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O CONTEXTO DA APRENDIZAGEM MOTORA

no Ensino da Educação Física: o Exemplo da Aprendizagem Motora

3.1 O CONTEXTO DA APRENDIZAGEM MOTORA

3.1 O CONTEXTO DA

APRENDIZAGEM MOTORA

Como uma das conseqüências do processo de cientificização da Educação Física, em meados da década de 60 desenvolve-se, como uma subdisciplina da ciência da motricidade humana, a área da aprendizagem motora. Isto não significa que estudos nesta área não tenham sido produzidos antes dessa data. Schmidt (1988) revela que os primeiros trabalhos foram conduzidos ainda no século XIX, por volta de 1820, pelo astrônomo Bessel, que pretendia investigar, entre os seus colegas, como as diferenças individuais afetavam a memorização do tempo de trânsito dos movimentos das estrelas.

Em seguida, Bryan & Harter (1897, 1899) realizaram uma série de estudos procurando compreender os processos de aquisição de habilidades na recepção e envio de mensagens via código morse. Um outro marco importante no processo histórico de desenvolvimento da área da aprendizagem motora foram os trabalhos de Thorndike (1927) sobre processos de aprendizagem de habilidades motoras, abrindo im-

portantes caminhos para o estudo de problemas específicos da área da motricidade humana.

O advento da Segunda Guerra Mundial também contribuiu de maneira decisiva para o de- senvolvimento da área específica da aprendizagem motora. Esta situação exigiu do Exército Americano o estabelecimento de critérios objetivos para realizar a seleção dos pilotos mais habilidosos. A fim de atender a esta necessidade, é fundado um centro de pesquisas especializado em estudos e aplicações de testes moto- res. No entanto, a década de 60 é considerada como ponto de referência para trabalhos sobre aprendizagem motora, uma vez que, antes dessa época, estes estudos eram realizados sobretudo por psicólogos, raramente preocupados com a questão específica da aquisição de comportamentos motores, ligados à Educação Física e aos esportes.

Os principais problemas estudados na aprendizagem motora, enquanto pesquisa básica, são: como a aprendizagem de diferentes habilidades motoras ocorre, quais variáveis determinam a velocidade da aprendizagem de habilidades motoras e quais variáveis determi-

nam quanto tempo se mantém a lembrança das habilidades aprendidas. Temas como feedback, memória, imagem mental, atenção, timing, tipos de prática, modelação, são alguns exemplos de estudos específicos conduzidos na área da aprendizagem motora.

No Brasil, os trabalhos em aprendizagem motora praticamente se iniciaram a partir de 1980, com o retorno de pesquisadores recém-doutorados em importantes centros de pesquisa dos EUA, Canadá e Japão.

Pareceria um processo natural se esses pes- quisadores, como membros de uma profissão com larga experiência no campo do ensino de habilidades motoras, tivessem se interessado por problemas da realidade, ou seja, problemas enfrentados por profissionais no cotidiano escolar. Entretanto, isto não ocorreu. Esses pesquisadores, ao contrário, passaram a identificar-se mais diretamente com os problemas da Psicologia, a comportar-se como psicólogos e a freqüentar congressos de Psicologia. De um modo geral, mostraram pouco interesse por programas de Esporte e Educação Física, demonstrando, muitas vezes, indiferença aos problemas vividos pelos professores de Educação Física e pelos técnicos esportivos.

Tal indiferença pode ser atribuída, em grande parte, ao processo de cientificização ocorrido na Educação Física no início da década de 70. Alguns autores criticam a ligação dos estudos em Psicologia do Esporte e em aprendizagem motora com a ciência mãe, uma vez que os pesquisadores, ao invés de buscarem teorias específicas para os problemas da área da motricidade humana, preferiram reproduzir o modelo da ciência mãe e, como conseqüência, enfrentam hoje muitos dos seus problemas e questionamentos.

Como sugestão para atenuar os efeitos do desfocamento ocorrido nestes quase 30 anos de

pesquisa na área da Educação Física, Betti (1993a) propõe um novo olhar para a relação entre as disciplinas mães e as disciplinas delas derivadas;

"É preciso Jazer o caminho de volta, e refocalizar a Educação Física, desta vez, numa dimensão práxica, quer dizer, subsidiada agora pelos conhecimentos ge- rados na ciência ou disciplina acadêmica, porém vis- tos agora não como resposta /soluções para a prática, mas como dados que tornam os problemas da prática mais claros"(p. 5).

Neste sentido, o conhecimento já produzido no campo da motricidade humana, mais especificamente na aprendizagem motora, pode ser bastante útil para a prática pedagógica, desde que sejam amplamente revisados e refocalizados.

Na área da aprendizagem motora, a aplicação dos conhecimentos pode ocorrer, em esportes de alto nível, em jogos, terapias físicas # corporais e até em indústrias. Schmidt (1988), que se constitui em um dos mais prestigiados da área e propõe-se discutir o papel dos conhecimentos produzidos, não menciona explicitamente a Educação Física Escolar, embora cite os jogos. Parece que o autor não mostra preocupação efetiva com os problemas que eventualmente venham a ocorrer na escola quando o professor ensina habilida des motoras. A sua postura e, antes dele, a de Adams (1971) foram decisivas para o desenvol vimento da concepção que predomina na área, seja no sentido da escolha dos problemas a se rem estudados, seja na metodologia adotada.

A repercussão do modo de produção do conhe cimento na área da aprendizagem motora e a ênfase nas pesquisas básicas, com metodologias reducionistas inspiradas no modelo da ciência moderna, delinearam um quadro pouco otimista quanto à possibilidade de aplicação desses conhecimentos na prática profissional. Ocorreu uma

A Questão da Aplicabilidade do Conhecimento no Ensino da Educação Física: o Exemplo da Aprendizagem Motora 35

fragmentação e especialização crescentes, bem como uma tendência de distanciamento entre a produção acadêmica, definida como teoria, e o mundo profissional, definido como prática.

Segundo Petersen et alii (1991), toda área de conhecimento deve, periodicamente, realizar uma avaliação da natureza das pesquisas, da sua contribuição para o desenvolvimento de um corpo de conhecimentos, bem como do seu valor prático. Este é o momento para "repensar", de acordo com os autores, a produção do conhecimento na área da aprendizagem motora, uma vez que estas pesquisas estão contribuindo muito pouco para o planejamento e a execução das aulas de Educação Física.

3.2 A CONTROVÉRSIA