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O Ensino Médio Politécnico no Rio Grande do Sul: interfaces com

1 EDUCAÇÃO A PARTIR DA DÉCADA DE 980: O ENSINO MÉDIO NAS

2.2 O CONTEXTO DAS ADAPTAÇÕES ESTADUAIS NO PROEMI

2.2.1 O Ensino Médio Politécnico no Rio Grande do Sul: interfaces com

O cenário educacional no Rio Grande do Sul, em 2011, não é diferente da realidade nacional e é a justificativa para a formulação da proposta de Ensino Médio Politécnico, advinda do plano de governo do Governador Tarso Genro, “no qual está prevista a construção de mudanças na educação, em especial na de nível médio” (AZEVEDO; REIS, 2013, p. 32). Conforme os autores, “a Rede Estadual de Ensino do Rio Grande do Sul (REE-RS), desde longa data, acumula um histórico de baixos índices de aprovação e altos índices de reprovação e abandono no Ensino Médio” (AZEVEDO; REIS (2013, p. 32).

O estado do Rio Grande do Sul monta a nova estratégia do Ensino Médio em 2011, dando o contorno da configuração a ser seguida a partir de 2012 e implantada até 2014, de forma gradual, iniciando pelos 1ºs anos do Ensino Médio e

denominada Ensino Médio Politécnico. A proposta pedagógica de reestruturação curricular do Ensino Médio

[...] se constitui por um ensino médio politécnico que tem por base na sua concepção a dimensão da politecnia, constituindo-se na articulação das áreas de conhecimento e suas tecnologias com os eixos: cultura, ciência, tecnologia e trabalho enquanto princípio educativo. Já a educação profissional integrada ao ensino médio se configura como aquisição de princípios que regem a vida social e constroem, na contemporaneidade, os sistemas produtivos. O objetivo é socializar, esclarecer e aperfeiçoar a proposta de governo.

A execução desta proposta demanda uma formação interdisciplinar, partindo do conteúdo social, revisitando os conteúdos formais para interferir nas relações sociais e de produção na perspectiva da solidariedade e da valorização da dignidade humana (RIO GRANDE DO SUL, 2011a, p. 4).

Trata-se de uma política pública que está sendo reavaliada pelo atual governo de José Ivo Sartori (2015-2018), mesmo sendo uma política institucionalizada. Segundo o gestor do Ensino Médio da SEDUC, E2, com a troca de governo foi solicitado a:

Levantar os pontos onde ainda não houve. São três anos e a caminhada é curta e é para dar continuidade na caminhada. Levantar onde estão os desafios e retrabalhar o que não foi trabalhado. [...]. O partido que estava era o PT37. Quem assumiu o governo foi o PMDB.38 Quem assume a secretaria

de educação, devido aos vários partidos do governo, é o PDT.39 São partidos

com propostas bem diferenciadas. O que está, quando assumiu a pasta, reuniu seu grupo de trabalho. O que é que ele pediu? Que fosse feita uma análise criteriosa. Vamos ir [sic] ao Ensino Médio Politécnico e ver quais as possibilidades de continuidade ou não. [...] Desde fevereiro se vem fazendo uma caminhada desses estudos.

As considerações do depoimento demonstram que as inovações do Ensino Médio Politécnico, como política educacional, estão sendo analisadas por critério político, pois,

[...] na educação escolar, as inovações sempre aparecem vinculadas a questões ideológicas, sociais, e econômicas e que as inovações dependem, para ser consideradas como tais, da conjuntura em que emergem, de quem são seus promotores e da incidência e da extensão que adquirem (HERNÁNDEZ et al., 2000, p. 19-20).

Analisando o contexto da mudança de governo, compreende-se a vontade do novo governante de implantar suas posições ideológicas na educação, contudo, se a aceitação da ideia inovadora anterior já chegou ao nível de consciência coletiva, existe a possibilidade de permanecer ou ser rompida por movimentos autoritários. Destaca-se que o Ensino Médio Politécnico passou a ser a diretriz curricular própria do Rio Grande do Sul com o Parecer do Conselho Estadual de Educação n° 310/2012, ao aprovar o Regimento Padrão Ensino Médio Politécnico (RIO GRANDE DO SUL, 2012), tendo como justificativa da elaboração dessa política educacional

[...] o Plano de Governo para o Rio Grande do Sul no período 2011-2014, os dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9.394/96 – incluindo a concepção para o Ensino Médio no que diz respeito à sua finalidade e modalidades nela presentes –, além da Resolução sobre Diretrizes Curriculares para a Educação Básica emitida pelo Conselho Nacional de Educação (CNE). RIO GRANDE DO SUL, 2011, [...] O Plano de Governo 2011-2014, no que tange à Política Educacional, estabeleceu como prioridade a democratização da gestão, do acesso à escola, ao conhecimento com qualidade cidadã; à aprendizagem e ao patrimônio cultural, e a permanência do aluno na escola, além da qualificação do Ensino Médio e Educação Profissional.

