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DA LDB AO PNE: PONTOS DE REFLEXOS NO ENSINO MÉDIO

1 EDUCAÇÃO A PARTIR DA DÉCADA DE 980: O ENSINO MÉDIO NAS

1.2 DA LDB AO PNE: PONTOS DE REFLEXOS NO ENSINO MÉDIO

A configuração do processo de elaboração da LDB, a constituição do FUNDEF, a mais recente alteração da política de fundos de financiamento da educação - o FUNDEB (BRASIL, 2007), e o PNE (2014-2024) orientam o movimento que o Estado fez a fim de regular a universalização da Educação Básica no âmbito do Ensino Médio e permitem compreender os formatos da escola ou as trajetórias curriculares, bem como o de financiamento, gestão e avaliação a partir de 1996. Sem a preocupação de um aprofundamento para o conjunto da Educação Básica, mas olhando os reflexos no Ensino Médio, buscou-se, principalmente, trazer pontos nessas políticas educacionais propostos para essa etapa formativa. No caso do PNE (2014- 2024), recorre-se a uma análise da meta 3, e do FUNDEF e FUNDEB, verificar a relação direta com a obrigatoriedade e gratuidade prevista em caráter limitado inicialmente na LDB e a ampliação posterior (BRASIL, 2009c, 2013a).

Como todas as políticas educacionais, nas trajetórias elas são marcadas por interesses de classe e de indução de padrões sociabilidade19, não foi diferente

com a LDB, e o processo histórico desvela a dificuldade de garantir uma proposta de lei pensada por educadores comprometidos com a qualidade da educação. A dificuldade de construção de consensos para a educação brasileira, em função de interesses diversos na sociedade, levou à construção de uma nova LDB questionada por setores da sociedade. Esse quadro de dificuldades e questionamentos pode ser retratado na análise de Saviani (1998) sobre a nova LDB e sua trajetória para que se tornasse uma lei, em que apresenta a multiplicidade de propostas representadas na disputa de projeto social e, ao mesmo tempo, o período longo desde os debates

19 Martins (2007, p. 1) esclarece que o conceito de “sociabilidade” é extraído do pensamento de

Antonio Gramsci: “O conceito nos ajuda a entender que os homens e as classes vêm produzindo e reproduzindo ao longo do processo histórico as condições objetivas e subjetivas de sua própria existência, sob a mediação das relações de produção, das relações sociais e do resultado das relações de poder, e que na atual fase do capitalismo essas condições objetivas e subjetivas foram significativamente alteradas, refletindo-se em novos preceitos de participação, cidadania e

iniciais no conjunto dos movimentos sociais e a passagem de vários governos até 1996 com sua sanção. O grau de dificuldade da aprovação de um projeto de lei, que nasce no Legislativo, desvelou o quadro de interferência, em quatro momentos, do Poder Executivo na sua elaboração e aprovação, em que

[...] o primeiro corresponde à fase final do governo Sarney e se estende de dezembro de 1988 ao início de março de 1990; o segundo vai da posse de Collor de Mello em 15 de março de 1990 à sua queda em setembro de 1992; o terceiro momento é aquele do governo Itamar Franco, entre outubro de 1992 e dezembro de 1994; finalmente, o último momento corresponde ao governo de Fernando Henrique Cardoso, cobrindo o período que vai de janeiro de 1995 até a sanção da nova LDB em 20 de dezembro de 1996 (SAVIANI, 1998, p. 157).

Observa-se um período de maturação de oito anos da proposta de LDB, e houve uma participação20 não decisória do Poder Executivo até o governo Fernando

Henrique Cardoso (1994-2002), que, não possuindo um projeto, demonstrou “repulsa ao projeto de LDB construído a partir de mais de 30 organizações científicas, políticas e sindicais congregadas no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 109), assumindo o elaborado por Darci Ribeiro. A condução desse processo ficou a cargo dos parlamentares afeitos ao tema, que, em sua maioria, representavam interesses societários para, de alguma forma, “preservar os interesses dos grupos privatistas” (SAVIANI, 1998, p. 157). A representação maior para a história desse espectro foi dada, então, ao Senador Darcy Ribeiro como último ator nesse processo de elaboração da nova LDB, que ficou caracterizado no contexto da cena política onde o relator, Deputado José Jorge

[...] mantém a mesma estrutura do substitutivo Darcy Ribeiro com praticamente o mesmo número de artigos e, fundamentalmente, o mesmo conteúdo tendo introduzido pequenas alterações que não chegaram a afetar o espírito geral do projeto aprovado no Senado.

