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A sexualidade é algo ligado à natureza humana e tão primitivo quanto ela, mas ao mesmo tempo evoluiu com o Homem e adaptou-se à complexa realidade da sua condição. Dado que esta se costuma praticar na intimidade, os pontos de referência são escassos e frequentemente distorcidos. O comportamento sexual é portanto, terreno fértil para a existência de numerosos tabus, sendo talvez, os jovens as principais vítimas destes preconceitos (Capellá Alfredo, 2003).

A sexualidade é uma energia que está sempre presente no ser humano e que interfere nos seus pensamentos e sentimentos. Desta forma, influencia as suas relações interpessoais, pelo que se torna emergente a sua compreensão.

A sexualidade está enraizada no biológico e não pode ser entendida sem ter em consideração esta dimensão. Os desejos e os comportamentos sexuais dependem, entre outros factores, das hormonas sexuais, da idade, do desenvolvimento físico e psíquico, da organização social e cultural em que o indivíduo está inserido. A sexualidade é vivida de diferentes maneiras consoante a forma de vida das pessoas. Seria óptimo dar uma definição de sexualidade que abrangesse um grande número de conceitos, vivências, culturas, sonhos, (…) mas continuaria a ser uma definição incompleta. Iríamos sempre descobrir alguém que pensa de forma diferente da nossa e que acrescentaria incessantemente algo de novo. Daí, dizer-se que é difícil definir a sexualidade, dada a complexidade dos aspectos em que está embricada (Capellá Alfredo, 2003).

Todos estamos extremamente interessados no sexo e na sexualidade, na nossa e na dos outros. Mas, de uma perspectiva científica, o termo encontra-se frequentemente associado às relações sexuais que conduzem à gravidez. No entanto, se analisarmos a História evolutiva da vida, vemos que o sexo é a formação genética que não tem, necessariamente, nada a ver com a reprodução, tal como hoje a compreendemos nos mamíferos (Sagan Dorion e Margulis Lynn, 1990; Rodrigues Custódio, 1999; Rosa João, 2001).

O instinto sexual é algo que, desde os insectos ao ser humano, aparece de uma maneira extremamente forte, levando a certos comportamentos e gastos de energias que só se justificam biologicamente porque tornam possível algo fundamental à vida, a perpetuação da própria espécie. O entendimento do comportamento animal poderá clarificar alguns aspectos das condutas do homem. Dado que a sexualidade animal só se realiza integralmente na idade adulta, poderá constituir uma mais valia no processo de conquista de informações bem como

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da sua importância na organização de uma conduta. Daqui resulta que as paradas nupciais das várias espécies poderão estar associadas a diferenciações da harmonia endócrina, da própria anatomia do aparelho genital bem como da fisiologia sensorial dos animais. O universo dos animais assenta na organização de uma brilhante convergência entre as espécies: a sinais característicos enviados pelos machos respondem mecanismos inerentes à fêmea (Andrade Isabel, 1996; Rodrigues Custódio, 1999; Rosa João; Diamond Jared, 2001; Allen Gomes; Crawford Marta et al., 2007).

Mas, se nas espécies inferiores como os insectos, répteis ou peixes, esse instinto se inicia e acaba com o acto sexual em si mesmo, à medida que se avança para as espécies superiores, começa a ver-se que muitas vezes o instinto também serve para criar laços ou relações mais ou menos fortes entre os parceiros sexuais. Comummente, o objectivo é que ambos os progenitores ajudem na criação dos filhos, que é tanto mais complexa, demorada e exigente de cuidados quanto mais evoluída é a própria espécie. O sexo dos indivíduos, compreende todos os seres vivos aptos a conceber gâmetas de apenas um dos géneros, masculino ou feminino. O termo sexualidade não designa apenas actividades e o prazer que dependem do funcionamento genital, mas toda uma série de excitações e actividades presentes desde a infância, cujo prazer é indomável à satisfação de uma necessidade fisiológica básica. A sexualidade torna-se mais perfeita com as mutações que se operaram nas diferentes espécies. À medida que se sobe na escala zoológica, a reprodução vai integrando estruturas cada vez mais complexas (Rodrigues Custódio, 1999; Marques António et al., 2000; Rosa João, 2001; Sampaio Daniel, 2006).

