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Custos e despesas relacionadas à atividade

2 A SUPREMACIA CONSTITUCIONAL E O DIREITO TRIBUTÁRIO

5.2 SOLUÇÃO PELA APLICAÇÃO DA RAZOABILIDADE, CAPACIDADE

5.2.1 Receitas decorrentes da prestação do serviço: inclusão na base de

5.2.1.2 Custos e despesas relacionadas à atividade

Como segundo elemento da definição das receitas decorrentes da prestação do serviço à luz dos critérios constitucionais elencados, pode-se referir que os custos e despesas arcadas pelo prestador do serviço para a consecução da sua atividade integram o preço do serviço. Por exemplo, o advogado não poderá deduzir os valores por ele próprio arcados atinentes ao papel, tinta de impressão, energia elétrica do escritório, deslocamento, secretário(a), etc. Da mesma forma, o médico não poderá deduzir os custos do consultório, o mecânico não poderá abater as despesas com a manutenção da sua oficina, a agenciadora não poderá excluir do preço do serviço o material de expediente. Muitos exemplos poderiam ser citados.

Enfim, tais despesas e custos são elementos da prestação do serviço e não podem ser deduzidos para fins de apuração da receita decorrente da atividade (base de cálculo do imposto).

Se eventualmente for permitida tal dedução, haveria certamente uma desvirtuação do aspecto material do ISS, transformando-o em imposto sobre a renda, pois é da natureza deste tributo (IR) a dedução de custos e despesas operacionais, nos termos da legislação aplicável (Regulamento do Imposto de Renda),348 para fins de apuração do montante tributável. Então, se forem permitidos abatimentos de custos e despesas para prestação do serviço, o Município estará tributando a renda (e não a prestação do serviço), invadindo, dessa forma, a competência da União, desvirtuando o tributo por meio da violação da razoabilidade- equivalência que deve existir entre o conceito constitucional de serviço e a sua base de incidência. Com isso, estaria desrespeitado o critério primordial para a definição da base de cálculo, que exige a relação da razoabilidade entre o aspecto material e a base de incidência.

Bernardo Ribeiro de Moraes se manifestou sobre a questão:

b) no cômputo do preço do serviço se incluem inúmeros valores já considerados na sua formação normal, como produto do custo, de outras despesas e do lucro. Em qualquer preço existem esses três elementos:

despesas de custo, correspondendo às saídas de numerário ou de valores

da empresa para a aquisição de bens (matéria-prima ou serviços) necessários à execução da sua atividade; demais despesas, seja de vendas (comissões, embalagens, fretes, etc.), de administração (aluguéis, consumo de luz, conservação, seguro, ordenados, etc.), financeiras (juros passivos, cobrança de títulos, etc.) ou tributárias (cargas fiscais que oneram a atividade da empresa); e margem de lucro. Tais despesas são gastos que devem ser cobertos na computação do preço do serviço, além do lucro que objetiva a empresa.349

Logo, pode-se afirmar que os custos e despesas relacionados à atividade desempenhada pelo prestador dos serviços e por ele arcadas estão na base de cálculo do ISS. O Superior Tribunal de Justiça considerou, por exemplo, que o custo atinente ao pagamento à produtora de filmes cinematográficos está contido na base de cálculo do ISS em relação à atividade de exibição dos filmes (Resp. n.º

348 Decreto n.º 3.000/1999.

349 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e Prática do Imposto Sobre Serviço. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1984, p. 522.