A ausência de vetos é fato raro na história da nossa política educacional, recordando-se que isto também se deu com a lei 5.692/71 durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici sob cujo autoritarismo a oposição estava inteiramente silenciada, não havendo espaço sequer para os ‘pálidos protestos’ ocorridos durante a votação da lei 5.540/68 no governo do marechal Arthur da Costa e Silva quando, no entanto, o texto foi sancionado com diversos vetos.

Esse resultado é explicável uma vez que o MEC foi, por assim dizer, coautor do texto de Darcy Ribeiro e se empenhou diretamente na sua aprovação. E, como a iniciativa privada, ficou inteiramente satisfeito com o desfecho. Tanto

20 Saviani (1998) relata, em maior e menor grau, a participação de cada governo neste período de

oito anos, todavia nenhum deles remeteu ao Congresso Nacional a sua proposta de LDB. Isso não significa que o Poder Executivo não possuísse uma posição sobre a proposta de LDB.

que recomendou ao Presidente da República a sanção sem vetos. E assim foi feito (SAVIANI, 1998, p. 162, grifo do autor).

Com a edição da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional (BRASIL, 1996c), passou-se a ter, então, uma norma geral de regulação da educação brasileira, em todas as dimensões, atualizada e adequada à Constituição Federal de 1988. Uma das dimensões importantes a se desvelar é em que contexto de orientações políticas as reformas do Estado brasileiro são permeadas nesse período. Para Frigotto (2011, p. 240), o governo Fernando Henrique Cardoso mostra que o “seu fundamento é o liberalismo conservador redutor da sociedade a um conjunto de consumidores”, o que leva à mercantilização das políticas sociais e, no caso da educação, à lógica produtivista de um serviço comprometido com o capital. O modelo neoliberal adotado, sob a orientação do Consenso de Washington21, agrega-se para o campo da educação ao

Relatório Delors22, que aponta para a ressignificação das políticas educacionais a

lógica do modo de produção flexível. É importante destacar, de forma detalhada, seguindo essa ressignificação, que

[...] o Relatório faz recomendações de conciliação, consenso, cooperação, solidariedade para enfrentar as tensões da mundialização, a perda das referências e de raízes, as demandas de conhecimento científico-tecnológico, principalmente das tecnologias de informação. A educação seria o instrumento fundamental para desenvolver nos indivíduos a capacidade de responder a esses desafios, particularmente a educação média (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 99).

À luz dessas considerações não há de haver estranhamento se no texto da LDB (BRASIL, 1996c) esteja garantida a lógica do mercado na educação, ou seja, a consolidação do princípio basilar de flexibilidade que é orientado pelo modo de produção flexível. Como um dos resultados, no caso do Ensino Médio, a volta da dualidade no § 2º do art. 36, tipificando que “o ensino médio, atendida à formação

21 Em 1989, “o documento produzido pelos representantes dos países do capitalismo central,

conhecido como Consenso de Washington, balizou a doutrina do neoliberalismo ou

neoconservadorismo que viria a orientar as reformas sociais nos anos de 1990” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 95).

22 “Entre 1993 e 1996, a Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, convocada pela

UNESCO, composta de especialistas e coordenada pelo francês Jacques Delors, produziu o Relatório Delors, no qual se fez um diagnóstico do “contexto planetário de interdependência e globalização” (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 99).

geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas” (BRASIL, 1996c). Segundo Kuenzer (2000, p. 35),

[...] com a acumulação flexível, o capital prescinde de formação profissional para os postos crescentemente simplificados, passando a demandar do Estado apenas educação geral, mais ampliada, é verdade, porém não mais universalizada, em face da redução dos postos de trabalho.

A LDB deixa essa dualidade mais perniciosa quando permite a utilização de recursos públicos para financiar a educação profissional, na rede de ensino privada, com o instrumento da cooperação23 do poder público com instituições

especializadas em educação profissional e parcerias pública-privadas.