Desta forma, nos seres mais primitivos, a reprodução manifesta-se sob o rigoroso controlo de informações codificadas ao nível dos seus genes, nos vertebrados e em determinados invertebrados assume já alguma forma de controlo hormonal e, finalmente, surgem nos mamíferos e, sobrepondo-se a ambos, os mecanismos cerebrais que, no Homem, navegam nas vias do imaginário, do simbólico e mesmo da razão (Andrade Isabel, 1996; Rodrigues Custódio, 1999; Diamond Jared; Rosa João, 2001).

A partir dos dois anos, as crianças começam a manifestar um especial interesse pelos seus órgãos genitais. É por essa altura que descobrem o prazer da sua manipulação (Carvalho P. Torres, 2000). Segundo o pediatra Benjamim Spock, citado por Carvalho P. Torres (2000:45), “as crianças de 3, 4 e 5 anos manifestam fisicamente os seus sentimentos de afecto, agarram-se e encostam-se aos adultos que preferem. Interessam-se pelo corpo humano, tanto pelo deles como pelo das outras pessoas; de vez em quando, sentem o desejo de o ver e de lhes tocar”.

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Há mais de cem anos, Freud Sigmund, esse profeta da sexualidade humana, escandalizou o mundo quando afirmava a existência de uma sexualidade infantil que se exprimia através de todo o corpo, e não era apenas circunscrita aos órgãos genitais. Freud Sigmund defendia, ainda que na criança a sexualidade se desenvolvia e manifestava ao longo de três movimentos distintos: a fase oral, a fase anal e, finalmente, a fase genital. “Assim a descoberta do prazer realiza- se, nos primeiros tempos de vida, através das funções biológicas e a sexualidade exprime-se na criança, através de todo o corpo” (Carvalho P. Torres, 2000:45).

A questão da sexualidade começa na infância. Ao alimentar o bebé, a mãe (ou a substituta) não está apenas a saciar a fome, mas há, aí, uma experiência de prazer prazer da mãe que alimenta, e estabelece com o filho o contacto corporal, a mãe que conversa e acaricia o seu bebé, criando, assim, um gozo na fusão e complementaridade entre ambos. Nesta fase da vida, é impossível para o bebé distinguir a satisfação do saciar da fome e da satisfação sexual, pois elas coabitam. Podemos pensar a sexualidade como instâncias de satisfações físicas somadas às experiências psíquicas (Sampaio Daniel, 2006; Crawford Marta et al.; Sá Eduardo, 2007). São variadíssimos os autores que perfilham esta ideia de que a sexualidade se manifesta na criança, desde o nascimento, logo quando a criança começa a mamar (no acto de sucção) e que se estabelece na relação com alguém, normalmente a mãe. Pelo que no ser humano a sexualidade possui contornos perfeitamente definidos que a distanciam dos restantes animais, escapando às determinações associadas à perpetuação da espécie (Capellá Alfredo, 2003). No homem, não há períodos sazonais e, na mulher, cuja supremacia em relação a qualquer finalidade reprodutora, é já, francamente, visível no desenvolvimento dos seus seios (independentemente do período de aleitamento), o desejo que a habita não está regularizado pelos períodos da ovulação. Podemos então dizer que a espécie humana aparece como o limite de um aperfeiçoamento em que impera a estrutura integrada pelo sistema nervoso central e o mecanismo hormonal. Absolutamente independente das intermitências sazonais e, excedendo o esquema estímulo-reacção, deixando de se consumir na acção reprodutora, ela desdobra-se no universo imenso do desejo, na procura de um sentido para a sua plenitude. Há ainda uma outra circunstância relevante no contexto da sexualidade, mercê da sua morfologia corporal, o coito face a face é exclusivo da espécie humana (Andrade Isabel, 1996; Chambon Philipe, 1998; Rodrigues Custódio, 1999; Diamond Jared, 2001; Sampaio Daniel, 2006; Sá Eduardo, 2007).

“O despertar do desejo pressupõe que o indivíduo se abandone à linguagem do corpo, que consinta no paroxismo de uma presença, outra que não a sua, capaz de o projectar nas virtualidades do imaginário e do simbólico. Isto

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murmúrio de uma voz, o tom de uma carícia se fundem na subjectividade de um indivíduo para com o outro e vice-versa” (Andrade Isabel,1996:9).

As representações adquirem-se depois do nascimento, em primeira instância, no seio familiar e, logo a seguir, no grupo social. Esse universo mental, sem o qual ninguém possuía a consciência de integrar a espécie humana, vai-se construindo através das interacções precoces, muito particularmente com a mãe, graças às quais a criança adquire pouco a pouco o conhecimento do seu próprio corpo, aprendendo a falar, reconhecendo a sua imagem no espelho e identificando o seu nome (Andrade Isabel 1996; Rodrigues Custódio, 1999; Marques António et al., 2000; Sampaio Daniel, 2006).

