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A “crítica da cópia”, do idealismo, à crença na reforma da Constituição e outras críticas

3.4 Discursos político-constitucionais: a reforma da Constituição de

3.4.1 A “crítica da cópia”, do idealismo, à crença na reforma da Constituição e outras críticas

“Só restou, realmente, o livro – isto é, a exegese dos constitucionalistas. Na 1a República foi este, sem dúvida, o único foco sobrevivente do idealismo utópico, na sua expressão mais pura, sincera e desinteressada.”579

Ao longo de todo o período de vigência da Constituição de 1891, foram recorrentes as críticas ao seu texto, que levaram à elaboração de discursos que buscavam combater a organização constitucional instituída, que desejavam uma alteração institucional profunda ou apenas alterações pontuais por via de reforma constitucional, pelos meios nela previstos, ou que acreditavam que o caminho para a solução dos problemas existentes não poderia passar pela busca da reforma da lei. Daí decorreram propostas de reformas constitucionais ou de outras naturezas, e também um ambiente discursivo em que essas críticas interagiram, desqualificando-se a reforma constitucional como o remédio dos problemas políticos, econômicos e sociais que o país vivenciava naquele momento. Este tópico da pesquisa destina-se a expor justamente esses discursos, comparando-os e contrastando-os.

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VIANNA, F. J. de O. O idealismo da constituição. 2. ed. aum. Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1939, p. 37.

150 Em primeiro lugar, foram recorrentes os discursos que criticaram o fato de a Constituição Brasileira ter sido elaborada com inspiração na Constituição dos Estados Unidos, e em menor medida nas Constituições Argentina e Suíça580, e pelo fato de se incorporaram ao país soluções estrangeiras inadequadas às condições do Brasil. Bernardo Ricupero, referindo-se aos trabalhos de Oliveira Vianna, chama essa reflexão de “crítica da cópia”, que adotaremos aqui para nos referirmos a essa circunstância para todos os trabalhos analisados581.

Evidentemente, essa percepção da “cópia” ou inspiração na Constituição estadunidense era muito comum, mas nem sempre foi acompanhada de uma crítica negativa. Podemos citar, por exemplo, o trabalho de José Soriano de Souza, de 1891, em que o autor apontou que, tendo sido a Constituição "inspirada pela Constituição dos Estados Unidos do Norte, e não poucas vezes dela copiada", seu estudo não poderia se dar sem o auxílio dos comentadores da Constituição estadunidense. Assim, propôs-se a usar, em suas lições, do trabalho desses comentadores582. Portanto, apesar de salientar a ideia da cópia da Constituição, não a criticou, e usou essa noção para auxiliar seus estudos ao recorrer aos comentadores da Constituição dos Estados Unidos.

Ademais, houve também críticas à “crítica da cópia” – porque esta última incorporava uma noção pessimista de que tudo não funcionaria no país por terem sido as instituições produzidas para outra realidade – para se afirmar que nenhum modelo seria transposto sem adaptações às necessidades e peculiaridades nacionais.

Associado à “crítica da cópia”, houve discursos que se voltaram à crítica do idealismo ou da abstração dos constituintes de 1891, por terem elaborado um produto dissociado da realidade do Brasil, de sua história, de suas condições sociais e econômicas. Da “crítica da cópia” e da crítica do idealismo, surgiram discursos com propostas de reforma da Constituição, os quais se destinavam a colocá-la em acordo com a realidade nacional.

Com ou sem as críticas anteriores, houve também discursos com a crítica às instituições estabelecidas pela Constituição, entendendo-se que eram responsáveis pelos !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

580

Cf. PIVATTO, P. M. Mecanismos de alteração constitucional: um estudo comparado das estruturas constitucionais da Argentina (1853/1860), Suíça (1848/1874) e Brasil (1891). Direito, Estado e Sociedade, n. 30, p. 102-124, jan./jun. 2007.

581 Cf. RICUPERO, B. A crítica da cópia em Oliveira Vianna. 36.o Encontro Anual da Anpocs. Disponível

em: <

http://portal.anpocs.org/portal/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=8148&Itemid=217>. Acesso em: 14 ago. 2014.

582

SOUZA, J. S. de. Princípios gerais de direito público e constitucional. Recife: Empreza d’A Província, 1893, p. 4.

