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Contribuições teóricas sobre assistência estudantil, educação e políticas públicas

3 TECENDO DISCUSSÕES TEÓRICAS SOBRE AVALIAÇÃO

3.1 Contribuições teóricas sobre assistência estudantil, educação e políticas públicas

Como a assistência estudantil é uma política educacional, faz-se necessário discutir sobre educação. Esta, segundo Martins, “envolve diversos espaços: o próprio sujeito, a família, a política, as organizações de cultura e, dentre elas, a ‘escola’, no sentido amplo que este termo encerra. Educação é um processo social vivenciado no âmbito da sociedade civil e protagonizado por diversos sujeitos” (2012, p. 34).

A autora explana ainda que a educação é um instrumento estratégico para o Estado, pois, segundo Gramsci (1999 apud MARTINS, 2012), para fazer com que a sociedade se mantenha sob controle, o Estado não faz uso apenas da violência, seja ela política ou econômica. Ele também se utiliza da coerção ideológica, que faz com que todos aceitem e tenham, como senso comum, a cultura hegemônica burguesa. Para tanto, “utiliza-se a escola, instituição que visa, em última instância, a transmissão dos conhecimentos acumulados historicamente pela sociedade e a formação de valores” (MARTINS, 2012, p. 34).

A educação é muito importante para as massas para que estas possam obter o conhecimento e o domínio dos mecanismos de reprodução global da formação econômico- social que são propensos a mudanças (GRAMSCI, 2006 apud MARTINS, 2012). Desse modo, a educação, segundo Martins (2012), é um instrumento que permite tanto as camadas populares formarem uma cultura contra-hegemônica para serem contrárias à opressão e à

alienação advindas da sociedade capitalista como também a perpetuação do ideário dominante.

Ao analisar a trajetória da política de educação brasileira, a autora percebe que, apesar de a política de educação ser defendida desde o início do século XX, sua concretização sempre foi delineada pela exclusão, que pode ser notada

nos dados estatísticos e, principalmente, nas notícias e relatos que flagram as dificuldades de acesso e permanência na escola em decorrência de fatores relacionados à própria condição da operacionalização desta política (infraestrutura, adequada, déficit na formação profissional dos educadores, baixos salários, programas e projetos educacionais desarticulados ou descolados da realidade, etc.) e, ainda, pelas sequelas da questão social que invadem o cotidiano escolar, considerando as mudanças no perfil dos alunos/famílias, usuários da escola pública, geralmente provenientes da classe trabalhadora (MARTINS, 2012, p. 41).

Em relação à mudança no perfil dos alunos e das famílias que estão na instituição pública, a autora relata ainda que tal mudança, ao permitir o acesso de mais pessoas ao ensino público, permitiu, também, a inserção de estudantes de classes menos abastadas, “que expressam as marcas da desigualdade social que vivenciam e que fazem parte do processo histórico da sociedade brasileira” (MARTINS, 2012, p. 44). Portanto, Martins (2012) refere que o espaço escolar é permeado pelas consequências do fortalecimento da questão social, as quais são postas à comunidade escolar, que não sabe como agir com o perfil de um aluno, de uma família, a qual até então não fazia parte do ambiente educacional. Ela acredita que

resvalam deste bojo as alterações nas relações interpessoais, impregnadas da influência da ideologia dominante, sob o ideário neoliberal, apresentando um individualismo exacerbado, competitividade, preconceitos, fragmentação do real, que reforçam o “o modo capitalista de pensar” e provocam conflitos nas instituições escolares e em seu entorno (MARTINS, 2012, p. 44).

David e Gazottto (2012), corroborando a fala de Martins (2012) sobre a entrada de jovens hipossuficientes no ensino superior, relatam que, com a abertura das Ifes, o número de discentes advindos de escolas públicas aumentou. Os autores corroboram, também, a importância do PNAES na vida estudantil desses discentes. Com a verificação desse perfil de jovem dentro da universidade, “em seus primeiros períodos de graduação, constata-se um elevado índice de defasagem de ensino, lazer, cultura e até mesmo condições baixas de saúde, moradia, alimentação e outras expressões da questão social” (DAVID; GAZOTTO, 2012, p. 182).

