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2.4: Considerações sobre a evolução industrial paulista numa perspectiva regional e ocupacional.

Cabe a esta análise, por fim, tecer algumas considerações sobre a concentração (e a desconcentração) da atividade econômica e industrial dentro do estado de São Paulo30. Se, por um lado, a indústria brasileira no século 20 foi marcada por sua concentração no estado de São Paulo, dentro deste ela se concentrou nos municípios da atual região metropolitana da capital paulista (RMSP). A partir da década de 1970, contudo, verificaram-se movimentos de desconcentração espacial do setor em direção ao interior paulista, com destaque para as regiões metropolitanas de Campinas, Vale do Paraíba e Baixada Santista, conforme mostra a tabela 37.

Tabela 35: Participação das regiões do estado de São Paulo no VTI nacional (em %).

1939 1949 1959 1970 1980 1989 2004

SP 40.7 48.9 55.6 58.2 53.4 50.2 43.1

RMSP 23.3 32.4 41.0 43.5 33.6 28.8 16.9

Interior 14.4 16.5 14.6 14.7 19.8 21.4 26.2

Fonte: Cano (2008)

Na década de 2000, no contexto de desconcentração espúria e baixo crescimento econômico e industrial, dois eixos ligeiramente mais dinâmicos se destacaram, como aponta estudo do Seade (2013), baseado nas informações de valor adicionado fiscal do estado (VAF). Primeiramente, o eixo entre as cidades de Sorocaba e Campinas, consolidando uma estrutura produtiva mais diversificada, e a região do centro-noroeste do estado, devido à expansão do complexo industrial da cana. Este estudo aponta, inclusive, que, a despeito da diminuição da participação do estado de São Paulo na indústria nacional, as regiões administrativas desses eixos dinâmicos aumentam sua participação na indústria nacional, de 9,4% em 2000 para 11% em 2010 no eixo Sorocaba – Campinas e de 5,0% para 5,4% no complexo da cana. Esses aumentos, porém, não foram o suficiente para contrabalançar a queda de participação

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Para uma visão mais aprofundada do debate sobre a dinâmica econômica e a desconcentração produtiva do estado de São Paulo, ver et. al. (2007), Caiado (2004), Pacheco (1998), Lencione (1994) e Azzoni (1987).

da RMSP. As RAs31 do litoral norte, da baixada santista e do Vale do Paraíba também tiveram redução no VAF e perderam participação dentro do estado e nacionalmente.

Nas RAs de Campinas e Sorocaba, houve um forte crescimento da cadeia industrial automotiva, registrado pela expansão do segmento de material de transporte. Também se observou grande expansão da indústria farmacêutica, particularmente na região de Campinas, e da produção de eletrodomésticos, máquinas para escritório e equipamentos de informática, material eletrônico e equipamentos de comunicação. Os ramos industriais de máquinas e equipamentos, materiais elétricos, produtos de plástico e aço – que fornecem bens de capital e bens intermediários para a indústria automotiva – e a chamada linha branca32

ganham relevância na estrutura industrial dessas regiões, que incluem municípios como Jundiaí, Piracicaba e Indaiatuba.

Na área industrial da cana de açúcar, que se expandiu de maneira mais difusa nas RAs de Araçatuba, São José do Rio Preto, Presidente Prudente, Bauru e Marília, se observou a formação de um núcleo industrial voltado para o fornecimento de bens de capital e insumos industriais para usinas de açúcar e álcool. A produção da indústria de máquinas e equipamentos, em particular caldeiraria e outras máquinas industriais, amplia a sua participação na estrutura da indústria dessa área, particularmente nas RAs de Ribeirão Preto e Bauru.

