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Como o principal instrumento de investigação desta pesquisa é o

Questionário Pratt sobre crença religiosa, de J. B. Pratt, empregaremos sua

teoria sobre crença religiosa para fundamentar este trabalho. Viu-se que o momento atual é fecundo para se estudar a religião com base na Psicologia. Há um nítido movimento de retomada de questões afetas à religião. J. B. Pratt é considerado, assim como William James e Wundt, um dos pioneiros nos estudos da Psicologia da Religião. O instrumento investigativo por ele construído tem sido adaptado para os dias atuais e empregado em pesquisas recentemente desenvolvidas. Freitas (2002) utilizou o questionário no

desenvolvimento de sua tese de doutoramento, que teve como objetivo investigar as crenças religiosas de estudantes de Psicologia relacionadas a características de personalidade, associando o Questionário Pratt sobre crença

religiosa ao teste de Rorschach. Dando continuidade aos seus estudos,

atualmente coordena um projeto de pesquisa na Universidade Católica de Brasília – UCB, no âmbito do qual alunos de Iniciação científica trabalham na adaptação do Instrumento para aplicação com idosos. O projeto de pesquisa “Religiosidade e atitude diante da morte em idosos” está em andamento, tendo sido aprovado pelo CONSEPE-UCB, em março de 2004 (Freitas et all, 2004).

Em sua tese, Freitas (2002) refere-se a estudos da psicologia no campo da religião e cita a dissertação de mestrado de Rosmarie Rodrigues de Oliveira Navarro, Intitulada: “A Experiência de Deus”: Uma Vivência e um Estudo com o Questionário Pratt Sobre Crença Religiosa”, defendida no Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília – UnB em 2000, que também utiliza o referido instrumento.

Outro estudo também recente é o de Conceição (2004), que adaptou o questionário Pratt à prática desportista, investigando a crença religiosa em atletas de handebol.

James Bisset Pratt foi um filósofo norte-americano, considerado referência constante por suas publicações sobre psicologia e religião. Suas principais obras, segundo Freitas (2002), foram Psychology of religious belief (1907); What is pragmatism? (1909); The religious consciousness (1920);

Matter and spirit (1920); Personal realism (1927); Naturalism (1938); Why religious die? (1940) (Freitas, 2003, p. 3).

Martins (1999), em seu verbete sobre Pratt, cita a metafísica dualista desenvolvida por ele nas suas últimas obras, o que ele definiu como realismo pessoal. O autor do verbete destaca a opção de Pratt ao propor a interação entre alma e corpo, por considerar que a realidade mental é irredutível à realidade física.

Freitas (2003) realiza importante leitura da obra de Pratt. Ao apresentar seus pressupostos teóricos/filosóficos, aproxima a concepção filosófica de Pratt – por ele Intitulada realismo pessoal – à de Descartes. Essa aproximação se dá pela aceitação de Pratt da dualidade da natureza. Entretanto, distancia-se de Descartes “(...) por não admitir uma consciência pura, desvinculada do corpo e

do mundo – sua opção foi por uma relação interativa entre matéria e espírito”

(Freitas, 2003, p. 2).

Outro tipo de aproximação dá-se com o maior filósofo americano, Peirce, pela sua concepção triádica em relação à natureza da crença. As raízes fundamentais dessa crença podem ser encontradas no que Pratt (1907) chamou de fundo de sentimento vital, que será discutido neste trabalho posteriormente. Outra aproximação com Peirce dá-se pela qualificação da intuição.

A autora aproxima-o também da fenomenologia de Husserl e Merleau- Ponty, quando da proposta de Pratt de uma superação do hiato entre a consciência e o mundo, “nesse sentido, busca também reintegrar o

conhecimento – ou a crença intelectual – ao conjunto de atividades especificamente humanas, em cuja base situa-se o vivido – a experiência fundamental em causa” (Freitas, 2003, p. 2).

Em The religious consciousness, Pratt faz conexões com a psicanálise freudiana, a partir de A Interpretação dos sonhos. Em função dessa aproximação, Pratt chega a uma melhor compreensão do fenômeno religioso. Nesse trabalho, o filósofo americano concorda com a afirmação de Freud, ao colocar o inconsciente como base da vida psíquica. Sendo assim, até mesmo a crença intelectual pode estar relacionada à natureza afetiva. Desde Psychology

of religious belief, Pratt (1907) argumenta que o inconsciente é a base de

nossos desejos e impulsos. Entretanto, nesse momento, não faz menção a Freud.