A assistência estudantil, como uma política pública educacional, é uma “resposta a necessidades sociais que têm origem na sociedade e são incorporadas e processadas pelo Estado em suas diferentes esferas do poder (federal, estadual e municipal)” (RAICHELIS, 2000, p. 1). Concordamos com o pensamento dessa autora porque o surgimento da assistência estudantil, direito exigido pelos professores, alunos e movimentos sociais, veio para apoiar a inserção dos filhos da classe trabalhadora no cenário do ensino superior mediante a definição de auxílios (transporte, moradia, alimentação etc.) que dessem as condições necessárias de se manterem na instituição de ensino superior.

É intrínseca à assistência estudantil a marca de ter sido gerada devido às desigualdades sociais que imperam na nossa sociedade, pois faz parte do rol das políticas sociais que são “desdobramentos e até mesmo respostas e formas de enfrentamento – em geral setorializadas e fragmentadas – às expressões multifacetadas da questão social do capitalismo, cujo fundamento se encontra nas relações de exploração do capital sobre o trabalho” (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 51).

A avaliação da assistência estudantil como política pública torna-se necessária “para o fortalecimento da pressão social sobre o Estado no sentido de conquista de direitos sociais, haja vista as informações de que a avaliação pode gerar e publicizar sobre políticas e programas sociais” (SILVA, 2001, p. 48), além de fortalecer sua efetivação.

Ao falar sobre as políticas sociais, Raichelis (2000) acredita que a importância de sua discussão vem das rápidas transformações que vem sofrendo a sociedade capitalista contemporânea, fazendo suscitar conversações sobre tal categoria entre aqueles que estão inseridos na responsabilidade pública.

De acordo com Raichelis (2000), com a queda do Welfare State, na década de 1970 (o qual buscava compensar as desigualdades sociais advindas do capitalismo com a redistribuição da riqueza social), ruíram as conquistas sociais garantidas após a Segunda Guerra Mundial e houve a ascensão do neoliberalismo, que pregava a não participação do Estado na fomentação de direitos e cidadania.

Raichelis expõe ainda que “este quadro societário atualiza os dilemas frente à questão social e as novas configurações que assume na sociedade capitalista atual, em decorrência da imposição de uma agenda de ajustes econômicos aos requisitos ditados pela globalização dos mercados em nível planetário” (2000, p. 3).

Concordamos com Silva (2001, p. 41) quando ela afirma que há vários interesses em jogo quando se trata de políticas públicas (no nosso caso, a assistência estudantil), “fazendo do desenvolvimento das políticas públicas um processo contraditório e não linear”. Portanto,

consideramos que é preciso levar em conta, principalmente, os interesses daqueles que são o foco da assistência estudantil: os estudantes.

Como pretendemos conhecer como se desenvolve a assistência estudantil no IFCE através dessa avaliação e, consequentemente, vislumbrar mudanças que possam ajudar a melhorar tal política, concordamos com Silva (2001, p. 51-52) quando expõe que a avaliação possui “o compromisso com valores éticos e com a não neutralidade, o que reafirma a perspectiva de mudança da política, com alteração da prática imediata dos programas sociais na direção desejada, tendo como referência as demandas sociais”.

Sobrinho (2004) está em consonância com Silva (2008) ao dizer que a avaliação possui intencionalidades e são elas que permitem que a avaliação tenha uma função. Tendo uma função, a avaliação fará com que compreendamos melhor o nosso objeto de estudo.

Essa afirmação do autor nos é importante porque, de fato, a avaliação que pretendemos realizar sobre a assistência estudantil no IFCE possui uma intencionalidade: a de ser subsídio que possibilite aos estudantes inseridos na assistência estudantil exigir melhorias nesta, bem como permitir aos profissionais, que trabalham com a referida política, de avaliarem o próprio trabalho e tentarem solucionar possíveis problemas.

Em relação às políticas sociais, Sposati (2010) acredita que não se deve “deixar para trás” suas particularidades, mas trabalhar, junto a tais particularidades, outras que possam romper com sua fragmentação. Portanto, em consonância com o pensamento dessa autora, acreditamos que devemos levar em conta as características (forma de seleção dos alunos para a referida assistência, valor dos auxílios pagos aos alunos, forma de participação destes na condução da política etc.) que atualmente formam a assistência estudantil no IFCE, não as menosprezando. Todavia, não devemos deixar de ressaltar outros detalhes que podem melhorar a condução da assistência estudantil, como atenção a outros critérios, que não sejam só os econômicos, para a seleção daqueles alunos e participação mais ativa e incisiva deles no que diz respeito ao desenvolvimento da assistência estudantil.

