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Contribuições das Feiras de Ciências para a formação do professor-orientador

4.2 A RELAÇÃO DO SUJEITO PROFESSOR-ORIENTADOR COM AS FEIRAS DE

4.2.1 As Feiras de Ciências e o professor-orientador

4.2.1.1 Contribuições das Feiras de Ciências para a formação do professor-orientador

As FCs são consideradas ambientes formativos aos diferentes públicos que circulam por elas, a exemplo do que já foi mencionado na subseção 2.1.3 desta pesquisa. Com foco nos professores participantes, destaco alguns trabalhos realizado com esse público, como os desenvolvidos por Roehrs, Castro e Castro (2017), Farias e Gonçalves (2007), Mbowane, Villiers e Braun (2017) e Gallon e Nascimento (2020). No trabalho desenvolvido por Rohers, Castro e Castro (2017), os autores investigaram elementos importantes para a construção de uma FC e demonstram carência desses aspectos na formação dos professores. Dessa forma, evidenciam que os professores se sentem inseguros na realização de projetos, e que isso interfere na aprendizagem dos estudantes relacionadas à elaboração de projetos investigativos. Ao final, apontam alguns caminhos em que a escola pode funcionar como um agente facilitador do processo.

Farias e Gonçalves (2007) buscaram analisar como as FCs se configuram em ambientes formativos para o desenvolvimento de estudantes e professores. Para isso, realizaram entrevistas com professores e estudantes e a leitura de diários de campo. Na investigação realizada, constataram diferentes oportunidades formativas, sendo valorizadas as experiências vividas por esses sujeitos e compartilhadas nas FCs. Tais atitudes condizem com um aperfeiçoamento no processo de orientação.

Os pesquisadores Mbowane, Villiers e Braun (2017) investigaram as percepções de professores de Ciências Físicas que participaram em várias edições de uma FC com abrangência nacional, na África do Sul. Eles buscaram significados educacionais para a contribuição da construção do processo identitário dos professores nos papéis assumidos como organizadores, orientadores e avaliadores. Foram levantados saberes, atitudes, crenças, normas e valores por meio de entrevistas realizadas com os docentes participantes. Os autores constataram contribuições das FCs aos professores com relação aos conhecimentos (factuais, procedimentais e atitudinais), autoeficácia sobre sua atuação, incremento nos processos de ensino e aprendizagem em sala de aula e o desenvolvimento de networking com os participantes da FC.

Em estudo que realizei em parceria com Nascimento (GALLON; NASCIMENTO, 2020), fizemos a seguinte pergunta por meio de um questionário virtual encaminhado por redes sociais a professores-orientadores: como você acredita que as Feiras e Mostras Científicas podem contribuir para a sua formação enquanto professor-orientador? Obtivemos 79 devolutivas e agrupamos as respostas nas seguintes categorias: aprendizagem dos estudantes e professores; competências técnicas, conceituais e gerenciais de projetos; motivação e criatividade e compartilhamento de vivências e de conhecimentos. O compartilhamento de conhecimentos e vivências foi a categoria que os professores apontaram como sendo os maiores benefícios da FC em seus processos formativos.

Abrangendo as ideias dos entrevistados nesta tese com relação às possíveis contribuições das FCs para as suas formações enquanto professores-orientadores organizei quatro eixos principais: motivação, cultura, aprendizagem e conhecimento (Figura 7). Os dados demonstram similaridade aos já registrados na pesquisa que realizei com Nascimento (GALLON; NASCIMENTO, 2020), porém, em se tratando de sujeitos diferentes, as respostas me conduziram a um novo arranjo categorial.

Figura 7 - Síntese sobre as percepções das contribuições das FCs à formação do professor- orientador

Fonte: Elaborado pela autora (2020).

No que diz respeito à aprendizagem e conhecimento, os entrevistados consideram a ocorrência em dois níveis: para eles, professores-orientadores, e no seu trato com os estudantes. Com relação à formação propriamente do professor-

orientador, os participantes mencionaram a aquisição de habilidades que os auxiliaram em um melhor processo de orientação: “[...] tu acaba adquirindo mais conhecimento do procedimento que tu precisa ter para orientar os alunos” (JATOBÁ). Também consideraram relevantes a aprendizagem e os conhecimentos sobre a organização/etapas da pesquisa, que os permite adequarem-se ao contexto de sala de aula, incrementando sua prática cotidiana.

