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3 TECENDO DISCUSSÕES TEÓRICAS SOBRE AVALIAÇÃO

4 O CAMINHO METODOLÓGICO: REALIZANDO A DESCOBERTA DOS SUJEITOS DA POLÍTICA

4.1 Primeiros contatos com os sujeitos da pesquisa

Permanecemos no Setor de Serviço Social por dois dias (24 e 26 de julho de 2013, a partir das 14h30min), no período da tarde, para observarmos a seleção que estava sendo realizada (posteriormente, falaremos mais sobre ela) junto aos discentes do IFCE que requeriam os auxílios alimentação e transporte. Essa seleção, que se iniciou no dia 15 de julho de 2013, estava voltada somente para esses dois auxílios. Ressaltamos ainda que a citada observação foi previamente marcada com a assistente social que trabalha no Setor de Serviço Social. A pesquisadora acredita que a facilidade com que se deu sua entrada nesse campo foi devido à relação profissional que as duas mantinham na época em que trabalhava no IFCE do campus Aracati.

Tentamos elencar alguns aspectos que consideramos importantes para realizarmos nossa observação, quais sejam: tentar identificar quais os critérios que definiam a escolha daqueles alunos que receberiam os auxílios, ou seja, que seriam inseridos na assistência estudantil; descobrir se os assistentes sociais eram os únicos profissionais que atuavam na escolha de tais discentes (psicólogos e pedagogos, porventura, também ajudavam nesse processo de seleção?); e desvendar o porquê da procura dos auxílios pelos estudantes. Sabíamos que tentar apreender como se dava a seleção para a escolha dos alunos que fariam parte da assistência estudantil não seria fácil, pois

a percepção etnográfica não é, por sua vez, da ordem do imediatamente visto, do conhecimento fulgurante da intuição, mas da visão (e consequentemente do conhecimento) mediada, distanciada, diferenciada, reavaliada, instrumentalizada (caneta, gravador, câmera fotográfica ou de vídeo...) e, em todos os casos, retrabalhada pela escrita (FIRTH, 2004, p. 17).

No dia 24 de julho de 2013, chegamos ao Setor de Serviço Social às 14h22min, conforme horário combinado com a assistente social com a qual faláramos. Nesse dia, ocorreriam as entrevistas com os alunos que estavam interessados em receber os auxílios transporte e alimentação (como já dito anteriormente, a seleção era voltada somente para esses dois auxílios). A seleção é anunciada através de cartazes que são expostos por toda a instituição, nos quais há ainda as datas das entrevistas, bem como o site da instituição para

que os discentes saibam quais são os documentos necessários para a sua realização. O período para se inscrever para a seleção também é divulgado no referido site. Sendo assim, os alunos já chegam ao Serviço Social, para marcar a entrevista, com os documentos exigidos e com o questionário social respondido, estando este também disponível no site.

Ao entrar na sala, logo começamos a “puxar papo” com a estagiária de serviço social. Soubemos, através dela, que a marcação das entrevistas era realizada com ela. Ela também disse que realizava algumas entrevistas, mas somente na presença de uma técnica do serviço social. Percebemos que ela estava muito à vontade com nossa presença, sendo muito solícita e gentil ao dizer que poderíamos nos pronunciar caso surgisse alguma dúvida. Assim como aconteceu entre a autora Gaspar e uma de suas informantes, na pesquisa que aquela realizava com as garotas de programa, houve, entre mim e a estagiária, uma simpatia mútua (GASPAR, 1988, p. 45), tanto pelo fato de aquela ver esta como uma colega de profissão como também por ter interesse em relatar sobre como se dava a seleção da assistência estudantil.

Ao chamar certo aluno para marcar a data da entrevista, ela perguntou qual turno ele preferiria para ser entrevistado. Ele disse que gostaria que fosse à tarde e, assim, é marcada para as 16 horas do dia seguinte (anteriormente, antes de entrarmos na sala do Serviço Social, nos encontramos com esse mesmo aluno, que aguardava sua vez para marcar a entrevista, e conversamos um pouco. Ele relatou que já possuía o auxílio-alimentação e agora estava tentando o transporte, pois cada aluno pode ter, no máximo, dois auxílios diferentes). Aquela confere se os alunos trouxeram a documentação exigida, esclarece algumas dúvidas que estes têm em relação à referida documentação, bem como sobre o questionário social que precisam responder. Ressaltamos que esse questionário serve de subsídio para a assistente social conduzir a entrevista com o aluno interessado nos auxílios.

A estagiária nos contou que nesse semestre não vão ofertar os auxílios pai/mãe discentes e moradia devido à pouca verba. Informou ainda que as entrevistas que ocorreriam naquele dia eram destinadas àqueles discentes que estavam solicitando, pela primeira vez, os auxílios transporte e alimentação. Eis alguns documentos necessários para que o aluno seja inserido na assistência estudantil, segundo a estagiária: identidade, Cadastro de Pessoa Física (CPF), autodeclaração de que não possui renda (caso não a tenha), declaração de renda de cada membro familiar (por exemplo: contracheque do pai, mãe, irmão, carteira de trabalho). Confirmamos a necessidade desses documentos mediante o site do IFCE, que informava os documentos necessários para a seleção da assistência estudantil.