Psychology of religious belief é o livro no qual o autor fundamenta o

instrumento de pesquisa utilizado neste estudo: o Questionário Pratt sobre

crença religiosa. Portanto, far-se-á, a partir de agora, uma incursão pela obra

em questão, como forma de substancializar teoricamente esta investigação. Pratt (1907) inicia sua abordagem de forma bem-humorada, fazendo uma brincadeira com uma suposta visita de um marciano ao planeta Terra. Ri do provável espanto do marciano, supostamente descrente, ao se deparar com um povo que crê,

(...) e com uma boa dose de firmeza, num ser que nenhum homem jamais viu ou teve a esperança de ver, cuja natureza eles não podem senão vagamente conceber e, no entanto, devem adorar e amar, e ao qual – aparentemente – por falta de melhor nome, eles chamam de “Deus”. (...) Se nosso marciano imaginário viajasse a outras terras, seu espanto apenas aumentaria. (...) ele se defrontaria com a mesma firme crença em algum tipo de ser sobre-humano que se deve cultuar, adorar e ao qual se deve suplicar. (Pratt, 1907, p. 5)

Assim, o autor dá início às suas reflexões sobre a crença do homem, perguntando-se “Por que os homens crêem? Em que esta crença realmente se

baseia? De onde ela retira sua força e em que região de nossa vida psíquica ela está mais enraizada?” (Pratt, 1907, p. 6). Segundo o autor, essas são

questões de fundamental importância, não somente para profissionais da psicologia e sociologia, mas também para ministros religiosos, professores, enfim, para todo amante das questões da humanidade.

Assim como Aristóteles, Pratt divide a mente humana em pensamento e desejo. Ao fazer isso, classifica os elementos psíquicos em duas grandes divisões, as quais chamou de racional ou cognitiva, subdividida por sua vez em ideação e experiência sensorial – cujo conteúdo é cognitivo, passível de representação, possível de tornar-se público, comunicável, encontrando-se no “centro” – e não racional, também subdividida em sentimentos e fenômeno do

background, cujo conteúdo é indefinível, indescritível, pois suas experiências

subjetivas e privadas não são suscetíveis de comunicação; encontram-se à “margem”.

Em seus estudos, o filósofo debruça-se especificamente sobre a segunda grande divisão, a não racional, por considerá-la pouco explorada, bem como por ser a mais importante, em se tratando da vida religiosa. Interessa, portanto, a consciência não racional e sua íntima e direta relação com a vida do organismo. Assim, o filósofo descreve o fundo sentimental como fundo vital, responsável por nossas “reações inatas ao meio, enquanto conscientes, as

antipatias e as tendências congênitas, nosso amor e ódio mais profundos – tudo são partes deste fundo e crescem a partir dele” (Pratt, 1907, p. 14).

O estudioso apresenta o material psíquico não racional, a que ele também chama de “grande massa de franja” e “pano de fundo”, como responsável pela conotação afetiva e “colorida” na nossa vida, “(...) sem ela,

ele (pensador) estaria privado de uma das mais fecundas fontes de idéias com que o homem é abençoado” (Pratt, 1907, p. 11). Assim acontece porque todo

pensamento surge de um fundo de sentimento. Quando pensamos em uma forma lógica, essa é geralmente o produto final, pois a idéia nasce e é nutrida pelo sentimento vital.

Descrito dessa forma, temos o material psíquico como pequenas ilhas, no caso ideação e sensação, margeadas por um imenso mar de sentimento vital. Da mesma forma que o mar de água tem tormentas e tempestades, o mar de sentimentos vive a arremessar conteúdos nas praias da consciência. O autor ainda argumenta que

emoções estão constantemente indo e vindo, sugerindo um número infinito de idéias e ações; sensações normalmente subliminais ou quase, repentinamente se tornam claramente discriminadas; idéias estouram em nossas mentes sem nenhuma conexão com a esteira do pensamento em curso; a solução de um problema surge sem que venha junto o argumento que a apontou; o curso de uma ação que já encontramos determinado, correto, mas aparentemente não baseado na razão; intuições de todos os tipos são arremessadas do pano de fundo escuro; o jovem subitamente descobre que está apaixonado e que tem estado assim já há algum tempo sem sabê-lo; o poeta encontra o poema já semi-escrito antes de pensar em escrevê-lo. (Pratt, 1907, p. 18)

Para Pratt (1907), a nossa consciência não racional tem uma raiz profunda, e vem de nossos antepassados. Comparada à nossa jovem

experiência sensorial (racional), nossa massa sentimental é mais velha que a nossa própria raça. Justamente dessa massa sentimental vem nossa capacidade de valorar o mundo à nossa volta, as pessoas, os acontecimentos, se não fosse ela, ao Invés de valores, existiriam apenas verdades.