De acordo com Cislaghi e Silva (2011), uma das metas do Programa Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) é a contenção da evasão nos cursos de graduação. Com a Portaria n° 39/2007 do MEC, surge o Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) – que seria efetivado em 2008 – como uma solução para o problema supracitado.

A política de cotas para alunos financeiramente hipossuficientes, iniciada pelo Governo Federal em 2001, em universidades do Sudeste e Centro-Oeste, também foi um terreno fértil para a criação do PNAES. Menin et al. (2008), através de uma pesquisa realizada

em 2006 com estudantes de uma universidade pública de São Paulo, constatou que tais cotas para discentes hipossuficientes são bem aceitas se comparadas com as cotas raciais, pois acreditam que os discentes oriundos de escolas públicas realmente sofrem “um desfavorecimento real” (MENIN et al., 2008, p. 258), sendo estes, portanto, o público-alvo do PNAES.

Veloso (2006, p. 88) explana que a

implementação de cotas se insere no âmbito das Ações Afirmativas e coloca em discussão a questão da identidade étnica, cultural e social da população brasileira, Na contemporaneidade, o debate tem assumido contornos distintos em diferentes espaços e instâncias sociais, sobretudo, nos meios acadêmicos – onde as cotas têm sido ponto de debates e polêmicas, defesa, e, também, resistência.

O autor relata ainda que as cotas podem promover mobilidade na estrutura social, fazendo com que o poder passe para outras pessoas, semeando condições propícias para que certas camadas sociais, que antes eram excluídas daquela mobilidade, possam ascender, e é justamente o PNAES que vem assegurar essa oportunidade, pois seria um meio através do qual as desigualdades sociais e regionais seriam enfrentadas. A assistência estudantil compreenderia ações voltadas para moradia, transporte, creche, alimentação, apoio pedagógico, saúde, inclusão digital e esporte. Os recursos necessários para o programa seriam administrados pelo Ministério da Educação.

Essas ações, fornecidas pelo PNAES, permitem que alunos em vulnerabilidade social do ensino público tenham as mesmas chances de crescer, dentro da instituição de ensino superior, que os alunos advindos da escola particular, pois, “ao tomar indivíduos e grupos desigualmente fortalecidos e preparados e colocá-los em situação de competição, o resultado e a reprodução é a acentuação das desigualdades, da exclusão e das hierarquias” (VELOSO, 2006, p. 92).

É essencial a gratuidade do ensino. Todavia, só isso não basta para que os alunos que se encontram em vulnerabilidade social possam frequentar a universidade e possam corresponder, de forma satisfatória, às exigências acadêmicas com o intuito de promover uma educação superior de qualidade (ARAÚJO; BEZERRA, 2007).

Posteriormente, em 19 de julho de 2010, o PNAES se transformou no Decreto nº 7.234/2010. Cislaghi e Silva (2011) expõem que há uma diferença interessante entre o PNAES e o decreto: enquanto aquele determinava que os alunos que seriam contemplados pela assistência estudantil deveriam ser escolhidos devido a fatores socioeconômicos (art. 4°), este afirma, claramente, que os discentes escolhidos seriam aqueles que estivessem na rede

pública de educação básica ou que possuíssem uma renda per capita de até um salário- mínimo e meio (artigo 5°). Enfim, infere-se, segundo as autoras, que “o governo aparenta garantir autonomia às Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes), mas determina critérios focalizados extremamente rebaixados para o acesso às ações de Assistência Estudantil” (CISLAGHI; SILVA, 2011, p. 11).

Com a criação do referido Decreto nº 7.234/2010, realizou-se a organização da assistência estudantil, que possui os seguintes objetivos:

I – democratizar as condições de permanência dos jovens na educação superior pública federal;

II – minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior;

III – reduzir as taxas de retenção e evasão; e

IV – contribuir para a promoção da inclusão social pela educação.