Essa volta da dualidade é marcante no debate pré e pós-aprovação da nova LDB, pois se traduziu como uma nova organização do Ensino Médio desde 1981. Para Kuenzer e Gonçalves (1995, p. 108), no movimento de crítica e alerta do meio acadêmico das consequências da aprovação da LDB em 1996, ou seja, tendo como referência a divisão social do trabalho24, a lei levaria à retomada da “velha dualidade

estrutural que, determinada pelo capitalismo em sua fase fordista prevê dois tipos diferentes de educação, em diferentes instituições”. Essa dualidade materializou-se no corpo da LDB e passou a configurar-se como política educacional através do Decreto do governo federal n. 2.208, de 17 de abril de 1997 (BRASIL, 1997), que traça as linhas gerais e os objetivos da educação profissional. De acordo com Zibas (2005, p. 1071), houve uma desconfiguração da proposta do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública para o Ensino Médio quando a LDB permitiu a coexistência de dois tipos de formação “ambíguas” e “não enfatizou a instituição do trabalho como princípio educativo e orientador de todo o currículo”. Nosella, apresentando o entendimento do trabalho figurando como princípio educativo, lembra que ele

[...] foi pensado e proposto a partir do processo de industrialização, no qual os homens compreenderam que o conhecimento científico necessário à indústria era fruto da articulação entre as atividades práticas e os estudos teóricos, uma vez que a inteligência e as mãos executavam, conjuntamente,

23 Essa previsão aparece no § 4º do art. 36 da LDB (BRASIL, 1996c).

24 Manacorda (2011, p. 11, grifo do autor) contextualiza, no artigo “Marx e a formação humana”, a

educação, faz as críticas ao modelo de ensino unilateral profissionalizante e aponta a opção por uma formação com omnilateralidade. Afirma que “este é o destino do homem e para isso deve visar o ensino intelectual, físico e tecnológico para todos. Porque, divisão dos homens entre os

destinados ao trabalho e outros à ciência, os à produção e outros ao consumo, uns ao cansaço ou outros ao gozo, é o nó das contradições da sociedade capitalista que Marx pretende cortar. Eis ‘o germe da educação do futuro’”.

operações segundo regras objetivas teóricas e práticas. Pela experiência científica, criava-se uma nova forma histórica de interação entre homem e natureza, um novo método de produção. Assim, o trabalho como princípio educativo passou a significar o objetivo geral de todo processo educativo, isto é, capacitar às gerações mais novas a transformar a natureza, de forma científica, humanizando-a (NOSELLA, 2011, p. 1.057).

Dado o viés produtivista expressado pela LDB, é importante ressaltar essa análise, pois a falta desse princípio educativo centrado na categoria de trabalho transformador da natureza, científico e humanista vai permitir outra inovação para o currículo com a publicação das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (BRASIL, 1998) em 1998.

Essa inovação introduzida, que se fundamenta na pedagogia das competências25 para o currículo, só existe em função das condições de alinhamento

das políticas educacionais às diretrizes dos organismos internacionais e da perspectiva pedagógica assumida no MEC, não só pela falta do trabalho como princípio educativo nas diretrizes. Na LDB, contudo, existe um campo aberto às interpretações do tipo de “vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais” (BRASIL, 1998), e, como uma escolha, pode ser considerada uma determinante passível de superação com outra perspectiva pedagógica. A opção do MEC, que foi quem encaminhou a proposta de diretriz, fica mais clara quando se interpreta da seguinte forma:

Trata-se de uma perspectiva pedagógica individualista, dualista e fragmentária coerente com o ideário da desregulamentação, flexibilização e privatização e com o desmonte dos direitos sociais ordenados por uma perspectiva de compromisso social coletivo. Não é casual que a ideologia das competências e da empregabilidade esteja no centro dos parâmetros e das diretrizes educacionais e dos mecanismos de avaliação (FRIGOTTO; CIAVATTA, 2003, p. 108).

O resultado dessa mudança conceitual, institucionalizada a partir da LDB e da perspectiva pedagógica do MEC, provocou mudanças no Ensino Médio, até então

25 Ramos (2003, p. 88) faz uma abordagem sobre o tema e diz que, “quanto ao segundo pilar da

pedagogia – o processo de ensino-aprendizagem – já sinalizamos que a pedagogia das competências em sua versão contemporânea aporta-se predominantemente no construtivismo piagetiano, particularmente na teoria da equilibração. Segundo esta teoria, ocorre um desequilíbrio estruturalmente perturbador quando o sujeito se defronta com situações desconhecidas ou

desafiadoras, diante das quais ele reorganiza seu pensamento em um nível mais elevado do que o previamente atingido, em um processo recursivo que conduz a um crescimento indefinido dos conhecimentos, quer no plano quantitativo, quer no plano qualitativo. As competências seriam as estruturas ou os esquemas mentais responsáveis pela interação dinâmica entre os saberes prévios do indivíduo – construídos mediante as experiências – e os saberes formalizados”.