Ao dividir os elementos psíquicos conscientes em racionais e não racionais, o pesquisador fundamenta o posterior estudo da natureza da crença, principalmente considerando a massa sentimental e sua origem “primitiva”, quando afirma, por exemplo, a crença do homem, de todas as épocas, em uma natureza divina, sagrada. Ao partir para a descrição da natureza geral da crença, o filósofo alerta para o fato de que “a vida, o mundo real de nossa

experiência imediata é muito diferente de qualquer narrativa sobre ela” (Pratt,

1907, p. 30). Portanto, em processo de Investigação deve-se “deixar de lado

todas as pretensões de apresentar o mundo tal qual ele é para a experiência imediata” (Pratt, 1907, p. 30).

Ao apresentar os conteúdos racionais e não racionais, o autor alerta para o fato de que a vida não é passível de divisão; essa ocorre para fins meramente analíticos, pois “ideação e experiência sensorial e fundo

sentimental nunca são encontrados isolados uns dos outros, porém juntos formam uma unidade, que é nossa vida consciente” (Pratt, 1907, p. 31). Dessa

forma, introduz as três modalidades de crença religiosa de que trata na obra de 1907: perceptiva, intelectual e emocional. Alerta, entretanto, que essas modalidades não são encontradas tão explicitamente separadas umas das outras na vida real, devido ao fato de que “(...) nenhuma crença genuína é

totalmente desprovida de sentimento, e quase toda crença da vida adulta é, em certa extensão, intelectual” (Pratt, 1907, p. 31).

Antes de descrever suas modalidades de crença religiosa, o filósofo preocupa-se primeiramente em definir o que é realmente uma crença, descrevendo-a como uma “(...) atitude mental de assentir com a existência de

um dado objeto” (Pratt, 1907, p. 31). Acrescenta que essa concordância pode

ser articulada ou não, pode vir de uma percepção imediata da realidade, sem questionamento prévio:

(...) pode ser a aceitação mais auto-consciente do objeto como real após a dúvida ter tornado plausível a possibilidade de sua não realidade imaginada. (...) O objeto da crença não é meramente apresentado ou representado, mas reconhecido e aceito como parte do mundo real – seja qual for o entendimento que este venha a ter. (Pratt, 1907, p. 32)

A crença influencia cada um de maneira diferenciada; é particular, personalizada. A forma como cada um percebe os acontecimentos à sua volta faz toda diferença. Albuquerque (1998) explica que “a decisão por uma crença

não se dá em função do que objetivamente aconteceu, mas do que a pessoa percebeu em função do que aconteceu” (Albuquerque, 1998, p. 34). Interferem

ainda as emoções que envolvem a crença, que permitem que uma pessoa possa “(...) refazer, atualizar, inverter ou mesmo apagar a influência de sua

decisão por uma dada crença” (Albuquerque, 1998, p. 35). De acordo com Pratt

Isso faz com que algo tenha importância maior ou menor, dependendo de quem crê.

Após esclarecer a crença, o autor analisa a “crença religiosa”, compreendida em três modalidades: crença perceptiva, crença intelectual e crença emocional. Essa concepção triádica da crença religiosa, como foi vista, aparece em The psychology of religious belief. Entretanto, em sua obra publicada em 1920, The religious conciousness – A psychological study, a partir da análise da crença em Deus, o autor acrescenta uma nova modalidade, assim como modifica a nomenclatura anteriormente adotada (Freitas, 2003). Nesse trabalho, o autor descreve quatro modalidades de crença religiosa, a saber:

1- autorizada (authoritative) ou habitual (que corresponderia àquela Inicialmente chamada de crença perceptiva), baseada sobre a credulidade natural da mente; 2- racional (que corresponderia àquela Inicialmente designada de crença Intelectual), pautada sobre formas de argumentos explícitos ou implícitos; 3- emocional, sustentada sobre as experiências afetivas, usualmente de espécie mística; e 4- volitiva (volitional), mantida pela vontade e pelo querer crer. (Freitas, 2003, p. 15)