Podemos perceber que esses objetivos são condizentes com o artigo 3° da Constituição Federal, que fala “que são objetivos da República garantir o desenvolvimento nacional, erradicar a miséria, eliminar as desigualdades regionais e sociais, construir uma sociedade livre, justa e solidária”. Sendo assim, acabar com os problemas citados não são intuitos recentes, e a assistência estudantil seria, então, um caminho a mais para agir frente às disparidades sociais do País. Além disso, segundo Bacelar (2000), se fizermos uma análise da nossa história, veremos que as políticas sociais nunca estiveram no centro das atenções das políticas públicas, pois era de forma compensatória a maneira como aquelas eram traçadas, não havendo uma mudança efetiva onde eram lançadas. O que importava, em primeiro lugar, era a industrialização, sendo mais valorizadas as políticas econômicas.

Segundo ainda a referida autora, a “vida” das políticas sociais se torna mais complicada pelo fato de elas serem decididas de forma centralizada, setorial, pois os que as implementam acreditam que o que é bom para uma área, certamente será para outra, não havendo, dessa forma, a participação daqueles que serão contemplados pela política. Isso acontece na assistência estudantil do IFCE, pois não há um diálogo mais apurado com os alunos para se saber de que forma a assistência estudantil poderia ser aplicada para que as reais necessidades dos discentes sejam atendidas. O movimento estudantil do IFCE, campus Fortaleza, promoveu, no ano de 2012, reunião e passeata para que a referida assistência fosse discutida com eles, e tais ações serviram para se abrir o “espaço da proposta, da parceria, da fiscalização e da avaliação” (BACELAR, 2000, p. 282).

Nascimento (2011) explicita que é inegável que a política de assistência estudantil foi um ganho para a educação superior. Porém, ela está condicionada aos interesses dos grandes organismos multilaterais (uma das exigências do Banco Mundial, por exemplo, é o aumento da escolaridade dos alunos pertencentes aos países periféricos), já que aquela se propõe a combater a evasão escolar e a retenção universitária, estando em consonância com tal exigência do Banco Mundial (BM), que quer formar mais técnicos em determinadas áreas para que possam suprir a carência de mão de obra qualificada em áreas estratégicas da economia. Infere-se que a preocupação do Estado vai além da melhoria da educação, pois, para este, “o essencial das políticas públicas estava voltado para promover o crescimento econômico, acelerando o processo de industrialização” (BACELAR, 2000, p. 262). Ainda segundo Bacelar (2000, p. 270),

cresce a importância das externalidades. Mão-de-obra qualificada, infra-estrutura, e serviços eficientes são requisitos fundamentais para o novo padrão produtivo. E as políticas públicas, hoje, vêm patrocinar isso. Não patrocinam mais a acumulação direta nas indústrias; patrocinam a oferta das externalidades.

A assistência estudantil do IFCE, considerada como uma política pública educacional voltada para a manutenção do discente no instituto, deve evitar as desigualdades sociais, bem como a evasão escolar, objetivos estes explicitados no Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) – mas também está subsidiando a oferta dessa mão de obra para o mundo capitalista.

Segundo os autores Shiroma, Moraes e Evangelista (2000), a preocupação do Banco Mundial com problemáticas educacionais, de acordo com o documento “Prioridades y Estratégias para La Educación”, de 1995, no qual detalha o estudo que realizou sobre a educação no mundo desde 1980, se deve ao fato de a educação ter uma forte incidência na diminuição da miséria e no alavancamento econômico.

Essa ideia vem confirmar o pensamento de Bacelar (2000) sobre a necessidade de o país se industrializar e de ter mão de obra, tendo a assistência estudantil como pano de fundo para realização dessas necessidades.

Tal documento relata ainda que a educação,

por outro lado, reafirma o lugar comum que a evolução da tecnologia e das reformas econômicas estão provocando mudanças na estrutura das economias, indústrias e mercados de trabalho em todo o mundo. Assim, a velocidade com que se adquire novos conhecimentos enquanto outros se tornam obsoletos tenderia a tornar as mudanças de emprego algo mais freqüente na vida das pessoas, circunstâncias que determinariam uma das prioridades fundamentais para a educação: formar

trabalhadores adaptáveis, capazes de adquirir novos conhecimentos sem dificuldades, atendendo à demanda da economia (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2000, p. 74).

Para o Banco Mundial, por causa dos motivos supracitados, todos os governos em geral, e não só os ministérios de educação, deveriam focar suas atenções na educação.

