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2 ASPECTOS ESTRUTURAIS DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS NO PLANO

3.7. Critério espacial

O critério espacial contido na hipótese de incidência tributária, ao lado do critério material e temporal, trará as notas que permitirão a identificação do local

299 Essa natureza declaratória, como já dissemos, não afasta o caráter prescritivo inerente a todos os enunciados e normas jurídicas que integram o sistema do direito positivo.

em que se considera ocorrido o fato jurídico tributário a fim de que irrompa a relação jurídica tributária no processo de positivação do direito.

De logo vale destacar que o aspecto espacial da hipótese de incidência tributária não se confunde com o campo de eficácia da lei tributária, muito embora, com frequência, se confundam na dicção legal. O campo de eficácia da lei tributária deve ser entendido como o campo territorial dentro do qual determinada norma esta apta a produzir efeitos.

Em um Estado Federal, como o Brasil, onde a competência tributária foi distribuída levando-se em conta, não apenas as materialidades, mas também o princípio da territorialidade, tem-se que o campo de validade das leis de cada ente tributante vai até os limites do seu território, não podendo alcançar fatos ocorridos fora destes limites territoriais (ordens parciais), salvo diante da existência de elementos de conexão válidos no sistema.

A Constituição Federal não traz indicações expressas a respeito de onde deverá considerar-se ocorrida a materialidade do ISS, papel este que compete à lei complementar tributária, seja para fins de dispor sobre normas gerais de direito tributário, seja para prevenir conflitos de competência (art. 146, II e III, da CF/88).

Contudo, por guardar íntima relação com o critério material da hipótese de incidência, já que não se pode cogitar da realização de um fato desprendido das coordenadas de tempo e de espaço, também a materialidade é que dará ao legislador os parâmetros e limites para que defina onde poderá considerar ocorrido determinado fato.

Paulo de Barros Carvalho, ao tratar do critério espacial, também entende a sua definição como uma opção do legislador300, variando, apenas a técnica legislativa atinente ao grau de elaboração do critério espacial da hipótese tributária. Segundo o mestre da Escola Paulista, esses indicadores hão de guardar uma das três formas compositivas, no que se refere ao grau de elaboração desta coordenada:

a) hipótese cujo critério espacial não faz menção a determinado local para a ocorrência do fato típico;

b) hipótese em que o critério espacial alude a áreas específicas, de tal sorte que o acontecimento apenas ocorrerá se dentro delas estiver geograficamente contido;

c) hipótese de critério espacial bem genérico, onde todo e qualquer fato jurídico, que suceda sob o manto da vigência territorial da lei instituidora, estará apto a desencadear seus efeitos particulares.301

Quando tratamos do critério material do ISS, quisemos deixar claro que este é composto por um verbo pessoal conjugado ao complemento serviços de qualquer natureza, com as ressalvas já feitas à extensão desta expressão.

A questão que nos causa certo desconforto diz respeito ao motivo pelo qual foi adotada pela doutrina a ênfase na atividade (processo) de prestar o serviço como a única constitucionalmente possível para se definir o critério espacial do ISS.

Isso porque, como vimos, não concebemos a existência de uma prestação de serviço tributável, nos moldes já conceituados, sem que se cogite do resultado desta prestação, como um critério de conexão territorial (subjetiva) também possível.

São os dois pontos de vista a partir dos quais pode ser analisada a prestação: o do prestador do serviço e o do tomador do serviço, que se beneficia do resultado. Isso sem nos olvidarmos da opção possível – pelo legislador, pelo critério do local onde se executa efetivamente o serviço, revelando, neste caso a eleição de um critério de conexão material (objetivo). E a Constituição Federal não determina, em momento algum, que se dê prevalência a um em detrimento do outro.

