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Definições platônicas e formas

No documento Benson, Hugh h. Platão (páginas 118-140)

R. M. DANCY

Aristóteles nos diz (Metaph. I.6.987a29- bl4, XIII.4.1078bl2-32 e 9.1086a24-b4) que Sócrates se preocupara com definições no domínio dos “assuntos éticos” (compreendido largamente de modo a incluir virtualmente todo assunto de avaliação) e que Platão herdou dele esta preocupação. Muitos dos diálogos de Platão classificados como “jovens” ou “socráticos” mostram uma preocupação constante com assuntos de definição. Não vejo nenhuma boa razão para duvidar de

Aristóteles (por outro lado, ver, por exemplo, Kahn, 1996) e estou fortemente inclinado a supor que os diálogos socráticos nos dão algo do sabor de um discurso socrático. Em outras palavras, tomo estes diálogos como uma ficção histórica, especialmente em conexão com as definições. Até em Xenofonte

Sócrates demonstra uma predileção por perseguir definições (ver, por exemplo, Mem. I.i. 16; IVvi), embora, quando tem de reconstruir a prática de Sócrates, Xenofonte não nos dá nada da ordem dos diálogos

socráticos de Platão.

Aristóteles nos diz, também, que a adoção por parte de Platão da busca por definições de Sócrates tomou um rumo especial: Platão tornou os objetos de definição, as “Formas”, distintos ou separados das coisas sensíveis. Veremos isso ocorrer não nos diálogos socráticos, mas no Fédon e na República. Eles pertencem ao grupo dos que são comumente referidos como diálogos “médios”.

Os diálogos socráticos que serão considerados aqui são: Carmides, Eutifro, Hípias Maior, Laques, Lísis, o Protágoras e o livro I da República (sobre a controvérsia a respeito do Hípias Maior, Lísis e República I, ver as referências em Dancy, 2004, p. 7-9). Quem questiona a veracidade histórica destes diálogos tomará a reconstrução a seguir como pertinente unicamente ao próprio

Platão. Portanto, as ocorrências do nome “Sócrates” devem ser tomadas somente como se referindo à personagem nos diálogos de Platão.

Isso se aplica a fortiori ao uso do nome “Sócrates” que ocorre na discussão abaixo dos diálogos médios, Fédon, Banquete e República, bem como do Mênon, que eu considero

Hugh H. Benson 119 de 711 como um diálogo de transição. Em

minha visão (que não é somente minha), estes últimos diálogos envolvem muito mais temas de Platão

e menos de Sócrates do que o fazem os diálogos socráticos; nesta perspectiva, o Sócrates dos diálogos socráticos tende a representar o

Sócrates histórico, ao passo que o

Sócrates dos outros diálogos tende a representar Platão, e há um desenvolvimento no tempo de um grupo para outro (ver os capítulos Interpretando Platão e O Problema Socrático).

Você não precisa aceitar nenhuma destas posições para seguir este capítulo. O desenvolvimento de que falo é, em primeira instância, um desenvolvimento lógico: os argumentos de Sócrates nos diálogos socráticos não o comprometem, tal como vejo, com a posição metafísica comumente denominada “Teoria das Formas”, mas seus argumentos nos diálogos “médios” o comprometem. Porém, estes últimos argumentos emergem dos primeiros. Em particular, um argumento crucial que emerge é o que chamarei “argumento da relatividade” (AR). Nos diálogos médios, este argumento contrasta a Forma, digamos, o Belo, com seus participantes mundanos, as coisas

belas corriqueiras, sob a razão que estas últimas são belas somente relativamente, enquanto o Belo é belo plenamente (ver o capítulo As Formas e as Ciências em Sócrates e

Platão). Ele efetua este contraste do seguinte modo (mais comentários a seguir):

(ARE) Há algo como o Belo.

(ARC) Uma [coisa: a língua grega não requer este termo] bela corriqueira é também feia.

(ARBelo) O Belo nunca é feio.

••• (ARCo) O Belo não é o mesmo que

uma [coisa] bela corriqueira.

Aqui (ARE) postula a Existência do Belo, (ARR) é uma premissa (a ser argumentada) segundo a qual coisas belas Rotineiras são belas somente relativamente, (ARB) é uma premissa sobre a Forma, o Belo, de acordo com a qual não é belo unicamente relativamente, e (ARCo) é a Conclusão.

