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Ao abordar a sexualidade em pesquisa psicológica, torna-se imprescindível citar a contribuição dos estudos psicanalíticos de Freud, certamente o primeiro a atribuir à sexualidade de forma geral a sua devida importância (Mitchell, 1979). Lodi resume bem a relação que podemos estabelecer entre Freud e o estudo da sexualidade:

A partir de Freud, e ao longo do século XX, aprendemos a ler a sexualidade em manifestações as mais diversas, não só no amor, como também no ódio, na indiferença, no desprezo, na escolha de parceiro ou nas relações com o grupo, na vida reclusa ou ascética, no narcisismo, na luxúria, no erotismo, nos crimes, na determinação pelo trabalho, na Indolência, nas brincadeiras infantis, no humor dos espirituosos, no cinismo, na ironia, nos costumes dos turcos, na mascarada, no fetichismo, na fobia. Assim também na obra de Leonardo da Vinci, na falsa gravidez de Anna O., na bofetada de Dora, nos tormentos de Hamlet, do delírio de Schereber, na epifania de Joyce, na sedução de Don Juan, nos sonhos, nos lapsos e nos esquecimentos, nos chistes e nos atos falhos, na escrita e no discurso. (Lodi, 2004, p. 381)

O tema da sexualidade aparece na obra de Freud pela primeira vez em 1893-1895, quando da publicação do texto “Estudos sobre a histeria”. Nesse

momento inicial, Freud sustentava a ocorrência de um trauma psíquico na infância, cujo conteúdo era sexual. Temos nesse momento uma teoria da sexualidade em estado embrionário, uma vez que Freud ainda não admitia a existência da sexualidade infantil. Em 1897, Freud, em carta a Fliess, apresenta sua descoberta do Édipo e, portanto, o papel da fantasia e da teoria do trauma.

A partir de então, a sexualidade passa a ser focalizada. Porém, somente em 1905 Freud publica “Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, considerado um marco em sua obra, por abordar o discurso da pulsão (Garcia- Roza, 1994). É justamente a pulsão que vem legitimar a existência do homem para além do biológico e retirar da sexualidade sua “função” meramente reprodutiva. Antes delimitada pelo instinto, a sexualidade tinha como função a reprodução, sendo toda conduta sexual contrária à reprodução, considerada como perversa. A teoria freudiana redefine, portanto, o que é sexualidade, conferindo-lhe um caráter humano, relacionado e manifestado aos aspectos mentais e ideacionais, podendo existir apenas no contexto da cultura humana (Mitchell, 1979). O referencial da pulsão legitima o prazer advindo da sexualidade, retirando a perversidade considerada na perspectiva instintiva. Acrescenta ainda a manifestação da sexualidade desde o nascimento, assim como diferencia o que é sexual do que é genital.

Até o século XIX, praticamente, a sexualidade era preocupação da religião e da filosofia moral (Weeks, 2001). Freud (1905) lançou luz sobre o desenvolvimento psicossexual e desde então esse holofote nunca mais se apagou, passando a sexualidade a ser preocupação também da psicanálise e

da psicologia. Lembramos que Freud não era o único a colocar a sexualidade em discurso, mas é seu o mérito de colocá-la como um fator chave na vida mental: “a conquista de Freud foi a de substituir a teoria biológica dos instintos

pela noção de pulsão humana e então, esboçar as suas possíveis expressões e relegá-las ao seu lugar dentro da história de subjetividade da pessoa”

(Mitchell, 1979, p. 48).

Mitchell também assinala que a grande diferença na teoria da sexualidade de Freud é que ele não aceitou a noção de sexualidade pronta, “completa em si mesma”. Para Freud, a sexualidade era uma unidade complexa, “(...) ele descobriu que a própria sexualidade “normal” assumia a sua

forma somente após percorrer um caminho longo e sinuoso” (Mitchell, 1979, p.

39). Esse caminho está descrito nas fases do desenvolvimento psicossexual, e o que é notório na obra de Freud é o fato de ele se propor a um diálogo freqüente com a sua obra. Em relação ao desenvolvimento psicossexual, por exemplo, não foi desde o primeiro esboço nos “Três ensaios” que ele estabeleceu uma relação direta entre castração e complexo de Édipo.