Segundo Freitas (2003), a quarta modalidade, denominada por Pratt de volitiva, é acrescida a partir da análise das respostas ao Questionário sobre

crença religiosa, fundamentada em seus estudos anteriores a 1907. Em seus

estudos sobre esse instrumento de investigação, Freitas (2003) chama a atenção para o nível de contato com a própria intimidade exigido pelas questões do questionário que, por isso, pedem uma disponibilidade para

instrospecção auto-reflexiva por parte do sujeito, o que faz com que muitos escorreguem pela tangente, fenômeno freqüentemente observado no meio acadêmico. Entretanto, a autora destaca este como um fenômeno atual, pois tal atitude escorregadia não parece ter sido obstáculo aos estudos de Pratt em 1907. Essa subdivisão em quatro modalidades vem dizer da “(...) natureza

particular dos conceitos, das idéias e representações a respeito de como o espírito humano concebe, percebe, sente e usa a idéia de Deus” (Conceição,

2004, p. 30). Segundo Pratt (1921), as quatro modalidades podem ser encontradas em toda pessoa genuinamente religiosa e em grau variado de acordo com as circunstâncias e particularmente de acordo com a idade. O autor caracteriza a criança, quase completamente, através da crença tradicional (perceptiva). Já o adolescente é um exemplo da modalidade intelectual e às vezes dos aspectos místicos, característicos da modalidade emocional, enquanto na vida adulta qualquer uma das quatro modalidades pode ser proeminente e, certamente, a modalidade ético-moral adquire seu melhor desenvolvimento.

O objetivo do filósofo era investigar os fatores que apoiavam a crença religiosa, desenvolvendo e aplicando um instrumento a variado público, na intenção de estabelecer comparações entre as diferentes modalidades e a diversidade da população. Seu maior interesse era investigar representantes da crença popular, mas não conseguiu alcançar totalmente o seu intento e questionou também sujeitos do ambiente intelectual.

Vejamos, então, as quatro modalidades de crenças, aqui denominadas: perceptiva, intelectual, emocional e ético-moral (volitiva).

1.3.1- Credulidade Perceptiva – Autorizada

Ao explicar a credulidade perceptiva, Pratt (1907) faz uma analogia ao período da infância, quando a criança ainda não faz distinção entre o que é real ou irreal, quando tudo o que chega à consciência é aceito como real, não existindo ainda espaço para a dúvida, para o questionamento da autoridade. A crença perceptiva, entretanto, não é uma crença limitada à infância. Para aquele que crê perceptivamente, tudo o que é visto é acreditado, real, “é

acreditado até que uma causa para dúvida surja, e a dúvida é sempre um problema secundário. (...) O objeto recém-apresentado à consciência é tido como inocente de falsidade, até que se prove o contrário” (Pratt, 1907, p. 36).

A crença perceptiva é uma postura de aceitação ingênua de tudo o que acontece e é percebido como real; é espontânea, herdada das tradições familiares e comunitárias (Conceição, 2004). Não acontece nenhum questionamento dessa herança, mas sim um costume às tradições anteriormente aprendidas. Sua base são os acontecimentos passados, a forma como percebeu a religião e a Deus é influenciada por figuras de autoridade que fizeram ou fazem parte da sua vida: pais, professores, igreja e/ou tradição. É justamente essa “confiança” numa autoridade que sustenta essa atitude religiosa.

Percebe-se claramente a relação entre a crença perceptiva e a autoridade, que pode tanto ser um outro ser humano, como algo material percebido através dos sentidos e, portanto, reconhecido como real. Lembramos aqui a porção racional cognitiva de ideação e experiência sensorial, pois a

percepção impede a dúvida, estabelecendo como real o objeto que é percebido.

Ao apresentar a crença na autoridade, o autor faz distinção entre dois sentidos. O primeiro, em que a crença se estabelece pela aceitação do que é apresentado, pelo fato de ter sido apresentado. E o segundo, que especificamente já não pertence mais à crença perceptiva, mas faz parte da crença Intelectual, por utilizar do argumento consciente da autoridade de uma pessoa como razão para sustentar a crença.

1.3.2- Crença Intelectual – Racional

Na crença perceptiva não existe espaço para a dúvida. Quando esta surge, é porque é possível que algo (objeto da dúvida) não exista. Em caso de dúvida, somos compelidos a buscar provas, indícios de uma existência, e justamente a partir da dúvida desponta a crença intelectual. Assim, os fatos não são meramente aceitos, são aceitos sabendo-se porque o são. A crença intelectual (racional) busca se livrar da autoridade, fundando-se na razão e nos fatos da experiência verificável (Pratt, 1921).