Este argumento não comparece nos diálogos socráticos, ainda que haja uma clara antecipação dele no Hípias Maior (ver infra). Comparece, contudo, nos diálogos médios. Este é o principal desenvolvimento de que estou falando, e está ali, qualquer que seja a cronologia ou as pessoas

Hugh H. Benson 120 de 711 envolvidas.

Vamos construir uma Teoria da Definição para Sócrates. Esta teoria não tem a pretensão de ser a Teoria da Definição de Sócrates ou a de

Platão, já que não existe uma Teoria da Definição explícita nestes diálogos, em contraste com os diálogos tardios Fedro, Sofista, Político e Filebo, nos quais há algo mais sob a forma de uma teoria (por vezes referida como o “Método do Agrupamento e Divisão”). A Teoria da Definição baseia-se antes na refutação por parte de Sócrates de várias tentativas específicas para definir termos, que em pronunciamentos de Sócrates

sobre o que deve ser uma definição; perguntamos, no caso de cada uma

das refutações, como

especificamente ela malogra e então como deveria ser uma definição que teria evitado tal fracasso.

Esta Teoria da Definição conterá uma condição de adequação para uma definição razoavelmente imediata, adiante denominada “Requerimento de Substitutividade”, uma outra mais difícil, o “Requerimento de Explicação”, e uma terceira bem problemática, o “Requerimento de Paradigma”. Estas duas últimas vão especialmente

alimentar a Teoria das Formas. Contudo, elas não implicam esta teoria; quando Sócrates está às voltas com definições, ele não está às voltas de modo algum com metafísica (contra isso veja, por exemplo, Allen, 1970). Veremos a virada à metafísica quando chegarmos ao Fédon.

UMA TEORIA SOCRÁTICA DA DEFINIÇÃO

Talvez a primeira coisa a observar é que Sócrates não dispõe de um termo que signifique diretamente “definição”; um termo que ele usa significa, em primeira instância, “fronteira”, mas o peso primário de suas discussões recai sobre a questão “o que é...?”, “o que é o pio?” (Eutifro), “temperança?” (.Carmides), “o belo?” (Hípias Maior), etc.

Antes de introduzir nossa teoria, devemos considerar por que Sócrates

está à busca de definições, por que responde em primeiro lugar às suas questões “O que é...?”

Em República I, ele pergunta o que é a justiça; ele espera com isso tornar claro se pessoas justas são mais felizes que pessoas injustas e, assim (352dl-7), nos ajudar a ver como devemos viver nossa vida. Este

Hugh H. Benson 121 de 711 interesse prático é bem visível em

outros diálogos nos quais definições são buscadas. Os dois primeiros terços do Laques têm a ver com a questão de se aprender ou não a lutar com armas pesadas ajuda a constituir o caráter, especialmente a coragem; a questão “o que é a coragem?” é feita em 190d para dirimir a questão. O Lísis trata da questão sobre o que é um amigo (212a8-b2: para a expressão, ver 223b7-8), após considerações sobre como os amigos devem tratar um ao outro (estas considerações ocupam metade do diálogo). No Eutifro, a questão “o que é a piedade?” é introduzida em 5c-d (citada a seguir), após Eutifro ter dito que estava processando seu pai por assassinato com base em teses sobre o que é agir de modo pio. Talvez o diálogo que cause mais impacto neste sentido seja o Protágoras, que inicia formulando a questão se estudar com um sofista como Protágoras conduzirá à virtude ou excelência, examina um número impressionante de ramificações de largo alcance e termina com Sócrates

dizendo a todo mundo que toda a dificuldade foi devido a fracasso deles em responder à questão “o que é a excelência”. Todo mundo se mostra por demais ocupado para se ocupar disso e o diálogo tem fim.

Sócrates, assim, quer definições porque pensa que elas são essenciais para se conceber como viver

corretamente e muito

frequentemente nestes diálogos os “preliminares” que levam à questão de definição ocupam mais espaço que a discussão desta questão.