SEADE (2013) analisa também os dados da Pesquisa de Investimentos Anunciados no Estado de São Paulo (Piesp), e observa que entre 2000 e 2010, 42,1% (US$ 30,7 bilhões) dos recursos anunciados na indústria de transformação paulista destinaram-se às regiões com expansão de valor adicionado fiscal, ou seja, as áreas de Sorocaba-Campinas e do complexo industrial da cana-de-açúcar. Essa análise se mostra, no entanto, mais reveladora quando é considerado o contexto de perspectivas de negócios. Assim, os primeiros cinco anos da série (2000 a 2004) referem-se a um

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Segundo a Fundação de Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), o Estado de São Paulo é subdividido em 15 Regiões Administrativas (RAs). Cada RA é composta por diversos municípios de uma determinada área geográfica com similaridades econômicas e sociais. Esta divisão foi criada pelo IBGE e não constitui região política ou administrativa de jure, sendo utilizada apenas para fins estatísticos.

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Aparelhos elétricos de uso doméstico não-portáteis, incluindo geladeiras, freezers verticais, freezers horizontais de uso doméstico, bebedouros, lavadoras de roupa, lavadoras de louças, condicionadores de ar doméstico, fogões a gás e forno de micro-ondas. Conforme: SANTOS, Ângela Maria Medeiros Martins; SOUZA, Adilson José de; & COSTA, Cláudia Soares. Bens de Consumo: Linha Branca. In: BNDES Setorial, nº2. Rio de Janeiro: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, novembro de 1995.

período de baixa expectativa de desempenho econômico, em que foram anunciados US$ 29,9 bilhões nos ramos da indústria de transformação em todo o estado. Nesse período, os anúncios de investimento nos eixos com expansão representaram 35,2% do total estadual. Já quando se consideram os anos em que havia perspectiva de crescimento mais acelerado da economia (de 2005 a 2010, com exceção de 2009, ano fortemente influenciado pela crise financeira internacional), tem-se que o total de investimentos anunciados nos ramos industriais de transformação chegou a US$ 38,5 bilhões, 28,5% superior ao período anterior. Nesse contexto favorável, essas duas regiões responderam por 49,7% dos investimentos. Esses percentuais foram ainda mais expressivos em 2005 (64,1%), 2007 (62,6%) e 2008 (55,9%).

Assim como no Brasil, a participação relativa da indústria da transformação no emprego formal diminui em São Paulo – ela chegou a deter 39% do emprego paulista em 1986 e passou a 20,1% em 2013 (FIESP 2015, p.29). Todavia, logicamente, a perda de participação não foi homogênea em todo o estado. Analisando dados da RAIS, do Ministério do Trabalho e Emprego, FIESP (2015) percebe uma redução da participação do emprego na indústria da transformação dentro do emprego total do estado em quase todas as RAs, porém com intensidade maior na RMSP e menos intensa nas demais RAs, indicando uma interiorização “espúria” do emprego industrial. Apenas duas RAs apresentaram aumento da participação do emprego industrial no emprego total, a saber, Barretos e Presidente Prudente, ambas ligadas à expansão das áreas industriais da cana de açúcar, além de alimentos e bebidas em Barretos e produtos químicos e produção de minerais não-metálicos em Presidente Prudente, conforme SEADE (2013) e FIESP (2015). Nas palavras deste estudo:

"Ao mesmo tempo em que a indústria de transformação paulista perdia participação em relação aos demais setores da economia, ela também sofria um rearranjo espacial dentro do Estado. O principal movimento do emprego industrial no período foi um deslocamento da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) para o interior do Estado em todos os setores” (FIESP, 2015, p.31).

Embora continuasse a ser a maior participação entre as RAs em 2013, com as perdas de empregos industriais formais concentradas em São Paulo, há uma desconcentração “espúria” desses empregos (dada pelo diferencial de taxas quase sempre negativas). Segundo FIESP (2015, p.32), São Paulo diminui sua participação

no total do emprego industrial do estado de 59,1% em 1993 para 41,6% em 2013, ao passo que Campinas a aumenta de 16,8% para 22,9%, Sorocaba a aumenta de 5,7% para 7,9%, São José dos Campos a aumenta de 3,7% para 4,8% e São José do Rio Preto, de 1,7% para 3,7%, nos respectivos períodos. Um resultado surreal, dado que a participação relativa do emprego industrial no emprego total dessas regiões entre 1993 e 2013 diminuiu, respectivamente, em 28%, 24%, 32% e 4%!

