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Feiras de Ciências: um levantamento das teses e dissertações brasileiras

2.1 FEIRAS DE CIÊNCIAS E SUAS TRAJETÓRIAS

2.1.1 Feiras de Ciências: um levantamento das teses e dissertações brasileiras

Buscando verificar como as FCs vêm sendo abordadas nos últimos anos nas dissertações e teses produzidas no Brasil, nesta subseção apresento um levantamento bibliográfico que realizei em teses e dissertações publicadas entre 2008 e 2018, que abordaram as FCs. A busca ocorreu tanto no Catálogo de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)6 quanto na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD)7.

A respeito da seleção dos dados, as dissertações e teses foram rastreadas por meio de alguns termos que deveriam constar no título das produções ou nas palavras- chave indicadas nas pesquisas, a saber: feira de ciências, feira científica, mostra científica, mostra de ciências, mostra escolar, feira multidisciplinar, feira do conhecimento, mostra de ciências, feira tecnológica, feira interdisciplinar.

Para a realização deste levantamento bibliográfico, em um primeiro momento considerei todos os trabalhos que retornaram ao digitar as palavras-chave nos campos de busca dos dois repositórios. Posteriormente, analisei se os termos de busca se encontravam presentes no título do estudo ou entre as palavras-chave, uma vez que se tratava de um critério para a escolha destes trabalhos. Em seguida, categorizei as pesquisas conforme o nível (mestrado ou doutorado), bem como pela instituição, foco, participantes do estudo e materiais analisados.

Neste recorte realizado, obtive 141 registros de teses e dissertações publicadas entre 1993 e 2018 nos dois repositórios pesquisados. Ao refinar a procura para o período entre 2008 e 2018, utilizando somente os termos de busca elegidos, seja nas palavras-chave ou no título, localizei 44 produções.

5 Os dados exibidos nesta subseção fazem parte do artigo Gallon et al. (2019a).

6 Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES: lançado em 2002, disponibiliza os resumos e referências das teses e dissertações defendidas nos programas de pós-graduação do Brasil, possibilitando ao usuário acesso facilitado a tais informações (CATÁLOGO DE TESES, 2019) e, dando destaque às pesquisas. As informações são fornecidas pelos programas de pós-graduação brasileiros, ficando estes responsáveis pelos dados publicados.

7 Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD): é uma base de dados que auxilia pesquisadores, armazenando os trabalhos de brasileiros de instituições de ensino e pesquisa do país ou residentes no exterior. Foi criado em 2001, em convênio estabelecido entre várias instituições de ensino e pesquisa com apoio do Conselho Nacional de Pesquisa – CNPq (BDTD, 2019). A Base disponibiliza apenas os metadados, como o título da dissertação ou tese, autores, palavras-chave, ficando os documentos originais sob guarda da instituição depositária.

É interessante destacar, no que diz respeito aos trabalhos selecionados, um significativo aumento no número de teses e dissertações ao longo do período de estudo, o que pode ser visto na Figura 1. Tal fato demonstra o crescente interesse dos pesquisadores de FCs e seus potenciais campos de análise. A partir de 2013, houve um aumento de produções envolvendo as FCs, e entre 2016 e 2017, foram 10 publicações em cada um desses anos. Quanto a 2018, não foi possível mensurar, naquele momento (meados de 2019), a precisão dos dados (três publicações), visto que após a defesa da tese ou dissertação decorre um período relativamente longo até sua disponibilização nos bancos de dados analisados.

Figura 1 - Teses e dissertações contabilizadas relacionadas às Feiras de Ciências no período entre 2008 e 2018

Fonte: Gallon et al. (2019a).

Do total de 44 trabalhos encontrados, 4 são produtos de doutoramentos e 40 de mestrado. Boa parte das dissertações encontradas são do tipo estudos de caso, que apresentam diferentes metodologias de ensino e aprendizagem visando contribuir à construção e organização de FCs. Ainda sobre as dissertações, é possível identificar pesquisas que objetivam compreender as concepções dos atores envolvidos nas Feiras. Diferente dos trabalhos em nível de mestrado, as teses de doutorado estão mais voltadas às questões documentais e análises de narrativas de sujeitos que estiveram envolvidos, em suas trajetórias, com as FCs.

