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CAPÍTULO 4: PESQUISA DE CAMPO: VIVÊNCIA E ENTREVISTAS

4.2 Contexto

A disciplina aconteceu no segundo semestre de 2019. Esse foi o primeiro ano do mandato do atual governo, marcado pelo grande ataque às universidades e diretamente à profissão do professor. Durante a entrevista, Fabíola comenta que o contexto político estava pesado e que isso, de certa forma, altera a disposição para enfrentar as aulas e a instituição.

Durante a minha graduação, sempre frequentei a sala dos professores, assim como vários outros alunos. Esse ano, devido à pesquisa, passei a frequentar com mais frequência e percebi um ar diferente, um desânimo e tensão maiores do que na época em que era aluna. Além disso, desde que foi diminuído o

financiamento federal aos alunos das instituições privadas (programa FIES), o curso de Design, a cada ano, vem perdendo muitos alunos e a incerteza sobre o futuro do curso paira acima de todos como uma nuvem cinza.

A instituição impõe normas invisíveis que, apesar de não estarem escritas em nenhum lugar específico, é sentida pelos professores. Os mais progressistas expressam suas opiniões políticas em murmúrios pelos cantos, escondidos. Muitos planos inovadores que não saem do papel e uma frustração por parte dos alunos que nem eles conseguem pontuar exatamente o porquê.

Há também um excesso de burocracia que marca as relações entre os alunos e também entre professores e alunos. As falas da Fabíola, Gabriela e João evidenciam um excesso de artificialidade. Gabriela enfatiza a ausência de debates de qualidade sobre temas políticos

A instituição privada precisou adotar estratégias mercadológicas para manter rodando a máquina, e essas estratégias mercadológicas facilitaram demais. [...] A instituição é maternal no pior sentido do termo, no sentido de excesso de proteção [...] que aceita a relação de consumo. Ela mesma anuncia que a relação é essa.

A PUC se rendeu, se entregou. Virou um colégio. Quando ela virou PUC, ela perdeu, porque antes [quando era aluna] havia um espírito de universidade. É entediante dar aula no ambiente da PUC. [...] Por mais que você entre em sala de aula e os alunos estejam ali. Mas mesmo os alunos [...] Antes era mais autêntico. Hoje virou um negócio artificial. É chato porque é artificial... preparando pessoas para uma vida artificial. E é angustiante para o professor, porque ele sabe que aquilo que a instituição tá querendo que você transmita, que o mundo vai ser “assim” quando você sair de lá… É uma mentira. É uma artificialização que só funciona para quem tem grana. E mesmo para quem tem grana, não funciona. [...]

Quando me vejo participando disso, me angustia um pouco (Fabíola).

Acho que existe um grande vazio entre aluno e instituição. A PUC tem uma falta de responsabilidade com certos assuntos que hoje em dia são muito importantes. Ela fecha os olhos e prefere não tocar no assunto. Existe um certo descaso (Gabriela).

Não sei definir a relação com a PUC. Nunca corri atrás da instituição [...] Existe a promessa da interdisciplinaridade na PUC. Fala-se disso, a gente

Luana faz uma comparação entre o valor pago e os serviços que a PUC oferece. Na sua fala está implícita a relação de compra de serviços e a ausência da constituição do espaço universitário como um espaço construído por todos.

A PUC é difícil né… [...] É uma relação muito forçada. Eles querem parecer que está tudo certo, nenhum problema e quando chega no fim do semestre, não tem papel higiênico para você usar, não tem sabonete. [...] Gosto muito do curso, mas sinto que a PUC não valoriza os alunos que tem e não dá o que a gente merece [...] Pelo preço que a gente está

pagando… a gente merecia um pouco mais de conforto (Luana).

Se pensarmos o ambiente e a relação com a PUC como monotom, a vivência na sala de aula é colorida, na visão dos alunos. Desde os professores mais antigos até os mais novos, cada um com sua personalidade e interesse específico, trazem vida para o curso de Design e fazem dele um lugar único. Apesar da entrevista ser especificamente sobre a aula da Fabíola, o relato da aula de outros professores sempre aparecia na fala dos alunos, destacando a relação afetuosa e as boas experiências de aprendizado.

Sempre que eu precisava, eles [professores] estavam dispostos a ter

conversas e dar opiniões baseado em suas vivências (João).

