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3. EVOLUÇÃO DA EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NA

3.5. Crítica à exigibilidade com fundamento generalizante e guinada no

Ainda que por meio do critério do homem médio, os doutrinadores adeptos da doutrina da exigibilidade houvessem solucionado o problema da total vinculação das hipóteses de exclusão de culpabilidade às questões individuais e, portanto, morais, difíceis de serem ponderadas (da exigibilidade com fundamento individualizador), não escaparam eles, também, da mesma ordem de crítica já formulada anteriormente.

Menciona Salas que: “La teoría normativa de la culpabilidad, gracias a la doctrina de la exigibilidad, había adquirido una dimensión jurídico-política de corte crítico-social.”152 O ponto tocado pelo autor é preciso. Desde Frank, com sua reprovabilidade (ainda que não houvesse encontrado fundamentos legais nem tampouco doutrinários para criar uma teoria de exculpantes supralegais), passando por Goldschmidt e Freudenthal, bem como por outros autores citados, a teoria normativa da culpabilidade contribuiu, com suas bases filosóficas neokantianas, para a aproximação do direito penal à realidade social. E a doutrina da exigibilidade, tenha

152 op. cit., p. 105. Em tradução nossa: “A teoria normativa da culpabilidade, graças a doutrina da exigibilidade, havia adquirido uma dimensão jurídico-política de corte crítico-social.”

ela fundamento individualizador, tenha ela fundamento generalizante, a qual somente poderia ter se desenvolvido nas bases de uma culpabilidade normativa, apresenta o ápice desta aproximação.

Foi exatamente em virtude dessa aproximação à realidade que surgiu, a partir de determinados setores, a reação à teoria da exigibilidade como um todo. Segundo Salas, “De ahí el apasionado rechazo que provocó en algunos sectores.”153

O movimento verificado no interior da teoria da exigibilidade, passando-se de uma vertente individualizadora para uma vertente generalizante, porém, não ficou adstrito a esse ponto. Concomitantemente com tal evolução verificou-se também uma guinada no que se refere à generalização da própria teoria da culpabilidade, ainda nos limites do normativismo.

Essa evolução se mostra interessante por dois aspectos, que se relacionam necessariamente. Em primeiro lugar, a tendência generalizante da culpabilidade como um todo permitiu a superação das críticas feitas contra a teoria da exigibilidade e se adequou perfeitamente aos ideais político-criminais que dominavam o estado nacional-socialista alemão, momento e local em que surgiram seus primeiros expoentes. Em segundo, surgem os primeiros traços do que mais a frente viria a ser chamado de direito penal do autor, em suas mais variadas formas.

Em termos jurídicos, o que a generalização da teoria da culpabilidade (como um todo) proporcionou foi o tratamento da culpa baseado em expectativas de comportamentos de um cidadão médio frente à norma jurídica. Ou seja, eleva-se à regra da culpabilidade o que segundo a doutrina da exigibilidade era exceção àquela. Deixa-se de exculpar e passa-se a culpar com base no que se esperaria de uma média humana. Nas palavras de Salas:

(...) la culpabilidad es por completo idéntica a la exigibilidad de otra conducta, y ésta se funda, a su vez, en que la conducta del ciudadano medio permite esperar un comportamiento ajustado a la norma. Luego, definen la culpabilidad en función de la frustración de expectativas.154

E continua Salas:

La generalización de la culpabilidad en su conjunto, operada por Kohlrausch y Marcetus, les hace desligarse del entendimiento puramente psicológico-descriptivo del dolo y la imprudencia, que también serán

153 Ibidem. “Daí o apaixonado rechaço que provocou em alguns setores.” (tradução nossa) 154

Idem, p. 107. “(...) a culpabilidade é por completo idêntica à exigibilidade de outra conduta, e esta se baseia, por sua vez, em que a conduta do cidadão médio permite eseperar um comportamento ajustado à norma. Logo, definem a culpabilidade em função da frustração de expectativas.” (tradução nossa)

definidos en relación con las expectativas de conducta que se pueden tener respecto del ciudadano-tipo-medio (…).155

O critério generalizante da culpabilidade, baseado no padrão do homem- médio, e, com sua evolução – a culpabilidade baseada em expectativas de comportamentos deste que seria o homem médio – foram justamente os marcos da mudança de uma dinâmica (ainda dentro do que poderia se chamar de normativismo) de culpabilidade vinculada ao fato do autor para uma dinâmica de culpabilidade vinculada ao autor do fato.

Segundo Salas:

La teoría normativa de la culpabilidad, en sus diversas direcciones, tenía en común la referencia de la culpabilidad al hecho individual. Frente a ellas, pero al interior del movimiento normativizador, surge, sobre el cambio de siglo, un grupo de teorías que buscan el criterio de culpabilidad decisivo en el modo de ser del autor, en su carácter, no en el hecho.156

Assim, a partir dessas novas tendências, podemos passar a dividir a teoria normativa da culpabilidade, centrada em seu aspecto formal que é a reprovabilidade, em alguns diferentes grupos: aqueles que têm como base da reprovação a possibilidade de condução conforme a norma, segundo uma doutrina centrada na exigibilidade; aqueles que têm como base de reprovação o caráter do indivíduo; aqueles que a têm com base na condução de vida da pessoa etc.

Estes dois últimos grupos, que têm como fundamento do juízo de reprovação a condução de vida ou o caráter do autor, são exemplos das novas teorias de culpabilidade que fortemente influenciaram o direito penal após o declínio da doutrina da exigibilidade, e que, não coincidentemente, tomaram força na Alemanha com o desenvolvimento da dogmática penal a partir da República de Weimar, e, principalmente, com a tomada de poder pelo partido nacional-socialista daquele país.

3.6. Considerações sobre a política criminal na República de Weimar e os seus