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Experiência da decisão - Colaboração com os alunos como estratégia

CAPÍTULO 4: PESQUISA DE CAMPO: VIVÊNCIA E ENTREVISTAS

4.5 Experiência da decisão - Colaboração com os alunos como estratégia

Nessa aula específica, o aspecto colaborativo que sempre faz parte das aulas da Fabíola se acentuou por ser uma disciplina optativa. A palavra colaboração aqui é usada em um sentido de compartilhamento do espaço de decisão em sala de aula. Essa palavra, para os entrevistados, teve significados diferentes.

Ao falar sobre colaboração, Fabíola expressa a dificuldade em fazê-la acontecer dentro de um formato de sociedade e, consequentemente, das instituições educacionais, que instiga a competição. Para ela, aquilo que se consegue alcançar em sala de aula é muito tímido perto do que poderia ser.

[...] para que a educação institucional se colocasse, para que fosse possível ser como é hoje, essa organização institucional extrema, teve que se matar o espírito de coletividade e o espírito de colaboração [...] Porque a colaboração [...] é uma ação no sentido de você estar em equilíbrio. Quem colabora está aberto para receber a colaboração do outro. [...] Isso é quase uma homeostase, a maneira daquele ambiente ficar equilibrado. E aí, [...] para que os processos industriais todos pudessem acontecer e se naturalizarem [...] entre nós, podendo ser comparáveis a própria natureza, o surgimento de um objeto na sua frente, essa perda... que levou a essa perda até do discernimento, do que é natural, do que não é… Quando isso foi colocado, a gente matou a colaboração e trocou ela por competição. Esse é um processo antigo [...] muitas gerações anteriores a nós vêm amadurecendo dentro de um rolo compressor [...] é muito difícil você ficar fora dele. E quando se trata de educação então... é completamente impossível. Eu acho que a colaboração é o que nós não temos, é o que a gente fala dentro de sala de aula que é necessário, mas ninguém consegue realizar. [...] Os professores quando conseguem realizar, conseguem de uma maneira

extremamente pobre (Fabíola).

Para ela, essa colaboração que acontece em sala de aula é mais uma mediação deliberada para que os alunos aprendam a se expressar, tendo o cuidado de entender o que cada um do grupo tem a oferecer e criar um ambiente para que ele se sinta à vontade para oferecer, eliminando os constrangimentos que os alunos possam ter sobre a troca intelectual, para se sentirem em um espaço onde podem compartilhar seu pensamento, mesmo que haja alguma insegurança quanto àquilo que ele pensa sobre determinado assunto.

Durante a minha observação, consigo perceber que mesmo durante aulas expositivas, existe interação em uma dinâmica de perguntas e respostas. Cada resposta dos alunos é escutada por ela com muita atenção e valorizada como uma

opinião válida. Não só isso, mas a resposta trazida pelo aluno serve de estímulo para novas perguntas, em uma construção de conhecimento coletiva.

O que eu faço é isso: um pensamento que receba contribuições e eu tento fazer com que essas contribuições se reúnam, se fundam num entendimento daquele momento, daquela aula para que todos saiam de lá carregando um pouco.

Qual é a luta ali? É você conseguir primeiro escanear [...] e entender o grupo, o que cada um tem para oferecer, o que está disposto a oferecer e criar um ambiente que ele se sinta à vontade para oferecer e que também se sinta à vontade para não oferecer. Que ele também fique bem se ele não quiser falar nada nunca. [...] é criar esse ambiente de segurança,

confiança, mesmo entre alunos que não confiam entre si (Fabíola).

Para ela, a graduação é só um momento de despertamento para algo que o aluno irá compreender somente em um outro momento da vida, além da universidade. A colaboração seria a dinâmica ideal, mas a quantidade de amarras com que os alunos chegam na faculdade, para ela, é muito grande, e o tempo de graduação, além do espaço educacional em que atua, não seriam suficientes para haver uma real compreensão do que significa uma colaboração plena.