Eles julgam ser positivo à sua formação o aumento da interação com o estudante-pesquisador. Dessa forma, elencam os seguintes aspectos direcionados ao estudante: o incentivo, a cooperação, o diálogo e escuta ativa e a autonomia do estudante. A exemplo disso, a fala de Ipê: “Essa inquietação, ela vai permitir, a partir das Feiras, dos projetos, me permitir ouvir mais o aluno. Permitir a dar maior autonomia para esse aluno e de que forma a gente pode trabalhar esse questionamento, de que forma a gente pode explorar melhor ouvindo esse aluno [...]”. A professora Aroeira acredita que a sua interação com a FC e com os estudantes permitiu que ela vislumbrasse novas possibilidades, com um olhar sobre o problema e não sobre disciplinas: “eu acho que é o aluno poder encontrar caminhos, possibilidades, de vivenciar diferentes áreas [...]”. Um ponto levantado por Cedro é a possibilidade de aprender a pesquisar junto com o estudante:

Quando eu tô orientado algum aluno, algum trabalho eu também, eu aprendo junto, assim. É aquele negócio de Freire, né, que a gente é professor-aluno, aluno-professor. Isso eu vejo assim, é um ciclo assim. Sempre que tô como orientador eu aprendo talvez tanto quanto né, quanto o aluno assim [...]. Percebe-se que às vezes se confunde o que os professores compreendem como contribuições das FCs e sobre seus fazeres enquanto professores-orientadores na organização dos projetos no ambiente da escola ao longo do ano letivo. Isso mostra que todas as ações direcionadas às aprendizagens e aos conhecimentos para orientar projetos investigativos convergem a um único momento - a orientação -, sendo impossível dissociá-las na busca por suas origens.

Cedro se refere à participação nas FCs e nos projetos investigativos como sendo a motivação necessária que o levou a se interessar mais pela pesquisa na escola: “Pra minha formação pessoal...Cara, desde que eu comecei a me envolver com as feiras, eu comecei também a me interessar mais por pesquisa. Isso eu vejo direto assim”. O professor encontrou na pesquisa uma fonte para seu interesse

pessoal, que o motiva a persistir no trabalho da orientação e o instiga a perseguir novos conhecimentos.

Cedro e Ipê mencionaram em suas falas que as FCs foram o fator motivador que os levou a investir em cursos de pós-graduação. Em Gallon e Nascimento (2020) e Mota e Martins (2016) já havia sido referenciada a importância da motivação do docente pela pesquisa como um aspecto importante para a permanência e incentivo do estudante no projeto. Cedro, após se familiarizar com as FCs em sua escola, resolveu se inscrever em um Mestrado em Linguística Aplicada, e Ipê, ingressou em um curso de doutorado na área de Ensino de Ciências. Ambos se envolveram com uma temática que emergiu das suas práticas: a alfabetização e letramento científico examinados por meio dos projetos investigativos realizados no âmbito da Educação Básica.

Outro tópico levantado pela professora Araucária foram as FCs como dispositivos culturais. A docente revela em suas falas sobre as suas experiências em diferentes FCs, contando sobre as competições entre os estudantes, as premiações, a forma de encarar a construção dos projetos investigativos

Agora da última vez que eu fui eu fiquei no quarto com uma chinesa. Então a cultura é diferente, a forma de tratar os alunos é diferente. Ah é tudo assim. Sempre tem gente que tá no ramadã. Então aí tu já percebe outros hábitos. Três horas da manhã, um pouco antes, eles acordam e vão se alimentar porque só se alimentam aquele horário. Então são os hábitos diferentes, cultura diferente.

Os trabalhos são bem diferentes. Eles têm, como eles que eles dizem, colônia de férias, então tem colônia de férias focada em ciências.

E uma das coisas que muito se observa lá, que é diferente daqui é o empreendedorismo do aluno. E não só empreendedorismo pela palavra empreendedorismo, mas é ele ter o brilho no olhar, ele fazer o projeto, ele levar adiante o projeto, independente assim daquele resultado do projeto, mas o quão ele conhece dele e como ele consegue lidar com os problemas para... claro que o resultado é muito importante. Mas é muito isso.

Estas menções às diferentes culturas observadas pela professora Araucária nas visitas e participações que fez à FCs com abrangência internacional expõem a relevância que esses eventos têm para a aquisição do repertório cultural - dados culturais e bagagem cultural -, tópico já desenvolvido nos resultados desta pesquisa (ver subseção 4.1.3) e no tópico criatividade e inovação, que será explicitado a seguir (ver subseção 4.2.1.2).

Portanto, percebe-se que as contribuições vindas da participação em FC são de diferentes ordens, cooperando desde os fazeres do professor-orientador, enquanto

a pessoa que guia um projeto investigativo, à sua dimensão pessoal, envolvendo motivação, cultura, aspectos esses que são intrínsecos ao seu eu.

4.2.1.2 As Feiras de Ciências e a influência nos processos criativos do professor-