É importante destacar que, embora o marco referencial sobre o estudo da sexualidade seja a publicação do texto “Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, um estudo que fez toda a diferença na elaboração freudiana sobre a sexualidade foi o Caso Dora. Segundo Celes (1995), a análise e a redação desse caso contribuíram significativamente para a elaboração do pensamento de Freud sobre a sexualidade. Celes cita a correspondência entre Freud e Fliess em 1899, em que o primeiro informava ao segundo suas intenções de escrever sobre o material que colhera pensando em uma teoria

da sexualidade. Em 1900, o tratamento de Dora, de outubro a dezembro, vem oferecer subsídios para a posterior publicação do “Caso Dora” e “Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, ambos em 1905 (Celes, 1995).

Mais próximo do tema deste trabalho, Mitchell (1979) aponta que se há interesse por compreender e assim recusar a opressão da mulher, não se pode negligenciar os estudos psicanalíticos de Freud, que contribuíram para a compreensão da feminilidade. Ao fazer esse estudo, a autora contextualiza os preceitos da psicanálise, para, então, discutir a feminilidade dentro dessa estrutura: “a despeito de como tenha sido usada, a Psicanálise não é uma

prescrição para uma sociedade patriarcal, mas uma análise de uma sociedade patriarcal” (Mitchell, 1979, p. 17). Cesarotto (2004) propõe, da mesma forma,

não só a contextualização do texto freudiano, mas uma atualização do texto. Diz ser necessário “(...) praticamente escrevê-lo outra vez, incorporando, à

leitura teórica, as mutações da contemporaneidade”, pois “a economia libidinal de cada época reflete o regime das satisfações, sempre historicamente determinadas” (Cesarotto, 2004, p. 427).

Mitchell (1979) destaca inicialmente o inconsciente como responsável pela aquisição das leis da sociedade. O inconsciente é considerado um conceito fundamental na Psicanálise, designando um sistema psíquico com funcionamento próprio. Seu conteúdo são sentimentos, memórias, desejos e conteúdo recalcado manifestados através de chistes, lapsos de linguagem, sintomas, sonhos (estes, considerados como a porta de entrada para a descoberta do inconsciente) e atos falhos. Freud não foi o primeiro a falar do inconsciente, mas foi o primeiro a dar-lhe o sentido de “gestor” do

comportamento, impondo a esses conteúdos uma lei, uma ordem. Assim, traz a desconcertante afirmativa de que o eu não é o senhor em sua própria casa (Freud, 1915). A partir da determinação de que a vida sexual se Inicia na Infância, “(...) e que a função sexual nesta fase se define por uma atividade a

obter prazer em qualquer parte do corpo, Freud vincula a sexualidade ao campo inconsciente e a desvincula do determinismo biológico da reprodução”

(Bahia, 2004, p. 351). Temos, então, o vínculo de dois conceitos fundamentais na psicanálise: inconsciente e sexualidade. Com o destaque dado ao significado da sexualidade na vida humana, juntamente com a descoberta da

“(...) natureza da vida mental inconsciente e as leis particulares que governam o seu funcionamento” (Mitchell, 1979, p. 27), encontramos os subsídios

necessários para compreender a teoria freudiana sobre a feminilidade e a sexualidade feminina.

A partir dessa explanação, propomos uma contextualização da obra de Freud e sua vida, privilegiando sua relação com as mulheres que dela fizeram parte.

2.2.1- Freud e as mulheres – sua vida e sua obra

Ao abordar a psicanálise de Freud, Mitchell (1979) chama a atenção para a importância de se contextualizar sua teoria num ambiente histórico- cultural e também ideológico. Salienta que “(...) precisamos conhecer as

circunstâncias históricas de seu desenvolvimento, prIncipalmente para não as limitar a tais circunstâncias” (Mitchell, 1979, p. 22). Falar de conceitos tais,

como “inveja do pênis”, “mulher fálica”, só faz sentido no contexto psicanalítico, considerando ainda o reconhecimento de Freud de que a sociedade e a ideologia são patriarcais. Gay, ao descrever Freud inserido em seu contexto, descreve-o como

