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4 SOBRE AS IMPLICAÇÕES DA AVALIAÇÃO PARA A APRENDIZAGEM DOS

6.3 Da formação dos licenciandos para o processo de avaliação

Questionados sobre sua preparação para avaliar os futuros alunos da educação básica, independente da compreensão que possuem sobre avaliação, a maioria dos futuros docentes disse que não se considera preparada, como Ágata: “[...] eu não sei como que eu pretendo avaliar, mas só avaliação tradicional, eu acho que não é suficiente, então, não sei como iria avaliar meus alunos em sala de aula, questão de participação conta muito, sabe? Então, alguma forma diferente, alguma atividade diferente, mas...”. Referindo-se à correção de provas, Euclásio comenta: “[...] eu não sei e eu preciso ainda de um tempo para aplicar isso com os meus alunos, por exemplo, é, não sei qual que é o melhor método para fazer isso, de correção, não sei”.

Quando indagados sobre a realização de estudos teóricos sobre avaliação, Rubelita afirma: “Não, nunca! Sobre avaliação que você fala... provas, notas... essas coisas, né? Não, nunca... nunca”.

Na organização curricular do curso pesquisado, a temática avaliação está contemplada na disciplina Didática. Contudo, a Didática compõe o rol das disciplinas optativas. Assim, não são todos os licenciandos que cursam essa disciplina, ou seja, a reflexão teórica sobre a temática avaliação não abrange todos os futuros professores. Sobre essa questão, Esmeralda

menciona: “É nessa disciplina [Didática] eu tive uma reflexão, aí a gente realmente percebeu que a avaliação, a prova, ela não é uma maneira boa de avaliar, porque ela cria uma barreira emocional, tem muita gente que passa mal em dia de prova aqui”.

A título ilustrativo, apresentamos a visão de Ametrino quando este descreve sua experiência de avaliação formativa no projeto EJA, uma vez que esta evidencia uma contradição que se mostrou presente em quase todos os depoimentos:

Eu valorizo, porque a escola define uma quantidade de pontos para prova, e eu avalio muito as produções que eles fazem em sala de aula, [...] o fazer exercício... o tentar fazer exercício... assim, eu gosto muito de dar atividades e ir vendo como que eles estão fazendo e aí é nesse momento que eles estão sendo avaliados. Então, cada aluno que faz os exercícios, tando certo ou não, no final ele tem registrado que naquela aula ele participou, e eu vou acompanhando, e aí tem as provas que eles têm que fazer naturalmente, né? Assim, que aí eu já não posso alterar.

[...] o aluno recebia uma ficha, onde eu descrevia, assim, o desempenho dele e eu fazia uma lista com todos os descritores que eu trabalhei, se ensinei somar, aí colocava lá, descritor um, consegue somar números com três ordens, sim, não, com ajuda, com dificuldade. [...] Eu acho que essa avaliação, ela é muito mais completa do que uma avaliação com nota! (Ametrino)

Ao emitir sua opinião, o estudante evidencia que valoriza mais o processo do que o resultado final. Contudo, é digna de nota a confusão que os licenciandos fazem com relação ao termo avaliação como sinônimo de prova. A explicação para essa confusão pode ser devido à submissão desse estudante a longos anos de vivência de uma prática avaliativa fundamentada na concepção de avaliação classificatória, com predominância da prova convencional, como ilustra o diálogo a seguir.

Pesquisadora: Você se considera preparado para fazer as avaliações dos seus alunos?

Ametrino: Nem sempre, porque eu acho muito difícil. Pesquisadora: Por quê?

Ametrino: Porque fazer uma prova não é uma coisa fácil, assim, a gente tem que pensar em várias coisas, que que eu quero saber, né? Às vezes, o menino que errou aquela questão, não necessariamente é um menino que não sabe, é... a matéria.

