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O modelo didático do gênero tragédia adaptada

CAPÍTULO 6 – RESULTADOS E CONTRIBUIÇÃO PARA A CONSTRUÇÃO DO

6.4 O modelo didático do gênero tragédia adaptada

Nesta seção apresentamos, primeiramente, o modelo didático elaborado a partir das características globais do gênero e das análises realizadas, com o objetivo de trabalhar com alunos do 9º ano do Ensino Fundamental e desenvolver capacidades de linguagem voltadas para leitura do gênero, conforme expusemos em nossa introdução e metodologia. Em segundo lugar, apresentaremos sugestões de atividades didáticas.

A partir das análises, podemos pensar que o modelo didático do gênero tragédia adaptada tem algumas características que podem ser ensinadas, voltadas para leitura, a alunos do 9º ano, desde que se levem em consideração as seguintes questões: primeiro, apesar do gênero tragédia não ser um gênero de texto lido habitualmente pelos alunos do Ensino

Fundamental, esses alunos têm contato com teatro, jogos ou histórias que possuem semelhanças com alguns aspectos da tragédia.

Conforme já dissemos, por mais que os manuais de ensino de gêneros de textos nos mostrem um crescente trabalho com os gêneros, mais especificamente, após a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental em 1998, ainda há uma predominância de trabalhos voltados para os textos que circulam em outras esferas, principalmente na esfera jornalística.

Segundo, o fato de que, ao utilizar um gênero que circula em uma atividade específica, em nosso caso, a literária, para a atividade de ensino, com o objetivo de desenvolvimento de capacidades de linguagem voltadas para leitura, é preciso compreender a necessidade de adaptação desse gênero ao contexto escolar de ensino e aprendizagem.

Em relação às condições de produção, podemos considerar o gênero tragédia como um gênero de texto que se realiza na atividade literária (literatura dramática), numa situação de interação específica, ou seja, personagens postos em cena numa interação verbal, em que o objetivo do adaptador em relação ao gênero, é o de torná-lo acessível às práticas linguageiras na multiplicidade de seu público alvo: adultos e infanto-juvenis, um gênero da literatura clássica.

Os textos pertencentes a esse gênero respaldam-se em acontecimentos ocorridos na mitologia grega, fonte temática das peças de teatro grego antigo da época. As informações trazidas eram releituras da mitologia, com fortes e frequentes referências a questões políticas e sociais de seu tempo e de certa forma é necessário um conjunto de conhecimentos externos ao próprio texto para compreendê-las. É um gênero de texto, portanto, cuja realização se respalda no cotexto de produção (contexto linguageiro imediato), ou seja, com o diálogo de textos auxiliares no posicionamento da temática central da própria tragédia. Sua temática pode variar, ou seja, pode ser relacionada à política, economia, sociedade, leis, morte, sofrimento, amor, etc.

O adaptador do gênero tragédia é profissional da área de literatura e editorial, reconhecidos socialmente na função de escritor, redator, tradutor e analista de originais e de projetos editoriais, a quem é atribuído um papel de autoridade para a produção do texto.

Os destinatários são pessoas que, a nosso ver, gostam de ler ou se não gostam podem ser despertados para o prazer de ler e são múltiplos públicos - adultos e o infanto-juvenis - que se interessam em conhecer as obras clássicas da literatura, mais precisamente obras voltadas para o teatro, como as tragédias gregas e assuntos relacionados à mitologia, deuses e heróis, e que muitas vezes exigem um conhecimento prévio do assunto abordado.

Em relação às características textuais do gênero tragédia, o modelo didático deve indicar como se constituem os textos pertencentes ao gênero em três níveis.

No nível organizacional as características que comportam esse gênero são as seguintes. Primeiro, o gênero tragédia se constitui por um plano global organizado em sequência dialogal geral, identificada através da fala dos personagens postos em cena no interior de um discurso principal, em outras palavras, há o embate e a troca de posições entre as personagens e que ocorre em momentos intercalados.

Atribuímos a essa questão o estilo assumido pelo adaptador, tendo em vista suas representações sobre a situação de diálogo em que se encontra o texto, efetivamente engajados em uma conversação, como numa peça de teatro.

Segundo, como discurso principal, encontramos o discurso interativo e o relato interativo e nas variantes discursivas, temos a presença de dois tipos de discurso encaixados aos discursos principais, são eles: o discurso interativo secundário e o relato interativo secundário que aparecem no quadro de gêneros da modalidade escrita. Junto ao relato interativo secundário temos o discurso direto encaixado que serve para construir o movimento interacional da tragédia, ou seja, relacionando aos parâmetros (personagens e acontecimentos) do mundo posto em cena no discurso principal. O uso dos tipos de discursos encaixados ao segmento principal foi uma das escolhas realizadas pelo próprio adaptador. Terceiro, é um gênero cuja organização sequencial é tipicamente dialogal, com a presença de sequências narrativas, argumentativas e explicativas.

Em relação aos mecanismos de textualização, o gênero tragédia apresenta, em primeiro lugar, a presença de organizadores textuais com valor temporal, espacial e lógico, distribuídos ao longo do texto, em diferentes funções semânticas. Além desses mecanismos explícitos, o gênero apresenta também conexões implícitas, compreendidas e interpretadas pela forma como o adaptador faz a sua produção, nesse caso, as proposições aparecem em ligação na fala das personagens. O uso dos mecanismos de conexão na tragédia, não segue uma norma específica de uso, mas segue os objetivos e intenções do adaptador em alcançar seu público. Em segundo lugar, em relação aos mecanismos de coesão nominal, o gênero tragédia apresenta, sobretudo, a predominância de anáforas pronominais por substituição e repetição, embora também apareçam anáforas nominais. Essa repetição de nomes não é aleatória, se dá pela relação do gênero tragédia com o contexto de produção, e conforme exposto, essa retomada não ocorre sobre qualquer termo, mas sobre termos que ajudam na construção da progressão dialogal existente no texto. Em terceiro lugar, o gênero tragédia apresenta, em relação à coesão verbal os tempos verbais com maior ocorrência característicos do discurso interativo secundário: presente do indicativo, pretérito perfeito, futuro perifrástico

e futuro do presente, e do discurso relato interativo secundário: pretérito perfeito e futuro do pretérito. Em relação aos mecanismos enunciativos, notamos que o gênero tragédia apresenta diferentes vozes e modalizadores que, além de respaldar, apoiar e justificar o andamento dramático assumido pelo adaptador nas falas dos personagens, muitas vezes denuncia questões políticas e sociais do nosso tempo. Sobre a inserção dessas vozes, elas são inseridas sob a forma de discurso direto e indireto livre. O emprego dessas formas depende das intenções, objetivos e estilos do adaptador. Da mesma forma, o uso das modalizações varia de acordo com os objetivos do adaptador, das representações que tem da situação de produção, dos seus destinatários e da imagem que quer passar de si mesmo e a relação que estabelece entre ele e o leitor. Nesse gênero, que tem como um dos pontos apresentar o diálogo efetivo entre as personagens e garantir o andamento dramático de uma tragédia, o emprego das modalizações (lógica, apreciativa, deôntica e subjetiva) é de extrema importância.