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Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos atos de corrupção ativa e passiva envolvendo a ENGE

No documento Ministério Público Federal (páginas 85-90)

GERSON ALMADA, CRISTIANO KOK, JOSÉ ANTUNES, MILTON PASCOWITCH e JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH incorreram, assim, na prática do delito de corrupção ativa,

3.8. Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos atos de corrupção ativa e passiva envolvendo a ENGE

A r. sentença reconheceu entre os crimes de corrupção envolvendo a ENGEVIX denunciados a continuidade delitiva.

Recorre-se nesse ponto, por entender que cada um dos crimes, além de envolver agentes diferentes, é dotado de potencialidade lesiva própria, o que justifica que sejam considerados diversos. Caso assim não se entenda, subsidiariamente requer-se que, em sendo conferido provimento ao item “3.6” das presentes razões, seja reconhecido o concurso material entre os diversos atos de corrupção concernentes aos contratos e a continuidade delitiva entre cada um dos aditivos atinentes a esses instrumentos celebrados.

A instrução processual comprovou que os apelados, na condição de administradores e agentes da ENGEVIX, associaram-se aos executivos de outras grandes empreiteiras com atuação no setor de infraestrutura, para, com abuso do poder econômico, dominar o mercado de grandes obras de engenharia civil demandadas pela Petrobras e eliminar a concorrência.

Com isso, lograram frustrar o caráter competitivo de licitações de grandes obras realizadas pela Petrobras, obtendo vantagens consistentes em impor preços maiores aos que seriam obtidos em um ambiente de livre concorrência, tornar certa a contratação em um volume determinado de obras e escolher as obras que lhes eram mais adequadas conforme a região ou por conhecimento técnico, dentre outras vantagens.

De forma a tornar o esquema ainda mais eficiente, as empreiteiras cartelizadas, dentre elas a ENGEVIX, representada pelos operadores financeiros MILTON PASCOWITCH e

JOSÉ ADOLFO PASCOWITCH, corromperam Diretores e empregados do alto escalão da Petrobras, como RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, oferecendo-lhes vantagens indevidas (propina) para que não só se omitissem na adoção de providências contra o funcionamento do conluio, como também para que estivessem à disposição sempre que fosse necessário para garantir que o interesse das cartelizadas fosse atingido.

Dos valores indevidos oferecidos à Diretoria de Serviços da Petrobras, parte era destinada automaticamente ao grupo político responsável por manter RENATO DUQUE no poder: o Partido dos Trabalhadores – PT. Desta forma, foram referidas ofertas realizadas também a JOÃO VACCARI, representante do PT, e JOSÉ DIRCEU, membro de referido partido responsável pela indicação de RENATO DUQUE ao cargo, por vezes representado por FERNANDO MOURA.

Especificamente quanto aos crimes de corrupção de que tratam os autos, no período entre, pelo menos, 13/06/2006 e 29/12/2011, GERSON ALMADA, na condição de sócio e administrador da ENGEVIX, com a anuência de seus sócios CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES43 e, ainda, com o auxílio dos operadores MILTON PASCOWITCH e JOSÉ

ADOLFO PASCOWITCH, ofereceu e prometeu vantagens indevidas, assim como viabilizou os seus pagamentos a empregados públicos da Petrobras para determiná-los a praticar, omitir e retardar atos de ofício, bem como a agentes integrantes do núcleo político responsável pela manutenção de referidos funcionários em cargos de direção dentro da Petrobras.

RENATO DUQUE, então Diretor de Serviços, e PEDRO BARUSCO, então Gerente Executivo de Engenharia, não só aceitaram tais promessas de vantagens indevidas, para si e para outrem, como efetivamente deixaram de praticar atos de ofício com infração de deveres funcionais, e os praticaram nas mesmas circunstâncias, tendo recebido vantagens indevidas para tanto. JOSÉ DIRCEU e JOÃO VACCARI, respectivamente associado e representante do Partido dos Trabalhadores – PT, agremiação política responsável pela manutenção de RENATO DUQUE no cargo de Diretor de Serviços da PETROBRAS, atuaram 43 A presente argumentação inclui, desde já, CRISTIANO KOK e JOSÉ ANTUNES considerando a hipótese

como verdadeiros beneficiários das vantagens indevidas aceitas pelo ex-Diretor de Serviços da estatal e seu Gerente Executivo de Engenharia, passando a receber parte de referidos valores. Por vezes, tal papel foi assumido por FERNANDO MOURA, representante de JOSÉ DIRCEU dentro da PETROBRAS e integrante do núcleo político em que se inseria o ex-Ministro-Chefe da Casa Civil.

