• Nenhum resultado encontrado

Da exploração florestal e do controle da origem dos produtos florestais

4. OS CÓDIGOS FLORESTAIS

4.7 Da exploração florestal e do controle da origem dos produtos florestais

O Código Florestal brasileiro prevê que toda e qualquer atividade envolvendo florestas nativas necessitam de aprovação prévia do Sisnama, o que é feito mediante Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS). O PMFS exige apresentação de série criteriosa de dados, como pode ser visto em seguida com a citação do primeiro parágrafo do Art. 31, referente ao documento:

149

I - caracterização dos meios físico e biológico; II - determinação do estoque existente;

III - intensidade de exploração compatível com a capacidade de suporte ambiental da floresta; IV - ciclo de corte compatível com o tempo de restabelecimento do volume de produto extraído da floresta;

V - promoção da regeneração natural da floresta; VI - adoção de sistema silvicultural adequado; VII - adoção de sistema de exploração adequado;

VIII - monitoramento do desenvolvimento da floresta remanescente;

IX - adoção de medidas mitigadoras dos impactos ambientais e sociais (BRASIL, 2012).

Ele prevê ainda a realização de vistorias e a entrega de relatórios regularmente, no intuito de assegurar a proteção da mata. Nesse sentido, a lei brasileira e a francesa são muito parecidas. Na França, também, o uso econômico da floresta não pode ocorrer sem antes a anuência do poder público. Não um, mas quatro documentos compõem a burocracia da norma francesa, que variam em função do tipo gestão e de exploração florestal a ser posto em prática. Eles são os Documentos de Planejamento, os Planos Simples de Gestão, os Regulamentos Tipos de Gestão e os Códigos de Boas Práticas Silvícolas. Como já se sabe, na França, a divisão da propriedade florestal pode ser pública, particular estatal ou privada, a classificação repercutindo nos pré-requisitos legais de uso dos biomas e nos documentos de gestão necessários. Apresenta-se aqui aquele mais comumente aplicado às propriedades particulares, o Plano Simples de Gestão, do artigo L.312-2, para auxiliar no esforço de comparação com o dispositivo transcrito acima:

Um Plano Simples de Gestão compreende:

1º Uma breve análise dos desafios econômicos, ambientais e sociais da floresta e, em caso de renovação do mesmo, da aplicação do Plano precedente;

2º Um programa de exploração dos cortes;

3º Um programa dos trabalhos de reconstituição pós-corte.

Quando ele comporta um programa de trabalhos de aperfeiçoamento, ele menciona aqueles que têm um caráter obrigatório.

Ele também define a estratégia de gestão das populações de animais de caça que fazem objeto de um plano de caça fixado para todo território nacional, em aplicação da terceira alínea do artigo L.425-6 do Código do Meio Ambiente, proposta pelo proprietário em conformidade com suas escolhas de gestão silvícola78 (FRANÇA, 2017).

Na segunda parte do Código francês, a chamada Regulatória, especifica-se a um nível maior de detalhes o que cada um dos itens listados no artigo acima deve encerrar. Com essas informações,

78 Un plan simple de gestion comprend : 1° Une brève analyse des enjeux économiques, environnementaux et sociaux de

la forêt et, en cas de renouvellement, de l'application du plan précédent ; 2° Un programme d'exploitation des coupes ; 3° Un programme des travaux de reconstitution après coupe. Lorsqu'il comporte un programme des travaux d'amélioration, il mentionne ceux qui ont un caractère obligatoire. Il précise aussi la stratégie de gestion des populations de gibier faisant l'objet d'un plan de chasse fixé sur tout le territoire national, en application du troisième alinéa de l'article L. 425-6 du code de l'environnement, proposée par le propriétaire en conformité avec ses choix de gestion sylvicole.

150 conclui-se que a lei brasileira e a francesa são muito semelhantes no que diz respeito ao rigor exigido previamente à liberação da derrubada de vegetação florestal nativa. Contudo, existe uma diferença importante entre os Códigos de cada um dos países em relação ao tratamento que é dado às matas recompostas. No Brasil, de acordo com o Art. 32 da norma florestal:

São isentos de PMFS:

I - a supressão de florestas e formações sucessoras para uso alternativo do solo;

II - o manejo e a exploração de florestas plantadas localizadas fora das Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal;

III - a exploração florestal não comercial realizada nas propriedades rurais a que se refere o inciso V do art. 3o ou por populações tradicionais (BRASIL, 2012).

