• Nenhum resultado encontrado

Conteúdo pessoal do poder familiar

2. PODER FAMILIAR: NOÇÕES GERAIS

2.2. Origem

2.8.1. Conteúdo pessoal do poder familiar

O poder familiar engloba um complexo de normas concernentes aos direitos e deveres dos pais relativamente à pessoa e aos bens dos filhos menores não emancipados.

As funções de conteúdo pessoal estão reguladas basicamente em três textos legais: na Constituição Federal, art.229; no Código Civil, artigo 1.634; e no Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 22.

Dispõe o artigo 1.634 do Código Civil, in verbis:

“Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores : I- dirigir-lhes a criação e educação;

116 Margarita Fuente Noriega, La patria potestad compartida, cit., p. 117; Denise Damo Comel, Do

II- tê-los em sua companhia e guarda;

III- conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV- nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;

V- representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;

VI- reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;

VII- exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.”

O artigo 1.634 do Código Civil não possui um rol numerus clausus, pois existem vários outros deveres e direitos advindos da relação parental, como, por exemplo, a concessão de emancipação e autorização para que o filho exerça o comércio.

De acordo com Maria Helena Diniz117, o poder familiar engloba um complexo de

normas concernentes aos direitos e deveres dos pais relativamente à pessoa e aos bens dos filhos menores não emancipados.

É de suma importância analisarmos cada uma das obrigações impostas no artigo 1.634 do Código Civil:

2.8.1.1. Dever de criar, educar e sustentar

Em primeiro lugar, analisando o inciso I do artigo 1.634 do Código Civil, vemos que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, sendo que tal dever está previsto na Constituição Federal de 1988, no artigo 229: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.

117 Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, cit., vol. 5, p. 519; Washington de Barros

Monteiro, Curso de direito civil, cit., vol. 2, p. 349; Silvio Rodrigues, Direito civil, cit., vol. 6, p. 398-399; Carlos Roberto Gonçalves, Direito civil brasileiro, cit., vol. VI, p. 362.

O Estatuto da Criança e do Adolescente também estabelece esse dever nos artigos 4º, 19º, 22º, 53º, 54º e 55º.

O dever de criar implica em assegurar aos filhos todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, garantindo aos filhos o bem estar físico, moral e social, estando estes direitos elencados no artigo 227, caput, da Constituição Federal, e repetidos no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente.

O dever de sustento é a obrigação alimentar ampla, ou seja, não apenas a alimentação, mas também a assistência médica, odontológica, educação, vestuário, esporte, cultura, lazer etc.

Quanto ao dever de educar, se refere ao encaminhamento as escolas e também a transmissão cotidiana de valores religiosos, filosóficos, morais e sociais, com o objetivo de formar um cidadão. Os pais têm de proporcionar aos filhos a oportunidade de desenvolver suas atividades intelectuais, morais e sociais em todos os níveis.

Maria Helena Diniz118 ensina que os pais têm de zelar pela formação moral,

material e intelectual dos filhos, criando-os em ambiente sadio. Devem prover de meios materiais a subsistência e instrução do menor de acordo com seus recursos e sua posição social, preparando-os para a vida, tornando-os úteis à sociedade, assegurando-lhes todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana. Cabe- lhes ainda dirigir espiritual e moralmente os filhos, formando seu espírito e caráter, aconselhando-os e dando-lhes formação religiosa.

Os pais devem, ainda, capacitar os filhos menores física, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade (ECA, artigos. 1º, 3º, 4º e 15º). A lei não determina o modo como os pais devem criar e educá-los, e muito menos como devem executar os encargos parentais, pois cada família se desenvolve por si

118 Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, cit., vol. 5, p. 519; Sílvio de Salvo Venosa,

mesma, pelo bom senso, pelos laços afetivos e pelas condições morais, sociais e financeiras próprias.

Não se pode exigir de uma família de baixa renda que forneça o que não tem condições de fornecer, mas que aja com zelo e que trate com amor e carinho, pois estes não custam dinheiro, e podem ser exigidos dos pais.

