• Nenhum resultado encontrado

“... criatividade é a essencialidade do humano no homem” (FAYGA OSTROWER, 1977, p.166).

A temática criatividade tem sido foco de discussões epistemológicas nas últimas décadas. A criatividade tem seu conceito dependente de diferentes pontos de vista dos universos empíricos ou metafóricos (AQUINO, 2012), e é possível ser abordada por diferentes perspectivas (VIRGOLIM, 2007).

Segundo Nakano e Weschsler (2007) a criatividade por muito tempo foi confundida com dom, como se fosse uma característica de poucos indivíduos que a teriam mais desenvolvida que outros e que, teria as belas-artes o domínio da expressão criativa (ALENCAR; GALVÃO, 2007). Esse mito de valorização da criatividade na área da Arte, expressa pelo intenso experimentalismo, teve o papel de divisor das fases modernistas e pós-modernistas da cultura contemporânea (LOSADA, 2007).

Grandes teóricos da Psicologia se ocuparam de sua análise apresentando resultados de pesquisas empíricas e teorias nos mais variados aspectos do campo da criatividade, da conceituação à possibilidade de melhora do desempenho criativo dos indivíduos (SANTOS, 2013).

Guilford em 1950 (apud VIRGOLIM, 2007), em seu Modelo de Inteligência, afirma que a criatividade está intimamente ligada ao pensamento divergente, que é a capacidade de inventar novas respostas. Ele apresenta a originalidade, fluência e a flexibilidade como características do pensamento criativo divergente (ALENCAR, 1986). A originalidade é a característica fundamental do pensamento criativo. Consiste na produção de novas soluções, novas formas, novas expressões. A fluência é a capacidade para imaginar e produzir muitas respostas para um problema, para uma situação, e implica uma grande mobilidade de pensamento. A flexibilidade é um pensamento versátil, resultante dos anteriores, flexível, que permite a descoberta de várias soluções para um problema.

Torrance, pesquisador da área da Psicologia, ao conceituar criatividade, acrescentou aos aspectos intelectuais, os aspectos da expressão das emoções, da expressão espontânea, da capacidade de fantasiar, de olhar o mundo, da habilidade de produzir humor e correr riscos (VIRGOLIM, 2007).

O filósofo e educador austríaco Lowenfeld, contribuiu significativamente para conceituação da criatividade na área artística, por meio de seus testes visuais e de manipulação de objetos em que o produto artístico, se apresentava como meio para se compreender o desenvolvimento individual e de desenvolver a consciência estética e criadora do indivíduo através do desenho (SANTOS, 2013).

Na década de 1980, Amabile incluiu fatores cognitivos, motivacionais, sociais e de personalidade como componentes da criatividade. Para essa estudiosa, o talento específico em uma área, a capacidade criativa e a motivação é que produzem um produto criativo (AQUINO, 2012).

Csikszentmihalyi, em 1988, afirmou que o fenômeno da criatividade acontece na interação entre os pensamentos do sujeito e o contexto social, cultural e histórico em que ele vive. A criatividade seria então o produto de três forças: o campo (a instituição social), o domínio (campo cultural) e o indivíduo (ator da mudança) (VIRGOLIM, 2007; SANTOS, 2013).

Para Renzulli (1994) a criatividade é um potencial que todos têm e que não se restringe a determinada área do saber como a Arte, mas que se apresenta nas atividades que envolvem o desenvolvimento de ideias ou produtos, aplicáveis às situações reais, interligados ao conhecimento e ao processo de pensamento.

Lubart (2007, p.16) explicita a definição consensual mais aceita entre os pesquisadores sobre o conceito de criatividade: “[...] a capacidade de realizar uma produção que seja ao mesmo tempo nova e adaptada ao contexto na qual ela se manifesta”. Conforme esse autor, a criatividade é dependente da inteligência, do conhecimento, do estilo cognitivo, da personalidade, da motivação e do contexto ambiental.

Outra obra relevante para a compreensão das capacidades cognitivas do ser humano é a de Gardner (1995) intitulada Inteligências Múltiplas. Essa abordagem resume estudos sobre os aspectos multifacetados das inteligências humanas como a inteligência linguística, lógico matemática, espacial, musical, corpóreo-cinestesica, interpessoal, intrapessoal e naturalista. Para Gardner, essas inteligências coexistem em diferentes proporções em cada indivíduo, com algumas mais acentuadas que outras para diferentes atividades. Esse autor relaciona a criatividade a várias manifestações da inteligência, principalmente a capacidade de resolver problemas e elaborar produtos. Osinski (2001, p.103), se referindo ao pensamento de Gardner, destaca: “O autor coloca, num mesmo grau de importância, aptidões artísticas,

físicas e intelectuais, igualando raciocínio lógico e competência linguística com as habilidades artísticas, corporais e musicais”.