Analisando apenas o último ano disponível, 2013, os segmentos da indústria da transformação paulista que mais empregavam eram o de alimentos (14,2% dos empregos industriais), seguido pelo de veículos automotores, carrocerias e autopeças (10,7%) e, em terceiro lugar, o setor de produtos de metal (8,2%), conforme FIESP (2015, p.43). Na Região Metropolitana de São Paulo, os setores que se destacaram em 2013 em relação ao emprego formal na indústria de transformação foram: veículos automotores, carroceria e autopeças, com 12,4%; produtos de borracha e material plástico, com 10,8%; e produtos de metal, com 10,1%. Na RA de Campinas, o setor de veículos automotores, carrocerias e autopeças apresentou uma participação de 13,3%, o setor de produtos alimentícios ocupou 11,8% e o setor de máquinas e equipamentos ocupou 9,8% do emprego formal. Já na RA de Sorocaba, o setor de destaque foi o de veículos automotores, carroceria e autopeças, que ocupava 12,8% dos empregados formais na indústria de transformação, seguido de produtos alimentícios, com 10,1%, e o setor de máquinas e equipamentos, com 9,5%. É interessante notar, ainda, que no total do Estado de São Paulo e em duas das três principais regiões administrativas, em número de empregados formais, o setor de alimentos se destaca entre os setores com maior participação no emprego industrial. Na Região Metropolitana de São Paulo, no entanto, este setor ocupa apenas a sexta colocação, sendo responsável por 6,9% do emprego formal na indústria de transformação. O setor de veículos automotores e autopeças, por outro lado, está em segundo lugar entre os setores industriais que mais empregam no total do Estado e também aparece como um setor de destaque nas três principais Regiões Administrativas, entre os que mais empregam nas regiões.

Similarmente à atividade produtiva, também no número de estabelecimentos industriais há uma perda de participação paulista no total nacional – de fato, ao passo que o número total de estabelecimentos industriais com mais de 100 empregados

(médio e grande porte) aumentou em 18,6%, no estado de São Paulo houve uma redução de 11%. Umas das causas dessa diminuição, conforme aponta FIESP (2015), é a migração de estabelecimentos para outros estados. A perda de estabelecimentos industriais no Estado de São Paulo é bastante nítida, porém o ganho de estabelecimentos industriais dos demais estados esteve mais diluído. A maioria dos Estados ganhou participação, com destaque para Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais e Goiás. Santa Catarina e Goiás foram estados que se utilizaram de artifícios como a Guerra Fiscal de portos para atrair esses estabelecimentos, conforme apresentado anteriormente pelo estudo de Macedo & Ângelis (2013). Nas palavras da FIESP:

"Estes dados oferecem fortes indícios de que está ocorrendo uma migração de indústrias paulistas para outros Estados, levando a um impacto maior no Estado de São Paulo da perda de participação da indústria na economia” (FIESP, 2015, p.39).

Para o estudo das alterações na estrutura da capital paulista, Torres (2012) lista seis interpretações para a desconcentração industrial experimentada pela capital paulista nos últimos trinta anos:

“Tal desconcentração se daria para áreas próximas, no campo aglomerativo de São Paulo; a região continuaria a reter as atividades associadas à capacidade de comando; a desconcentração seria ‘concentrada espacialmente’, sem alterar os padrões nacionais de distribuição das atividades produtivas; a região manteria as atividades intensivas em conteúdo tecnológico, bem como aquelas articuladas aos principais circuitos comerciais e financeiros do país; a desconcentração seria limitada setorialmente, com tendência à reconcentração em alguns setores; a desconcentração industrial seria limitada a setores secundários, devendo ser interpretada de modo associado ao fortalecimento da região como centro de serviços” (Torres, 2012, p. 69).