não vistas desde 1981, como instrumento de uma política de uma nova sociabilidade. Ramos (2011, p. 772) conclui na mesma direção e desvela o simbolismo buscado no governo federal em caracterizar uma “suposta definição da finalidade do ensino médio: formar para a vida”.

A superação dessa perspectiva pedagógica no marco legal do Estado passa por momentos distintos e incompletos, que sua interpretação mereceria outros estudos aprofundados a saber se foi completada ou não e que tipo de formação é praticada na escola atual de Ensino Médio. A dualidade foi mitigada com o Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004, que revogou o decreto nº 2.208 (BRASIL, 1997), permitindo, assim, novamente, que “educação profissional técnica de nível médio” (BRASIL, 2004) acontecesse na Educação Básica. Para Krawczyk (2011, p. 760), a perspectiva pedagógica do “ensino médio integrado”, proposta pelo Decreto nº 5.154/2004, é uma alternativa à superação dessa dualidade, e explica que

[...] almejam uma profunda revisão de paradigmas e conceitos e a eliminação da indesejável oposição entre conhecimento geral e específico. Entretanto, esse não é um desafio fácil de responder nas condições do sistema de ensino brasileiro (KRAWCZYK, 2011, p. 760).

Em um caminho mais longo, as DCNEM de 1998 vigoraram como marco legal da organização curricular até a edição da proposta do MEC, pelo Conselho Nacional de Educação, da Resolução nº 2, de 30 de janeiro 2012, que definiu as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (BRASIL, 2012). A consequência dessa mudança é a redefinição dos princípios do Ensino Médio, que passam a ser balizados por uma “formação integral do estudante” e o “trabalho e pesquisa como princípios educativos e pedagógicos” (BRASIL, 2012) em uma perspectiva ontológica humanista. Ramos (2003, p. 6) já apontava um aspecto pedagógico que se aproxima das atuais DCNEM, que leva em conta o trabalho como princípio educativo, ou seja, de uma pedagogia histórica e crítica ou da práxis; ela o chama de “uma pedagogia das competências contra-hegemônicas” e levaria em consideração

[...] um referencial teórico-metodológico centrado na práxis humana, mediada pelo trabalho, inicialmente na sua dimensão especificamente econômica – que ordena as finalidades da educação profissional – mas processualmente na sua dimensão ontológica, por tentar potencializar ações emancipatórias pelos trabalhadores (RAMOS, 2003, p. 6).

Anterior às DCNEM, e em sintonia, destaca-se a eliminação da trava legal à obrigatoriedade que desaparece com a promulgação da Emenda Constitucional nº 59, que estabeleceu mudança no inciso I do art. 208, da Constituição Federal de 1988, tornando a “educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria” (BRASIL, 2009c). Entretanto, existe a combinação com o art. 6º, da própria Emenda, com duas ressalvas, ou seja, a de que “deverá ser implementado progressivamente até 2016” e “nos termos do Plano Nacional de Educação” (BRASIL, 2009c). A Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o PNE (BRASIL, 2014a), prevê duas ações na meta 3, que trata do Ensino Médio: a primeira de “universalizar até 2016 o atendimento escolar para toda a população de quinze a dezessete anos”, e a segunda, “elevar até 2024 a taxa líquida de matrículas para 85% nesta faixa etária” (BRASIL, 2014a).

