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3 PRÁXIS DOCENTE NA RELAÇÃO INSTITUIÇÕES DE

3.2 Abordagem das instituições de ensino na relação modernização

3.2.2 Contextualização da regulação de uso das TDIC: um olhar

A comunicação sempre foi uma necessidade humana e para que ela se promovesse, ao longo da história da humanidade, diversas formas de tecnologias foram surgindo e sendo aperfeiçoadas. Nesse sentido, é pertinente dizer que o ato de

comunicar é inerente ao ser humano e essa peculiaridade tem viabilizado nossas inter- relações.

Vivemos na contemporaneidade uma sociedade em constante mutação. Essa revolução ancorada nas tecnologias digitais da informação e comunicação tem reconstruído nosso cotidiano de modo que passamos a “um novo sistema de comunicação que fala cada vez mais a mesma língua universal digital” e está “movendo a integração global da produção e distribuição de palavras, sons e imagens de nossa cultura e personalizando os gostos das identidades e humores dos indivíduos” (CASTELLS, 1999, p. 40).

O texto midiático de cunho tecnopedagógico que permeia esse contexto caracterizado por Castells (1999) é um objeto discursivo (MAINGUENEAU, 2008a) e manifesta-se, pois, por meio de uma semiose verbal integrada, a saber, o discurso. Sobre esse aspecto, o discurso faz esse elo entre o linguístico e o não linguístico, daí podemos compreender a relação intrínseca entre: sujeito, sociedade e ideologia (CARVALHO, 2011).

Todavia vale ressaltar que o sentido não é um dado a priori, o que significa dizer que ele se materializa na enunciação por meio da interação dos sujeitos (MAINGUENEAU, 1989). Portanto, todo ato de linguagem está intrinsecamente ligado à sua situação de comunicação, ou seja, o discurso é um fenômenointerativo que se constitui na imbricação entre linguagem e o meio social (CHARAUDEAU, 2009).

A natureza do discurso tecnopedagógico é, assim, multifacetada, uma vez que nele há uma predominância do modo argumentativo, mas também se configura a presença dos demais modos descritivo e narrativo como estratégias de constituição discursiva na elaboração da tese desejada. Por conta dessa peculiaridade, por vezes, apresenta-se subjacente ao texto midiático de cunho tecnopedagógico, uma cena englobante (MAINGUENEAU, 2006) de caráter híbrido, ou seja, uma interseção de tipo de discursos, tais quais, publicitário, político e pedagógico. Como a cena englobante cumpre a função pragmática do discurso (CHARAUDEAU e MAINGUENEAU, 2012), essa convergência de tipos discursivos não ocorre de maneira aleatória, mas se relaciona diretamente com a intenção do falante, que no caso do discurso em foco, visa à adesão dos atores sociais ao uso dos artefatos digitais como ferramentas pedagógicas no campo educacional pós-moderno.

Desse modo, todo ato de linguagem se compõe de um propósito referencial, que, por sua vez, está encaixado em um ponto de vista enunciativo do sujeito falante, ambos integrados em uma situação de comunicação específica (CHARAUDEAU, 2009). Enunciar se refere, então, ao fenômeno que consiste em “organizar as categorias da língua, ordenando-as de forma que deem conta da posição que o sujeito falante ocupa em relação ao interlocutor, em relação ao que ele diz e em relação ao que o outro diz” (CHARAUDEAU, 2009, p. 82. Grifo do autor).

Sendo assim, enunciar consiste em organizar as categorias da língua a fim de que essas expressem a posição do sujeito falante em três instâncias (CHARAUDEAU, 2009).

Dessa forma, na construção enunciativa temos três atos44:

a) ATO ALOCUTIVO (foco no outro): relação sujeito falante / interlocutor

b) ATO ELOCUTIVO (foco no eu): ponto de vista do sujeito falante sobre o mundo c) ATO DELOCUTIVO (foco na 3ª pessoa): há um apagamento do locutor e do interlocutor.

Apresentamos a seguir o quadro resumo no qual o autor propõe os procedimentos da construção enunciativa, expondo a relação que se estabelece entre os comportamentos enunciativos, as especificações enunciativas e, finalmente, as categorias de língua que lhes são correspondentes.

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Cf. Ximenes (2012, p. 06). Esse modo se sobrepõe aos outros modos ao demonstrar a posição dos sujeitos da linguagem por meio de marcas formais como o sistema pronominal, os dêiticos e a modalização.