Mesmo assim, a questão pela definição tem claramente grande importância e Sócrates nos dá uma razão para insistir nela quando estamos tentando determinar como viver. Ele pressupõe (contra isso ver, por exemplo, Beverluis, 1987), como afirma explicitamente, algo a que me referirei como a “Suposição Intelectualista” (frequentemente referida alhures como “Falácia Socrática” ou “Princípio da Prioridade da Definição”; ver especialmente Benson, 1990; 2000, p. 112- 63; Dancy, 2004, p. 35-64 para mais comentário e referências), que podemos formular como:

(SI) Para saber que... F –, deve-se ser capaz de dizer o que F ou F-dade é.

Onde “...F é uma sentença declara- tiva que contém “F” (ou “F- dade” ou “o F); por exemplo, onde “F’ é “pio”, “...F pode ser “esta ação é pia” ou “piedade ~e uma boa coisa”. Dizer

Hugh H. Benson 122 de 711 o que é F ou F-dade é o definir. Assim,

por exemplo: para dizer se processar o próprio pai por assassinato em circunstâncias como as de Eutifro é o que deve ser feito, deve-se definir o pio ou a piedade (ver Euthph. 4d9-e8, 5c8-d5, 6d6-e7,15cll-el); para dizer se algo é bom ou belo (traduções alternativas da mesma palavra em grego, kalon: vou manter “belo”), deve-se definir o belo (ver Hp. Ma. 286c5-d2, 298bll-c2, 304d4-e3); para dizer se pessoas justas são mais felizes que pessoas injustas, deve-se definir justiça (ver R. I, 354al2-c3).

Até aqui tenho usado minúsculas, como em “o belo”, para mencionar o sujeito sobre o qual

Sócrates pergunta “o que é”. Nos diálogos médios, o belo é reconstruí- do como uma Forma, “o Belo”. Vou adotar esta convenção: maiúsculas serão utilizadas quando estivermos falando de Formas.

A convenção aplica-se também ao termo “forma”; nos diálogos socráticos, Sócrates fala mais de uma vez sobre o que está procurando como uma “forma” (eidos) ou uma “ideia” (idea). Não há nenhuma força discernível entre estes dois termos, ambos derivados da raiz “id—” associada a um verbo para ver: vou

adotar “forma”. Os termos em questão eram bem comuns em grego como termos para características ou qualidades das coisas (inicialmente, características ou qualidades visuais), usados por pessoas sem nenhuma ideia profunda acerca do status ontológico das características e qualidades. Assim, falarei de “formas” nos diálogos socráticos e de “Formas” nos diálogos médios.

Sócrates por vezes dá início à sua busca de definição verificando se ele e seu interlocutor concordam em que haja algo sobre o que falar. No Hípias Maior (287c8- d2), ele pergunta se existe algo como o belo, e Hípias

prontamente concede que sim. Tais concessões, quando chegamos à Teoria das Formas, são concebidas como suposições sobre as Formas, ao fato que há algo como o Belo, a Forma. Porém, quando Hípias faz sua pronta concessão, ele não pensa que ela está carregada deste tipo de peso metafísico. E Sócrates imediatamente tira proveito da concessão para o que quer: “diga-me então, meu caro, o que é o belo?” (287ed2-3). Ele não se investe em uma elaboração do status ontológico do belo. O diálogo está às voltas com a definição, não com a ontologia. Quando falamos de modo habitual sobre, digamos, animais e

Hugh H. Benson 123 de 711 perguntamos o que distingue o leão

do tigre, usualmente não temos nenhum interesse na questão metafí- sica se o leão é algo além dos leões comuns. E Sócrates não parece demonstrar nenhum interesse na questão paralela se o belo é algo além das coisas belas – pelo menos, não neste ponto. Do ponto de vista deste capítulo, esta é a diferença entre os diálogos socráticos e os da fase média.

A Teoria da Definição que vamos reconstruir parece o seguinte. Começamos com um candidato para definiens: uma expressão que pretende definir adequadamente um termo, o definiendum. Os diálogos socráticos requerem de uma definição adequada que ela satisfaça:

 o Requerimento de

Substitutividade: o definiens deve poder ser substituído por seu definiendum sem alterar a verdade ou falsidade da sentença que contém o definiens (salva veritate);

 o Requerimento de Paradigma: o definiens deve fornecer um paradigma ou padrão em comparação com o qual casos de seu definiendum podem ser determinados; e

 o Requerimento de Explicação: o definiens deve explicar a aplicação de seu definiendum.

