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Contexto Histórico

No documento Joao Bosco de Santana (páginas 98-105)

2.4 Tributos Indiretos

2.4.3 Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre

2.4.3.1 Contexto Histórico

Conforme já mencionado, com o advento da Revolução Industrial na Inglaterra, na segunda metade do século XVIII, foi a vez do consumo ser eleito como hipótese de incidência de tributo.

No Brasil, pela primeira vez, na Constituição da República de 1934, de competência da União, constava o Imposto sobre o consumo de quaisquer mercadorias, exceto os combustíveis de motor de explosão; e de competência dos Estados o Imposto sobre vendas e consignações – IVC – efetuadas por comerciantes e produtores, inclusive os industriais que perduraram até a Constituição de 1967.

Conforme já mencionado, o então Imposto sobre o consumo veio ser substituído na Constituição de 1967 pelo Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI.

Quanto ao Imposto sobre Vendas e Consignações – IVC, segundo BALEEIRO, (2008, p. 367), tratava-se do mesmo imposto que a União criara em 1923 por meio da Lei n.º 4.625, de 31/12/1922, com o nome de imposto sobre vendas mercantis, sua instituição foi por imitação à França, que cobrava Chifre d`affaires; e à Alemanha que cobrava o Umsatzsteuer no período da guerra de 1914 – 1918, seguido de vários países e Estados norte-americanos.

Conforme ensina TEIXEIRA (2002, p.256), “é que entre as duas guerras mundiais, a maioria dos estados do mundo ocidental introduziu em seus ordenamentos jurídicos uma espécie de imposto sobre volume geral das vendas, que era uma forma de tributar o consumo”.

O Imposto sobre vendas e consignações – IVC – era um imposto que incidia em cascata, em razão disto, para os juristas e economistas da época era propiciador de inflação, verticalizador da atividade econômica, impeditivo do desenvolvimento da federação e tecnicamente incorreto.

Dizer que determinado imposto incide-se em cascata é o mesmo que dizer que tem incidência cumulativa, que significa dizer que a alíquota aplicável incide a cada operação sem qualquer abatimento do imposto pago na operação anterior, assemelhando-se ao cálculo do juro composto sobre um determinado capital.

À guisa de ilustração, a tabela 2.4.3.1.34, abaixo, apresenta situação em que o fabricante adquire insumos para a produção por R$50,00 e vende os produtos de sua fabricação por $100,00 ao atacadista, que também os revende por R$200,00 ao varejista que finalmente os revende ao consumidor final por R$400,00.

Tabela 2.4.3.1.34 - Cálculo do IVC, em cascata ou cumulativo FABRICANT E ATACADIST A VAREJIST A CONSUMIDOR Preço de Compra 100,00 200,00 300,00 400,00 Preço de Venda R$ 200,00 300,00 400,00 Alíquota 10% 10% 10%

O Imposto sobre vendas

e consignações – IVC 20,00 30,00 40,00

Fonte: Elaboração Própria.

Nota-se que, embora a alíquota do imposto seja de 10%, em razão do efeito cascata, o imposto onerou a cadeia produtiva em R$90,00 o equivalente a uma alíquota aplicável de 22,5% do preço final pago pelo consumidor.

Pela tabela 2.4.3.1.35, a seguir, demonstra-se, por meio da Demonstração do Resultado do Exercício, parcial, o efeito nocivo do Imposto sobre vendas e consignações – IVC na cadeia de produção e distribuição em razão do efeito cascata.

Tabela 2.4.3.1.35 – Demonstração do Resultado do Exercício – parcial

DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO

Em $ FABRICANTE ATACADISTA VAREJISTA

VENDAS BRUTAS 200 300 400

Deduções: 0 0 0

VENDAS LÍQUIDAS 200 300 400

(-) CUSTO DAS VENDAS 100 200 300

LUCRO BRUTO 100 100 100

(-)Despesas Operacionais De Vendas

IVC 20 30 40

Outras despesas ou Receitas

Operacionais 0 0 0

Lucro Operacional 80 70 60

Fonte : (MARION,2009, p.141) – adaptada

Verifica-se,de fato, o efeito propiciador de inflação do IVC em vista do cálculo do imposto em cascata. Todos os agentes econômicos, na cadeia, acrescentaram ao preço de compra $ 100 para a formação do preço de venda. Em razão da ausência de deduções do imposto, por não estar no preço, todos obtiveram vendas líquidas e vendas brutas no mesmo valor e, em conseqüência, o mesmo lucro bruto, já que todos acrescentaram $100. Entretanto, mesmo com a ausência de despesas, tiveram lucro operacional diferente e cada vez mais decrescente na cadeia, sendo o varejista o mais prejudicado.