151 problemas existentes no país. A reforma da Constituição viria, assim, para sanar esses problemas, adequando-a às necessidades do Brasil. Essas reflexões também não ficaram imunes a ataques, surgindo daí a crítica à crença na reforma da Constituição – ou, como diria Oliveira Vianna de maneira mais ampla, crítica à “crença no poder das fórmulas escritas”.

Essa “crítica à crença na reforma da Constituição” foi associada nos discursos analisados a três fatores levantados pelos críticos: (i) ao fato de se acreditar que, na verdade, o problema estaria nos agentes públicos, que não executariam a Constituição com vistas ao atendimento do interesse público, e sim unicamente aos seus interesses, (ii) de se acreditar que o povo brasileiro é que não estaria organizado de forma a exigir a correção na execução das Constituições (ainda que essa incapacidade não fosse considerada como causada pelo próprio povo) e (iii) à insuficiência de uma reforma constitucional, exigindo- se, na verdade, reformas econômicas e sociais mais amplas. Quanto à reflexão em torno da suposta incapacidade do brasileiro para participação na vida pública, surgiram propostas que estavam relacionadas à instrução moral e cívica da população e ao adequado desenvolvimento do ensino primário.

Em contrariedade às críticas às instituições constitucionais, houve discursos que acreditavam que os problemas do país decorreriam não delas, mas dos homens públicos que executavam a Constituição (como já se identificou acima), daí desdobrando-se outras propostas para a solução de problemas: a reforma da Constituição para corrigir a eleição dos agentes públicos, ou a conservação da integridade da Constituição, buscando-se, ao contrário, compelir os agentes públicos a dar adequado cumprimento a ela. Também essa crítica foi objeto de ataque, havendo discursos voltados a criticar a crença na capacidade de um homem que pudesse ser capaz de solucionar todos os problemas.

Apresentados, em linhas gerais, os principais discursos em torno do debate que envolveu a Constituição de 1891 e as reflexões sobre suas reformas, segue-se a descrição desses discursos, organizados, na medida do possível, por data de publicação583584.

A crítica da cópia e a crítica ao idealismo foi recorrentemente direcionada contra Ruy Barbosa, por ser ele um dos principais responsáveis pela organização institucional

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583 Considerou-se a data de publicação da primeira edição do trabalho, ou da primeira vez que houve a

publicação dele.

584

Saliente-se que reflexões semelhantes à que se desenvolveu no tópico 3.4.1 foram também esboçadas por Serzedello Correa, Samuel de Oliveira, Araujo Castro, Aurelino Leal e Oscar Stevenson nos trabalhos produzidos na época da Primeira República.

152 brasileira naquele momento. Salienta-se, entretanto, sua posição sobre a questão, para que se possa considerar o debate em seu contexto.

Em artigo publicado na imprensa em 24 de fevereiro de 1899, no aniversário da Constituição, e compilado por Homero Pires em “Comentários à Constituição Federal Brasileira”, Ruy Barbosa chamou atenção para o fato de que todas as Constituições passariam por um período de acomodação, o qual seria mais dilatado quanto mais revolucionário fosse o seu nascimento e quanto maiores as distinções entre o novo regime e o regime superado, o que poderia ser verificado até mesmo na história constitucional dos Estados Unidos585. Entretanto, Ruy Barbosa afirmou que as situações do Brasil e dos Estados não se assemelhariam, e os perigos iniciais de cada uma não se confundiriam, porque nos Estados Unidos não haveria ainda um povo americano, ao passo que no Brasil haveria unidade nacional e um povo constituído586.

De qualquer forma, refletindo sobre relação entre a lei e a realidade, Ruy Barbosa reconheceu que não bastaria a habilidade do legislador para transportar instituições de sucesso de um determinado Estado para outro, porque o êxito dessa empreitada dependeria também da idoneidade dos povos, de forma que Barbosa entendeu ser difícil pretender a semelhança entre as instituições brasileiras e americanas:

Certamente ha criações, que não se imitam, que não se transportam. Não basta a vontade e a sciencia, para obter, noutro paiz, a reprodução de um Senado como o americano. Não vale a intelligencia do modelo, nem a arte da adaptação, para transplantar dos Estados Unidos o seu Supremo Tribunal Federal. Instituições destas não se alcançam pela habilidade plastica dos legisladores. Dependem eminentemente da idoneidade dos povos, como do caracter das raças. E sem ellas bem duvidoso é que a nossa Constituição tenha o direito de pretender á affinidade, que suppõe, com a obra de Washington e seus collaboradores. Fazendo, porém, por esse lado, como fez, quanto estava ao alcance da sua insufficiencia, cumpria, ao menos que, na linha dos resultados praticamente realizaveis, os constituintes de 1890 houvessem acudido aos dois problemas do regimen, que visavam: o autogoverno dos Estados e a existencia da União.587 (grifo nosso)

Por esse discurso vê-se que Ruy Barbosa, ao que parece, não desconsiderou a existência de dificuldades na transposição de institutos estrangeiros para o país, nem incorreu na crença de que esse processo poderia se dar pela simples ação do legislador.

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585 Cf. BARBOSA, R. Comentários à constituição federal brasileira. Coligidos e ordenados por Homero

Pires. v. I. São Paulo: Saraiva e Cia., 1932, p. 29.

586

Cf. BARBOSA, R. Op. cit., p. 30.

153 Foi, entretanto, sujeito de inúmeras críticas por essa circunstância ao longo de toda a Primeira República.

O discurso de Assis Brasil caminhou no sentido de compreender que as reformas das normas poderiam ser soluções adequadas para os problemas de organização institucional então existentes, e essa reflexão foi expressamente apresentada pelo autor, que desejava se opor àqueles que acreditariam ser inútil legislar sobre uma dada questão para solucioná-la. Em “Democracia representativa”588, Assis Brasil ponderou que a crença na onipotência das leis cedera espaço à necessidade de consideração da experiência para adequação das normas ao povo em que vigeriam. Essa superação, entretanto, não significaria que a alteração das normas seria inócua, mas sim que a alteração das normas deveria atender às condições do povo para o qual valeria:

Em outros tempos e no domínio de um critério filosófico hoje desacreditado, fiava-se tudo na onipotência das leis. Este modo de pensar era errôneo e teve de ceder ao de espíritos iluminados pelo método da observação e experiência, mostrando que as belas leis ficariam inertes no papel, se não fossem adequadas às condições do povo a que se destinassem. Isso não quer dizer que o maior ou menor aperfeiçoamento das leis seja indiferente; significa somente que esse aperfeiçoamento deve corresponder ao estado social que elas vierem reger. 589 (grifo nosso)

Nesse passo, Assis Brasil buscou interagir com aqueles que criticariam qualquer proposta de alteração normativa por acreditarem que não se poderia auferir qualquer efeito positivo da alteração das leis e que apenas a educação da massa poderia solucionar os problemas nacionais. O autor esclareceu, entretanto que sua intenção não seria promover mudanças a “golpes de decretos”, como alguns doutrinadores superficiais poderiam pretender, mas, se algumas das irregularidades existentes poderiam ser imputadas às normas escritas, poderiam também ser solucionadas justamente pela alteração normativa590.

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588 Em nota introdutória datada de 1931, Assis Brasil afirma que escreveu o trabalho “Democracia

Representativa” como justificativa de um projeto de lei apresentado ao Congresso em 1893. Embora a edição utilizada se baseie na 4a edição, de 1931, Assis Brasil apresenta a advertência inicial de que respeitou o texto antigo, adicionando esclarecimentos, comentários e correções ao final do livro. Cf. BRASIL, J. F. de A. Democracia representativa: do voto e do modo de votar. In: BROSSARD, Paulo (org.). Ideias políticas de

Assis Brasil. 2. ed. Brasília, Rio de Janeiro: Senado Federal, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1990, p. 19-22.

589

BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 143.