No entanto, a realidade que se apresenta está a exigir, urgentemente, mudanças e novos paradigmas para o Ensino Médio e para Educação Profissional. A qualidade cidadã da educação está ancorada em três fatores

37 Partido dos Trabalhadores.

38 Partido do Movimento Democrático Brasileiro. 39 Partido Democrático Trabalhista.

estruturantes: valorização profissional, diretamente relacionada à questão salarial, à carreira e à formação inicial e continuada; reestruturação física da rede estadual de ensino; e reestruturação do currículo da educação básica, em especial o ensino médio (RIO GRANDE DO SUL, 2011a, p. 3).

A proposta aponta para uma ação interdisciplinar do trabalho pedagógico, entre as áreas do conhecimento (Ciências da Natureza e suas Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias; Linguagens e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias); na relação teoria e prática; na pesquisa como princípio pedagógico; no trabalho como princípio educativo; na Politecnia como conceito estruturante do pensar e fazer. Na interlocução com os eixos Cultura, Ciência, Tecnologia e Trabalho, tendo como perspectiva a construção de conhecimento e a inserção social da cidadania (AZEVEDO; REIS, 2013). O assento da concepção pedagógica no Rio Grande do Sul, para o currículo, fica cristalizado no papel integrador da categoria trabalho e oposta ao modo produtivista orientado pelas diretrizes curriculares de 1998, que,

sob a hegemonia da teoria do capital humano e em sintonia com os princípios da meritocracia, presumia-se que, com o prolongamento de uma base comum a todos os alunos, a escola poderia exercer uma função compensatória, igualando as oportunidades dos diferentes setores sociais. E a igualdade de oportunidades escolares se transformaria em igualdade de oportunidades sociais, dada a forte associação entre ocupação, salário e nível educacional (KRAWCZYK, 2011, p. 759).

Cabe ressaltar que Krawczyk (2011), em suas reflexões sobre o Ensino Médio e a possibilidade de se construir uma proposta curricular com os fundamentos teóricos da politecnia, concomitantemente, alerta para as dificuldades de aplicação dada a complexidade de construção de tal perspectiva curricular no sistema de ensino brasileiro. A autora reforça que existe a persistência de um movimento de rompimento no processo de aprendizagem da aparente divisão entre o trabalho intelectual e o manual que é típico do atrelamento da educação ao modo capitalista de produção.

Nas suas orientações, o Ensino Médio Politécnico apresenta aproximações teórico-metodológicas com o ProEMI, no que tange aos eixos constituintes do Ensino Médio, que são Cultura, Ciência, Tecnologia e Trabalho (RIO GRANDE DO SUL, 2011a), previstos nas DCNEM. E2, gestor da SEDUC/RS, salienta que, do ponto de vista metodológico e pedagógico,

[...] nosso documento está muito articulado com as diretrizes curriculares da resolução 2. [...] A formação integral humana. Então professor e gestor

percebem que ele sim contempla o que está posto para ela é maior e que a [sic] precisamos enquanto grupo de educadores.

A primeira adaptação é evidenciada no modo como as duas políticas educacionais, a federal e a estadual, aparecem no conjunto das instituições estaduais, ou seja, na SEDUC/RS e na escola, que são as responsáveis pela adoção dos instrumentos de adesão ao ProEMI. No caso do ProEMI, ambas as instituições, reconhecem o Programa, todavia a nomenclatura ProEMI é desconsiderada enquanto programa na práxis escolar, na comunidade escolar. E2, gestor da SED/RS, reporta sua consideração historicizando que:

O ProEMi é anterior nas propostas nacionais, mas a proposta propriamente dita vem ter sua aplicação nos estados em 2012 e para o Rio Grande do Sul. Então tem 2012, 2013 e em 2014, sendo que nós já estávamos em reestruturação. Então, quando tu me fala [sic] assim: ‘escola ProEMI’, tu me assusta [sic], porque a minha é escola Ensino Médio Politécnico, o programa é um plus’. [...] Esse programa Ensino Médio Inovador, vinculado ao MEC, o que vem facilitar? O que a gente diz nas escolas é que é um programa que tem um recurso. É uma verba. Um valor que vai ser dado pelo número de alunos que tu tens na escola.