Para exercer o poder familiar, podem os pais usar moderadamente o seu direito de correção como sanção do dever educacional, mas tais castigos devem ser moderados, pois, se abusarem dos meios corretivos, poderão ser destituídos do poder familiar, além de incorrerem em responsabilidade criminal (CC, art. 1638, I; CP, artigo 136).

O descumprimento do dever de criar e educar poderá também caracterizar os crimes de abandono material, moral e intelectual, previstos no Código Penal, arts. 244 a 246.

Cumpre notar que, de acordo com alguns autores, incluindo Josiane Rose Petry Veronese, Lúcia Ferreira de Bem Gouvêa, Marcelo Francisco da Silva119 e Vera

Maria Schwertner120, o abandono da criança é aquele que pode encaminhá-la à

miséria, à fome, ao convívio com as drogas e outros fatores extremamente negativos. Se comprovado ficar que o abandono é decorrente de desleixo, desinteresse dos que detêm o poder familiar, a destituição ocorrerá, mas não liberará os pais da obrigação alimentar, pois essa surge do vínculo parental e não do poder familiar.

Contudo, há uma dificuldade prática muito grande em se determinar quando realmente ocorre o abandono voluntário, punível pela lei, pois há uma grande quantidade de menores que, ininterruptamente, ficam na rua, ficando difícil demonstrar se o abandono é voluntário ou decorrente da pobreza, da situação caótica, sem expectativa e sem esperança do país. Programas oficiais de auxilio

119 Josiane Rose Petry Veronese et al., Poder familiar e tutela à luz do novo Código Civil e do Estatuto

da Criança e do Adolescente, Florianópolis: OAB/SC Editora, 2005, p. 30-45.

existem, mas não atingem a maioria dos necessitados. Na prática, nos dias atuais, torna-se complexa essa análise.

Há várias decisões judiciais em que se entendeu que os pais, apesar de serem extremamente pobres, são pessoas que amam os filhos, e que a pobreza não constitui motivo para destituição do poder familiar; o Estado deve também cumprir sua parte, amparando e auxiliando tais famílias.

DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. NEGLIGÊNCIA E FALTA DE CUIDADOS. CARÊNCIA DE RECURSOS. 1. A falta de cuidado com os filhos configura situação de risco capaz de justificar a suspensão do poder familiar. 2. A perda ou suspensão do poder familiar devem ser evitadas quando os demandados demonstram condições de se reestruturar e dar à adolescente e aos infantes condições de vida com um mínimo de dignidade. 3. É necessário, porém, que o Estado desenvolva um plano de trabalho tendente a amparar a família e fortalecer os vínculos familiares, sendo inadmissível que a ausência de políticas públicas e a inércia dos órgãos de proteção, acarrete desagregação definitiva do grupo familiar. 4. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para se decretar a perda do poder familiar. Inteligência do art. 23 do ECA. Recurso provido em parte, por maioria, para que sejam aplicadas medidas de proteção previstas no art. 101 do ECA. (Apelação Cível Nº 70013037916, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 30/11/2005)”121.

121 No mesmo sentido: Processo 1.0024.02.619286-4/001(1). Data do acórdão: 05/05/2005 –

“EMENTA: DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE MÁXIMA PROTEÇÃO À CRIANÇA E DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. A destituição do poder familiar é algo sempre perturbador e traumático para o juiz, pois envolve o poder de declarar desfeitos os vínculos de filiação e parentescos entre os pais e os filhos. Por ser algo tão sério e relevante, o legislador trata a destituição do poder familiar como algo excepcional e enfatiza, no artigo 23 do Estatuto da Criança e Adolescente, que a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou suspensão do poder familiar. Tal medida é de suma relevância num contexto de um país tão miserável economicamente como o Brasil. Evita- se, assim, a possibilidade de os pais, apenas por serem carentes de recursos materiais, serem

No acórdão acima descrito, os desembargadores do Tribunal entenderam não ser caso de destituição do poder familiar, devendo o Estado propiciar condições de amparo à família que tem boas intenções, mas não tem condições financeiras de atender ao menor, demonstrando ter levado em conta o melhor interesse do menor.