Portanto, a corrupção no “esquema criminoso” ora narrado era bilateral e envolvia não só a corrupção ativa, por parte dos executivos das empreiteiras cartelizadas, como também, e de forma concomitante, a corrupção passiva de funcionários da Petrobras e agentes políticos.

Na divisão das vantagens indevidas, o valor da propina repassada a empregados corrompidos da Diretoria de Serviços, em especial RENATO DUQUE e PEDRO BARUSCO, era de ao menos 2%, também do valor total do contrato e de seus respectivos aditivos, sendo que parte desses valores seria destinada a integrantes do Partido dos Trabalhadores (PT). No presente caso, tal porcentagem variou entre 0,9% e 2,28% dos valores de contratos e respectivos aditivos celebrados pela ENGEVIX com a Petrobras.

Nessa seara, como resultado da corrupção de empregados da Petrobras, a ENGEVIX, individualmente ou por intermédio de Consórcios, obteve sucesso na formalização de contratos com a Estatal em diversos procedimentos. Na presente ação penal, trata-se das licitações vencidas para as obras referentes à Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase III, em Linhares/ES; a URE e URC da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC, em Cubatão/SP; às obras da unidade de propeno da Refinaria Presidente Getúlio Vargas – REPAR, em Araucária/PR; às obras de offsite da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves – RLAM, em São Francisco do Conde/BA.

Conforme descrito na denúncia, para as obras dos módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas – Fase III, a ENGEVIX adjudicou objeto de licitação, celebrando, com a Petrobras, em 05/03/2007, o contrato nº 0801.0030185.07.2, no valor de R$ 1.377.035.922,78. A partir dele foram firmados, no período de 05/08/2009 a 20/04/2011, três aditivos de aumento de valor.

Para as obras da URE da Refinaria Presidente Bernardes - RPBC, sagrou-se vencedor o Consórcio SKANSKA-ENGEVIX URE, composto por ENGEVIX e SKANSKA. Em 31/08/2007, a Petrobras celebrou o contrato nº 0800.0034522.07.2, no valor de R$ 165.500.000,00 com o consórcio em questão. Em razão deste contrato, foram, ainda, celebrados, no interregno entre 21/10/2008 e 02/12/2011, seis aditivos de aumento de valor.

A ENGEVIX, ainda, como membro do Consórcio Integradora URC, do qual eram membros também a NIPLAN e a NM, celebrou o contrato nº 0800.0051044.09.2 com a Petrobras, na data de 06/10/2009, no valor de R$ 493.508.317,61, para as obras do URC da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC. No período entre 31/03/2010 e 14/03/2011, foram, ainda, celebrados três aditivos de aumento de valor ao contrato em comento.

Para as obras da unidade de propeno da Refinaria Presidente Getúlio Vargas – REPAR, restou celebrado, entre a Petrobras e o Consórcio SKANSKA-ENGEVIX, em 30/03/2007, o contrato nº 0800.0030725.07.2, no valor de R$ 224.989.477,13. A Petrobras celebrou com o Consórcio, em adição, 11 aditivos contratuais de aumento de valor, no período entre 18/03/2008 e 23/03/2011.

Por fim, para as obras de Implementação das Tubovias e Interligações do off-site da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves - RLAM, a ENGEVIX, compondo o Consórcio Integração com a empresa QUEIROZ GALVÃO, consagrou-se vencedora de certame, celebrando, em 20/08/2008, com a Petrobras, no valor de R$ 909.448.100,48, o contrato nº 0800.0044602.08.2. Dele sucederam três aditivos de aumento de preço, datados de 14/04/2011, 30/09/2011 e 29/12/2011.