Essa análise se dá em conformidade com o princípio da territorialidade, que se vale de elementos de conexão para vincular determinados fatos, pessoas, objetos, com um determinado ordenamento tributário. Segundo Alberto Xavier:

O elemento de conexão é o elemento da previsão normativa que, determinando a “localização” de uma situação da vida num certo ordenamento tributário, tem como efeito típico determinar o âmbito de aplicação das leis desse ordenamento a essa mesma situação.302

Diverge desse entendimento Ana Emília Cordelli Alves, para quem a limitação do legislador quanto à opção pelo chamado princípio da origem (ênfase no

301 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 272. 302 XAVIER, Alberto. Direito Internacional Tributário do Brasil. 5. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 2002,

prestador do serviço), onde a tributação recai sobre a fonte produtora do bem ou serviço, decorre da própria Constituição:

A opção da Constituição foi pelo ângulo do prestador do serviço, e não pelo ângulo do consumidor ou usuário do serviço. […]

O que isso significa? Significa que a Constituição adotou o critério, o princípio, da origem. O que autoriza a criar o ISS é o princípio da

origem. Ou seja, a prestação do serviço, o estabelecimento prestador e, portanto, a capacidade contributiva do prestador do serviço.303

E, mais adiante, conclui:

Na verdade, esse critério da origem só se confirma quando analisamos a tributação das exportações. Por quê? Porque quando vamos ao art. 156, §3º, II, da CF, está previsto que é possível ao legislador complementar excluir da incidência do ISS as exportações de serviços destinados a tomador ou usuário residente, domiciliado ou sediado fora do Brasil.304

Haveria algum impedimento constitucional ao legislador complementar para a adoção do princípio do destino, elegendo como critério de conexão o local do estabelecimento do tomador do serviço, ao invés do local do estabelecimento prestador ou do local da efetiva prestação, para a definição da hipótese de incidência do ISS?

Quer nos parecer que não. A preocupação está intimamente relacionada ao princípio da territorialidade e com a eleição de critérios de conexão válidos para localizar uma determinada situação da vida reveladora de capacidade contributiva, vinculando-a a determinado território.

Nos impostos de consumo, dentre os quais, como visto, está o ISS, Alberto Xavier observa que estes, geralmente, são lançados no país consumidor, revertendo em benefício dos Estados nos quais são consumidos os bens sobre que incidem (princípio do destino).305

303 ALVES. Anna Emilia Cordelli. ISS e lei complementar 116/2003. Revista de Direito Tributário, n. 92. São Paulo: Malheiros, p. 89-109, 2004, p. 91-92.

304 Ibid., p. 93.

305 XAVIER, Alberto. Direito Internacional Tributário do Brasil. 5. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.264.

Continua o autor justificando a opção por este técnica legislativa:

Precisamente por isso, o país de origem, isto é, o país no qual o bem foi produzido, procede normalmente, à restituição ou isenção do imposto no momento da exportação; e, por razões simétricas, o país do destino, onde o bem será consumido, institui um encargo compensatório sobre mercadorias importadas, em ordem de colocá-las em pé de igualdade com os produtos nacionais.306

A adoção desta sistemática que, como veremos, foi feita expressamente pelo ordenamento brasileiro, guarda íntima relação com o princípio da não- discriminação em razão da nacionalidade (residentes e não residentes).

Daí porque discordamos de Ana Emília Cordelli Alves quando justifica a adoção do princípio da origem em razão da prescrição contida no art. 156, §3º, II, da CF, que excepciona o princípio da origem.

Ora, a opção do legislador por isentar as exportações, ao contrário, demonstra que, nas relações internacionais (tanto na exportação, como na operação simétrica, que é a importação), é legítima a adoção do princípio do destino. Novamente, Alberto Xavier:

Pode, pois, concluir-se que, tal como sucede na circulação internacional de mercadorias, na circulação internacional de serviços optou-se pelo princípio do destino, tributando-se as “importações”de serviços em que os beneficiários são residentes no Brasil e exonerando-se as “exportações promovidas por prestadores no Brasil.

Essa posição, porém, não é assente na doutrina; daí a alguns doutrinadores se manifestarem contrariamente à constitucionalidade das normas que preveem a possibilidade de que seja instituído o ISS sobre as importações, como veremos adiante.

306 XAVIER, Alberto. Direito Internacional Tributário do Brasil. 5. ed. rev. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 265.