Enfim, pode-se perceber, através desse recorte do referido documento, as mudanças pelas quais a educação brasileira (e também dos países latinos) passou nos anos 1990 (e que repercutem até hoje). Em tal década, o Brasil, seguindo fielmente o que preconizava o Banco Mundial, não poupou esforços para instigar vários setores da sociedade, principalmente trabalhadores e empresários, que gostariam de interferir nas políticas educativas.

Afinal, os organismos internacionais já haviam prevenido que o êxito dessa política dependeria de um processo de negociações e de persuasão dos interessados dentro e fora do sistema, posto que uma ruptura entre eles poderia conduzir à supressão das condições de efetivação das reformas (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2000, p. 75).

Nascimento (2011, p. 32), ainda sobre a assistência estudantil, relata que o

problema é que sendo orientada pelo discurso do neo-desenvolvimentismo, a forma como o PNAES é implementada nas Ifes aproxima a Política da lógica dos mínimos sociais, sob o argumento de ampliação do número de usuários mas que acontece de forma desarticulada da qualidade dos serviços prestados. Sem contar o fato de que suas ações preveem maiores resultados à custa de menores investimentos e a forma como a política se estrutura caminha na lógica das políticas pobres para os pobres!

A compreensão de tal política se inicia a partir do período da ditadura (1964-1969), em que a política de educação foi adequada em consonância com os interesses da autocracia burguesa da época, e é justamente no interior dessa situação que nascem as formas de entrada e permanência do discente no ensino superior (NASCIMENTO, 2011). Nesse período, com o advento do Estado de Bem-Estar Social nos países industrializados e a crescente industrialização dos países periféricos, haverá uma propensão aos estudos das políticas públicas (FLEXOR; LEITE, 2000). Os autores falam ainda que “esses processos políticos, sociais e econômicos que acompanharam a transformação do Estado a partir da segunda metade do século XX resultaram na emergência de um novo campo de investigação social que podemos denominar de análise das políticas públicas” (FLEXOR; LEITE, 2000, p. 199).

No Governo Dilma (2011-2014), houve uma análise sobre as prioridades da presidente, e chegou-se à conclusão de que sua atenção era voltada para educação e assistência social. Todavia, mesmo tal governo tendo a educação como foco, a União

Nacional dos Estudantes (UNE) acredita que precisa haver um aumento significativo nas verbas destinadas ao Plano Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), e que determine também outras fontes para o financiamento dos restaurantes universitários, moradias, creches para as mães estudantes, auxílio com transporte, material escolar e o que mais for necessário.

Baseando-se no que foi supracitado, podemos dizer, então, que houve uma ampliação do Estado – assim definida por Gramsci, segundo Coutinho (1994) –, com a socialização da política, pois os estudantes, organizados na UNE, podem lutar pelos direitos deles, inserindo esses direitos dentro desse Estado. E é justamente esse tipo de organização que vai fazer a diferença, para Gramsci, na formação desse Estado ampliado, já que considera que tal formação se desvenda mediante a sociedade política e a sociedade civil. O grande mérito do autor é que vai considerar a sociedade civil como superestrutura e não infraestrutura, como consideravam Marx e Engels. Estes a viam como “o conjunto das relações econômicas capitalistas”, ou seja, infraestrutura. Já para Gramsci, sociedade civil é a superestrutura, como falado anteriormente. A superestrutura

designa, mais precisamente, o conjunto das instituições responsáveis pela representação dos interesses de diferentes grupos sociais, bem como pela elaboração e/ou difusão de valores simbólicos e ideologias; ela compreende assim o sistema escolar, as Igrejas, os partidos políticos, as organizações profissionais, os meios de comunicação, as instituições de caráter científico e artístico etc. (COUTINHO, 1994, p. 54).

A sociedade civil e a sociedade política se diferem devido à função que desempenham em relação à organização social e, principalmente, no que diz respeito à articulação para a reprodução das relações de poder, relata Coutinho (1994), com base nos estudos de Gramsci.

Ainda sob a visão de Gramsci, podemos dizer que o embate entre governo e os estudantes, que lutam pela melhoria da assistência estudantil, se passa dentro do Estado ampliado, já que tal embate é possível, não havendo um cerceamento tão incisivo das forças estudantis. Dessa forma, possuímos uma formação social ocidental, na qual a relação entre sociedade civil e sociedade política acontece no mesmo nível. Enfim, no Estado ampliado, a luta de classe baseia-se na “guerra de posição”, ou seja, numa captação processual de espaços