam como os agentes imbuídos do esforço de levar a tecnologia Python da universidade para mercado.

Em se tratando de uma questão que se apresenta tendo como corte antagônico a lógica proprietária de produção acaba se estabelecendo um ponto discursivo, aqui caracterizado como o “discurso do open source” que penetra o campo de produção de software e geração de inovação, com compreensões opostas a respeito da produção de bens simbólicos e modalidades de inovação no atual estágio do capitalismo, aqui denominado

de capitalismo cognitivo.Isso caracteriza um antagonismo acerca da compreensão de uma suposta realidade a respeito de temas no processo de produção de software.

Para a análise desse campo discursivo, torna-se imperativo compreender os sentidos dados nesse processo de construção. Assim temos de compreender o cenário contemporâneo onde o capital se transformou em um bem “imaterial”: informação e o conhecimento governam agora o mundo da produção. As TIC oferecem a possibilidade de a gestão dos fluxos imateriais não fiquem restritos as corporações privados. Oferecem horizontes políticos abertos na sociedade da informação como as experiências do software livre, que constituem espaços tensos em que outra perspectiva instrumental pode ser forjada dentro do próprio capitalismo contemporâneo.

Daí a importância de se levar em conta recursos decisivos como a “inteligência coletiva” que pelo fato de serem de difícil mensuração e quantificação não são permutáveis no mercado. Além disso, a “capacidade do prazer” e a “aptidão ao lazer” nas atividades de produção de software contribuem para a construção de espaços que permitem a expansão do potencial inovador e desvio da relação industrial entre projeto e produto. Tal atividade permite outro tipo de apropriação das linguagens de programação, que, por si só, contribuem para a inserção de alternativas no mercado, de preparação de mão de obra e do “produto” que fazem parte das linguagens de programação abertas.

Para a compreensão desse contexto, teremos de apropriar conceitos relacionados ao capitalismo imaterial para entender esse novo modo de produção social, da construção da tecnologia para análise das possibilidades técnicas que potencializam as atitudes e comportamentos individuais para transformação da cultura e da inovação no cenário contemporâneo. Esse deslocamento redefine a tradicional relação entre pesquisa universitária e empreendimentos da iniciativa privada, uma vez que as comunidades

surgem como lócus de desenvolvimento aberto e o futuro modelo de produção de conhecimento e trabalho distribuído.

Temos, assim, a articulação de várias áreas de conhecimento, na análise que busca a compreensão do que realmente move a comunidade estudada no estabelecimento, de modo contingencial e precário, da sua cadeia de equivalência, tendo como ponto de fixação um posicionamento antagônico representado pelo “discurso do open source”.O quadro 1 abaixo representa a forma como os conceitos da teoria do discurso devem auxiliar na compreensão do processo de construção discursiva da comunidade PUG-PE.

3 CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA

Este capítulo apresenta a estrutura analítica do estudo para a aplicação empírica da teoria do discurso. O desafio empírico é compreender o processo de construção discursiva da comunidade PUG-PE a partir da emergência dos antagonismos, hegemonia e significantes vazios. Pretendemos demonstrar como a aplicação de arcabouço conceitual contribui tanto para o avanço da teoria do discurso como responder as questões de pesquisa. A primeira secção apresenta a estrutura analítica que considera a identidade, projetos e o discurso de governança open spource do grupo. O objetivo é entender como as cadeias equivalenciais vêem a se estabelecer nesse processo. A segunda secção apresenta os dados requeridos para a aplicação empírica dessa estrutura a uma comunidade open source. Isso sugere um estudo de caso de um discurso que fixa os significados da produção de SLCA.Na terceira parte será apresentado os métodos utilizados para construir esses dados e abordagens de análise.