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Normas que definem a competência: regras

2 A SUPREMACIA CONSTITUCIONAL E O DIREITO TRIBUTÁRIO

2.3 INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAIS

2.3.2 Normas que definem a competência: regras

Feitas as considerações acerca da distinção, cumpre salientar que, das espécies de normas analisadas, aquela que define a competência da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para instituir tributos possui dimensão normativa de regra.

Analisando o texto constitucional e interpretando-o, inexiste outra conclusão senão a de que as normas que autorizam a instituição de tributos sobre aquelas hipóteses pré-determinadas pelo Texto Constitucional, bem como a grande maioria das limitações (e.g., imunidades)63, são regras.

Definitivamente, ao autorizar a tributação, a Constituição Brasileira outorga uma permissão, ou seja, descreve um comportamento permitido e, por outro lado, um comportamento proibido ao deixar hipóteses fora da autorização para tributar. Não há como compreender tal disposição constitucional como se fosse um princípio, pois nada há que identifique um fim juridicamente relevante. Ao contrário, existe uma descrição do que é proibido e o que é permitido. Mesmo tomando por base o critério compatibilizá-los.” (OLIVEIRA JUNIOR, José Alcebíades de. Estado e eficácia dos direitos

fundamentais. Revista do Direito de Santa Cruz do SUL n.º 11, jan/jul 1999, p. 54).

63 A propósito: “É que não se pode ponderar as regras imunitórias. Vale dizer, não se pode admitir ponderação entre, por exemplo, solidariedade social (princípio) e imunidade recíproca (regra) ou dos templos de qualquer culto (regra), etc. A ponderação é inviável, na medida em que imunidade é regra e não pode ser flexibilizada em confronto com outro princípio. Ao contrário, ela está sujeita à subsunção: uma vez observada a hipótese de incidência da regra imunitória, ela se subsume à hipótese e se sujeita à consequência jurídica daí advinda. Não se pode, pois, cogitar de ponderação da imunidade, dada sua dimensão de regra que, como dito, define a competência constitucional para a instituição de tributos. Por isso, afirma-se que a norma imunitória constitucional tem dimensão de regra.” (STURTZ, Gabriel. Natureza jurídica da imunidade e demais formas de não

tributação: evolução doutrinária e jurisprudencial. In Luiz Felipe Silveira Difini (coord.) Imunidades Tributárias e Direitos Fundamentais, Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2010. p. 134).

de Alexy para a distinção (aplicabilidade: subsunção e ponderação), a conclusão seria a mesma, posto que não se pode ponderar as normas que autorizam, por exemplo, a instituição de impostos sobre a propriedade, renda, serviços, etc. São disposições que estruturam o sistema tributário conferindo aos entes políticos o direito a tributar aqueles fatos.

Tais disposições não estão sujeitas à ponderação. Em outras palavras: não se pode admitir ponderação entre, por exemplo, solidariedade social (princípio) e possibilidade de tributação sobre serviço (art. 156 da CF) ou sobre a renda (art. 153 da CF) em cima de eventos que não se pode qualificar como acréscimo patrimonial ou prestação de serviço. A ponderação é inviável, na medida em que a autorização para a tributação é uma regra (pois descreve um comportamento e não um fim a ser atingido) e não pode ser flexibilizada em confronto com outro princípio. Prova disso é que, em uma ocasião em que a solidariedade social foi posta em debate em confronto com a norma autorizativa de competência tributária, o Supremo Tribunal Federal, calcado na segurança jurídica, rechaçou a hipótese de ponderação.64 Tampouco se poderia considerar as normas que autorizam a tributação como normas de colisão ou metanormas, na medida em que não têm relação alguma com a definição alhures referida, porquanto não se prestam para orientar a aplicação de outras normas do sistema.