Quadro 4- Procedimentos da construção enunciativa

Cada categoria modal proposta pelo autor presente no comportamento elocutivo diz respeito ao ponto de vista expressado pelo locutor sobre o seu próprio dizer. A construção enunciativa revela duas ordens: a linguística e a discursiva. Sendo a primeira responsável pelos diferentes tipos de relação do ato enunciativo, por meio dos processos de modalização do enunciativo; a segunda, ocupa-se dos procedimentos que contribuem para pôr em cena os demais modos de organização do discurso (Descritivo, Narrativo, Argumentativo).

O discurso tecnopedagógico caracteriza-se, pois, por apresentar em seu bojo um comportamento enunciativo alocutivo e sua relação de influência sobre o interlocutor dá-se mediante planejamento de determinadas estratégias discursivas de natureza sugestiva, propositiva e, por vezes, injuntiva. Logo, esse discurso de natureza dialógica

manifesta seu caráter regulador quando cumpre seu propósito de conduzir o interlocutor a compreender o premente uso das novas tecnologias. Sendo assim, nesse processo discursivo, os sujeitos emanam da relação dialógica e da “situação de interação e de conflito tenso e ininterrupto” entre ambos (BAKHTIN, 1981, p. 96).

Nesse momento chegamos ao ponto norteador de nossa abordagem discursiva a respeito da natureza reguladora do discurso tecnopedagógico. Intrínseca a essa relação dialógica, repousa uma relação metonímica entre as inovações tecnológicas inerentes à sociedade tecnologizada e midiatizada e quem de fato transforma essa inovação num discurso de necessária busca e atualização tecnológica, a saber, a ordem por parte da administração institucional educacional ao exigir do docente formação condizente com a incorporação das TDIC na nova práxis pedagógica; ou simplesmente a ordem velada de necessária atualização profissional condizente à era digital contemporânea, subjacente aos materiais de formação: documentos de organismos internacionais, manuais didáticos, pesquisas acadêmicas etc. destinadas aos docentes que compõem e constroem esse universo pedagógico pós-moderno.

Esse discurso tecnopedagógico ancora-se também no processo de tecnologização que tem proporcionado ao longo dos anos, cada vez mais acesso à informação em variados e tradicionais suportes midiáticos: rádio, televisão, jornais, revistas, livros etc. A questão pontual é que, segundo Kenski (2013), toda essa gama de possibilidades garantiu ao homem avançar no conhecimento, mas não lhe tirou do lugar de apenas receptor dessa mensagem.

Lits (1997) apud Kenski (2013) também afirma que, embora o zapping tenha mudado a maneira como o telespectador vê a TV, não passa de uma mera ilusão de poder sobre a programação televisiva. Para o autor, essa ilusão de configura no fato de ele apenas poder alterar o canal e não a programação disponibilizada pra ele pelas emissoras televisivas, por exemplo. Essa ilusão de controle é ainda maior na Rede mundial de computadores.

Entendemos a afirmação do autor, na perspectiva de que, embora a Web 2.0 tenha proporcionado ao usuário o poder de tornar-se também um produtor de conhecimento, no que concerne à área educacional, ainda encontramos muito material de cunho tecnopedagógico finalizado e disposto na Rede a funcionar tão só como manual de consulta e eventual desenvolvimento de projetos escolares. Essa gama de

possibildades de consulta no paraíso da informação chamado Google, poderia dá ao professor a ideia de liberdade, mesmo falseada, de escolhas pedagógicas a serem seguidas, quando de fato, as escolhas já teriam sido tomadas e o caminho construído, a priori. Ao professor restaria não mais que a ilusão de trilhar esse caminho como se fora o autor de sua obra pedagógica, e não apenas um intérprete.

Todavia, se essa busca por novos conhecimentos e materiais tecnopedagógicos na Rede Mundial de Computadores necessariamente existirá atrelado a essa nova cultura digital, que traz em seu bojo determinadas especificidades que desafiam a formação de professores e a sua atuação profissional, como devemos agir em relação à formação de professores para o exercício de sua docência mediada por artefatos pedagógicos digitais?

Nos sites nos quais o discurso tecnopedagógico se evidencia, questionamentos dessa natureza são hipoteticamente respondidos. De acordo com site O canal do educador45, por exemplo, em matéria intitulada: As TICs na prática pedagógica, a Agenda do século XXI é estabelecida e por meio dela o professor deve “colocar as tecnologias como aliadas para facilitar o seu trabalho docente. Deve-se usá-las no sentido cultural, científico e tecnológico, de modo que os alunos adquiram condições para enfrentar os problemas e buscar soluções para viver no mundo contemporâneo”.