As teorias acerca da criatividade foram respaldadas pela expansão do conhecimento sobre o cérebro proporcionado pela aplicação de tecnologias desenvolvidas no século XX. Os estudos científicos a respeito do cérebro revelaram revolucionárias descobertas no campo da Neurologia e da Psicologia que permitiram o conhecimento científico sobre o seu funcionamento e sobre como ocorre o processo criativo (TEIXEIRA, 2002).

Assim, a criatividade perpassa, pela educação do indivíduo com Altas Habilidades/Superdotação, como instrumento de expressão, investigação, compreensão e contextualização histórico-cultural desse indivíduo, e que se manifesta nas ideias ou produtos desenvolvidos por eles (LOSADA, 2007) e conforme pontuam Alencar e Galvão (2007, p. 103): “[...] não se limitava apenas às artes, podendo permear, em maior ou menor grau, as diferentes dimensões do fazer humano”.

Consequentemente, essas novas visões influenciaram a queda da supremacia das disciplinas de Matemática, de Linguagem Escrita e Oral dentro da escola que, juntamente com a valorização da História e com o reconhecimento da produção artística como patrimônio cultural contribuíram para que a disciplina de Arte passasse a ser mais valorizada e vista com mais atenção no contexto escolar (FUSARI; FERRARI, 2001).

Outro alavanque que muito influenciou a percepção diferenciada do ensino da Arte na escola, foi a ideia de que a criatividade pode ser ensinada e desenvolvida e que é função das práticas pedagógicas do ensino da Arte procurar oferecer ambientes propícios para esse desenvolvimento, privilegiando a espontaneidade, autoliberação e originalidade em atividades de produção, reflexão e apreciação de obras artísticas (BARBOSA, 1985).

Conforme Losada (2007), citando Gombrich (1986), a criação artística é como qualquer ciência ou processo de descoberta. O artista em um exercício experimental contínuo testa as possibilidades expressivas, em diferentes materiais e testa também o limite do conceito de Arte. Desta forma, o produto artístico acontece pelo pensamento hipotético-dedutivo em interação com materiais, ideias e processos mentais e se revela na produção criativa. A essência do ensino da arte é então de fazer pensar em termos de interação e criatividade (BARBOSA, 1985).

Portanto, as teorias advindas da área da Psicologia influenciaram a percepção sobre a criatividade na expressão artística e no ensino da Arte e também contribuíram para novos direcionamentos sobre o estudo da criatividade na esfera das habilidades superiores.

Portanto, percorrer os caminhos conceituais do universo do ensino voltado ao estudante com Altas Habilidades/Superdotação, a fim de compreender as conceituações e discrepâncias entre Altas Habilidades/Superdotação, Arte e Criatividade, possibilita o entendimento do conjunto de conhecimentos que embasam e auxiliam esse estudo. Há a necessidade de compreendê-los, visto que esses conceitos se entrelaçam e muitas vezes se sobrepõem uns aos outros, dificultando o entendimento e a prática de ações pedagógicas por eles permeadas.

2 DEFINIÇÃO DO PROBLEMA

O Atendimento Educacional Especializado ao Estudante com Altas Habilidades/Superdotação foi implementado pela Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal no ano de 1976. A partir do ano 2000, o Modelo de Enriquecimento Escolar proposto pelo educador Joseph Renzulli (RENZULLI E REIS, 1997) foi adotado como referencial teórico e metodológico para o desenvolvimento das políticas educacionais e das práticas pedagógicas dirigidas ao estudante superdotado no âmbito distrital (ASPESI, 2003; TENTES, 2011).

Há entendimento entre os estudiosos da área de que o atendimento ao estudante utilizando a referida proposta teórica e metodológica tenha sido consolidada no Distrito Federal (ASPESI, 2003; CHAGAS, 2007; MAIA-PINTO, 2012; GUIMARAES, 2007; PEREIRA, 2007; TENTES, 2011). Os trabalhos de pesquisa desenvolvidos no contexto do AEE-AH/SD, os documentos normativos da SEEDF acerca desse atendimento, a proposta curricular, bem como inúmeras publicações científicas que destacam os estudantes superdotados do Distrito Federal suscitam reflexões sobre o impacto dos pensamentos de Joseph Renzulli no atendimento aos estudantes superdotados das escolas públicas e particulares.