1.139.610), haja vista que os custos referentes a aluguel, pessoal, e valor pago à produtora dos filmes são integrativos da atividade.350

Da mesma forma, o Tribunal entendeu que, no caso de empresa prestadora de serviço de transporte municipal, a base de cálculo do ISS abrange o valor referente ao custo de gerenciamento operacional, porquanto tal valor seria despesa operacional necessária para a realização da atividade (Resp. n.º 1.088.853). Neste caso, afirmou o Tribunal que a base de cálculo é o preço do serviço e, uma vez admitida tal dedução, estar-se-ia tributando o lucro operacional, o que seria inadmissível.351

Em caso paradigmático (Resp 1.138.205), o Tribunal, tomando por base a atividade-fim do prestador de serviço, categoricamente separou as receitas de terceiros reembolsáveis (valor que não pode ser incluído na base de cálculo do imposto) dos custos ínsitos à prestação do serviço, concluindo que estes últimos integram a base de incidência:

350 “No caso de exibições cinematográficas (item 12.02 da lista anexa à LC 116/2003 e item 28, “a”, da lista anexa ao DL 406/1968), qualquer pessoa que já foi ao cinema sabe que o preço do serviço é o valor do ingresso pago à exibidora. De fato, preço por serviço, por definição, é a contrapartida paga pelo consumidor do serviço ao prestador, pela utilidade oferecida. Quando alguém paga o ingresso do cinema, está entregando dinheiro à exibidora pelo filme que assistirá a seguir. Pouco importa, para o consumidor, os custos da prestadora do serviço com aluguel, com pessoal ou com os produtores das películas. Espera apenas que o serviço (exibição de filme) seja prestado adequadamente, razão pela qual concorda em pagar o preço cobrado. Os preços pagos pelos consumidores (ingressos), cujo somatório equivale ao faturamento bruto da contribuinte, correspondem, portanto, à base de cálculo do tributo municipal. A legislação aplicável (LC 116/2003 e DV 406/1968) não prevê qualquer abatimento, na hipótese. Caso se admitissem abatimentos nessa base de cálculo, a título de despesas da exibidora, o ISS passaria a se confundir com Imposto de Renda ou com algum imposto não cumulativo, o que inviável”. (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp. 1.139.610/SC, 2ª Turma, Recorrente: Empresa de Cinemas Arco Íris Ltda., Recorrido: Município Balneário Camboriú, Rel. Min. Herman Benjamin, D.J. 04 março 2010, págs. 2/3).

351 “A BHTRANS presta um serviço que atende às concessionárias e é necessário para a sua atividade (gestão do sistema). Em contrapartida, as empresas de transporte pagam à BHTRANS o Custo de Gerenciamento Operacional – CGO” a título de remuneração pela gestão do sistema de transporte” (fl. 144). Ou seja, o Custo do Gerenciamento Operacional – CGO nada mais é que uma despesa operacional da contribuinte. Inviável, a toda evidência, seu abatimento da base de cálculo do ISS. (...)

Reitero que o Custo do Gerenciamento Operacional – CGO não configura simples repasse de valores, mas sim preço cobrado pela BHTRANS das empresas concessionárias “ a título de remuneração pela gestão do sistema de transporte”, como consignado pelo TJ-MG (fl. 144). Admitir o abatimento da base de cálculo do ISS, relativo ao Custo de Gerenciamento Operacional –CGO, implicaria a dedução de todas as demais despesas operacionais da empresa, pois não há distinção entre elas. Isso seria o mesmo que modificar a base de cálculo do ISS de “preço do serviço” para uma espécie de “lucro operacional”, o que é inadmissível. (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp. 1.088.853-MG, 2ª Turma, Recorrente: Município de Belo Horizonte, Recorrido: Rodopass Transporte Coletivo de Passageiros Ltda., Rel. Min. Herman Benjamin, D.J. 20 abril 2009. p.3).

Destarte, tem-se que, consoante o disposto no art. 9º, caput, do Decreto-Lei nº 406/68, a base de cálculo do ISS é “o preço do serviço”, assim entendido como a contraprestação que o tomador ou usuário do serviço deve pagar diretamente ao prestador, vale dizer, o valor a que o prestador faz jus, pelos serviços que presta. Essa é a receita auferida pela prestação do serviço – a receita bruta, que incorpora-se ao patrimônio do prestador, distinguindo-se, portanto, das somas pertencentes a terceiros, que não constituem fato gerador do tributo.