Então, se as florestas forem plantadas, o proprietário brasileiro tem direito de usá-las conforme seus interesses econômicos, sem o dever de comunicação ao poder público. Na França, segue-se nas matas reerguidas a mesma regra que para florestas nativas, ou seja, a exploração deve dispor do consentimento estatal. Não só isso: a própria plantação de novas florestas só ocorre com as espécies aprovadas pelo poder público, o que varia de região para região. Finalmente, o uso econômico da vegetação não nativa também requer supervisão. No Brasil, a interpretação do capítulo da Exploração Florestal sugere que há previsão legal para que se inicie um ciclo vicioso e não sustentável de uso das florestas. Por exemplo: o Art. 31 obriga o proprietário a comunicar o uso ou desmatamento de florestas nativas, as quais devem ser repostas mais tarde por florestas plantadas, como no parágrafo primeiro do Art. 33. Contudo, o Art. 32 prevê que não são cobertas pelos PMFS as florestas plantadas, que podem assim ser exploradas sem observância dos dispositivos mais rigorosos do Código. Cria- se, desse modo, o seguinte precedente: explora-se uma floresta nativa com o porte de todos os documentos legais obrigatórios; em seguida, ela é replantada, sem necessariamente fazer-se uso de espécies nativas, pois a lei é flexível nesse sentido79. A partir desse momento, ela cessa de ser

considerada nativa, passando, portanto, a ser regida por outro instrumento da mesma lei, mais flexível no que diz respeito à exploração florestal, já que não exige o documento de PMFS. Assim, a floresta que era nativa e se enquadrava em regime especial de preservação torna-se, com o passar de alguns anos, floresta plantada, mais facilmente sujeita ao desmatamento que uma floresta original. Na França, é mais difícil de se percorrer esse caminho, pois tanto as florestas nativas quanto as plantadas recebem tratamento muito semelhante pela lei. Se a nativa requer tramites burocráticos específicos

79 Art. 33, § 4º: A reposição florestal será efetivada no Estado de origem da matéria-prima utilizada, mediante o plantio

151 para ser explorada, a floresta plantada também não pode ser usada economicamente sem a anuência de um órgão público.

Vale destacar que o Código brasileiro dedica um artigo para a atividade industrial que utiliza recurso madeireiro, o de número 34, instituindo que empresas precisam elaborar o Plano de Suprimento Sustentável, a ser submetido à aprovação do Sisnama, antes de obter liberação para o desempenho de suas atividades. Na França, a atividade industrial dependente de exploração das florestas não recebe artigo específico. Seu conteúdo está distribuído pelo texto da lei, sempre lhe sendo feitas alusões quando se comentam as atividades econômicas nas florestas ou o interesse que as pessoas jurídicas podem ter pelos biomas. Da mesma maneira que, no Código brasileiro, a atividade agropecuária é considerada um dos objetivos da política florestal, na lei francesa, declara- se que o Estado tem como um de seus objetivos precípuos garantir a satisfação das indústrias da madeira, no artigo L.121-1, o que é elencado ao lado de outros objetivos nobres, como a manutenção da diversidade biológica e a adaptação à mudança do clima. Ademais, os Conselhos nacional e regionais que auxiliam na elaboração das diretrizes florestais na França sempre contam com a participação de representantes da indústria da madeira, que defendem os interesses da classe produtiva. Dessa maneira, apesar de o Código francês enumerar com mais globalidade os direitos e deveres que incidem sobre a atividade econômica, percebe-se que ela segue orientação produtiva também nas instâncias principiológicas e deliberativas.

No caso do controle de origem dos produtos florestais, segundo capítulo tratado nesta seção, tem-se basicamente o reforço do que foi falado acima, ou seja, reitera-se a liberdade de exploração de produtos das florestas plantadas, sendo com espécies nativas ou exóticas. É introduzido aqui a necessidade de se realizar o controle de origem, o que é feito por meio do Documento de Origem Florestal (DOF). O DOF torna-se, então, obrigatório no transporte e na comercialização dos produtos florestais. Entretanto, nada se comenta sobre o que ocorreria caso a transação acontecesse sem a posse do documento. Tampouco redireciona-se o leitor ao Código Penal ou a alguma outra lei. Ao todo, dois artigos, os 35 e 36, dedicam-se ao controle de origem.

Na lei francesa, o número salta para 25. São definidos os nomes genéricos para os tipos de produtos que podem ser comercializados, suas categorias, a forma como deve acontecer a classificação, a forma como as empresas devem proceder, tudo com riqueza de detalhes. Há também três artigos que orientam o comércio com países da União Europeia e com o resto do mundo. Vê-se assim preocupação com o internacional, apesar de que não voltada necessariamente à conservação

152 das florestas. O Código francês reserva ainda outro momento para descrever as penas cabíveis aos infratores da lei.