A crença na autoridade reaparece aqui num sentido mais racionalista, pois trata-se da autoridade da razão. A crença intelectual baseia-se em fatos que nos são dados, de naturezas diversas, firmados na segurança oferecida pela autoridade de especialistas, pois nenhum homem é capaz de investigar tudo o que percebe ou que lhe vem à mente. Geralmente temos razões, sejam

elas boas ou más, que nos oferecem subsídios para que acreditemos na palavra do especialista.

O autor não deixa de assinalar, também, a dependência dessa credibilidade na natureza do Indivíduo que raciocina. Como vimos anteriormente, a crença não é aleatória, ela está vinculada aos acontecimentos da vida do sujeito e à forma como foram Interpretados, da mesma forma varia a força da convicção intelectual. Pratt (1907) chama a atenção, assim, para a força que uma crença Intelectual pode atingir, pois

(...) enquanto o conceito abstrato, ou a asserção racionalizada são, em si mesmos, comparativamente pobres em realidade-sentimento, podem ser tão Interconectados e entranhados em nosso mundo “real” que a recusa em aceitá-los causaria estragos em nossas realidades aceitas, viraria todos os nossos hábitos de pensamento de ponta-cabeça, e não nos deixaria sequer um palmo de chão firme em que nos suster. Uma crença conceitual assim estabelecida é comumente mais difícil de remover, mais até que uma sustentada por uma experiência sensorial imediata. (Pratt, 1907, p. 40)

Como descreve Conceição (2004), essa atitude religiosa não acontece aleatoriamente. Para que ela surja é necessário um rompimento com as figuras de autoridade tradicionais, o que se daria, provavelmente, após frustrações da crença perceptiva, que, como já dissemos, abre espaço para a dúvida e o questionamento.

Vimos que, para Freud, a crença é incompatível com o questionamento, pois, se a crença é uma ilusão, não existe preocupação com a veracidade dos

fatos, com a verificação da realidade. Pratt, entretanto, mostra-nos exatamente o contrário: crença e dúvida andam lado a lado na crença intelectual.

1.3.3- Crença Emocional

Ao descrever a crença emocional, Pratt reapresenta o sentimento vital, que faz parte justamente da segunda divisão, não racional, de onde essa modalidade de crença retira sua força. Ao descrever a crença emocional, refere-se a dois tipos de casos, aqueles superficiais, movidos por desejos momentâneos e ocasionais e também aos casos de urgência das necessidades vitais. A emoção torna-se a grande responsável pela vivacidade dada a uma determinada idéia, podendo atribuir-lhe tamanha

(...) realidade-sentimento que quase lhe dá a mesma força de uma apresentação direta aos sentidos. Ela é para a fé o que as asas são para o pássaro; muitas crenças que se abandonadas a seu próprio suporte lógico cairiam ao chão, mas são capazes de, pela mera força de seu imperioso sentimento, desafiar o poder da gravitação e duvidar. (Pratt, 1907, p. 41)

Assim como na crença intelectual, cuja força de enraizamento pode obstruir o julgamento mental, o mesmo pode ocorrer a partir da paixão que alimenta a crença de fundo sentimental. Ao apresentar o fundo de sentimento, o autor destaca sua estreita relação com a vida do organismo, chamando-o de

porta-voz de seus instintos e desejos. Associando essa íntima relação com o organismo, tem-se que

O uso do termo “crença” aqui não é uma extensão de seu sentido estrito. É literalmente “a atitude mental de aceitação da realidade de um objeto dado”. O objeto, nestes casos, é a coisa que irá satisfazer a necessidade ou impulso, e a idéia desta coisa deve, é claro, ser derivada de uma experiência prévia ou da Instrução recebida de outros, antes que se possa dizer surgida a crença. (Pratt, 1907, p. 42)

Essa experiência prévia é exemplificada pelo autor através da relação da criança com a mãe. A criança necessita de comida e calor. Ao conhecer a satisfação de suas necessidades, a simples idéia da mãe e da satisfação por ela oferecida conferem um profundo colorido de realidade-sentimento. Sabe-se que o objeto desejado não está presente, mas o organismo acredita em sua existência, conferindo-lhe e exigindo um caráter de realidade. Assim, “ele é

muito real para ela; acredita nele porque precisa dele. Esta é a forma primitiva e a origem orgânica da “vontade de crer” (Pratt, 1907, p. 41). Apoiada no

sentimento vital, temos uma crença baseada em vivências de fundo emocional,

“(...) um sentimento religioso que se traduziria na sensação de união com o divino, conexão com Deus ou com a natureza, percepção de Deus como energia” (Conceição, 2004, p. 32).

Pratt (1907) conclui sua descrição sobre a crença emocional, retomando