(...) um inflexível cavalheiro do século XIX. Nunca adaptou suas maneiras antiquadas a uma nova era, e tampouco seus ideais igualmente antiquados, sua forma de falar e escrever, seus trajes e – boa parte do tempo – até mesmo sua ortografia. Não gostava de rádio nem de telefone. Achava absurda a discussão sobre questões morais, visto que o decente ou indecente, o certo ou o errado são, afInal de contas, absolutamente óbvios. Em suma, ele nunca vacilou em sua adesão a uma era que se tornava histórica diante de seus olhos. (Gay, 1989, p. 460)

Continuando essa contextualização, Gay remete-nos à vida do próprio Freud ao nos apresentar a vida de um homem continuamente permeada por mulheres, seja no universo pessoal, em que merecem destaque sua mãe, sua ama de leite, sua sobrinha Pauline, suas irmãs, sua esposa e grande paixão Martha Bernays, sua cunhada Minna Bernays, suas filhas, principalmente Anna; seja ambiente profissional, como mestre interlocutor de Karen Horney, Jeanne Lampl-de Groot, Helene Deutsch, Marie Bonaparte, Joan Riviere, Ruth Mack Bruns-wick, dentre outras; ou como analista dos casos clínicos de Hilda Doolittle, Anna O., Dora (Gay, 1989).

Em relação às mulheres presentes na vida de Freud, Bertin observa a distinção que ele faz em relação às mulheres presentes em sua obra e as mulheres da sua família. A autora descreve a dificuldade de Freud em imaginar que as mulheres de sua família fossem também atormentadas por questões sexuais, embora tenha se proposto a analisar a própria filha, Anna Freud. Nesse sentido, faz uma conexão entre a imagem dessas mulheres e o homem tradicional que Freud foi:

A imagem das últimas (mulheres de sua família) em sua correspondência ou em suas conversas com os amigos, seus sentimentos com relação a elas são os de um filho calmo, muito submisso ou de um pai de família com autoridade suave, que nada confunde. Conduz sua vida de acordo com os princípios da moral mais rígida e mais tradicional. O respeito pelas convenções parece para ele um meio de afirmar seu lugar na sociedade. (Bertin, 1990, p. 234)

Da mesma forma, Nunes aponta que

(...) a resistência de Freud a reconhecer o papel da cultura na construção dos ideais de masculinidade e feminilidade é, de certa forma, bastante circunscrita a essa questão da diferença entre homens e mulheres e de certo modo sintomática de sua representação de mulher. (Nunes, 2003, p. 189)

É possível estabelecer, portanto, um diálogo entre a vida de Freud e sua obra. Quando encontramos, por exemplo, ao longo de sua obra, bem como em correspondências e outras publicações, sua insatisfação em relação ao

conhecimento desenvolvido sobre a sexualidade feminina, podemos fazer uma leitura relacional entre sua postura de vida, suas crenças, seu ambiente, suas relações – intra e interpessoais – que muito colaboraram na construção dos seus escritos. No que diz respeito ao incômodo em relação à sua produção sobre a sexualidade feminina, Gay (1989) relata que, em 1928, Freud falou a Ernest Jones da intrigante sexualidade feminina, e sua insatisfação com o que havia construído até então. Confuso e intrigado com a sexualidade feminina, sem conseguir entendê-la, chama-a de o “continente negro”. Além dessa afirmativa, Gay nos traz outra máxima freudiana, em que se pergunta “O que quer a mulher?” Ao se fazer esse questionamento mostra um misto de defesa de um sexo insondável, desconhecido e, portanto, temido, mas também “(...)

um gesto de impotência, uma medida de sua insatisfação com as lacunas de sua teoria” (Gay, 1989, p. 455).

Mesmo com esse misto de insegurança e insatisfação, Freud não desistiu de entender e solucionar o enigma da feminilidade. Afirma que “(...) a

psicanálise não tenta descrever o que é a mulher – seria esta uma tarefa difícil de cumprir –, mas se empenha em indagar como é que a mulher se forma”

(Freud, 1933, p. 117). Assim, cita a importante contribuição de psicanalistas mulheres que começaram a trabalhar a questão, atribuindo-lhes responsabilidade e maiores possibilidades de entender o universo feminino.

Mesmo “dividindo” essa responsabilidade e atividade de entender como a criança bissexual se transforma em homem ou mulher, Freud nunca desistiu de estudar e entender o continente negro. É possível traçar em sua obra os

vários escritos, as idas e vindas que faz ao longo da vida. Vejamos, então, um pouco desse percurso na construção de uma sexualidade feminina.