No Quadro 1, são apresentados os números de Instituições de Ensino Superior vinculadas às produções acadêmicas selecionadas, por região, e o número de teses e dissertações registradas no período de 2008 até 2018. A Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, em Belo Horizonte, MG, destaca-se com a produção de

0 2 4 6 8 10 12 2008 2010 2012 2014 2016 2018

Número de Publicações

quatro dissertações, seguida pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo, RS, com a produção de duas teses de doutoramento (Quadro 1).

Quadro 1 - Teses e dissertações defendidas envolvendo as Feiras de Ciências, entre os anos de 2008 e 2018, no Brasil, destacando-se o número de instituições e de produções por região8

Região Instituições de Ensino Superior Teses e Dissertações publicadas entre 2008 e 2018 Centro-oeste 3 3* Nordeste 6 4 Norte 6 5 Sudeste 21 12* Sul 8 6**

Fonte: Gallon et al. (2019a).

A maior concentração de pesquisas relacionadas às FCs ocorreu na região Sudeste, seguida pela região Sul, Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Em trabalho que realizei em parceria com colaboradores (GALLON; ROCHA FILHO; NASCIMENTO, 2017), já havíamos constatado, ao analisarmos artigos relacionados às FCs nas atas dos Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências - ENPEC, entre as edições de 1999 e 2015, uma predominância de publicações da temática FCs na região Sudeste, uma vez que parte das pesquisas apresentadas neste evento são produtos de estudos maiores desenvolvidos em nível de pós-graduação. Na próxima subseção, volto a explorar estas questões.

A respeito dos programas de pós-graduação dos quais as pesquisas encontradas fazem parte, podemos perceber, no Quadro 2, que 23 estão atreladas a mestrados profissionais. Existem diferenças, conforme Moreira (2009), entre os mestrados profissionais e os acadêmicos. Uma delas é a recomendação que o mestrando, na modalidade profissional, esteja exercendo a docência, diferente do mestrado acadêmico, onde em grande parte das vezes um dos requisitos é a dedicação exclusiva à pesquisa.

Outra característica que difere o mestrado profissional do acadêmico é que no mestrado profissional se intenta à criação de um produto educacional, como, por exemplo, uma sequência didática, material didático ou elaboração de projetos

investigativos. Assim, percebe-se forte vínculo entre as pesquisas desenvolvidas por essa modalidade de pós-graduação e as FCs, em que a organização, planejamento, formação de professores, por exemplo, são voltados à produção das FCs, sendo isso em algumas situações, o produto analisado e desenvolvido por esses pós- graduandos.

Quadro 2 - Programas de pós-graduação envolvidos nas pesquisas selecionadas para este estudo9 Programas de Pós-Graduação Teses e Dissertações

Ciência e Tecnologia Ambiental 1

Educação 6+++

Educação Agrícola 1

Educação Matemática 1

Educação para a Ciência* 2

Engenharia Elétrica 1+

Ensino de Ciências (modalidades Física, Química e Biologia) 1

Ensino de Ciências e Matemática 5

Ensino e História das Ciências e da Matemática* 2 Letras: Ensino de Língua e Literatura 1

Mestrado Profissional em Astronomia 1

Mestrado Profissional em Ciências e Tecnologias na Educação 1 Mestrado Profissional em Educação e Docência 2

Mestrado Profissional em Ensino 4

Mestrado Profissional em Ensino de Ciências 2 Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática* 6 Mestrado Profissional em Ensino de Ciências Exatas 1 Mestrado Profissional em Ensino de Física 3 Mestrado Profissional em Formação de Professores 1

Mestrado Profissional em Letras 1

Mestrado Profissional em Química 1

Fonte: Gallon et al. (2019a).