Importante frisar que o dever dos pais de criar e educar os filhos também é uma obrigação do Estado, de acordo com o artigo 227, da Constituição Federal.

2.8.1.2. Dever de ter os filhos em companhia e guarda

Em segundo lugar, em relação ao conteúdo pessoal do poder familiar, compete aos pais ter os filhos menores em sua companhia e guarda122, que é uma extensão

do dever constitucional de assistir o filho e do dever de criar e educar, pois os pais somente poderão criar e educar os filhos se puderem tê-los consigo.

Os pais têm, portanto, o direito e o dever de guarda dos filhos. Ao lado do direito, está o dever de guarda, como condição do dever de educação que lhes incumbe e que implica na responsabilidade quanto aos atos praticados pelo filho. Como direito- dever, a guarda abrange o dever de vigilância, seja em relação às atitudes, como também às companhias dos filhos, não devendo os pais permitir sua convivência

destituídos de seus filhos. Contudo, se a falta de recursos materiais não é motivo para destituição do poder familiar, o mesmo não ocorre acerca da carência de amor, afeto, atenção, cuidado, responsabilidade, compromisso e proteção, pois tais sentimentos são imprescindíveis para o pleno e integral desenvolvimento da criança. Sem amor, afeto, atenção, cuidado, responsabilidade, compromisso e proteção dos pais, a criança será imensamente prejudicada, tendo, seriamente, ameaçados seus valores maiores, como, dignidade, respeito, saúde, vida, lazer, alimentação, cultura, liberdade e educação. O abandono afetivo, evidenciado no desinteresse de criar, educar, orientar e formar os filhos, transferindo tal responsabilidade para terceiros, que culmina na ausência de cuidados e falta de comprometimento, impõe a perda do poder familiar. Entender o contrário é fazer pouco caso dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e de proteção integral à criança, que asseguram a ela o direito à vida, à dignidade, ao amor, ao afeto, ao cuidado, à proteção, ao carinho e ao respeito, pois, como pessoa humana em processo de desenvolvimento e como sujeito de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis, tem ela direito de ser acolhida por uma nova família que lhe conceda uma relação de parentesco afetiva. Em todos os litígios em que uma criança esteja envolvida, notadamente aquelas que envolvam pedido de adoção e de destituição de poder familiar, o julgador deve ter em vista, sempre e primordialmente, o interesse da criança.”

122 Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, cit., vol. 5. p. 520; Washington de Barros

com pessoas nas quais não depositam confiança. A infração a esse dever acarreta para os genitores a responsabilidade advinda da culpa in vigilando, na hipótese de o filho praticar ato ilícito.

Qualquer um dos pais pode reclamar o direito de ter o filho em sua companhia, exercitável contra quem o detenha injustamente. Para tanto poderá utilizar-se do instituto da busca e apreensão de pessoas (CPC, artigo 839).

Assim, os pais têm o direito de ter os filhos menores em sua companhia, com eles convivendo; mesmo que estejam separados, e os filhos forem confiados à guarda de um dos pais, não haverá ofensa ao poder familiar, porque o direito de guarda é da natureza, e não da essência do poder familiar, podendo até ser confiado a outra pessoa, desde que seja a melhor solução para o menor.

Como os pais têm o direito de ter os filhos em sua companhia, com eles vivendo, fixam o domicílio dos filhos menores.

Ter os filhos em sua companhia é uma função típica do poder familiar e não significa apenas morar com o filho sob o mesmo teto numa convivência continua e permanente, pois é mais complexa e deve ser entendida como uma verdadeira comunidade de vida e interesses, havendo uma constante troca de experiências, sentimentos e informação.

O direito à convivência familiar é um direito constitucional, disposto no artigo 227, e também previsto no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Quando os direitos previstos no artigo 4º do ECA não são obedecidos, deverão ser aplicadas as medidas protetivas previstas nos artigos 101 e 129 do mesmo Estatuto123.