Transcorridos catorze anos de aplicação do SEM na rede de ensino público do Distrito Federal, há que se compreender o impacto e a influência do mesmo nesse contexto. Assim, é objeto dessa investigação conhecer a percepção dos professores que atuam em Sala de Recursos com alunos superdotados, acerca do atendimento e do SEM, a partir das seguintes questões de pesquisa: 1) Quais as percepções dos professores que atuam em Sala de Recursos sobre o atendimento oferecido aos estudantes com Altas Habilidades/Superdotação na Rede Pública de Ensino do Distrito Federal? 2) Quais as percepções dos professores que atuam em Sala de Recursos sobre o Modelo de Enriquecimento Escolar adotado como referencial teórico e metodológico ao AEE-AH/SD? 3) Quais as semelhanças e diferenças entre as percepções de professores das Salas de Recursos da área de Talento Artístico e da área Acadêmica em relação ao AEE-AH/SD e em relação ao SEM? 4) Quais elementos teóricos e metodológicos do SEM estão presentes nas percepções e na prática pedagógica dos professores do AEE-AH/SD?

Acredita-se que os resultados desse estudo proporcionarão reflexões sobre o Atendimento Educacional Especializado e suas contribuições para o

desenvolvimento de estudantes talentosos. Almeja-se, portanto, suscitar questionamentos que permitam compreender o impacto do SEM no trabalho pedagógico desenvolvido por professores que atuam na Sala de Recursos e assim contribuir com subsídios para a formação continuada dos mesmos.

2.1 OBJETIVO GERAL

Investigar as percepções de professores que atuam em Salas de Recursos acerca do Atendimento Educacional Especializado ao Estudante com Altas Habilidades/Superdotação e do Modelo de Enriquecimento Escolar, identificando os elementos teóricos e metodológicos presentes na prática docente.

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

 Investigar as percepções de professores que atuam em Sala de Recursos sobre o atendimento oferecido aos estudantes com Altas Habilidades/Superdotação na Rede Pública de Ensino do Distrito Federal.  Investigar as percepções de professores que atuam em Sala de Recursos

sobre o Modelo de Enriquecimento Escolar adotado como referencial teórico e metodológico no atendimento.

 Identificar semelhanças e diferenças entre as percepções de professores que atuam em Sala de Recursos da área de Talento e da área Acadêmica em relação ao Atendimento Educacional Especializado ao Estudante com Altas Habilidades/Superdotação e em relação ao Modelo de Enriquecimento Escolar.

 Identificar os elementos teóricos e metodológicos do Modelo de Enriquecimento Escolar presentes na prática docente de professores do Atendimento Educacional Especializado ao Estudante com Altas Habilidades/Superdotação.

3 METODOLOGIA

3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA

Para analisar as percepções de professores da Sala de Recursos acerca do Atendimento Especializado aos Alunos com Altas Habilidades /Superdotação (AEE- AH/SD) e também acerca do Modelo de Enriquecimento Escolar (SEM), esse estudo adotou uma abordagem de pesquisa de métodos mistos, associando as abordagens qualitativa e quantitativa, por meio da convergência paralela dos dados acessados, utilizando a análise dos documentos normativos e operacionais do atendimento, questionário, entrevistas semiestruturadas e observação da dinâmica dos trabalhos desenvolvidos em Salas de Recursos.

O procedimento para a realização dessa pesquisa baseou-se na convergência do método misto orientadas e descritas por Creswell e Clark (2013). A escolha por essa abordagem se justificou pelo fato da convergência de dados possibilitar o trabalho com informações advindas de diferentes ângulos de observação e de serem usadas para proporcionar mais evidências e dar mais visibilidade ao problema de pesquisa (CRESWELL, 2010; CRESWELL; CLARK, 2013). As diferenças entre abordagem qualitativa e quantitativa não impedem que ambas sejam usadas numa mesma pesquisa, pois se mostram como suportes complementares para a apresentação de um resultado relevante para o contexto investigado, conforme afirma Melo (2013).

3.2 PARTICIPANTES

Foi utilizada uma amostra de conveniência composta por 30 professores, destes, 24 foram convidados a responderem um questionário e seis participaram da entrevista, todos atuantes em Sala de Recursos do Atendimento Educacional Especializado aos Estudantes com Altas Habilidades/Superdotação, da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, sendo 24 (80%) professores do gênero feminino e seis (20%) do gênero masculino. O critério de inclusão foi o professor atuar na área de sua formação acadêmica e com o tempo de trabalho com superdotados, de pelo menos um ano letivo. A média de idade dos pesquisados era de 43 anos, variando entre 34 anos e 55 anos. Em média os participantes informaram ter

experiência de sete anos e quatro meses de atuação na Sala de Recursos, variando de um ano (n= 7) a 20 anos (n= 01). As áreas de formação informadas referem-se: professores da área de atividades (n=7); área de Arte (n=6); área de exatas (n=5); área de humanas (n=3), área de códigos e linguagens (n=4) e professores itinerantes (n=5).

Os professores participantes pertenciam a nove escolas situadas em diferentes regiões administrativas do Distrito Federal, a saber: Guará, Núcleo Bandeirante, Plano Piloto, Cruzeiro, Taguatinga, Ceilândia, Sobradinho, Samambaia e Gama.