A França, segundo BALEEIRO (2008, p. 368), foi o primeiro país industrializado a se perceber das desvantagens de um imposto cumulativo incidente sobre todas as fases de produção industrial e de circulação e, em 1954, implementou-se no sistema tributário daquele País o princípio da não-cumulatividade. O tributo instituído com esta característica foi o Taxe

Sur La Valeur Ajoutée – TVA, retocado posteriormente, mas ainda hoje vigente. Na década de

60, outros países foram se alinhando a essa nova realidade e implantando, nos respectivos ordenamentos jurídicos tributários, o mesmo princípio.

No Brasil, o princípio da não-cumulatividade foi introduzido na Constituição por meio da reforma Constitucional n.º 18 de 1965. Embora já o tivesse adotado, em legislação ordinária, no imposto de consumo que, posteriormente, veio a ser o pelo Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI. (BALEEIRO, 2008)

Na constituição de 1967, o Imposto sobre vendas e consignações – IV – já figurou como Imposto Sobre Operações Relativas À Circulação De Mercadorias, realizadas por produtores, industriais e comerciantes.

Não obstante, foi mesmo no texto constitucional de 1969 que se escreveu com toda a inteireza, Imposto Sobre As Operações Relativas À Circulação De Mercadorias realizadas por produtores, industriais e comerciantes. Imposto que não será cumulativo e do qual se abaterá, nos termos do disposto em Lei complementar, o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado. A isenção ou não-incidência, salvo determinação em contrário da legislação, não implicará crédito de imposto para abatimento daquele incidente nas operações seguintes. (CONSTITUIÇÃO DE 1969)

Observa-se que, no mesmo artigo constitucional, explicitou que a hipótese de incidência eram as operações relativas à circulação de mercadorias e os contribuintes de direito, os produtores, industriais e comerciantes que realizassem tais operações.

O Imposto Sobre as Operações Relativas À Circulação De Mercadorias – ICM, mais tarde, por meio da Constituição Federal de 1988, abarcou outros três impostos únicos federais que tinham incidência sobre a energia elétrica, os combustíveis e lubrificantes líquidos e gasosos e os minerais do país, os quais passaram a integrar o fato gerador do ICM e ainda foram acrescentados os serviços de transportes intermunicipais e interestaduais e os serviços de comunicação passando o então Imposto Sobre as Operações Relativas À Circulação De Mercadorias – ICM – para Imposto Sobre Operações Relativas Á Circulação De Mercadorias

E Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS.

Na Comunidade Econômica Européia, sob o nome de Imposto Sobre O Valor Adicionado – IVA, foi adotado em 1967 e, paulatinamente, implementado pelos seus membros: Dinamarca em 1967; Alemanha em 1968; Inglaterra em 1973; Irlanda em 1972; Luxemburgo e Bélgica em 1969. Também no final da década de 60, difunde-se na América Latina – Bolívia, Uruguai, Peru, Equador, Argentina e Paraguai. (BALEEIRO, 2008)

TEIXEIRA (2002, p.16) cita que “os Estados Unidos da América optaram por um Imposto Incidente Sobre as Vendas a Varejo ao consumidor final: Sales Tax”.

Observa-se que o Sales Tax, também conhecido por IVV, modelo adotado pelos americanos, não envolve em momento algum os agentes econômicos industriais ou atacadistas na arrecadação do imposto, sendo o único contribuinte de direito o varejista no momento da venda ao consumidor final.

Nota-se que os países que adotaram a incidência sobre o valor adicionado têm como hipótese de incidência do imposto a circulação. No entanto, pela adoção do princípio da não- cumulatividade como regra, atinge-se na cadeia o valor acrescido, pois sendo cobrado no valor da operação e abatendo-se o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou por outro Estado, resulta-se que, embora o Estado antecipe a sua receita tributária ao longo da cadeia, não se onera os agentes econômicos envolvidos, mas tão somente o contribuinte de fato, consumidor final, que arcará como ônus tributário.

AMARO (2006, p. 91) cita que “não cumulativo é o tributo que, em cada fase, incide apenas sobre o valor que nela se agregou, ou grava todo valor acumulado do bem, descontando-se, porém, o valor que já gravou as fases anteriores (por exemplo, o IPI e o ICMS)”.