Impende distinguir essas despesas reembolsáveis, meras recuperações de valores despendidos em nome de terceiros – no caso, a título de salários e encargos -, dos custos ínsitos à prestação do serviço. Enquanto aquelas não integram a base de cálculo do ISS, esses, ao revés, por configurarem despesas com a própria atividade, não podem ser deduzidos para a apuração do resultado, sob pena de o preço do serviço deixar de ser a receita bruta a ele correspondente.352

Portanto, no fornecimento de mão-de-obra (o que é diferente do mero agenciamento), o valor referente aos salários dos trabalhadores, por ser um custo decorrente do serviço, integra a prestação, motivo pelo qual está incluído na base de incidência do imposto.

É importante salientar que há precedente do mesmo Tribunal reconhecendo a dedutibilidade de valores atinentes a telefonemas, cópias, transporte e hospedagem em caso de prestação de serviço de consultoria (Resp. 621.067).353 Com a máxima vênia, não está correta tal conclusão, haja vista que tais despesas são integrativas da prestação do serviço. Aliás, a decisão subverte a base de cálculo do imposto, já que é autorizada a tributação sobre o lucro, e não sobre a prestação do serviço. Ao que parece, a posição é isolada e a recente jurisprudência do Tribunal Superior

352 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, Resp. 1.138.205/PR, 1ª Seção, Recorrente: Município de Londrina, Recorrido: Admita Recursos Humanos Ltda., Voto Rel. Min. Luiz Fux, D.J. 01 fevereiro 2010, p.14.

353 “Na espécie, entendeu-se no voto condutor do acórdão impugnado (fls. 97/98), não ser possível tributar valores decorrentes de reembolso de despesas, tais como telefonemas, cópias reprográficas, transporte e hospedagem realizados no interesse do cliente. Ponderou-se no julgado que a referida quantia não integrava o preço – consoante determinado pelo art. 9º do Decreto-Lei 406/68 – já que não constituíam receitas auferidas pela autora, ora recorrida, em razão da prestação de serviços de consultoria. Com efeito, afastou-se a prestação do ente municipal, ora recorrente, de tributar a autora por serviços prestados por terceiros em outros Municípios e por atividade diversa da prestação de serviços de consultoria.

O acórdão recorrido não merece reparos.

Quanto ao tema, adoto o entendimento desta Corte de que “a base de cálculo do ISS é o preço do serviço, não sendo possível incluir nesse valor importâncias que não serão revertidas para o prestador, mas simplesmente repassadas a terceiros, mediante posterior reembolso. Precedentes REsp nº 411.580/SP, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 16/12/02 e REsp nº 224.813/SP, Rel. Min. José Delgado, DJ de 28/02/00” (Recurso Especial 618.722, relator Min. Francisco Falcão, DJ de 19/12/2005)”. (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp. nº 621.067/SP, 2ª Turma, Recorrente: Município de São Paulo, Recorrido: KPMG Consulting, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 25 abril 2007, págs, 2/3).

(Resp. 1.088.853, Resp 1.139.610 e Resp 1.138.205, alhures mencionados) veio para corrigir o entendimento externado no acórdão que ora se critica.

Não há, como visto, possibilidade de admitir exclusão de custos e despesas relacionadas à atividade, sob pena de desvirtuar o tributo cobrado, transformando-o em imposto de renda.

Portanto, despesas e custos integrativos da prestação do serviço arcados pelo prestador representam receitas decorrentes da atividade, exteriorizam a capacidade contributiva, observam a razoabilidade entre a regra de competência constitucional, a base de cálculo e a legalidade. Por isso, estão incluídos na base de cálculo do ISS.

5.2.2 Receitas não decorrentes da prestação do serviço: não inclusão na base