Caso o familiar seja autônomo, há uma declaração de renda específica; boletim, histórico escolar, horário de aula (os profissionais exigem tal horário porque tem prioridade,

em relação aos auxílios, o aluno que passa o dia inteiro na instituição, que faz o curso integrado, por exemplo), extrato do Bolsa Família (caso o aluno e sua família sejam contemplados por tal benefício) e conta bancária que esteja no nome deste (já que o dinheiro não pode ir para terceiros).

Soubemos ainda, pela supracitada estagiária, que se porventura o aluno possui gastos com remédios e aluguel, isso é levado em conta ao se fazer a análise da renda familiar daquele, já que tais gastos são um dispêndio enorme para sua família.

Após ter colhido essas informações com a estagiária, a assistente social chega e pede para que esperemos por ela em outra sala, dentro do próprio setor, que é onde ocorrerão as entrevistas. Perguntamos a ela quantos profissionais estão “ligados” diretamente à assistência estudantil e ela responde que três assistentes sociais são responsáveis por toda a demanda, sendo estas responsáveis pelos pareceres sociais dos auxílios e pelas bolsas de trabalho. Mesmo estando familiarizados com o ambiente da pesquisa e os atores sociais que lá estavam, nos sentimos um pouco apreensivos na realização de nossa pesquisa – afinal, os estranhos ali éramos nós e, sendo assim, não sabíamos qual seria “a reação do outro à nossa presença” (FIRTH, 2004, p. 27).

Entrou na sala onde estávamos o primeiro aluno a ser entrevistado (ele requeria o auxílio-transporte). A assistente social disse que, caso tivéssemos alguma dúvida, poderíamos nos pronunciar.

Iniciando a entrevista, tendo em mãos o questionário social desse aluno (estudante de gestão desportiva), ela se apresenta, expõe o motivo de nossa presença na sala das entrevistas e pergunta ao rapaz se ele aceita que realizemos nossa pesquisa. Ele concorda, e a servidora dá início à entrevista ao confirmar alguns dados que ele informou no questionário social, como endereço e dados da conta corrente. A profissional pergunta ainda, ao discente, se ele está recebendo o Bolsa Família. Ele disse que não, já que o benefício está bloqueado. A servidora do IFCE diz que, sendo assim, ele precisa comparecer à Secretaria de Assistência Social para desbloqueá-lo.

O questionário social contempla algumas questões sobre a saúde da família do discente, como a necessidade de comprar remédios. Ela pergunta sobre isso ao aluno e indaga se ele pode receber tais remédios no posto de saúde. Depois de tal pergunta, ela verifica os documentos que faltam para o aluno entregar, como a xérox do cartão da conta corrente no nome do estudante e o cartão do Bolsa Família, bem como o extrato deste, mas somente quando estiver desbloqueado.

Após essa entrevista, pedimos alguns esclarecimentos sobre o porquê de se pedir o histórico escolar e o boletim do aluno. A profissional nos disse que esses documentos ratificavam a matrícula do aluno na instituição – um dos critérios para receber o auxílio- transporte. Já para o auxílio-alimentação, o histórico escolar e o horário individual do aluno são documentos essenciais para saber se o estudante passa o dia todo no IFCE (lembrando que esse é um requisito para que o auxílio-alimentação seja concedido).

Dando continuidade à seleção, entra na sala uma aluna. A assistente social realizou a mesma apresentação que fez anteriormente, também perguntando à estudante se ela permitia nossa presença ali. Ela disse que poderíamos ficar e, assim, iniciou-se a nova entrevista.

As mesmas perguntas são feitas: sobre o recebimento do Bolsa Família, declaração de renda dos familiares, falta de alguns documentos etc. Em certo momento da entrevista, a profissional pergunta à aluna se possui alguma dúvida e ela indaga sobre o auxílio-óculos. A profissional esclarece que, entre um pedido e outro desse auxílio, é preciso ter o intervalo de um ano; que era preciso esperar “abrir” o período para solicitar tal auxílio, o que aconteceria somente em agosto, pois a demanda era enorme.

Depois de esclarecida a dúvida da jovem, já finalizando a entrevista, a servidora pede a ela que não se esqueça de trazer, no dia 26 de julho de 2013, os documentos que ela não entregou e que são necessários para a análise do processo de seleção dos candidatos aos auxílios.

Após uma breve pausa, entra outro aluno, estudante de artes cênicas, que requeria o auxílio-alimentação. Mais uma vez, a profissional relata ao discente que fará perguntas sobre sua “estrutura sociofamiliar” (expressão dela), o que abrange as questões de renda familiar, número de parentes que moram com o aluno, se paga aluguel ou não etc. Aqui, nessa entrevista, decidimos escrever um pouco menos sobre as ações dos atores sociais e prestar mais atenção naquele momento.