2.2.2- Sexualidade feminina

No texto “Sexualidade Feminina”, de 1931, Freud inicia relembrando o complexo de Édipo, como ele acontece no menino e na menina – considerados por ele como equivalentes até 1924. Destaca logo de início o fator complicador do desenvolvimento da sexualidade feminina “(...) pelo fato de a menina ter a

tarefa de abandonar o que originalmente constituiu sua principal zona genital – o clitóris – em favor de outra nova, a vagina” (Freud, 1931, p. 259). O próprio

Freud já tinha alertado sobre esse fato em 1905, nos “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, mas acrescenta agora mais um complicador: a troca do primeiro objeto amoroso, a mãe, pelo pai. Em “Sexualidade Feminina”, Freud passa a atribuir a verdadeira importância à fase pré-edipiana na menina. Resumindo essas questões, “(...) à mudança em seu próprio sexo deve

corresponder uma mudança no sexo do seu objeto” (Freud, 1931, p. 263).

Em relação à bissexualidade infantil, Freud considera que ela está presente de forma muito mais clara nas mulheres. Isso se deve justamente a um dos fatos relatados anteriormente: possuir duas zonas sexuais, a vagina, considerada como órgão genital propriamente dito, e o clitóris, que seria análogo ao órgão masculino (Freud, 1931).

Encontramos na obra de Freud, vários escritos sobre a sexualidade. Da mesma forma, vários são os autores que criticam sua obra e a forma como

abordou a sexualidade. Não é objetivo do presente trabalho rever toda a construção freudiana da sexualidade humana, tampouco da sexualidade feminina. Portanto, traçaremos agora os destinos da sexualidade feminina propostos por Freud no texto “Sexualidade Feminina” (1931), e retomados por ele em “Feminilidade” (1933).

Como descrito acima, em “Sexualidade Feminina’, Freud se atenta para a fase pré-edipiana na menina e sua relação com a mãe. A partir dela, o complexo de castração na mulher tem efeitos completamente diferentes do homem, e é justamente esse resultado que Freud trabalha em três linhas de desenvolvimento sexual possível para as mulheres. Prates (2001) descreve a construção da feminilidade como um verdadeiro desafio, em que a mulher precisa “(...) lidar ao mesmo tempo com o falicismo, necessário para afastá-la

da passividade diante da mãe, e a retomada, a posteriori, de uma passividade especificamente feminina que a libere do “complexo de masculinidade” (Prates,

2001, p. 42). Vejamos então, essas três possibilidades.

O primeiro destino, a partir da descoberta da falta de um pênis na mãe, levaria ao abandono dos impulsos sexuais, instalando-se a frigidez (Silva, 2004). Conforme Freud, acontece “(...) uma repulsão geral à sexualidade. A

menina, assustada pela comparação com os meninos, cresce insatisfeita com seu clitóris, abandona sua atividade fálica e, com ela, sua sexualidade em geral” (Freud, 1931, p. 264). A menina viveu até essa descoberta, de modo

masculino, ou seja, ativamente, obtendo prazer da excitação do seu clitóris. A partir da constatação da falta e conseqüente comparação com o “equipamento muito superior do menino”, a menina modifica seu amor próprio, “(...) renuncia

à satisfação masturbatória derivada do clitóris, repudia seu amor pela mãe e, ao mesmo tempo, não raro reprime uma boa parte de suas inclinações sexuais em geral” (Freud, 1933, p. 126). A constatação da castração materna faz com

que a menina abandone a mãe como seu objeto de amor, precisando assim, ressignificar “(...) sua falta de pênis como uma falha em relação à mãe” (Prates, 2001, p. 42). Até então, “(...) a menina imaginava, na vertente passiva, ser o

falo da mãe, aquilo que a completava; e na vertente ativa, demandava da mãe o falo que supunha que tivesse” (Prates, 2001, p. 42).

