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2 ASPECTOS ESTRUTURAIS DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS NO PLANO

3.8. Critério pessoal

No critério pessoal, encontraremos as notas que permitirão a identificação dos sujeitos que, uma vez realizado o evento previsto no antecedente da norma geral e abstrata e vertido ele na linguagem competente, constituindo o fato jurídico tributário, ocuparão os lugares sintáticos de sujeito ativo e sujeito passivo da relação jurídica tributária.

Dentro da estrutura da regra-matriz de incidência tributária tal como adotada no presente trabalho, o critério pessoal integra o seu consequente, prestando-se à identificação dos dois polos da relação jurídica tributária que surgirá quando da ocorrência no mundo social daquele evento descrito na hipótese de incidência normativa.

O critério material da hipótese, por ser composto necessariamente, por um verbo pessoal, de predicação incompleta é o quanto basta para que se identifique o realizador daquela conduta descrita no antecedente normativo. Neste sentido, José Roberto Vieira:

Alguns juristas questionam a ausência de um critério pessoal ou subjetivo no antecedente, pois o fato ali traçado sempre está preso a uma pessoa, remanescendo por conseqüência incompleto este seguimento da regra- modelo. […] Entretanto, parece-nos explicitamente admitida a existência deste aspecto subjetivo do fato descrito no suposto, quando se faz menção, no critério material, ao comportamento de pessoas, quando se requerer um verbo pessoal, e quando se repele qualquer verbo impessoal.307

Há outros, porém, como Sacha Calmon Navarro Coêlho308, que se posicionam no sentido de que a regra-matriz de incidência tributária na concepção de Paulo de Barros Carvalho, estaria incompleta, sendo imprescindível a presença de um critério pessoal autônomo no antecedente da norma jurídica tributária.

Nada obstante vermos como indispensável a indicação do sujeito realizador da conduta prevista na hipótese normativa, não vemos a necessidade de um

307 VIEIRA, José Roberto. A Regra-Matriz de Incidência do IPI. Texto e Contexto. Curitiba: Juruá, 1993, p. 64.

308 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 170.

critério pessoal autônomo na estrutura da regra-matriz de incidência tributária, como unidade mínima irredutível do deôntico.

Essa necessidade é suprida diante da exigência de que o verbo integrante do critério material seja um verbo pessoal, o que pressupõe necessariamente um sujeito que realize aquela ação expressa pelo verbo, tal como ocorre na maioria dos casos em que o sujeito passivo tributário identifica-se com aquele indivíduo que realizou a materialidade descrita no núcleo da hipótese de incidência (contribuinte).

Quanto ao sujeito ativo, não há dúvida de que é o ente político titular da competência tributária nos termos previstos pela Constituição Federal que tratou de reparti-la, cuidadosamente, entre os entes da Federação.

Há casos, porém, em que o próprio sujeito competente para a instituição do tributo atribui a sua exigibilidade a outra pessoa que, nos dizeres de Paulo de Barros Carvalho, pode ser uma pessoa jurídica pública ou privada, não vendo o autor óbice a que seja uma pessoa física, desde que desempenhe atividade exclusiva e de real interesse público309. Nestas hipóteses, estamos diante do fenômeno da parafiscalidade.

No caso do ISS, a titularidade pertence aos municípios, nos termos do art. 156, III, da CF/88. A competência do Distrito Federal para instituição deste imposto está prevista no art. 147, da CF/88, que também dispôs que caberá à União a competência para instituição desta exação em territórios federais que não sejam divididos em municípios310.

O sujeito passivo da relação jurídica tributária, por sua vez, a despeito de não ser tema pacífico na doutrina, é a pessoa que ocupa o polo passivo da relação jurídica tributária; é aquele a quem, uma vez ocorrido no mundo fenomênico fato jurídico descrito hipoteticamente na norma, fica obrigado ao pagamento do tributo ou ao cumprimento dos deveres instrumentais, ou ambos.

309 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 311. Eis a diferença entre competência tributária e capacidade tributária ativa. No primeiro caso, apenas as pessoas de direito público que são dotadas de competência para legislar, instituindo efetivamente tributos. No segundo, aquelas que, apesar de não terem a competência tributária, reúnem atributos, conferidos expressamente por lei, para integrar a relação jurídica tributária, no lugar sintático do sujeito ativo. 310 No Brasil, Fernando de Noronha era um território, mas, com a nova ordem instaurada pela CF/88, este

passou a integrar o Estado de Pernambuco; assim também Rondônia, que era território federal e, em 1981, foi transformado em Estado. Atualmente, não existe território federal, mas nada impede que possa ser criado.