Tendo a percepção de que a orientação sexual, não é uma escolha e que a sexualidade tem múltiplas manifestações, torna-se importante que os jovens compreendam e aceitem esta variabilidade, contribuindo desta forma para que essa mesma sexualidade possa ser vivida em plenitude e com satisfação. Tudo o que é sexual é da ordem do desejo do prazer e (…) da líbido. A líbido que concebe, possibilita, viabiliza e potencia as relações entre ambos os sexos (Andrade Isabel; Frade Alice et al., 1996; Rodrigues Custódio; Moore Thomas, 1999; Diamond Jared, 2001; Capellá Alfredo, 2003; Sampaio Daniel, 2006; Crawford Marta et al.; Damas Manuel, 2007).

O relacionamento sexual tem assim, na espécie humana, além da função reprodutiva, dois papéis importantíssimos: a satisfação de um instinto básico, tal como existe nos outros animais, e sobretudo, a criação de laços vinculativos, fortes entre duas pessoas que procuram o prazer mútuo e, eventualmente, uma vida em comum. O sexo faz parte da vida, daí os seres humanos darem uma grande importância à sexualidade. Frequentemente, ela é sentida como uma necessidade básica para satisfazer um impulso fisiológico do nosso corpo. Este impulso pode ser satisfeito, através da masturbação ou através de um(a) parceiro(a) casual ou pago(a) para o efeito. Mas, na maioria das vezes, esse sexo pelo sexo não é, de modo algum, completamente satisfatório em termos psicológicos e afectivos. Isto acontece porque, como somos seres humanos e para nos realizar ou viver completamente a nossa sexualidade, existe sempre a necessidade de criar laços ou relações afectivas e de cumplicidade com a pessoa que normalmente na nossa sociedade voluntariamente escolhemos como companheiro(a) (Brown e Cromer, 1996; Rodrigues Custódio, 1999; Marques António et al., 2000; Macpherson Ann, 2001; Sampaio Daniel, 2006; Allen Gomes; Crawford Marta et al., 2007).

Apesar destas extraordinárias mudanças, muitos dos comportamentos sexuais dos homens e mulheres contemporâneos continuam a deixar transparecer marcas da ancestralidade, que a todo o momento nos lembram o caminho evolutivo percorrido. Muito embora a sexualidade

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humana mantenha algumas características semelhantes às de outras espécies animais, delas difere radicalmente na sua essência. Espírito, inteligência, sentimentos, emoções e afectividade são cambiantes que conferem qualidades que a distinguem e afastam da reprodução animal. A vida na espécie humana, deveria surgir de um acto de intimidade consciente, voluntário, prazeroso, afectivo e amoroso (Andrade Isabel, 1996; Ferreira M. F. Moreira et al, 2004; Sampaio Daniel, 2006; Allen Gomes;Crawford Marta et al.; Sá Eduardo, 2007).

O termo sexualidade encerra em si a totalidade das qualidades humanas, e não apenas o aparelho reprodutor e o seu funcionamento, abrange todos os componentes de um indivíduo, nomeadamente os do foro biológico, psicológico, emocional, social, cultural e espiritual (Ferreira, M. F. Moreira et al., 2004; Sampaio Daniel, 2006; Allen Gomes; Crawford Marta et al.; Damas Manuel, 2007).

O ser humano é podemos dizer, todo um conjunto de intenções, emoções, sonhos, desejos, medos, um passado, um ambiente cultural e uma vida interior de pensamento e fantasia na qual o sexo é um dos aspectos mais influentes da vida. O sexo é infinitamente mais misterioso do que, regra geral, imaginamos e só é superficialmente levado em conta, quando falamos sobre ele em termos de hormonas e da mecânica do acto sexual (Andrade Isabel, 1996; Moore Thomas, 1999; Rodrigues Custódio, 2000; Rosa João, 2001; Sampaio Daniel, 2006; Sá Eduardo, 2007).

“A sexualidade humana pode constituir uma forma privilegiada de enriquecimento pessoal e relacional ou, pelo contrário, tornar-se uma fonte de sofrimento que afecta dramaticamente a vida da pessoa, quer a nível da realização pessoal e relacional, quer a nível das pesadas facturas pagas quando a sua expressão se faz de forma imatura, ignorante, culpabilizada e ou violenta” (Frade Alice et al., 1996:7).

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