590 Nas palavras do autor: “Não basta ter convicções, é preciso também ter muita paciência, para afrontar um

modo de pensar tão radicalmente vicioso quanto generalizado em todas as camadas de opinião. O que se trata de demonstrar é justamente que as irregularidades até agora presenciadas estribam em grande parte nos defeituosos regulamentos eleitorais que têm vigorado; como, pois, oferecer o resultado negativo desses mesmos regulamentos a título de prova de incapacidade do povo? É elementar, e hoje indiscutido, que a capacidade do povo está no número das condições essenciais para o bom desempenho das leis; mas a questão

154 Mas o rebanho enorme dos que, não pensando por si, estão sempre prontos a correr atrás das afirmações em voga, e mais quando real ou aparentemente delas ressumbra um pouco de pessimismo, compreendeu só uma face da grande verdade e a repete hoje com a maior impertinência. Para esses é absolutamente inútil legislar; negam redondamente qualquer efeito dos qualquer efeito dos atos e ordenanças dos poderes legítimos, e tudo atribuem à educação da massa popular, espécie de bode expiatório de todos os erros e crimes, tenha ou não culpa neles. Está condenado a sofrer verdadeiras torturas, impostas por essa gente simplista, qualquer homem de espírito que se dedicar a corrigir algum vício das leis. Confundem-no logo com os doutrinários superficiais que ingenuamente pretendem mudar os costumes a golpes de decretos. Pelo que me toca, sei bem que a virtude não se decreta. Ansiava por fazer esta declaração e pedir para ela a maior atenção dos meus leitores; ela aplica-se a toda a intenção predominante do meu livro, e todo, ou quase todo, o assunto deste capítulo poderia constituir a advertência que ocupasse as primeiras páginas da obra, tal é a necessidade de destruir desde logo a prevenção universal contra a eficácia do melhoramento das leis, especialmente em matéria eleitoral.591 (grifo nosso)

Nesse passo, Assis Brasil criticou aqueles que acreditariam apenas na educação como forma de resolver os problemas nacionais e também aqueles que creriam apenas na solução por meio da lei, por desenvolverem um raciocínio incompleto. Isso porque, na sua visão: “Nenhum povo, por mais educado que fosse, dispensaria uma lei acorde com as suas necessidades e competência; nenhuma lei, por mais aprimorada em suas disposições, dispensaria um povo apto para exercê-la”592. Tanto uma quanto outra soluções, se isoladas, seriam incompletas. E assim apresentou ao Congresso, naquele momento, um projeto de lei em matéria eleitoral.

Em “Do governo presidencial na República Brasileira”, de 1896, uma das questões que informaram a reflexão de Assis Brasil foi: “De que índole é a reforma que nos convém?” Mais uma vez, o autor afastou a ideia de uma ingênua crença no texto escrito e salientou a necessidade de que as Constituições refletissem as condições e exigências particulares de cada povo, porque o texto escrito, por si só não teria valor que pudesse durar ao longo do tempo e conforme as alterações demandadas pelo organismo social:

Não ha hoje pensador esclarecido que afague o velho sonho de que as constituições politicas possam ser obras de um dia. Ainda que á competencia theorica do legista se unisse a immaculada sinceridade do !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

tem duas faces: desde que se trata de aplicar uma lei a povo, tanto é preciso saber o que é esse povo, como o que essa lei é.” (BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 144).

591 BRASIL, J. F. de A. Democracia representativa: do voto e do modo de votar. In: BROSSARD, Paulo

(org.). Ideias políticas de Assis Brasil. 2. ed. Brasília, Rio de Janeiro: Senado Federal, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1990, p. 143.

155 patriota, seria insufficiente para a producção de uma boa lei fundamental. Nos nossos dias os mais modestos legisladores constituintes não iriam pedir a Spencer, como foram outr’ora ingenuos colonos da Carolina supplicar a Locke, a constituição que houvessem de traçar para a sua patria. Melhor é encommendar a legislação ao bom senso, inspirado nas tradições e nas exigencias particulares de cada povo – do que pedil-a a sabios divorciados da vida de acção. O valor dos textos escriptos é precario e trasitorio; não encerram por si sós virtude para cousa alguma. Embora escriptas primorosamente, nascidas embora da mais pujante corrente do pensamento dominante em um dado momento, as leis fundamentaes, se são lettra fria e immovel, não tardarão a offender as tendencias progressivas do organismo social. É este um ser vivo, que não póde jazer, eterna chrysalida, amortalhado em tecido de fórmulas immaleaveis. Á simmilhança dos corpos animados, soffre perpetuo trabalho de nutrição e desnutrição, assimila progressos e elimina substancias que já não teem objecto util.593 (grifo nosso)