Diferentemente do sujeito ativo, cuja determinação é expressa ou decorre diretamente da rígida distribuição da competência tributária pela Constituição, o sujeito passivo não está expressamente determinado no texto Constitucional, nada obstante a sua eleição deva ser sempre orientada pelos princípios e demais preceitos constitucionais e complementares, integrantes da norma de competência de cada tributo. Ou seja, a definição do sujeito passivo da obrigação tributária cabe ao legislador infraconstitucional, que deverá escolher dentre aquelas pessoas que apresentem conexão com o núcleo da hipótese de incidência (critério material), respeitado sempre o princípio da capacidade contributiva e vedação ao confisco.

Clara a lição de Paulo de Barros Carvalho, a propósito:

Sujeito passivo da relação jurídica tributária é a pessoa — sujeito de direitos — física ou jurídica, privada ou pública, de quem se exige o cumprimento da prestação: pecuniária, nos nexos obrigacionais; e insuscetível de avaliação patrimonial, nas relações que veiculam meros deveres instrumentais ou formais.311

E a relação entre este aspecto da hipótese de incidência e o princípio da capacidade contributiva, insculpido no art. 145, §1º, da CF/88 é condição indispensável para que se possa instituir validamente um tributo no ordenamento jurídico brasileiro. Luís Cesar de Souza Queiroz assevera, com propriedade:

Capacidade contributiva significa a existência de fato ou fatos que revelem sinais de riqueza por parte de alguém, decorrendo, portanto, para esse mesmo alguém, uma aptidão para entregar parcela da riqueza (de que é titular) ao Estado.312

Essa relação necessária entre o princípio da capacidade contributiva (em sentido absoluto) e o sujeito passivo da norma jurídica impositiva também foi claramente captada por Geraldo Ataliba que, definindo imposto, mostra que é

tributo não vinculado, ou seja, tributo cuja h.i. consiste na conceituação legal dum fato qualquer que não constitua uma atuação estatal (art. 16 do CTN); um fato da esfera jurídica do contribuinte. Adiante, complementa

311 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 296. 312 QUEIROZ, Luís Cesar Souza de. Sujeição passiva tributária. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 167.

que “esse fato é indicativo de capacidade contributiva de alguém que será, precisamente, posto na condição de sujeito passivo.313

Entendemos como Maria Rita Ferragut, que não há, no plano constitucional, qualquer norma que indique quem deva ser o sujeito passivo de uma relação jurídica tributária.314 Os princípios constitucionais e demais enunciados integrativos da norma de competência, como vimos, traçam os limites dentro dos quais poderá andar o legislador infraconstitucional no exercício desta competência. Apenas isso. Nas palavras da autora:

Desconhecemos a existência de qualquer norma constitucional que indique quem deva ser o sujeito passivo de uma relação jurídica tributária. Por isso entendemos que a escolha é infraconstitucional. […] Como todas as materialidades referem-se a um comportamento de pessoas (um fazer, um dar, um ser) elas pressupõem a existência do realizador da conduta humana normativamente qualificada. É ele, certamente, que praticará o fato passível de tributação, manifestador de riqueza. Mas não é ele, obrigatoriamente, quem deverá manter uma relação jurídica tributária com o Fisco.315

O ISS não escapa a esta constatação. O que há no texto constitucional é a previsão de materialidades que fazem referência a um comportamento humano que denote conteúdo econômico. Assim é que entendemos que não decorre da Constituição a limitação ao legislador infraconstitucional para que apenas eleja como contribuinte316 do imposto que tratamos sujeito que realiza a atividade de prestar o serviço tributável, como será mais bem delineado adiante.

313 ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 121. 314 FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Tributária e o Código Civil de 2002. São Paulo: Noeses,

2005, p. 30. 315 Ibid., p. 30.

316 A despeito de estarmos tratando do tema apenas no plano constitucional, já adiantamos nosso posicionamento no sentido de que sujeito passivo é gênero, do qual contribuinte e responsável, nos termos do art. 121, do CTN, são espécies. Por contribuinte entendemos o sujeito passivo que realiza o fato jurídico tributário e ocupa o polo passivo da relação jurídica tributária que daí se origina.