O município de São Paulo ainda possui um peso absoluto importante na indústria nacional, com uma estrutura industrial diversificada, além de ter elos relevantes com o restante da região metropolitana de São Paulo e com outros municípios do país. Porém, como vimos, houve maior espraiamento da atividade industrial da região metropolitana de São Paulo para o interior paulista, principalmente Sorocaba, Campinas, Santos e São José dos Campos. E a dinâmica de longo prazo de mudança da estrutura produtiva, que tem enorme impacto de arrecadação e de emprego em cidades pequenas ou médias, também pode afetar a maior cidade brasileira de modo significativo.

Esta desconcentração industrial atinge mais intensamente o município de São Paulo do que o restante de sua região metropolitana. Torres (2012) mostra que a participação relativa de São Paulo na indústria brasileira caiu de 13,8% para 8,9% entre 1985 e 2000 (quase 5 p.p. ou 35% em quinze anos).

Paradoxalmente, vários autores consideram essa redução suave ou benigna, pois: 1) a indústria que permanece na capital é de elevada qualificação técnica; 2) a desconcentração alivia a congestão urbana da capital; e 3) o setor de serviços cresceu concomitantemente, contrabalançando a redução da participação no setor industrial. Contudo, o autor discorda dessa interpretação branda:

“mesmo quando os processos de redistribuição produtiva parecem pouco intensos em termos macrorregionais, o rearranjo setorial do emprego e da atividade produtiva pode ter impactos econômicos e sociais de grande relevância para uma dada localidade — mesmo quando a região onde ela se insere continue relativamente dinâmica” (Torres, 2012, p.70-71).

Este autor buscou estimar os impactos da desconcentração produtiva entre 1980 e 2010 no município de São Paulo e na restante da região metropolitana através de três tendências principais (articuladas entre si): a desconcentração relativa da população, a migração da atividade produtiva, principalmente da indústria, para o interior do estado, e a elevação do preço da terra na capital nesse período.

Analisando a dinâmica demográfica, observa-se que São Paulo deixou de ser o grande polo de atração de migrantes do país e tornou-se uma região com taxas de crescimento moderadas, saldos migratórios negativos e perda de participação relativa no estado. Entre 1980 e 2010, a participação da RMSP na população do estado caiu de 50,4% para 47,8%, ao passo que a capital caiu de 34,0% para 27,3% (TORRES, 2012). Ganharam participação, entretanto, foram os municípios do interior do estado, principalmente no eixo entre Sorocaba e Campinas, associado com a melhor dinâmica produtiva dessas RAs, conforme demonstrado por SEADE (2013).

A cidade de São Paulo teve desempenho muito ruim na geração de empregos formais (em todos os setores), como reflexo da desconcentração econômica em direção ao interior. O município só foi melhorar após 2005, com o aquecimento da economia, mas, mesmo assim, São Paulo sempre teve desempenho abaixo que o da sua região metropolitana e do interior, ou seja, perdia mais empregos que a média

quando a economia desacelerava e ganhava menos empregos que a média quando a economia acelerava.

Assim, entre 1991 e 2010, a taxa de crescimento anual do emprego formal (de todos os setores) foi de 2,2% no município de São Paulo, 3,8% no restante da RMSP e 4,6% no interior do estado. A participação da capital nos empregos formais caiu de 46,3% em 1991 para 37,9%, ao passo que a da região metropolitana caiu de 62,3% para 55,7% e a do interior cresceu de 37,7% para 44,3%. O crescimento da participação no interior foi ainda mais intenso no emprego industrial formal. Em 2010, o emprego formal industrial do interior era 25% maior que o de toda a Região Metropolitana de São Paulo. Entre 1991 e 2010, o interior ganhou 642 mil empregos formais industriais, ao passo que São Paulo perdeu 254 mil e o restante da Região metropolitana de São Paulo ganhou 82 mil.