Logo soubemos que ele terminou o ensino médio na escola pública e que morava de aluguel com alguns amigos (sendo que um deles não ficava na casa constantemente, já que estudava medicina em Juazeiro do Norte). O aluno relatou que desembolsava, todo mês, R$ 250,00 para ajudar no aluguel. O dinheiro advinha dos “bicos” que realizava como ator (ela realizava oficinas, “contação” de histórias etc.). Notamos que, tanto na entrevista anterior como nessa que agora descrevemos, a profissional se muniu de um “documento extra”, chamado Ficha de Complementação de Entrevista Social, para completar as informações fornecidas pelo aluno através do questionário social que fora preenchido.

No outro dia, em 26 de julho de 2013, chegamos por volta das 14h30min. Enquanto aguardávamos nossa entrada na sala do Serviço Social, vimos que dois alunos esperavam ser chamados, pela estagiária ou pela assistente social, para marcarem a data de suas entrevistas. Mais uma vez, tentamos iniciar uma conversa9 com um aluno que aguardava ser chamado para ser entrevistado.

Assim como Silva (2001, p. 89) tentara “entender de onde vieram, o que pensam” os meninos de rua, nós também tentávamos apreender essas questões com os alunos que procuravam a assistência estudantil. O estudante contou que desejava conseguir os auxílios transporte e alimentação (lembramos que cada aluno pode ter, no máximo, até dois auxílios), pois gastos com comida e passagens de ônibus eram um “peso muito grande” (palavras dele) no orçamento familiar; e foi justamente a entrevista desse aluno, estudante do primeiro semestre do curso de música, que presenciamos.

Como no dia anterior, a assistente social se apresentou ao aluno e nos apresentou, dizendo quem éramos e o porquê de estarmos ali, pedindo a permissão do discente para permanecermos na sala durante a entrevista. Ele consentiu e a entrevista seguiu normalmente, praticamente com as mesmas perguntas feitas anteriormente aos outros candidatos.

Como o aluno requeria os dois auxílios supracitados, a profissional explanou que talvez só fosse possível ser concedido um, por causa do baixo orçamento que estava direcionado para a assistência estudantil no IFCE. Nesse caso, o auxílio concedido seria aquele que fosse prioridade, mas, mesmo assim, também devido ao ínfimo orçamento, nem sempre se podia atender a prioridade.

A servidora continuou sua fala dizendo que existem alunos que não são atendidos em suas demandas, e que os profissionais que lidavam com a assistência estudantil realizavam a análise socioeconômica, bem como a situação acadêmica do aluno (por exemplo, ele ficava o dia todo no IFCE? Se sim, era um forte candidato a receber o auxílio-alimentação, ao contrário daqueles alunos que ficavam somente meio período na instituição).

Retornando às perguntas do questionário, a servidora pergunta ao discente sobre a condição socioeconômica da sua família, que é do interior do estado do Ceará. Ele responde a tal pergunta e, posteriormente, acrescenta que trabalha com música e no teatro. A família o ajuda, quando pode, com alimentação, sendo o aluguel por conta do aluno, que trabalha há cerca de um ano como músico, e é justamente desse trabalho que advém o dinheiro para o pagamento do aluguel.

9 Essa conversa foi informal e rápida. Esse aluno, com o qual conversei, não se incluiu nos estudantes

Depois desse relato, a assistente social pediu que o aluno trouxesse os documentos que faltavam para ajudar na análise da entrevista (comprovante de renda do aluno, documento para pagamento da Coelce e contrato do aluguel que explicite que o valor, gasto com energia, já está incluso no aluguel, de acordo com o que informou o aluno).

A servidora disse ainda que o auxílio-alimentação já estava indeferido para ele, já que estudava somente pela manhã, não passando o dia inteiro no IFCE.

Após o fim da entrevista, quando a assistente social sai, o aluno reclama, para nós, sobre a falta do auxílio-moradia (este, segundo a profissional, só será ofertado no segundo semestre, devido ao ínfimo orçamento).

Na última entrevista, realizada com um aluno do curso de mecânica industrial, a assistente social o cumprimenta e se apresenta, dando início à entrevista como das outras vezes.

Ele requer auxílio-transporte. O resultado, com os nomes daqueles alunos que serão inseridos na assistência estudantil, sairá no dia 14 de agosto de 2013. A assistente social relata que, quando o aluno pede os dois auxílios, pergunta qual auxílio é prioridade para ele; ambos são concedidos caso haja dinheiro, todavia, naquele semestre, segundo a servidora, o orçamento “está apertado”. A servidora, já no final da entrevista, ainda diz que, dependendo da situação do aluno, serão concedidos os dois auxílios.

4.2 Como os alunos avaliam a política de assistência estudantil no IFCE, campus