A maioria dos professores tem uma relação muito próxima com os alunos. [...] São preocupados [...] Eles mostram seu lado profissional, se abrem… vira uma família o design. [...] Mesmo com a grande quantidade de projetos, a gente sente que está sendo acolhido pelo curso e eles estão

lá a qualquer momento para ajudar a gente (Luana).

As disciplinas de Estúdio, entre outras obrigatórias, é oferecida por mais de um professor, devido à quantidade de alunos. Eles precisam tecer a aula em conjunto, preocupados com as metodologias e habilidades que o designer precisa aprender. A Optativa, por outro lado, é o espaço onde os professores se mostram, onde podem escolher a sua metodologia de aula com maior liberdade. É a oportunidade para que o aluno aprenda com aquele professor o conteúdo exclusivo que somente ele pode trazer ali dentro do curso, por ser o espaço onde

ele mais se mostra. Durante a minha graduação, tive a experiência de ver o professor extremamente criterioso e exigente nas disciplinas obrigatórias, se mostrar mais aberto e despretensioso durante a sua disciplina optativa.

Para Fabíola, essas disciplinas são a ponte entre a vivência do professor fora da universidade e sua docência.

A disciplina optativa é muito diferente da disciplina regular [...] O professor tem uma liberdade maior de oferecer algo que ele domine, que ele tem apreço. As disciplinas optativas estão muito próximas daquilo que a gente gosta de fazer. [...] Isso traz um diferencial muito grande, porque é onde a gente vem com a nossa vivência. [...] Você tem que injetar muito da sua energia pessoal para que a disciplina se realize. [...] tem que ser muito inventivo nos trabalhos que você coloca para que as pessoas consigam construir algo significativo em torno disso. [...] Acho que o papel delas é trazer oxigênio para o curso [...] pela flexibilidade de conteúdos, porque a gente opera de forma mais aberta [...] Num momento de tantas mudanças, a optativa é o momento de trazer o cotidiano imediato para dentro do curso (Fabíola).

Ela também pontua que as Optativas são subutilizadas dentro do formato do curso, devido a pequena quantidade de alunos. Certas disciplinas atingem uma barreira, quando todos os alunos do curso já a cursaram. Dessa forma, o professor precisa oferecer outra optativa para que os alunos consigam cumprir a carga horária, o que impede que elas tenham uma perenidade. Foi o caso da disciplina de Cenografia. Essa dinâmica se confirma na fala do João, quando afirma que não conseguiu fazer com que a outra optativa oferecida pela professora se encaixasse na sua carga horária nos semestres anteriores.

Eu passei metade do curso tentando pegar optativa com a Fabíola. Eu queria fazer a de Multimídia. Decidi fazer a Cenografia por causa da

professora… era meu último semestre (João).

João e Gabriela trazem uma percepção similar de que essas disciplinas seriam um espaço de aproximação com os professores, sendo muitas vezes esse o motivo para a escolha de determinada Optativa. Os três entrevistados afirmam

que a escolha de cursar Cenografia se deve à Fabíola. Para eles, o aprofundamento na área de seu interesse, seja ela artística ou técnica, é algo que funciona.

Na optativa, a gente pode criar um vínculo com o que gosta e ficar muito próximo dos professores. (...) Eu levo muito a sério. A cobrança que tenho com os trabalhos da optativa é a mesma que a das outras disciplinas

(Gabriela).

Todas que peguei levavam para o lado do design gráfico. Na optativa [...], a gente escolhe a matéria e por isso a gente vai muito mais aberto. É uma boa dinâmica, porque faz com que a gente se empenhe [...] Todas as optativas que fiz… Tinham a vibe de uma aula de artes na sexta feira, na escola pública normal, sabe? A semana inteira com matérias pesadas, e na sexta, tinha aula de artes. A optativa para mim sempre tinha essa energia. Por ser a matéria que você escolheu, [...] é uma matéria mais calma [...] O ateliê de Gravura era o mais terapêutico. Lá dentro eu sabia

que não ia me estressar com nada (João).

Das optativas, eu espero algo que me ajude com habilidades para o mercado de trabalho. [...] Essas matérias também são essenciais para nos

auxiliar em outras matérias, projetos maiores (Luana).