123 Jayme Henrique Abreu, Convivência familiar: a guarda, tutela e adoção no Estatuto da Criança e

do Adolescente, in: Tânia da Silva Pereira (coord.), Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei 8.069/90 - estudos sócio-jurídicos, p. 135-152, Rio de Janeiro: Renovar, 1992; Jason Albergaria, Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), Rio de Janeiro: Aide, 1991, p. 32.

As medidas destinadas aos pais responsáveis também devem ser consideradas protetivas, pois o objetivo de sua aplicação não é a punição deles, e sim a sua sensibilização, não havendo diferença em essência entre os institutos.

Observando-se os artigos 101 e 129 do ECA, destacamos a existência de medidas de apoio e orientação (art. 101, inc. I e II e 129, inc. IV, VII), medidas de auxílio material e encaminhamento para tratamento especializado (art. 101, IV, V e VI e art. 129, inc. I, 11, 111, VI) e medidas de coerção para a garantia da educação (art. 101, inc. 111 e 129, inc. V).

Existem, ainda, as medidas mais graves, como o abrigamento e a colocação em família substituta (ECA, art. 101, inc. VII e VIII), as quais se fazem acompanhar, como contrapartida, pelas medidas de perda da guarda, destituição da tutela e suspensão ou destituição do poder familiar, destinadas aos guardiões, tutores e pais (ECA, art. 129, inc. VIII a X).

A evasão escolar é um exemplo de problema enfrentado pelo Conselho Tutelar e Vara da Infância e Juventude. Se os pais não encaminham os seus filhos para escola, apesar da existência de vaga e transporte, estará configurada a situação de risco, por omissão dos pais, por descumprirem o dever de educação. Diante desta situação, poderá ser-lhes aplicada a medida prevista no art. 129, inc. VI, do ECA ("obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar"), bem como a família poderá receber orientação, nos termos do art. 101, inc. II do ECA.

Conforme o artigo 99 do Estatuto da Criança e do Adolescente, as medidas protetivas são cumuláveis e substituíveis a qualquer tempo. E, de acordo com a determinação do artigo 100, tais medidas devem fortalecer os vínculos familiares e comunitários, tendo caráter pedagógico e não punitivo, devendo ser eficazes e edificantes, sendo instrumentos de conscientização e superação.

Roberto João Elias124 preleciona, com pertinência, que foi corrigida “a injustiça

que o Código de Menores contemplava, quando os pais poderiam perder o pátrio poder, pelo simples fato de não terem condições materiais para cuidar dos filhos (art. 23 do ECA), pois há o acesso a programas que visam resolver a questão. É relevante que haja um estudo social para averiguar as reais necessidades do grupo familiar”. Alaís Ávila Vasconcelos125 também se posiciona neste sentido.

Para que haja uma convivência familiar na sociedade de hoje, é necessário verificar a situação de pobreza em que vive a maioria da população, devendo ser oferecida, além da ajuda financeira, uma orientação às famílias, como têm feito a Pastoral da Criança e outros órgãos, que transmitem, além da ajuda, noções de higiene, de cuidados com a prole, de organização doméstica, de saúde e muitas outras.

Mas também a pobreza não pode servir como justificativa, o que pode mascarar grande comodismo e dependência excessiva da ajuda constante de terceiros. Os elementos de prova, como as avaliações psicossociais e a oitiva dos envolvidos, são imprescindíveis para diferenciar a omissão dolosa da real precariedade de recursos.

No caso concreto, deve se diferenciar a situação de omissão da de penúria, para

124 Roberto João Elias, Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), 2. ed.,

São Paulo: Saraiva, 2004, p. 23.