O segundo destino acontece a partir da identificação da menina com o pai, provocando um complexo de masculinidade (Silva, 2004). Acontece, nesse caso, uma recusa ao reconhecimento do “(...) fato indesejado, e,

desafiantemente rebelde, até exagera sua masculinidade prévia, apega-se à sua atividade clitoridiana e refugia-se numa identificação com sua mãe fálica ou com seu pai” (Freud, 1933, p. 129). Esse complexo também pode “(...) resultar numa escolha de objeto homossexual manifesta” (Freud, 1931, p. 264). A partir

da sua masculinidade ameaçada, a menina se agarra à esperança de conseguir um pênis e tornar-se um homem (Freud, 1931). Em 1933, Freud descreve uma quantidade superior de atividade, comparada à atividade masculina, que barra a passividade que levaria à feminilidade. Em algum momento, a menina precisa tomar seu pai como objeto, entretanto, depois de um inevitável desapontamento com o pai, ela se vê forçada a voltar ao complexo de masculinidade anterior.

O último destino é considerado como a atitude feminina normal. Ao escolher o pai como objeto, a menina encontra o caminho para a forma

feminina do complexo de Édipo (Freud, 1931). Prates (2001) descreve que, a partir do abandono da masturbação clitoridiana e conseqüente renúncia a uma atividade considerada masculina, há um domínio da passividade, em que o pai torna-se alvo. No dizer de Freud,

o desejo que leva a menina a voltar-se para seu pai é, sem dúvida, originalmente o desejo de possuir o pênis que a mãe lhe recusou e que agora espera obter de seu pai. No entanto, a situação feminina só se estabelece se o desejo do pênis for substituído pelo desejo de um bebê, isto é, se um bebê assume o lugar do pênis, consoante uma primitiva equivalência simbólica. (Freud, 1933, p. 128)

Essa escolha dará acesso à feminilidade (Silva, 2004). O complexo de castração força a menina a ligar-se ao pai, estabelecendo a relação edipiana. Embora Freud (1931) não considere que exista resolução para o complexo de Édipo feminino, este é o melhor caminho para a conquista da maternidade e do casamento.

Ainda considerando Freud, mas não se trata agora especificamente da sexualidade feminina, Vergote (2001) aponta a impossibilidade da satisfação pulsional sexual. Em seus escritos, relembra as considerações de Freud a partir da constatação da impossibilidade da simples satisfação da pulsão sexual, inscrevendo também três possibilidades de resolução. A primeira, seria a responsável pelas perversões e crimes, pois seria dado livre curso aos impulsos sexuais humanos, a passagem ao ato propriamente dita. A segunda, se dá a partir do recalcamento da “(...) parte da pulsão sexual que a moral, a

sociedade e o cuidado consigo mesmo proíbem satisfazer: isso conduzirá à psicopatologia” (Vergote, 2001, p. 164). E por fim, a sublimação de

(...) uma parte importante do impulso da pulsão sexual, orientando-a para os valores culturais; mais precisamente, (...), transformando uma parte de pulsão sexual em atividades que têm valor cultural: Interesse Intelectual, trabalho profissional que pratica com prazer, criação e gozo artísticos, religião, formação de um comportamento moral. A sublimação deve, portanto, salvar o homem da psicopatologia de natureza neurótica. (Vergote, 2001, p. 164)

Freud (1908) chama de sublimação a capacidade que o homem tem de

“(...) trocar seu objeto sexual original por outro, não mais sexual, mas psiquicamente relacionado com o primeiro” (Freud, 1908, p. 174). Em 1908,

Freud já se referia à dependência da sociedade da repressão pulsional. Aponta que essa repressão contribui para o “(...) acervo cultural comum de bens

materiais e ideais” (Freud, 1908, p. 173).

No contexto social, acredita-se “(...) não existir maior ameaça que se

possa levantar contra sua civilização do que a possibilidade de as pulsões sexuais serem liberadas e retornarem às suas finalidades originais” (Freud,

1916, p. 36). Para evitar essa ameaça, é exigido do homem um padrão único de conduta sexual, o que é considerado por Freud (1908) como uma grande Injustiça social. As pulsões sexuais são sublimadas, têm suas finalidades sexuais desviadas para outras, que sejam mais elevadas socialmente. No entanto, Freud alerta para a instabilidade desse desvio, pois existe o risco

dessas pulsões sexuais se rebelarem contra esse destino civilizado. (Freud, 1916)

Façamos agora uma incursão sobre a sexualidade relacionada à religião católica.