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O ISS sobre a importação de serviços e a Lei Complementar n 116/03

2 ASPECTOS ESTRUTURAIS DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS NO PLANO

4.2 O ISS sobre a importação de serviços e a Lei Complementar n 116/03

A previsão da tributação da importação de serviços pelo ISS foi introduzida no nosso sistema pela Lei Complementar n. 116/03, que estabeleceu no seu artigo 1º,§1º, o seguinte:

Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

§ 1º. O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País.

A complementação da regulamentação desta hipótese de incidência está no art. 3º, cujo caput, traz a regra geral a ser adotada quanto à definição do critério espacial, qual seja, o local do estabelecimento prestador, enumerando, nos XXII incisos que seguem as exceções a tal regra.

Pela leitura do caput do art. 1º acima transcrito, vemos que o legislador complementar não fez a opção pelo verbo que deve ser conjugado à materialidade possível do ISS, razão pela qual entendemos que caberá ao legislador municipal, quando da instituição do tributo, escolher o verbo que comporá o critério material da regra-matriz de incidência tributária do ISS.

Essa afirmação pode, a princípio chocar aos leitores e intérpretes menos atentos ou que se deixam levar por “fundamentos óbvios”, mormente quando a grande maioria da doutrina especializada insiste em afirmar que o critério material do ISS seja formado pela conjugação do verbo prestar ao complemento serviços de qualquer natureza.

Contudo, nos parece que não foi este o caminho trilhado pelo legislador complementar. Com efeito, o art. 1º da LC n. 116/03 utiliza-se da expressão prestação de serviços; não vemos aí a presença de qualquer verbo, senão do substantivo prestação aliado ao signo serviços. Ou seja, a definição contida na LC n. 116/03 restringe- se à materialidade, no sentido de atividade econômica passível de ser alcançada pelo ISS, mantendo-se assim conformidade com os preceitos constitucionais que limitam a competência tributária dos Municípios.

O evento eleito pelo legislador municipal deverá, portanto, colher, necessariamente aspectos atinentes a uma prestação de serviço. Contudo, esta pode ser alcançada tanto pelo fato de tomar serviços, quanto pelo fato de prestar serviços, já que estas atividades estão intimamente relacionadas com a materialidade constitucionalmente prevista.

A única diferença está na circunstância de quê, optando o legislador ordinário pelo verbo tomar, deverá prever, necessariamente os meios pelos quais o sujeito realizador do fato jurídico tributário deverá ressarcir-se do montante devido a título de tributo, a fim de que a tributação alcance a capacidade contributiva relativa ao ISS (normas de retenção ou ressarcimento).

Essas considerações revelam ainda maior importância no caso da incidência do ISS sobre a importação de serviços, prevista no inciso I, do art. 1º, da LC n .116/03, a qual entendemos perfeitamente compatível com o ordenamento jurídico pátrio, como tentaremos demonstrar.

O inciso I, do art. 1º da LC n. 116/03 estabelece que o ISS poderá incidir sobre a prestação de serviços provenientes do exterior ou cuja prestação tenha se iniciado no exterior do País.

Nesta situação, diferentemente do que ocorre nas prestações de serviço internas, nas quais tanto o prestador quanto o tomador do serviço estão submetidos ao ordenamento jurídico brasileiro (respeito o âmbito de validade espacial das normas expedidas por cada Município), podendo ser postos, destarte, no polo passivo da obrigação jurídica tributária, apenas o tomador do serviço poderá ser alcançado pelas normas do Município no qual estejam estabelecidos.

Daí porque o legislador ordinário ao instituir o tributo terá menor margem de liberdade, em comparação ao que ocorre nas prestações de serviço internas. É dizer, nestes casos, o evento descrito no antecedente da hipótese de incidência será tomar serviços ou, contratar uma prestação de serviços proveniente do exterior ou cuja prestação tenha se iniciado fora do território nacional.

Mantendo a coerência com esta diretriz, o legislador complementar, excepcionando a regra geral no que se refere ao local da prestação, traz a indicação do aspecto espacial como sendo o local do estabelecimento do tomador:

Art. 3º. O imposto considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:

I - do estabelecimento do tomador ou intermediário do serviço ou, na falta de estabelecimento, onde ele estiver domiciliado, na hipótese do §1º do art. 1º desta Lei Complementar;

A análise dos enunciados prescritivos relativos à incidência tributária do ISS incidente na importação de serviços nos permite concluir que, ao

contrário do que vem defendendo parte da doutrina, não se trata de imposto novo, de nova materialidade introduzida no sistema pela Lei Complementar n. 116/03.

Esta continua sendo a mesma, ou seja, a operação que tem por objeto uma prestação de serviços. O que difere em relação ao ISS incidente nas operações internas envolvendo serviços é apenas a ênfase dada pelo legislador complementar a alguns dos aspectos da regra-matriz, mais especificamente, o espacial e o pessoal.

Da forma como disciplinada a matéria pelo legislador complementar, nos parece que pretendeu alcançar duas situações possíveis relacionadas à importação de serviços: uma, a dos serviços cuja prestação foi integralmente realizada no exterior; e outra, a dos serviços cuja prestação se realizou em mais de uma etapa,sendo que, ao menos uma delas aconteceu no Brasil. Em ambos os casos, é indispensável a presença seja do tomador, seja do intermediário, no território nacional.

Para a compreensão hipótese de incidência do ISS prescrita na primeira parte do § 1º, do art. 156, da CF/88, se faz indispensável a construção do conteúdo semântico das expressões “serviços provenientes do exterior” e “serviços cuja prestação tenha sido iniciada no exterior”, a fim de podermos delimitar o alcance deste enunciado prescritivo, já que o legislador complementar nada mais dispôs sobre isso. Decerto, essa construção de sentido é papel do intérprete e aplicador da legislação tributária ante os preceitos constitucionais e infraconstitucionais conformadores da competência tributária.

Necessário, portanto, respondermos às seguintes questões: é possível falarmos em importação de serviços? Em que consistiria um serviço proveniente do exterior do País, cuja prestação tenha iniciado no exterior do País, para fins de tributação pelo ISS? Teria o legislador complementar criado uma nova materialidade para o ISS?

Partindo da premissa de que não houve inovação quanto à materialidade do ISS, que continua sendo a prestação de serviços, é possível (válida) a pretensão do legislador em alcançar fatos jurídicos tributários ocorridos além dos limites territoriais do ente tributante? Mais especificamente, é válida a pretensão de se tributar não residentes que não possuem estabelecimento prestador no Brasil, pelo ISS?

Enfocando, agora, o consequente da regra-matriz de incidência do ISS de que tratamos, como compatibilizar a compostura constitucional do tributo com o

aspecto pessoal (sujeito passivo) apontado pelo legislador complementar? Em outras palavras, é legítima a opção do legislador complementar por incluir no polo passivo da relação jurídica tributária o tomador dos serviços? Ou, ao assim proceder, o legislador teria violado o arquétipo constitucional do ISS, que impõe seja o contribuinte o prestador do serviço? Enfim, tal norma é compatível com o ordenamento jurídico brasileiro?

A esta tarefa, humildemente nos propomos, deixando claro que não temos qualquer propósito de esgotar o tema, mas, apenas, trazer algumas ideias que podem ser utilizadas para acalorar e instigar a discussão deste.

4.3 Conteúdo e alcance da expressão importação de serviços e a consagração do