Tabela 36: Participação relativa no emprego formal do estado de São Paulo entre 1991 e 2010.

Período Estado de

São Paulo RMSP Interior

Cidade de São Paulo Restante da RMSP 1991 100,0% 62,3% 37,7% 46,3% 16,0% 1995 100,0% 59,1% 40,9% 43,5% 15,6% 2000 100,0% 57,5% 42,5% 39,9% 17,6% 2005 100,0% 55,6% 44,4% 37,7% 17,8% 2010 100,0% 55,7% 44,3% 37,9% 17,8% 1991 100,0% 60,1% 39,9% 35,8% 24,3% 1995 100,0% 56,6% 43,4% 32,4% 24,3% 2000 100,0% 50,7% 49,3% 26,6% 24,2% 2005 100,0% 46,8% 53,2% 22,7% 24,1% 2010 100,0% 44,4% 55,6% 21,2% 23,2%

Participação relativa no emprego formal - vínculos em todos os setores

Participação relativa no emprego formal - vínculos na indústria

Fonte: MTE, RAIS e Fundação SEADE Apud TORRES (2012).

Entretanto, o autor ressalva que o interior é bastante heterogêneo, e esse crescimento do emprego industrial ficou bastante concentrado num quadrilátero a 100 quilômetros da capital, formado por Santos, São José dos Campos, Campinas e Sorocaba, além do eixo entre Campinas e Ribeirão Preto, condizentes com as expansões produtivas identificadas por SEADE (2013). Ademais, como os últimos trinta

anos foram de regressão da estrutura industrial e com uma formalização maior do setor de serviços, a participação do emprego industrial no total dos empregos formais cai tanto na capital, na região metropolitana e no interior. A participação do emprego formal industrial no emprego formal total cai de 27% para 13% na capital entre 1991 e 2010, ao passo que cai de 53% para 29% na região metropolitana no mesmo período e cai de 43% para 28% no interior do estado (TORRES, 2012).

Essa forte transição de uma metrópole predominantemente centrada no emprego industrial para uma focada no emprego do setor de serviços teve consequência significativas, principalmente no rendimento nominal médio do trabalhador. Como o salário médio industrial aumentou mais que o salário médio de serviços e os empregos industriais se deslocaram em direção ao interior do estado, o rendimento nominal médio do setor formal cresceu mais rapidamente no interior (114% entre 2000 e 2010, ou 7,9% a.a.) que no município de São Paulo (94% no período, ou 6,9% a.a.) (TORRES, 2012). Assim, o autor conclui que:

“Como resultado, a massa de rendimentos nominais no setor formal cresceu muito mais rapidamente no interior do estado do que na capital. Se esse resultado parece auspicioso na perspectiva daqueles que almejam um crescimento regional mais equilibrado, não deixa de ser preocupante para uma metrópole que vem acumulando historicamente problemas sociais de significativas proporções” (TORRES, 2012, p.76).

Influiu, também, no deslocamento das atividades industriais da capital paulista a enorme expansão do preço da terra urbana na capital, estimulando que a instalação ou expansão das empresas industriais ocorresse fora da região metropolitana de São Paulo. Embora não existam indicadores sobre o preço do terreno industrial, Torres (2012) indica que o preço do metro quadrado de lançamentos imobiliários entre 1995 e 2010 registrou alta de 352%, contra uma alta de 264% do IPCA no mesmo período. Apenas entre 2007 e 2010, o preço do metro quadrado valorizou-se em 80%, numa média anual de 21%. O autor argumenta que valorizações dessa natureza constituem incentivos fortes para a reconfiguração do uso do solo, com transformação de antigas plantas industriais em áreas residenciais e em atividades de serviço e comércio e com subsequente relocalização das indústrias em outros municípios.