Tais normas, pois, não estão sujeitas à ponderação e, por isso, não podem ser qualificadas como princípios se tomada por base a classificação de Alexy e Dworkin. Também não se constituem em diretrizes para a solução de conflito entre princípios, de sorte que, por isso, pode-se afirmar categoricamente que não se trata de princípio, tampouco de postulados (ou normas de colisão). Ao contrário, como

64 “Realmente, a flexibilidade de conceitos, o câmbio do sentido destes, conforme os interesses em jogo, implicam insegurança incompatível com o objetivo da própria Carta que, realmente, é um corpo político, mas o é ante os parâmetros que encerra e estes não são imunes ao real sentido dos vocábulos, especialmente os de contornos jurídicos. Logo, não merece agasalho o ato de dizer-se da colocação, em plano secundário, de conceitos consagrados, buscando-se homenagear, sem limites técnicos, o sentido político das normas constitucionais. O art. 195, não há a menor dúvida, atribui a toda a sociedade o financiamento, de forma direta e indireta, da seguridade social, fazendo-o, no entanto, em termos que têm como escopo maior a segurança na vida gregária. (...) Compreendo as grandes dificuldades de caixa que decorrem do sistema de seguridade social

pátrio. Contudo, estas não podem ser potencializadas, a ponto de colocar-se em plano secundário a segurança, que é o objetivo maior de uma Lei Básica, especialmente no embate cidadão-Estado, quando as forças em jogo exsurgem em descompasso.” (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 166.772-9/RS, Recorrente: Abastecedora Tonolli Ltda e Outros, Recorrido: Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12 maio 1994. Pub DJ 16 dezembro 1994. p. 716 e 723).

norma de estrutura65 que é, disciplina um comportamento. Não se pode cogitar como ponderação das disposições previstas nos artigos da Constituição que autorizam o exercício do poder tributário sobre determinadas situações, dada sua dimensão de regra que, como dito, define a competência constitucional para a instituição de tributos, ou seja, imediatamente descreve um comportamento: permissão para a instituição do tributo e, ao mesmo tempo, proibição de instituição fora desta hipótese. Por isso, afirma-se que tais normas têm dimensão de regras jurídicas.

Nesse sentido, manifesta-se Humberto Ávila acerca da forma pela qual a Constituição Federal atribui aos entes federativos o poder de tributar que, segundo o autor, é exercido inequivocamente por meio de regras:

A Constituição Federal de 1988 (adiante CF/88) atribuiu poder de tributar aos entes federados por meio de regras de competência. Estas regras descrevem fatos tributáveis, de modo que só há poder de tributar sobre fatos cujos conceitos se enquadrem nos conceitos previstos nessas regras e, inversamente, não há poder algum de tributar sobre fatos cujos conceitos não se emoldurem nos conceitos previstos nessas regras. Daí serem intransponíveis os limites conceituais previstos nas regras de competência. Fora deles não há poder de tributar. A respeito das regras de competência já decidiu o Supremo Tribunal Federal, ao asseverar que o intérprete “...não deve ir além dos limites semânticos, que são intransponíveis”. 66

Com efeito, tratando-se, inequivocamente, de regras que definem e limitam a competência para o exercício do poder tributário, vale agora estabelecer qual o critério de interpretação acerca do significado das regras de competência constitucionais, de forma a obter uma premissa importante para o desenvolvimento dos critérios de apuração da base de cálculo do ISS.

65 “Com as assim chamadas “regras de estrutura”, no entanto, a regulação das condutas fica na dependência da edição de outra norma cujo conteúdo é disciplinar a competência. Somente com o advento desta última, norma de competência (regra de estrutura), é que surgirá a norma de conduta dela derivada, regendo, então, diretamente os comportamentos interpessoais.” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 139). 66 ÁVILA, Humberto. Imposto sobre a Prestação de Serviços de Qualquer Natureza – ISS. Normas

Constitucionais Aplicáveis. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Hipótese de Incidência, Base de Cálculo e Local da Prestação. Leasing Financeiro: Análise de Incidência. Revista Dialética de Direito Tributário nº 122. São Paulo: Dialética, nov 2005. p. 121.