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CAPÍTULO 1 PRESSUPOSTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DO

1.6 Procedimentos de análise dos textos

1.6.1 Contexto de produção textual

Nesta seção, para que possamos abordá-la de forma compreensível, apresentaremos as categorias de análise que serão utilizadas para identificarmos o contexto de produção textual do gênero tragédia, dentro do quadro metodológico de análise de textos adotado pelo ISD.

Essa apresentação dar-se-á por subseções, separadamente, para uma exposição mais didática, buscando estabelecer relações entre elas sempre que possível e, ainda, destacamos que os níveis de análise apresentados devem ser considerados como complementares entre si, formando uma rede de sentidos, que dialogam e se determinam, ou seja, partes de um todo.

Dispomos de representações particulares de nosso contexto social, ao produzir um texto em determinadas situações que influenciam e determinam nossa produção e nossas escolhas dos mecanismos que o estruturam internamente. Então, se é na e pelas atividades de linguagem que representamos/interpretamos/avaliamos o mundo e o agir humano, logo, são os textos (orais e escritos) que devemos analisar, pois os textos são os “correspondentes empíricos /linguísticos das atividades de linguagem” (BRONCKART, 2006, p. 139). Como já foi dito na seção anterior, os gêneros de textos “apresentam certas propriedades estruturais mais ou menos estabilizadas e mais ou menos identificáveis” (BULEA, 2010, p. 65) que possibilitam o uso ou não, a mobilização ou não, a adaptação ou não em determinadas situações de interação. Em outras palavras, o protagonista dessa ação de linguagem assinala as propriedades dos mundos representados recorrendo ao conjunto de representações dos mundos formais: físico, social e subjetivo de sua situação de produção e elege um gênero de texto e, deste, um texto que terá características particulares, ou seja, será marcado com “traços das decisões tomadas pelo produtor individual em função da sua situação de comunicação particular” (BRONCKART, 1999, p. 77).

Portanto, o contexto de produção é definido por Bronckart (2007) como o conjunto dos parâmetros que podem exercer uma influência sobre a forma como um texto é organizado. Eles são agrupados, pelo autor, em dois subconjuntos, o primeiro refere-se ao mundo físico e o segundo ao mundo social e subjetivo. Para o primeiro grupo, podemos afirmar que o texto resulta de um comportamento verbal concreto que surge da ação de um sujeito, a qual é coordenada dentro de um espaço e tempo.

O contexto físico, portanto, se realiza através de quatro parâmetros precisos:

 O lugar de produção: o lugar físico em que o texto é produzido, por exemplo, em uma biblioteca, uma sala de aula;

 O momento de produção: a extensão do tempo durante a qual o texto é produzido;  O emissor (ou produtor ou locutor): a pessoa (ou a máquina) que produz

fisicamente o texto, podendo essa produção ser efetuada na modalidade oral e escrita;  O receptor: a (ou as) pessoa (s) que pode (m) perceber (ou receber) concretamente

o texto (Bronckart, 2007: 93).

Temos a produção do texto inserida, no segundo conjunto, no quadro de interação comunicativa que implica o mundo social (valores, regras e normas, etc.) e o mundo subjetivo (a imagem que o agente dá de si quando age). Esse contexto sociossubjetivo decompõe-se em três parâmetros principais:

 O lugar social: no quadro de qual formação social, de qual forma mais geral, de qual instituição, em que modo de interação o texto é produzido: família, escola, exército, mídia, interação informal, interação comercial, etc;

A posição social do emissor (que lhe dá seu estatuto de enunciador) qual é o papel social que o emissor desempenha na interação em curso: papel de pai, de professor, de aluno, de cliente, de superior hierárquico, de amigo, etc;

 A posição social do receptor (coenunciador);

 O objetivo (ou os objetivos) da interação: qual é, do ponto de vista do enunciador, o efeito (ou os efeitos) que o texto pode produzir no destinatário. (Bronckart, 2007:94)

Diversas pesquisas que utilizaram como base teórica os parâmetros do contexto sociossubjetivo de produção, constataram a necessidade de detalhá-los para uma melhor compreensão do agir humano nos e pelos textos.

Segundo Machado (2009), através das pesquisas do Grupo ALTER/CNPq, refletiu-se na necessidade de que:

 Na constatação de que em grande parte das situações de produção, estão envolvidos mais de um destinatário, estando presentes ou ausentes, sendo o direcionamento do conteúdo mais ou menos direto.

 Na verificação, no processo de produção, dos diferentes papéis que o emissor pode assumir ao mesmo tempo, não confundindo, no entanto, com seu papel social.  Na observação de que o produtor pode ter representações de mais de um objetivo a ser alcançado.

Devido às necessidades do Grupo ALTER, assim como os parâmetros do contexto sociossubjetivo foram revistos, foram acrescidos à análise do contexto de produção quatro outros aspectos: o contexto sócio-histórico mais amplo em que o texto é produzido, que possibilita levantar hipóteses sobre a conjectura política, social e cultural em que os textos são produzidos e quais as implicações; o suporte em que o texto é veiculado, é o elemento físico que transporta o texto; o contexto linguageiro imediato, é um conjunto de textos que são transportados e veiculados pelo mesmo suporte, e que acompanham o texto a ser analisado; e o intertexto, isto é, os textos com os quais o texto mantém relações facilmente identificáveis antes mesmo das análises. (MACHADO, 2009, 46-47)

O primeiro aspecto, o contexto sócio histórico mais amplo, teve sua necessidade ressaltada nas análises de textos das instâncias governamentais que prescrevem o trabalho do professor (BRONCKART & MACHADO, 2005). No segundo e terceiro aspecto houve necessidade da análise do contexto linguageiro imediato e do suporte em que é veiculado o texto.

Quanto ao suporte, Machado e Bronckart (2009) recorreram à pesquisa de Barbosa (2009)16, quando a pesquisadora analisou crônicas e contos sobre o trabalho docente em diferentes revistas, na mídia impressa, em dois suportes diferentes: revista semanal voltada para o público em geral, e revista dirigida, especificamente, a professores.

Analisando o suporte e os demais textos, a autora identificou a influência desses textos sobre as crônicas analisadas, pois apresentam representações/avaliações/interpretações do trabalho docente de acordo com os “modelos valorizados pelos editores de revista”       

16

Tese de doutorado desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo “Representações sobre o professor e seu trabalho em textos da Revista Veja São Paulo e Revista Nova Escola”, concluída em 2009.

(MACHADO E BRONCKART, 2009, p. 48), que se configuravam no conjunto dos textos que acompanhavam as crônicas. Tudo isso revelou que, devido a essa diferença de suportes que veiculava textos distintos, o mesmo gênero textual foi construído de diferentes formas, por diferentes escolhas linguísticas, causando diferentes efeitos de sentido, pois a diferença sugeria a diversidade de públicos e objetivos.