Com base neste depoimento, remete-se ao que preconiza o PNE, que tem na estratégia 3.1 uma perspectiva de institucionalizar um programa nacional de renovação curricular no Ensino Médio. Observa-se que o ProEMI esbarra nessa perspectiva no Rio Grande do Sul, quando o estado desconsidera o Programa nacional em sua nomenclatura, como proposta pedagógica, e na aplicação estadual o reduz à questão do financiamento. O olhar do gestor estadual está muito mais na oportunidade de receber recursos financeiros, neste caso, sem se preocupar efetivamente em reconhecer o Programa e a qualidade do Projeto de Redesenho Curricular traçado para apresentação ao MEC. O Projeto de Redesenho Curricular, apresentado para avaliação no SIMEC como condicionante para receber recursos financeiros, é resultado de um diagnóstico que a comunidade escolar deve ter feito a partir da problemática da escola e vem relacionando um conjunto de ações e componentes pedagógicos elaborados no contexto dos macrocampos. Aqui, verifica- se que os macrocampos não são considerados na elaboração do Projeto de Redesenho Curricular nem tampouco tal projeto existe na prática escolar.

Nesta direção, uma segunda adaptação é desvelada sobre a proposta de redesenho curricular e revela que sua concepção foi estruturada no contexto da estrutura superior da SEDUC/RS e levada à escola. O Ensino Médio Politécnico

apresenta uma configuração curricular disciplinar pré-estabelecida e o componente de integração curricular apresenta-se como uma disciplina, ou seja, aparece na grade curricular da escola com tempo e lugar determinado com objetivo de realizar os projetos interdisciplinares. E3, diretor da escola analisada em Porto Alegre, faz considerações sobre a proposta curricular flexível e anterior da escola, que, mesmo sendo do estado, participava do projeto do

[...] Instituto Unibanco. Então, a escola assume o ProEMI, adota ProEMI, foi bem colocado. Na Secretaria de Educação tu não vê [sic] diferenciação numa escola com o ProEMI e sem o ProEMI. Diferenciação nenhuma, pois, nós todos tivemos que fazer o regimento, que é igual em todas as escolas. Ele nunca foi construído pela comunidade e ele foi colocado.

O redesenho curricular posto no estado do Rio Grande do Sul é realizado com o Seminário de Integração, pensado na SEE/RS e institucionalizado no regimento da escola (RIO GRANDE DO SUL, 2012), integrando, assim, a grade curricular a fim de realizar o processo de integração com os campos de conhecimento. A inovação pedagógica deve ocorrer nessa lógica nos projetos apresentados pelos professores no Seminário Integrado, com a perspectiva de integração curricular entre as disciplinas.

A terceira adaptação evidenciada, nesse processo vertical, é de que a escola não teve oportunidade de discutir antecipadamente o modelo de integração curricular a ser construído por ela, que é uma das premissas do ProEMI na elaboração do currículo flexível. Conforme E3, um dos critérios utilizados pela SEDUC/RS foi fazer um único Regimento Escolar para todas as escolas da rede, o que é denominado “como um Regimento outorgado”. A proposta curricular aproxima-se do ProEMI quando assinala dez “eixos temáticos transversais para a parte diversificada” (RIO GRANDE DO SUL, 2011a, p. 24), com papel interdisciplinar: Acompanhamento Pedagógico; Meio Ambiente; Esporte e Lazer; Direitos Humanos; Cultura e Artes; Cultura Digital; Prevenção e Promoção da Saúde; Comunicação e Uso de Mídias; Investigação no Campo das Ciências da Natureza; Educação Econômica e Áreas da Produção. Observa-se que, por exemplo, a participação estudantil não figura entre as estratégias interdisciplinares.

A política educacional para o Ensino Médio do Rio Grande do Sul passa a ser instrumento uniformizador, que estabelece uma única política de currículo e é dada

identidade própria, com característica politécnica40, observando o referencial teórico41

que o acompanha. É de formato totalizante, porque tem em uma das suas características o critério essencial, como ressalta Mészáros (2005), sendo aplicado em todas as escolas de Ensino Médio, sem oportunidade de outro currículo e outra organização de tempo para o Ensino Médio regular público estadual. Essa opção sinaliza uma vontade real de superação dos desafios elencados para essa etapa da educação e antagônica ao modo formal ou experimental estabelecido para o ProEMI como programa.

2.2.2 O Ensino Médio Integral em Santa Catarina: interfaces e adaptações no