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Capítulo 5- A sentença arbitral e a revisão judicial

5.1 O árbitro

5.1.2 Das boas relações entre os juízes e árbitros

A opção por um julgamento através da arbitragem não é suficiente para manter a análise do conflito totalmente à margem do poder estatal, pois haverá situações em que a tutela judicial será inevitável. Isso se deve ao fato de que, apesar do árbitro ter poderes jurisdicionais conferidos pelas partes e autorizado pela própria lei, ele não tem poderes coercitivos. Sendo assim, imagine a situação em que se tenha que executar medida cautelar, que encontre resistência daquele em face de quem a providência deva ser adotada. Por isso é que se espera que, em decorrência das várias situações que poderão ocorrer em que os juízes possam ter que participar do processo

juntamente com um árbitro, cada um com suas funções específicas, os mesmos possam desenvolver entre si relações de cordialidade.198

A Lei de Arbitragem disciplina o relacionamento entre os juízes e árbitros em dois parágrafos do artigo 22. No § 2° há a determinação de que o árbitro poderá solicitar a autoridade judiciária competente que conduza a testemunha renitente199 a fim de prestar depoimento. Já no §4°, quando da necessidade de realização de medidas coercitivas ou cautelares, o árbitro poderá solicitá-las ao Poder Judiciário.

Podemos, então, constatar que há, de certa forma, uma divisão de trabalho entre o árbitro e o juiz, mas caberá ao árbitro solucionar o litígio e ao juiz cumprir as medidas coercitivas que se façam necessárias para a consecução do que foi determinado na sentença arbitral.O que significa dizer que cada um trabalhará no seu âmbito de competência a fim de se chegar ao provimento jurisdicional, eficaz, pretendido pelas partes.200

Como se daria, então, essa divisão de competências nos casos apresentados pelos §2° e §4° do art. 22 da Lei de Arbitragem?

Primeiramente, no que tange ao §2° do artigo 22, quanto à condução da testemunha renitente, é preciso que se esclareça que a decisão a respeito de ouvir ou não a testemunha é do árbitro, que analisará a respeito da utilidade e da pertinência da prova testemunhal, como dele também será a atribuição de analisar os dados colhidos, que poderão influir ou não no julgamento a ser realizado. Mas, pode acontecer de a testemunha ser chamada a comparecer perante o árbitro e a mesma se recusar, cabendo, pois, ao árbitro, já que despido do poder coercitivo, inerente

198 CARNACINI, Tito. Arbitraje. Trad. Santiago Sentis Melendo. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa -

América, 1961, p. 83.

199 Ressalte-se que, caso a testemunha não queira comparecer perante o juízo arbitral, não seria a ela aplicável a

penalidade legal prevista à testemunha renitente do juízo comum, não havendo, por conseguinte, neste caso, a configuração do crime de desobediência. CARNACINI, Tito. Arbitraje. Trad. Santiago Sentis Melendo. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa - América, 1961, p. 83.

200 CARMONA, Carlos Alberto. Das Boas relações entre os juízes e árbitros. In: Revista do Advogado. São Paulo,

apenas ao juiz togado, solicitar a este a tomada de providências oportunas, através da possibilidade de condução sob vara.

O juiz togado determinará a condução coercitiva da testemunha à presença do árbitro sem, contudo, avaliar a respeito da pertinência ou utilidade da prova testemunhal. Caberá ao juiz togado, tão somente, verificar se o árbitro está albergado pela convenção arbitral válida e se está agindo dentro dos limites dos poderes que lhe foram outorgados pela mesma.

O que a Lei de Arbitragem não respondeu é como se daria este pedido do árbitro ao juiz. Não há dúvidas de que este procedimento deve se assemelhar em muito com o adotado para a carta precatória, pois não tendo o árbitro competência para determinar a condução à força, ele solicita (depreca) a quem tenha tal poder.

O árbitro deverá dirigir-se ao juiz através de mero ofício, instruído com a cópia da convenção de arbitragem. No ofício estará indicado pelo árbitro o dia, hora e local (desde que nos limites da comarca) em que a testemunha prestará depoimento, devendo constar ainda do mesmo o endereço para as diligências. Esse ofício será distribuído para um dos juízes competentes para o ato. Como vimos, caberá ao juiz apenas a análise dos aspectos formais, mas se da análise destes comprovar que não assiste ao árbitro a possibilidade do julgamento (quando, por exemplo, a cláusula arbitral for nula) deverá recusar o cumprimento da solicitação que lhe fora enviada, devolvendo o ofício recebido.201

Caso o juiz togado venha a negar, sem motivo, a solicitação do árbitro, estando este acobertado por uma convenção de arbitragem válida, poderá o árbitro pedir as medidas

201 CARMONA, Carlos Alberto. Das Boas relações entre os juízes e árbitros. In: Revista do Advogado. São Paulo,

correicionais cabíveis, sem prejuízo ainda de poder pleitear perante o tribunal, através de mandado de segurança, o cumprimento da diligência que lhe foi denegada.202

Um problema, no entanto, que suscita um certo inconveniente é a possibilidade da medida cautelar ser pretendida antes da instauração do juízo arbitral, ou seja, após a celebração da cláusula compromissória, mas antes da nomeação dos árbitros.

Neste caso, deveria haver a aplicação clara do princípio do quando est periculum in mora incopetencia non attenditur, ou seja, as regras de competência podem ser desprezadas quando e se houver algum obstáculo à parte que está necessitada da tutela de emergência de obter acesso ao juízo originalmente competente. Sendo assim, a parte necessitada poderia interpor o pedido de medida cautelar perante o juízo comum, sem prejuízo da via arbitral posterior, apenas para a concretização da medida urgente. Instituída a arbitragem, os autos do processo cautelar serão remetidos ao árbitro que deverá analisar quanto à manutenção ou revogação da medida, já que pertence a este o juízo acerca da tutela cautelar.