De modo agregado, os dados de emprego e produção indicam um claro deslocamento da atividade industrial para o interior do estado, com destaque para as regiões de Campinas e Sorocaba. “Do nosso ponto de vista, a desconcentração relativa [da capital paulista] é uma tendência espacial importante e de longa duração” (TORRES, 2012, p.81). As deseconomias de aglomeração do município de São Paulo são relevantes, com destaque para o elevado custo da terra e da obsolescência relativa das plantas existentes hoje na região metropolitana de São Paulo. No entanto, para este autor, a velocidade e a intensidade do ritmo da desconcentração dependerão de três aspectos principais, a saber, o crescimento da economia brasileira, da taxa de câmbio e da evolução da infraestrutura do estado de São Paulo. Há de adicionar, também, o tipo de inserção externa e o modelo de desenvolvimento que o país seguirá, como já se argumentou.

Com uma economia crescendo a taxas mais aceleradas, novos investimentos acontecerão mais frequentemente fora da região metropolitana pelas deseconomias citadas anteriormente, fazendo com que, em termos relativos, a região perca participação mais rapidamente. Nesse caso, o emprego industrial pode até crescer em termos absolutos, mas a sua queda tenderá a se dar muito rapidamente em termos relativos.

Já em relação à taxa cambial, o autor argumenta que a indústria paulista (como a indústria brasileira em geral) é claramente sensível à taxa de câmbio, com importante contenção dos níveis de atividade em momentos de maior valorização cambial. A manutenção de um câmbio valorizado, embora reduza o montante de investimento global (que tenderia a ocorrer no interior do estado), penaliza a lucratividade das indústrias, forçando a busca por novas localizações que reduzam os custos de operações (“particularmente o de mão de obra”) e força o encerramento, com maior probabilidade, dos parques industriais mais antigos, como o de São Paulo. Por outro lado, muitas indústrias substituíram insumos nacionais por importados como estratégia de redução de custos no contexto de valorização cambial, o que torna suas estruturas de custos vulneráveis a uma desvalorização cambial.

E em terceiro lugar, sobre a evolução da infraestrutura de transportes do estado, Torres argumenta que a infraestrutura também avançou de modo dramático no

interior de São Paulo nos últimos trinta anos, justificando em parte a descentralização observada. De certa forma, “a melhoria da infraestrutura, o adensamento das cadeias produtivas e a disseminação de uma cultura empresarial no interior do estado” são também elementos que minam pouco a pouco “as antigas vantagens competitivas da indústria da metrópole” (TORRES, 2012, p.82).

O autor chama a atenção, ainda, de que alterações tributárias decorrentes da descentralização produtiva não são neutras. Mesmo que de início haja uma suposta compensação pela tributação de serviços, as indústrias são tributadas de modo bastante diferentes e elas implicam tanto em maior consumo de insumos tributados (como energia elétrica) quanto em maiores operações de compra e venda em sua operação, que são tributadas. Igualmente, normalmente os produtos industriais são produzidos em maior escala que os serviços. Ademais, como o ICMS taxa o produto na origem e o município fica com 25% do ICMS arrecadado, isso beneficia intensamente o município que produz (e não necessariamente o que consome).

“Em suma, se o município de São Paulo não for capaz de compensar a perda de atividade industrial com a concomitante dinamização do seu setor de serviços, o risco de estagnação econômica (...) não pode ser considerado irrelevante, como, aliás, o baixo dinamismo econômico verificado na década de 1990 já delineava claramente” (TORRES, 2012, p.83).

Por fim, o autor destaca que outros municípios brasileiros passaram a articular estratégias agressivas no setor de serviços, como Curitiba (com foco em qualidade de vida), Recife (com foco em informática) e Rio de Janeiro (com foco em