Na LDB, seguindo mesmo movimento da Constituição Federal, com a nova redação dada pela Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013 (BRASIL, 2013a), ficou estabelecido que a Educação Básica seria agora “obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade” e o “atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático- escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde”. Ao agregar os programas suplementares, a LDB reforça a nova regra de financiamento da Educação Básica, que já vinha ocorrendo no Ensino Médio anteriormente à regra da obrigatoriedade. Tais mudanças foram introduzidas na Carta Magna por meio da Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006 (BRASIL, 2006b), instituidora do FUNDEB em substituição ao FUNDEF. Até 2006 o FUNDEF arrecadava 60% dos recursos que eram direcionados à educação, desde a sua criação em alteração à Constituição Federal, que previa, inicialmente, na sua promulgação a obrigatoriedade de aplicação de 50% desses recursos ao desenvolvimento do Ensino Fundamental. Com o FUNDEF, o Ensino Médio e a Educação Infantil perderam mais 10% de suas possíveis fontes de financiamento. A Medida Provisória nº 339, de 28 de dezembro 2006 (BRASIL, 2006a), convertida na Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007 (BRASIL, 2007), criando o FUNDEB, regulamentou o art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias alterado com a Emenda Constitucional nº 53, que corrige essa distorção do financiamento da Educação Básica ao estabelecê-lo para todas as etapas.

É interessante analisar uma necessidade de adoção dessa medida para compor um quadro de receitas, ao Ensino Médio, frente a um número crescente de matrículas nos SEE. A distorção do financiamento no Ensino Médio pode ser examinada a partir do movimento crescente de matrículas nos SEE, que se consolidaram nas duas últimas décadas e a prioridade ao Ensino Fundamental imposta por vinculações de receitas na Constituição Federal até o ano de 2006 a essa etapa. Com a adoção da obrigatoriedade na matrícula e o FUNDEB, consolidam-se as pré-condições para a universalização do Ensino Médio.

A adoção do FUNDEB configura-se como uma necessidade colocada aos governos estaduais por uma realidade provocada por um aumento crescente da matrícula buscada pela população, que, atendida com a universalização do Ensino Fundamental e sob influência de mudanças socioeconômicas e do mundo do trabalho26, estava a exigir mais e constante formação27 ao indivíduo, aumentando

progressivamente o número de acesso e a permanência no Ensino Médio.

No âmbito do acesso ao Ensino Médio, Costa (2013, p. 187), ao analisar dados da matrícula entre os anos 1990 e 2000, confirma essa configuração e aponta que a falta de uma política governamental provocou “marginalmente a expansão do ingresso [dos jovens] no ensino médio”. A expansão marginal do acesso ao Ensino Médio deu-se em relação à obrigatoriedade imposta, exclusivamente, ao Ensino Fundamental, que não impediu o aumento da matrícula. Esse entendimento de marginalidade e de que o capital induz a uma nova sociabilidade, permite compreender que, independentemente, do interesse governamental momentâneo e sem financiamento próprio, ocorreu o movimento marginal do aumento da matrícula a partir da década de 1990, ultrapassando as barreiras do financiamento e da obrigatoriedade.

26 Alves e Batista (2010, p. 173), em uma discussão sobre “o fetiche do capital intelectual”, fazem a

seguinte constatação: “Na verdade, estamos vivendo uma época nebulosa e sombria para o trabalho, porém não a ponto de negarmos sua centralidade, pelo contrário, em decorrência da superexploração e precarização a que são submetidos milhões de homens, mulheres e crianças, sobretudo, na periferia do sistema do capital e nos países ditos emergentes. Afirma-se nessa época a eterna tendência do capital em sua insaciabilidade e incontrolabilidade na busca pela

valorização”.

27 Os autores apontam as contradições da influência atual da ideologia imposta por uma formatação

pedagógica no ideário para formação de uma nova sociabilidade neoliberal e facilitadora dessa superexploração do homem, através da sociedade do conhecimento, do slogan “Aprendizagem ao Longo da Vida”, da pedagogia do aprender a aprender que “ impõe a obrigatoriedade de cada indivíduo ser o principal responsável pela sua formação e inserção no mercado de trabalho, pela via da construção de competências para a empregabilidade” (ALVES; BATISTA, 2010, p. 173).

A tabela 2 ressalta esse movimento da população de ultrapassar as barreiras, em saltos lentos e progressivos ou regressivos, porém, nesta série histórica de 1995 a 2013, o número percentual mais representativo é a diferença da matrícula existente em 1996 e o incremento para 1997, que representou um salto de 11,60 %. Esses saltos progressivos aparecem até 2004 com um incremento de 1,05%, em referência ao ano anterior, e representaria mais de nove milhões de jovens no Ensino Médio. A partir de 2005 a 2013, em sinais de estabilização não tão segura da matrícula no Ensino Médio, a tabela demonstra dados de regressão percentual da matrícula, lenta e com oscilação positiva, mas não ao ponto de recompor os números de 2004.