Quando eu falo sobre empatia em uma aula de design… “O designer tem que se colocar no lugar do outro” ... Ele só vai se colocar no lugar do outro se ele conhecer o outro é e ele só vai conhecer o outro se ele se deixar conhecer. E pra isso acontecer você tem que ficar na sua fragilidade [...] o aluno entra dentro de sala carregando 15 capas, que se manifestam em diversos sintomas… tudo isso é feito para acobertar o que eu acho fraco em mim, o que eu acho frágil, o que eu acho indefensável, o que eu acho errado. Então, quando eu consigo tirar algumas capas.... se o professor consegue criar um ambiente em que o aluno se sinta seguro para falar uma coisa que ele não sabe se está certo, ele já tirou uma capa. Dentro

da sala de aula a gente tira duas ou três (Fabíola).

Acho que o conceito dela de fazer a aula em círculo tem a ver com isso. Retirar as barreiras, que são as mesas. Quando a pessoa expunha as ideias era de frente para alguém, que podia complementar ou discordar. É uma forma de aula mais cooperativa. A aula em si é um organismo só

Esse seu comprometimento com o exercício do desprendimento dos medos e da capacidade do aluno de se expor, se assumir em sala vem junto com seu próprio comprometimento em se assumir quando dá aula. Às vezes, percebo como ela fica surpresa com determinadas respostas e ela sempre expressa essa surpresa ali na frente dos alunos. Percebo que existe, por parte dela, um convite ao desafio de questionar-se e questionar o tema proposto. Para Paulo Freire, essa posição crítica é tarefa do educador dialógico:

[...] uma das tarefas nossas enquanto educadores — obviamente numa posição que eu chamaria aqui de democrática, aberta, crítica — seria exatamente, de um lado, a de compreender certos medos dos educandos e, de outro, não incentivar os medos, mas, em certo sentido, ajudar o educando a assumir, pouco a pouco, quando ele não tenha já a coragem de perguntar, a coragem de criticar, a coragem de indagar. Acho isso absolutamente fundamental (2014, p. 117).

Para os alunos, colaboração tem um significado próximo ao de compartilhamento:

Pra mim, colaboração é agregar, tipo um quebra-cabeça. Você tem um pedaço, mas falta certas coisas que outros no grupo tem para fechar o ciclo (João).

Eu entendo como a partilha de certo conhecimento que os envolvidos nessa colaboração tem interesse e disposição. [...] Um engajamento em

desenvolver algo junto (Gabriela).

Fabíola relata que nas disciplinas obrigatórias, especialmente aquelas do início do curso, as delimitações projetuais tendem a ser mais rígidas, já que os conhecimentos e habilidades que o aluno precisa aprender nas disciplinas devem ficar bem claros para todos os envolvidos. Na aula optativa, ela sente ainda mais liberdade para promover uma aula aberta, que vai sendo modelada conforme os alunos, se eles tiverem maturidade. Na disciplina da minha prática docente, não só o “como” foi sendo tecido conforme a aula acontecia, mas também os temas abordados foram escolhidos em colaboração com eles.

É interessante como a Fabíola às vezes começa uma aula crua e as coisas vão se construindo. [...] [Ela] chega e pergunta o que vai ser o semestre. [...] “O que seria interessante? Vocês acham que a gente devia divulgar

Goiânia?” Ela vai construindo a aula dia após dia (Gabriela).

Ela deixa a gente participar em como vai ser o projeto. A gente também tem voz e não é só o professor que impõe. [...] A gente se sente mais próximo do professor e sente que o projeto faz sentido pra gente. [...] Tem

mais a nossa personalidade (Luana).

Deixar as coisas na mão da turma… mesmo que não tenha sido 100%, em cada momento, em cada aula, alguém tinha decidido alguma coisa. Algum ponto você ajudou a escolher. No final, todo mundo tava fazendo o que queria, todo mundo tava focado. Tanto que até quem não levava desenho, tinha pensado alguma coisa. Ela deu essas escolhas para a gente. [...] Essa oportunidade de escolha ajuda a não desmotivar. E como ela deixou escolher em vários momentos, cada ponto de delimitação do projeto tem algo seu (João).

Ela não traz um peso para as nossas respostas, um valor… um valor no sentido de “Isto vale mais ou menos, certo e errado” Ela tenta entender de onde vem aquela opinião que a gente relatou. Depois que ela escuta é que ela vai dizer como isso pode ser importante na nossa vida e na matéria (Gabriela).