Nesta mesma linha, para HENRIQUE (2003, p. 124), a não-cumulatividade “significa que o valor tributário efetivamente devido, não decorre de simples incidência tributária, mas da incidência acompanhada por um encontro de contas, de modo que o montante devido decorra de um encontro de créditos (decorrentes de operações anteriores) e débitos (provenientes de operações presentes)”.

A tabela 2.4.3.1.36, a seguir, à guisa de ilustração, com base em informações trazidas em seminário sobre política tributária promovido em 2005 pela Secretaria da Receita federal do

Brasil na qual se compara a apuração do imposto indireto, sobre o consumo pelo princípio da não-cumulatividade – IVA e ICM, com alíquota fixa na última fase da cadeia – IVV e por fim o cálculo cumulativo, efeito cascata – IVC. A alíquota adotada foi de 10% para os primeiros e 5% para este último.

Tabela 2.4.3.1.36 – Cálculo do imposto indireto, sobre o consumo, pelo princípio da não- cumulatividade e a incidência cumulativa

Fases Preço de Venda - Valor da Operação IVA e ICM - Alíquota de 10% Apuração do IVA e ICM - Não Cumulatividade IVV Alíquota de 10% IVC Cumulativo - Alíquota de 5% I -Produção 100,00 10,00 - - 5,00 II -Atacado 150,00 5,00 (15,00 - 10,00) - 7,50 III -Varejo 200,00 5,00 (20,00 - 15,00) 20,00 10,00 Total - 20,00 - 20,00 22,50

Fonte: II Seminário de Política Tributária 2005 - Adaptado

http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/estudotributarios/Eventos/SeminarioII/P05TributacaosobreoConsumo .pdf

Nota-se que a incidência cumulativa é tão nociva que, mesmo com utilização da alíquota de 5%, metade da utilizada na apuração do imposto pelo princípio da não-cumulativade na cadeia produtiva – IVA e ICM – e com alíquota fixa na última fase da cadeia – IVV, ela foi a que mais onerou a operação.

Não obstante, ainda assim, segundo dados trazidos naquele Seminário de Política Tributária promovido em 2005 pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, nem todos os países aderiram à adoção do princípio da não-cumulativadade, conforme se vê na tabela a seguir.

Tabela 2.4.3.1.37 - O IVA por regiões no período de 1960 a 2001 Expansão do IVA Regiões 1960-1979 1980-1989 1990-2001 Total de Países c/ IVA Part. % s/ total de países. Europa 12 4 26 42 97,7 América 12 4 6 22 81,5 África 2 6 25 33 51,6 Ásia/Outros 1 6 19 26 51 Total 27 20 76 123 66,5

Fonte: FMI – The Modern VAT. 2001 – II Seminário de Política Tributária 2005 -

http://www.receita.fazenda.gov.br/Publico/estudotributarios/Eventos/SeminarioII/P05TributacaosobreoConsumo .pdf

Veja que na região da Ásia, praticamente, apenas metade dos países adotaram o princípio da não-cumulatividade. Por outro lado, na Europa, praticamente todos os países o adotaram. Como demonstrado, no Brasil, o principio da não-cumulativade já vigora desde 1967, o que demonstra que o legislador, de fato, entendeu que, por se tratar de imposto sobre consumo, não se deve onerar a cadeia produtiva. É o que consta no artigo 20 da Lei Complementar n.º 87 de 13 de setembro de 1996:

“Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação” (Art. 20, LC n.º 87,1996).

Não obstante a tal dispositivo, vê-se, na prática, certas limitações e adiamento por parte da própria lei, por meio do artigo 30, para o exercício desse direito pelo contribuinte:

I – somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso ou consumo do estabelecimento nele entradas a partir de 1o de janeiro de 2020;

II – somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento: a) quando for objeto de operação de saída de energia elétrica;

b) quando consumida no processo de industrialização;

c) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais; e

d) a partir de 1o de janeiro de 2020 nas demais hipóteses;

III - somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao ativo permanente do estabelecimento, nele entradas a partir da data da entrada desta Lei Complementar em vigor.

IV – somente dará direito a crédito o recebimento de serviços de comunicação utilizados pelo estabelecimento:

a) ao qual tenham sido prestados na execução de serviços da mesma natureza; b) quando sua utilização resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção desta sobre as saídas ou prestações totais; e

c) a partir de 1.º de janeiro de 2020 nas demais hipóteses” (Art. 33, LC n.º 87,1996).

Feitas essas considerações, no tópico seguinte, longe e sem nenhuma pretensão de exaurir o tema, serão abordados alguns elementos essenciais sobre o Imposto Sobre Operações Relativas À Circulação De Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS.

No documento Joao Bosco de Santana (páginas 98-105)