Logo, o discurso tecnopedagógico traz em seu bojo os preceitos de evolução da era pós-moderna, portanto, impele o cenário educacional a mudar sua roupagem analógica e assumir a tendência digital como um novo parâmetro pedagógico a ser seguido. Esse fato é justificado, de acordo com Kenski (2013), porque são alterações necessárias à realidade educacional. Pois, tais ações:

que mesclam aspectos os aspectos trabalhistas (como, por exemplo, a valorização personalizada do desempenho; atuação docente diferenciada em espaços e tempos diversos, entre outros), a formação e a permanente atualização para a compreensão das novas tecnologias disponíveis e das novas temporalidades docentes (que recaem sobre os seus variados papéis) e para o desenvolvimento, em equipe, de cursos e disciplinas mediadas pelas tecnologias (KENSKI, 2013, p. 15).

Desse modo, toda essa contextualização tecnológica respalda o discurso de necessária atualização e uso das TDIC, além de evidenciar a postura que o professor deve assumir diante dessa questão, a saber, inserir-se nesse cenário cambiante com o

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espírito desbravador para superar as eventuais dificuldades acarretadas pelas constantes mudanças na educação e no ensino.

Seguindo essa mesma vertente, a Unesco também propõe uma reforma educacional e desenvolvimento dos professores:

o projeto da UNESCO de Padrões de Competência em TIC para Professores representa as implicações que cada uma das três abordagens tem para as mudanças em cada um dos componentes do sistema: política, currículo e avaliação, pedagogia, uso da tecnologia, organização e administração da escola e desenvolvimento profissional (UNESCO, 2008, p. 10).

Como é possível perceber, o projeto da Unesco de Competência em TIC para professores, o qual tece as bases dessa nova pedagogia ancorada na incorporação das TDIC como ferramenta pedagógica, está situado em um amplo contexto político de reforma educacional e desenvolvimento sustentável. A educação, nesse sentido, é posta como função central.

Destarte, esse novo paradigma tecno-econômico, ancorado nas novas tecnologias de informação e comunicação, envolve a formação de diversos setores da sociedade e não apenas o campo educacional. Ademais, surgem novas formas de gerar inovações e transmitir conhecimento. Portanto, há “a necessidade de definir e implementar novas estratégias e politicas para o desenvolvimento”. Dessa maneira, novas parcerias são traçadas, tanto com empresas e instituições públicas e privadas, no intuito de promover ações nos setores do ensino e da pesquisa (OLIVEIRA, 2006).

Oliveira (2006) destaca ainda que esse novo paradigma educacional pautado no uso das TDIC, surge em decorrência de uma exigência capitalista, a partir do esgotamento do sistema de acumulação. As causas que alavancaram, pois, o desenvolvimento tecnológico e, por conseguinte, a inserção das novas tecnologias, nos diversos setores da sociedade, inclusive no campo educacional, tem sua gênese no declínio do Fordismo.

Sendo assim, a inserção tecnológica digital na sala de aula parece seguir como um futuro certo na educação, uma vez que a evolução tecnológica e a terceira revolução industrial, por meio das novas tecnologias, criaram uma nova dinâmica a partir de meados do século XX. Logo, a formação das pessoas e os grupos, bem como os avanços

científicos e técnicos e as expressões culturais, estão em constante evolução e tudo operando numa interdependência cada vez maior (UNESCO, 2005, p. 05).

Claramente, as exigências pós-modernas impelem as instituições educacionais a uma remodelação. Não seria o fim da escola, mas o fim de uma escola, para o nascimento de outra sob novos paradigmas digitais. A esse respeito, embasamos nosso posicionamento na assertiva de Fino e Sousa:

Vivemos numa forma de sociedade que, por ser pós-industrial, requer formas de educação pós-industrial, em que a tecnologia será, com pouca hipótese de dúvida, uma das chaves da concretização de um novo paradigma educativo, capaz de fazer incrementar os vínculos entre os alunos e a comunidade, enfatizar a descoberta e a aprendizagem, e de fazer caducar a distinção (2008, p. 12).

Lançar, pois, um olhar crítico para essa conjuntura política se faz necessário e, desse modo, perscrutar as ideologias subjacentes às políticas públicas que fomentama inserção das TDIC no seio cotidiano da sociedade e no campo educacional. Não se trata, todavia, de assumir um posicionamento reacionário, ou, simplesmente, negar a atual conjuntura tecnológica na qual estamos inseridos. Trata-se de os professores buscarem os reais motivos de usarem as tecnologias no âmbito social e profissional. Tomando ciência disso, buscar a melhor forma de desenvolver um uso desses artefatos tecnológicos de modo consciente quer seja no cotidiano, quer seja na sua práxis pedagógica. Assim sendo, é importante que se analise as reais intenções de uso das tecnologias digitais nas entrelinhas do discurso tecnopedagógico.