125 Alaís Ávila Vasconcelos, Comentários ao arts. 99 e 100 do ECA, in: Munir Cury; Antônio Fernando

do Amaral e Silva; Emílio García Mendez (coords.), Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, 33 ed., 2. tir., rev. atual., São Paulo: Malheiros, 2000, p. 306-307. Neste sentido, defende que "as medidas especiais de proteção devem-se apoiar em procedimentos metodológicos que se pautem por um caráter emancipador em todas as ações empreendidas. Isto quer dizer que se faz mister edificar todo um trabalho social e educativo com vistas à promoção e defesa dos direitos humanos e de cidadania, atuando nas dimensões pedagógica, política social e econômica em um mesmo processo. Dever-se-á buscar, portanto, um desdobramento das potencialidades de auto- determinação e libertação do educando. Enquanto sujeito de um processo que se renova continuamente, através da escolarização, profissionalização, saúde, cultura e lazer. São esses momentos inter-relacionados do processo educativo que lhe propiciarão condições básicas de suporte para atingir uma etapa de autonomia na condição da própria existência. Concomitantemente, o trabalho educativo, visto em sua globalidade, deverá contemplar uma atuação efetiva com as famílias e a comunidade, interferindo em processos mais amplos que a própria necessidade da criança ou do jovem em si. Logo, a atuação dos profissionais, no que tange ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, deve-se compatibilizar com os processos sociais mais abrangentes, aí incluindo a orientação do quadro familiar quanto aos mecanismos a serem utilizados para o encaminhamento de suas necessidades básicas: saúde, trabalho, justiça, assistência social e outras."

se decidir sobre a destituição do poder familiar126.

Jones Figueirêdo Alves127 destaca que "o poder familiar não pode e não deve ser

entendido como um poder de exercício facultativo". Define a omissão como: "a falta de cuidados, a desídia, a falta de vigilância: a deserção ao próprio exercício do poder familiar, pela configuração do não agir em situações em que o agir torna-se imperativo e indeclinável".

Na nossa sociedade, infelizmente, a violência doméstica está muito relacionada com os valores da sociedade e com a cultura de dominação. A psicóloga forense Dayse César Franco Bernardi128, analisando estes aspectos, denunciou que:

"Nem sempre a família é um núcleo de proteção. No exercício da maternidade/paternidade, muitas vezes, encobertos pela necessidade de disciplinar os filhos, os pais os agridem de forma violenta. Muitas vezes, movidos pela necessidade de ordem, os pais humilham seus filhos fazendo-os fracos e indefesos ou muito violentos. Assim, toda gama de ações abusivas são cobertas com um pacto de silêncio, garantindo-se que a família seja considerada ‘perfeita’. Entretanto, a família, quando abusiva, reflete um padrão cultural que perpassa todas as relações sociais”.

Nelson Nery Júnior e Martha Toledo Machado129 professam, quanto à

necessidade de uma convivência familiar :

“Assim, em decorrência da elevação familiar a direito

126 Sílvio de Salvo Venosa, Direito civil, cit., vol VI, p. 341.

127 Jones Figueiredo Alves, Abuso de autoridade ou omissão de dever para a perda do poder familiar

- breves considerações sobre o inc. IV do art. 1.638 do novo CC, in: Mário Luiz Delgado; Jones Figueirêdo Alves (coords.), Questões controvertidas no novo Código Civil, vol. 2, São Paulo: Método, 2004, p. 111-121.

128 Dayse César Franco Bernardi, Violência na família, in: Eliana Riberti Nazareth (coord.). Direito de

família e ciências humanas: caderno de estudos nº 1, São Paulo: Jurídica Brasileira, 1997, p. 63-76.

129 Nelson Nery Junior; Martha de Toledo Machado, O Estatuto da Criança e do Adolescente e o novo

Código Civil à luz da Constituição Federal: princípio da especialidade e direito intertemporal, in: Nelson Nery Junior; Rosa Maria Borriello de Andrade Nery, Revista de Direito Privado, São Paulo: Revista dos Tribunais, 12:9/48, 2002.

fundamental das crianças e adolescentes, criou-se no ordenamento jurídico uma verdadeira escala de prioridades na aplicação da lei ao caso concreto, toda vez que se discute a manutenção da criança no convívio com seus pais biológicos, limitando severamente o âmbito do juízo de valoração a ser realizado pelo magistrado, ao decidir sobre a suspensão/destituição do poder familiar ou a colocação em família substituta, seja sob a forma de guarda, tutela ou adoção, que são as formas por meio das quais se opera a colocação em