Mesmo vivenciando experiências práticas mais próximas da perspectiva formativa, Ametrino ainda diz: “Porque fazer uma prova não é uma coisa fácil [...]”. Essa fala é indicativa de uma possível sedimentação da concepção de avaliação classificatória vivenciada

ao longo do percurso estudantil. Outro aspecto muito destacado pelos estudantes é a dificuldade para avaliar, como afirma Topázio:

Mas eu acho que uma avaliação perfeita, impossível, eu não me considero capaz de fazer, sabe? É muita coisa, muita coisa, é muito menino com... muita característica diferente, poder tocar em cada menino de uma forma positiva, isso eu acho uma tarefa muito difícil, sabe? Muito difícil mesmo!

Quando interrogados sobre como pretendem avaliar seus futuros alunos, alguns estudantes mencionam seus professores modelos, como Esfênio:

Pesquisadora: E como você pensa em avaliar, se você assumir uma turma? Esfênio: Igual eu tive com meu professor anterior, igual eu tive no ensino médio. Eu penso que avaliar um aluno igual na faculdade seria apenas se eu fosse um professor de universidade. [...]. Eu teria dado a matéria da mesma forma e uma parte da aula seria para exercícios, tentaria da mesma forma, foi o melhor até hoje que eu tive.

Outros, como Esmeralda, demonstram uma visão mais próxima da perspectiva da formativa:

Eu quero dar muita autonomia para eles, eu quero que eles se sintam capazes de caminhar sozinhos... eu não quero ser aquela professora, olha, vocês vão fazer isso aqui agora, no final da aula vocês vão me entregar tal coisa. Eu quero que eles façam muitos trabalhos assim, eu acredito que o trabalho individual e em grupo faz com que o aluno aprenda muito mais.

É possível inferir através de muitos depoimentos dos licenciandos que as experiências vividas na graduação, particularmente na prática das disciplinas investigadas, geram implicações - modelos e contramodelos de docência - na formação dos futuros professores da educação básica:

[...] por exemplo, pessoas que quase não nunca veem a aula, então você pergunta, qual a forma justa do professor avaliar? Ele vai ficar olhando a peculiaridade de cada um? É muito complicado! [...]. Ele vai se prender a a sabe? A peculiaridade de cada um? Fica muito complicado, eu falo isso porque também pretendo um dia estar no lugar deles. Eu já estou no ensino fundamental e médio e pra mim é muito difícil pensar em outras formas de avaliar o aluno. Que eu, infelizmente, preciso produzir um documento, preciso dar uma resposta pra sociedade, como vou fazer isso? (Sodolita) Então, muitas vezes, você tem que tomar decisão da sua didática, de como você vai dar aula, com base no você tem da sua experiência da sua vida, porque numa escola onde forma os professores, eu acho que a gente deveria, em qualquer matéria que seja, uma matéria muito difícil ou uma matéria muito fácil, um professor que ensine a matéria que seja de uma maneira

voltada para alguma coisa que você vai passar em qualquer fase da sua vida. (Jaspe)

Mas além das provas eu dou muita lista de exercício, dou muita tarefa, sabe? Tarefa para fazer em casa, porque ele faz dez vezes, o próximo exercício que aparecer, ele sabe fazer de novo. Então é isso que vai capacitar ele para a hora de fazer a prova. (Euclásio)

Mas em relação ao sistema de avaliação na escola básica... eu faria da mesma forma que eu faria na universidade, daria uma lista de exercício valendo... 10% da etapa e o resto de prova. (Citrino)

Oscilando entre uma visão ora tradicional, positivista, ora próxima da perspectiva dialética, formativa, os depoimentos da maioria dos interlocutores naquele momento do curso, evidenciam que eles estão arraigados na concepção tradicional ou positivista, com predominância da prova convencional. Ou seja, no próprio processo avaliativo na licenciatura, os alunos veem a prova como imprescindível. Apesar de alguns demonstrarem preocupação em buscar outras formas de conceber a avaliação, indo além da visão classificatória, é possível inferir que o habitus do professor de Matemática os conduziu à “adesão” da abordagem de avaliação classificatória praticada nas disciplinas de conteúdo específico. Tudo levar a crer que, não tendo vivenciado outras práticas durante a formação, essa visão tende a ser valorizada nas futuras práticas da educação básica.