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O professor designer de experiências de aprendizagem: tecendo uma epistemologia

CAPÍTULO 2: PEDAGOGIA DO DESIGN NO BRASIL - REFLEXÕES E

2.1 O professor designer de experiências de aprendizagem: tecendo uma epistemologia

tecendo uma epistemologia para a inserção do Design na Escola

A tese elaborada por Bianca Rêgo Martins (2016), se debruça sobre a Aprendizagem Baseada em Design, na defesa da presença do design na escola e na formação de pedagogos, devido aos aspectos específicos da aprendizagem desta área, que conferem ao designer uma inteligência peculiar na lida de problemas complexos. A autora coloca em diálogo conhecimentos do campo do Design, Educação e Cognição, visitando teorias de aprendizagem ativas (Aprendizagem Baseada em Problemas e Aprendizagem Baseada em Projetos), trazendo também referências do ensino de design na Educação Básica no Brasil e em outros países. A pesquisadora traz três diferentes enfoques em sua pesquisa de campo: um mergulho na disciplina Design, parte do currículo de uma escola de Ensino Básico; o processo de planejamento e implementação de uma disciplina

no curso de Pedagogia, que busca levar processos de design para os professores não-designers; além de entrevistas com estudantes e professores de Design e Pedagogia. O trabalho é concluído com uma aproximação a uma epistemologia da Aprendizagem Baseada em Design, que coloca o professor também como designer de experiências de aprendizagem.

A discussão que a autora traz sobre a presença do design na educação básica se mostrou relevante, pois pontua-se os aspectos excepcionais da aprendizagem do design, tanto na prática, como na teoria, ajudando-nos a compreender também a educação em design na graduação. Além disso, ao nomear o “professor-designer”, a autora coloca ênfase na prática educativa de design como um campo de estratégias que, em alguns momentos, podem se assemelhar às estratégias da prática de design, mas que também são (e devem ser) adaptadas à uma preocupação pedagógica, tendo uma preocupação com a didática, o desenvolvimento de competências específicas e também aquilo que a autora traz como multiculturalidade, com ênfase no protagonismo dos sujeitos na construção do conhecimento.

Uma das etapas relevantes do trabalho consiste em uma coleção teórica, colocando o design dentro uma perspectiva de “saber, conhecimento e pensamento” (p. 30), discutindo teorias filosóficas e cognitivas no âmbito do design, em sua aproximação com a Ciência. Aborda também a forma como o designer pensa seus projetos, destacando que o processo de projetar se aproxima muito do cotidiano, das tarefas do dia a dia. É destacado o aspecto de problematização do design, em que, em um processo dialético, inventam-se problemas ao mesmo tempo em que se solucionam problemas. Neste sentido, uma aprendizagem onde é muito claro o processo de criação, também se aprende a aprender, em uma dinâmica constante de reinvenção:

Num processo de aprendizagem, construímos problematizações a respeito de situações indesejadas e, para abordá-las, acabamos nos

modificando. E, ainda, quando a problematização de uma situação específica é algo que nos motiva, desenvolvemos uma atenção sensível para abordá-la e nos deixamos afetar pelo que vemos e vivenciamos. Nos modificamos e, ao nos modificarmos, alteramos nossa visão de mundo. Pensar problematizando, ou seja, indagando e inventando novos problemas faz parte do processo projetual de Design (p. 46).

Sobre a aprendizagem baseada em Projetos de design, a autora, discutindo Baynes (2010) fala sobre o propósito de se aprender através da prática do design no ensino fundamental, onde ressalto os seguintes aspectos:

 A importância da educação prática: aplicação de habilidades e conhecimentos tanto teóricos quanto práticos, para alcançar um objetivo satisfatório;

 Incentivo à imaginação: a realização do design em futuros desconhecidos;

 A consciência estética: a determinação da inteligência estética nos nossos pensamentos e ações;

 Aprender fazendo: a prototipagem que tem como objetivo atender a uma demanda concreta de um contexto.