Também nesse trabalho, Assis Brasil salientou que a Constituição brasileira não poderia ser a cópia de nenhuma das outras Constituições existentes, por suas características históricas, naturais, sociais e políticas muito peculiares. Depois de analisar os casos da Suíça, Estados Unidos e Argentina, que adotavam a república federativa na época594, concluiu que seriam enormes as diferenças entre o Brasil e tais países com instituições semelhantes 595 e que dizer que as instituições mais adequadas ao Brasil seriam as republicanas, federativas e presidencialistas não implicaria dizer que deveriam ser cópia das de outros países596. Rechaçou, assim, a crítica da cópia, e se opôs àqueles que criticaram as instituições americanas, quando na verdade desejavam criticar as brasileiras597. Propôs-se, então, a buscar a origem de certos problemas do país.

Primeiramente, Assis Brasil argumentou que o problema brasileiro não residiria na forma de governo, cuja controvérsia já teria sido superada no campo da teoria e dos fatos598. Também não seria problema a questão social, pois, afirmou, não haveria no país abundância de trabalhadores e falta de trabalho, nem mesmo capital ou proletariado, de forma que não poderia haver salário insuficiente ou reivindicação por salário insuficiente ou redução de jornada599. Também não seria organização administrativa, podendo-se !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

593 BRASIL, J. F. de A. Do governo presidencial na República brasileira. 1. ed. Lisboa: Companhia

Nacional Editora: 1896, p. 21.

594 Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 31-40. 595 Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 40. 596 Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 42-43. 597

Nesse ponto, o autor conclui: “Fugindo a esse methodo radicalmente falso, darei sempre por supposto, neste obra, que a Constituição do Brasil deve ser, antes de tudo, brasileira, que não ha typo algum, concretisado ou ideal, para as instituições que nos convem e que, se em alguns ou em muitos ponctos nos confundimos com o que está admittido por outros povos, é porque taes casos entram no numero d’aquelles a que pertencemos.” (BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 44).

598

Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 47-56.

156 mesmo falar em unanimidade em torno da federação600. Não sendo estes os problemas, seria lógico concluir, de acordo com Assis Brasil, que a questão que dividiria as opiniões estaria na melhor organização do governo republicano-federativo, quanto ao presidencialismo ou parlamentarismo601. O autor analisou então as razões para a impopularidade do presidencialismo no Brasil, e concluiu o problema estaria no fato de que nenhum homem teria estado com responsabilidade na direção do regime presidencial602, o que não poderia ser imputado ao presidencialismo em si: os primeiros anos da República não teriam tido realmente o presidencialismo, mas um regime militar no governo civil. Nesse passo, toda a circunstância do momento de transição passaria, e só então seria possível ver o funcionamento do presidencialismo. Portanto, no que diz respeito especificamente ao presidencialismo, o problema estaria nos homens que ocuparam o cargo de Presidente da República.

Alfredo Varela, nesse debate, apresentou um discurso que trabalhava com a ideia da necessidade de recurso à realidade nacional para adaptação das instituições. Em seu “Direito constitucional brasileiro: reforma das instituições nacionais”603, denunciou a instabilidade do regime instalado, pela disputa de forças entre aqueles que desejariam manter as instituições, e aqueles que pretenderiam modificá-las ou substituí-las por outras604. Aliando-se à escola histórica, entendeu que esta seria capaz de “por termo à secular disputa, estudando com um animo imparcial o que há de razoável nas resistências da autoridade e nas reclamações do elemento popular”605. Iniciou seu estudo criticando a crença na democracia representativa, o que se repetiria no desenvolvimento da obra606, defendendo que uma força conservadora da sociedade, que não atuasse ao impulso da vontade popular, precisaria ser dela distinta607. Embora não desejasse uma “soberania do governo”, desejava que houvesse uma soberania da “suprema ordem universal”, que atendesse às “leis históricas” e à “natureza das coisas”.

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600 Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 57-59. 601

Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 59-60.

602 Cf. BRASIL, J. F. de A. Op. cit., p. 75.

603 Na dedicatória de seu livro, datada de 1898, Alfredo Varela salientou desejar que a obra possa, “de par

com o justo zêlo de uma sã liberdade, infundir ideias mais conservadoras em nossa revolta sociedade brasileira”, dedicando-a à sua avó, que teria cooperado para corrigir seus “sentimentos republicanos,