É notável a relação entre os cursos normalmente relacionados à Ciência e os estudos realizados nas Feiras. Tal como na Educação Básica, as FCs normalmente são desenvolvidas (ou ficam sob responsabilidade) por professores de Matemática, Biologia, Física e Química, por exemplo. Como já mencionado, ainda é comum que

9 O símbolo * indica agrupamento de programas com nomenclaturas similares. O símbolo + indica os programas onde foram desenvolvidas as teses de doutoramento.

professores de outras áreas do conhecimento não se sintam convidados e incluídos nestas propostas (MANCUSO; LEITE FILHO, 2006).

Busquei identificar, dentre os trabalhos selecionados, o público-foco ou documentos analisados nas pesquisas. Observei interesse, dentre as pesquisas selecionadas para esse estudo, pelo desenvolvimento de FCs na Educação Básica, com predomínio no Ensino Fundamental e Médio, com interesse menor pelos outros públicos e pelas pesquisas documentais (Quadro 3). A respeito dos trabalhos documentais, pude constatar a presença de estudos dedicados a analisar a trajetória histórica de Feiras como a Mostratec, realizada em Novo Hamburgo, RS, e as FCs realizadas em Roraima entre 1986 e 2008.

Quadro 3 - Foco das pesquisas com base no público ou material analisado10 Foco das Pesquisas Número de pesquisas Ensino Fundamental Anos Iniciais Professores 2

Estudantes 1*

Anos Finais Professores 6

Estudantes 8

Ensino Médio Professores 4

Estudantes 14*

Anos Finais +Ensino Médio 1

Ensino Superior Graduação 2

Documental 4*

Documental + estudantes Ensino Fundamental Anos Finais 1

Sujeitos de 20 a 69 anos 1*

Fonte: Gallon et al. (2019a).

Foi notada, ainda, a baixa quantidade de produções aplicadas aos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, tanto relacionadas aos professores quanto aos estudantes. Esse dado foi anteriormente constatado em um levantamento que realizei nos mesmos bancos de dados, porém com foco específico na Educação Infantil e Anos Iniciais (GALLON, 2017) entre os anos de 2008 e 2017. Nessa pesquisa anterior, localizei seis trabalhos que explicitavam a relação das FCs com os estudantes da Educação Infantil e Anos Iniciais. Analisando as produções, apenas dois abordavam a Feira como um ambiente educativo. Nas demais, as FCs foram mencionadas

apenas como um ambiente de visitação, sem a intenção pedagógica. Pensando na iniciação voltada à pesquisa, é necessário que a ação investigativa e o trabalho com pesquisa sejam instituídos ainda nos Anos Iniciais, visto que um pensamento investigativo deve ser construído de maneira gradual e contínuo ao longo da Educação Básica (VALLE, 2009; FREIBERGER; BERBEL, 2010).

Já abrangendo o público do Ensino Superior, localizei somente duas produções, sendo uma delas realizada com calouros de Engenharia e a outra, um estudo sobre a divulgação científica universitária, não especificando o público-alvo. Provavelmente o baixo número de trabalhos dedicados aos universitários se deve ao fato de que as Feiras, de uma forma geral, são eventos voltados aos estudantes da Educação Básica. Contudo, no Ensino Superior, eventos com natureza similar são organizados adotando outras designações, como os salões de iniciação científica, congressos científicos ou reuniões acadêmicas organizadas por alguns cursos.

De modo geral, foi perceptível um crescimento, ao longo dos anos, das produções envolvendo as FCs, o que demonstra suas potencialidades à realização de futuros estudos, seja pela possibilidade da culminância de projetos científicos realizados ao longo do ano letivo, por parte dos estudantes, ou pela investigação de relações estabelecidas entre os sujeitos participantes desses eventos.

Com base neste levantamento, considero relevante mencionar que o número de produções que tomam as FCs como objeto de estudo de suas pesquisas ainda se mostra incipiente, visto a quantidade de eventos científicos com esse caráter que ocorrem todos os anos no país, bem como estudos dedicados aos processos de organização e públicos, que poderiam vir a apresentar grande potencial para novas investigações.

2.1.2 As Feiras de Ciências e as pesquisas científicas: uma revisão sistemática