Consoante anteriormente referido (item “3.6”), para os contratos e aditivos referentes às obras de Cacimbas, localizado no Espírito Santo, da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC, situada no estado de São Paulo, da Refinaria Presidente Getúlio Vargas – REPAR, localizada no município da Araucária, no estado do Paraná, e da Refinaria Landulpho Alves – RLAM, na Bahia, narrados e imputados na exordial acusatória, o pagamento de propina restou provado:

231. Reporta-se a denúncia aos seguintes contratos obtidos pela Engevix Engenharia junto à Petrobrás por cartel e ajuste de licitações e nos quais teriam sido oferecidas propinas aos dirigentes da Petrobrás:

a) dois contratos da Engevix Engenharia para construção dos módulos 1, 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas (UTGC;

b) contrato do Consórcio Skanska-Engevix URE para a execução de obras e implementação das unidades de recuperação de enxofre III e de tratamento de gás residual na Refinaria Presidente Bernardes (RPBC);

c) contrato do Consórcio Integradora URC/Engevix/Niplan/NM para a execução de obras de adequação da URC da Refinaria Presidente Bernardes (RPBC);

d) contrato do Consórcio Skanska/Engevix para a execução das obras de implementação do on-site da unidade de propeno da UN-REPAR, na Refinaria Presidente Getúlio Vargas - REPAR; e

e) contrato do Consórcio Integração (Engevix e Queiroz Galvão) para a execução das obras de implementação das tubovias e interligações do off-site da carteira de diesel da Refinaria Landulpho Alves – RLAM.

(…)

645. Reputo caracterizado um crime de corrupção por contrato, ou seja, cinco, ainda que tenham se consumado mediante dezenas de repasses de dinheiro e envolvido mais de um beneficiário.

646. Não reputo suficientemente provado o crime de corrupção em relação ao primeiro contrato de Cacimbas (Fase II). Para este contrato, teria havido, segundo a denúncia, mera oferta de propina, sem aceitação e pagamento. Sem aceitação e pagamento, a única prova a respeito da oferta consiste nas declarações de Milton Pascowitch e que, sozinha, não ampara a condenação criminal.

Confirmou-se, então, o pagamento de propina vinculado à contratação da ENGEVIX, para obras de Cacimbas, do Consórcio SKANSKA-ENGEVIX URE e do Consórcio INTEGRADORA URC, para obras da Refinaria Presidente Bernardes – RPBC, do Consórcio SKANSKA-ENGEVIX, para as obras da Refinaria Getúlio Vargas – REPAR, e do Consórcio INTEGRAÇÃO, para obras da Refinaria Landulpho Alves - RLAM. Ocorre, no entanto, que se tratam de momentos, locais e personagens distintos.

As corrupções vinculadas a cinco diferentes obras, para o Juízo a quo, pertenceriam a um mesmo processo, devendo ser encaradas sob o prisma da continuidade delitiva. Todavia, neste ponto, encontra-se equivocado o entendimento firmado na r. sentença recorrida.

Para a caracterização do crime continuado não basta a simples reiteração dos fatos delitivos sob pena de tornar letra morta a regra do concurso material. É necessário

que haja homogeneidade de circunstâncias de cada delito, de modo que os subsequentes possam ser considerados desdobramentos dos antecedentes. A simples semelhança em termos de tempo e lugar não é suficiente para atrair a continuidade delitiva quando verificada a diversidade da maneira de execução e de agentes nos diversos delitos.

In casu, em cada obra, há distinção de local (Espírito Santo, São Paulo,

Araucária/PR e Bahia), objeto (obras dos módulos 2 e 3 da Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas, obras de URE da RPBC, obras da URC da RPBC, obras da unidade de propeno da REPAR e obras de offsite da carteira de diesel da RLAM), agentes (ENGEVIX, CONSÓRCIO SKANSKA-ENGEVIX URE, CONSÓRCIO INTEGRADORA URC, CONSÓRCIO SKANSKA-ENGEVIX e CONSÓRCIO INTEGRAÇÃO) e datas (estendendo-se de 13/06/2006 a 29/12/2011). A atuação nos contratos para cada obra apresenta-se, portanto, como isolada e independente, afastando a ideia da continuidade delitiva.

Assim, diante da diversidade de local, de objeto, de agentes e de empresas envolvidas em cada uma das obras, há que se reconhecer o concurso material entre os atos de corrupção correlatos.

Dentro de cada grupo de fatos, ou seja, de um contrato com seus respectivos aditivos, tendo em linha de conta o que sustentado no item “3.6”, os diversos atos poderiam constituir, ainda, crimes continuados.

3.9. Contra o reconhecimento da continuidade delitiva quanto aos delitos

No documento Ministério Público Federal (páginas 85-90)