Boaventura Santos (2002) destaca, por exemplo, que se considerarmos a influência hegemônica sob os mercados dos países em desenvolvimento, há uma tendência de ocorrer processos de subordinação, inclusive em relação a políticas públicas educacionais. Isso se evidencia porque esses países tendem a adotar uma lógica de obediência ao mercado.

É pertinente, dessa maneira, considerarmos que “toda ação pedagógica é objetivamente uma violência simbólica enquanto imposição, por um poder arbitrário, de um arbitrário cultural” (BOURDIEU e PASSERON, 2014, p. 26), ou seja, violência e arbitrariedade se estabelecem numa relação de interdependência:

A seleção de significações que define objetivamente a cultura de um grupo ou de uma classe como sistema simbólico é arbitrária na medida em que a estrutura e as funções dessa cultura não podem ser deduzidas

de nenhum princípio universal, físico, biológico ou espiritual, não estando unidas por nenhuma espécie de relação interna à “natureza das coisas” ou a uma “natureza humana” (BOURDIEU e PASSERON, 2014 p.29 – grifo dos autores).

Sendo assim, o poder arbitrário está ancorado nas divisões de classes sociais e se apresenta subjacente à ação pedagógica que tende à reprodução cultural e social simultaneamenteda classe dominante. Desse modo, há que se analisar se ao contrário de promoverem a transformação social de seus alunos, por meio da inserção das TDIC, não tenhamos medidas pedagógicas que estejam corroborando para ratificar suas desigualdades.

Outrossim, se as ações fomentadas por tais instituições consideram a necessária formação que deve ser destinada ao corpo docente frente às habilidades digitais que lhe serão exigidas. Em outras palavras, faz-se necessário perscrutar de que maneira as instituições estão promovendo suas ações pedagógicas, se de modo a não ignorar as diferenças socioculturais entre as diferentes classes sociais, ou se de modo camuflado, numa política educacional que, embora se apresente preocupada em eliminar a brecha digital, por exemplo, privilegie determinados patrimônios culturais das classes mais favorecidas em detrimento das menos favorecidas.

Nessa perspectiva, em seu primeiro informe mundial, a Unesco (2005) apresentou observações e projetos nos quais põem em evidência a necessidade de pautar “as novas bases de uma ética que oriente as sociedades do conhecimento em sua evolução. Uma ética da liberdade e da responsabilidade, que se baseia no aproveitamento compartilhado dos conhecimentos46” (UNESCO, 2005, p. 5). Essa base cumpre uma finalidade básica de estabelecer princípios éticos norteadores na aquisição de novos conhecimentos mediados pelas tecnologias digitais, bem como pretende estabelecer parâmetros éticos entre seus agentes.

Prosseguindo no mesmo fio argumentativo, na subseção seguinte pretendemos problematizar a inserção das TDIC na sala de aula, considerando aspectos teórico- metodológicos, históricos e culturais que remetem aos desafios da educação hoje

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Nossa tradução para o trecho: La revolución tecnológica y cognitiva que hemos heredado del siglo XX ha dado una nueva dimensión al mandato de la Organización, haciendo que sean cada vez más estimulantes los desafios estratégicos y complejos que ha de afrontar hoy en día. Las observaciones y los proyectos que presentamos en este primer Informe Mundial de la UNESCO ponen de manifiesto la necesidad de sentar las nuevas bases de una ética que oriente a las sociedades del conocimiento en su evolución. Una ética de la libertad y de la responsabilidad, que ha de basarse en el aprovechamiento compartido de los conocimientos (UNESCO, 2005, p. 05).

(FANTIN e RIVOLTELLA, 2012). A pergunta central que colocamos é: Como praticamente tudo hoje em dia pode ser encontrado em formato digital, os professores têm encontrado um campo fértil para uma práxis pedagógica mediada pelas as TDIC no contexto educacional? Nosso fio condutor da reflexão é traçado entre o imperativo de uso das novas tecnologias (BELLONI, 2012) e à necessária reflexão crítica do seu uso no atual ambiente institucional de ensino (PORTO, 2012; CHARLOT, 2008) em diálogo com a necessária ressignificação curricular e, finalmente, a relação desses elementos frente à formação docente requerida nesse emergente processo de ensino e de aprendizagem mediado pelas TDIC (DEMO, 2009; KENKY, 2013; PORTO, 2012; QUARTIERO, 2012). Sendo assim, se o professor não recusa à mudança (PORTO, 2012), como empreender uma formação inicial e continuada reflexivo-crítica apropriada à inserção das TDIC na sala de aula de modo a tornar o contexto educacional um campo fértil para a inserção dessas tecnologias?

3.3 Abordagem da formação docente na relação incorporação das TDIC e