Essas reflexões sobre o ensino de design fora da preparação profissionalizante são relevantes para compreender as particularidades da educação em design que são valorosas para um a construção de uma visão crítica do mundo, tirando o enfoque da importância técnica para o valor humano do design como lugar de aprendizagem, corroborando aquilo que é enfatizado neste trabalho. Quando retiramos a aprendizagem de design do seu lugar padrão (graduação em Design), conseguimos perceber esses valores de uma forma que nem sempre conseguimos quando olhamos diretamente para aprendizagem do design no campo profissional.

Na discussão do estudo de caso, a professora discute os resultados da disciplina para professores da Pedagogia, destacando a qualidade ética e política que existe nas estratégias de aprendizagem:

“[...] o Design está não só nas técnicas, mas na abordagem, na perspectiva, no olhar para o público e no envolvimento cuidadoso de uma ação pedagógica instigante. (...) Esse olhar de quem planeja experiências de aprendizagem revela opções e até mesmo um discurso político: o quanto é importante enquadrar o discurso pedagógico nas questões de identidade, diferença e poder para uma ação pedagógica contemporânea, uma vez que já sabemos que as linguagens, estéticas e estratégias planejadas implicam também em opções éticas (p. 112).

Na entrevista feita com alunos e professores de design, pela autora, podemos identificar os discursos que permeiam esse campo, em que podemos perceber a forma como, subjetivamente, é construído o conhecimento de design, de que forma esses discursos se aproximam da teoria, além da forma como o conhecimento brasileiro de design se desenvolve à sua própria maneira. O método de entrevistas se revela crucial para expor o conhecimento que acontece no encontro entre a experiência do professor profissional de design, o conhecimento adquirido por ele na vivência da sala de aula e a própria teoria do design, que, ao se juntarem, criam um saber diferente daqueles que o originou. Essa percepção é importante quando discutimos uma pedagogia que ainda não possui licenciatura no Brasil, como a própria autora destaca em seu trabalho.

Ao discutir a multirreferencialidade no exercício de construir uma epistemologia para a Aprendizagem Baseada em Design, a autora destaca o elemento de alteridade e auto reflexão que faz parte do processo de aprendizado do professor, numa compreensão que vai ao encontro da perspectiva dialógica na prática educativa:

qualquer experiência estética caracteriza-se por posturas de estranhamento e surpresa que deslocam o eu e mobilizam uma atenção aberta ao plano dos afetos. Não se ensina transmitindo informações. O professor atua como um dispositivo por onde circulam afetos. Ele não é

professor porque detém um saber, mas porque possui um savoir-faire com esta dimensão da experiência (p. 162).

A autora também salienta que o professor que fica na memória dos alunos é aquele que trabalha com emoção, paixão e se permite afetar pelos ânimos e conhecimentos construídos, abraçando a incerteza e o improviso que fazem parte da prática.

A alteridade também é enfatizada pela autora no processo de construção de conhecimento do próprio aluno, já que o conhecimento adquirido quando se aprende projetando, conjuga diversas perspectivas e é construído ao se deixar afetar pelos diferentes sujeitos que o constroem.

O aluno, sob esta perspectiva, assume a postura de protagonista/pesquisador de soluções adequadas aos problemas

propostos e também aos demais problemas que possam surgir a partir da abordagem dos primeiros. Portanto é possível argumentar que o aluno, ao criar estas propostas de solução, constrói um novo conhecimento, pois cada solução é um arranjo original de conhecimentos, procedimentos e afetos que visam atender às nuances multirreferenciais do problema. Vale a pena observar que esta nova solução/conhecimento pode se materializar em algo concreto (objetos, maquetes etc.) ou pode ser abstrato (uma estratégia, a prestação de um serviço, um projeto de comunicação etc.). Neste momento, introduziremos uma perspectiva importante: esta solução é, ainda, sempre para alguém(ns), sempre

para o outro (p. 163, grifo nosso).

A autora conclui que as práticas de design ajudam a qualificar a docência, colocando o professor como “articulador da complexidade de saberes, valores, sentimentos e modos de interação de cada espaço-tempo social” (p. 172), ressaltando também que a formação do professor extrapola a academia, sendo tecida em múltiplos contextos.

2.2 O ensino de projeto na graduação em design no Brasil: O