O primeiro dos três requerimentos pode ser, com conveniência, partido em dois, com base no esquema que o formaliza: (RS) w = df abc -> (...w – <-> ... abc -)

entendendo “...w como antes com “...F e lendo como “somente se” e como “se e somente se”. Então, (RS) pode ser entendido como a conjunção de

(Nec) w = dfabc -» (...w—>... abc -),

que nos diz que o definiens “abc” fornece uma condição necessária para que algo satisfaça o definiendum “w”, e

(Suf) w – dfabc (...w —>... abc -),

que nos diz que o definiens nos fornece uma condição suficiente para que algo satisfaça o definiendum. Por exemplo, se “égua” é corretamente definida como “a fêmea do cavalo”, então (Nec) nos diz que se Mimosa é uma égua, ela é uma fêmea do cavalo, e (Suf) nos diz que, se ela é uma fêmea do cavalo, ela é uma égua.

Hugh H. Benson 124 de 711 Enunciar puramente os

requerimentos malogra em espelhar em um importante aspecto a prática de Sócrates, pois Sócrates nem sempre os trata como requerimentos isolados: antes, ele tende a apresentar mais de um deles em conjunto.

Como um exemplo deste fenômeno, considere um par de passagens do Eutifro. Primeiro, em 5c8-d5, Sócrates diz:

Agora, por Zeus, diga-me o que acabou de afirmar que conhece claramente: que tipo de coisa você diz que o reve- rente [isto é, o pio: veja 5d2 a seguir] e o irreverente [isto é, o ímpio] são, no que toca tanto ao assassinato quanto a outros [assuntos]?

Ou não é o pio ele próprio o mesmo em cada ação, e o ímpio, novamente, o contrário do pio em sua totalidade, mas como ele próprio e tudo o que há de ser ímpio tem, com respeito à sua impiedade, uma ideia?

(Quando, no início, Sócrates diz que Eutifro “acabou de” afirmar que sabia claramente o que o reverente é, faz alusão a 4d-e, passagem na qual a Suposição Intelectualista é desdobrada.) Em meus termos, ele está nos dizendo que (Nec) é satisfeito e, se ler- mos “ímpio” como “não pio”,

está nos dizendo também que, por contraposição, (Suf) é satisfeito também.

Eutifro aceita isso e Sócrates o menciona após Eutifro ter tentado definir o pio como “processar quem comete injustiça, seja a respeito de assassinatos, roubos em templos, ou quem causa dano de algum outro modo, seja ele o pai, a mãe ou alguém outro, e não o processar é ímpio” (5d9-e2). Podemos formular isso como:

(Dipio) x é pio = df x é o caso de processar quem causa dano de um modo ou de outro.

Antes de ir adiante, deve-se notar que (Djpio) é totalmente típico de todos os diálogos sob consideração pelo fato que, apesar de gerações de comentário, os interlocutores de

Sócrates, em suas primeiras tentativas de definição, não citam “particulares” como opostos a “universais” (ver Nehamas, 1975/6. No caso de (D^io), processar pessoas más é um “universal” perfeitamente bom, instanciado muitas vezes em cortes de justiça mesmo atualmente. Os interlocutores de Sócrates sempre propõem universais, embora frequentemente, como neste caso,

Hugh H. Benson 125 de 711 universais que não são

suficientemente universais, como observa Sócrates. O que ele diz é (6d6- 8):

... Porém, Eutifro, você diria que muitas outras coisas são também pias. Eutifro: Pois elas também são [pias].

Até aqui, tudo o que temos é Substitutividade, em particular (Nec): há outras coisas pias além de processar malfeitores, de sorte que não nos dá uma condição necessária para a piedade.

O que Sócrates diz a seguir vai além disso (6d9-e7):

Sócrates: Então, você lembra que eu

não lhe disse para ensinar-me uma ou duas das muitas coisas pias, mas aquela forma ela própria pela qual todas as coisas pias são pias? Você, pois, disse, eu penso, que é graças a uma ideia [= forma: veja anteriormente] que as coisas ímpias são ímpias e as coisas pias, pias; ou você não lembra?

Eutifro: Lembro-me, de fato.

Sócrates: Então, ensina-me esta ideia,

o que é, de sorte que, olhando para ela e servindo-me dela como um paradigma, o que quer que seja tal como ele é entre as coisas que você ou

alguém faz, direi que é pio, e o que quer que não seja tal, direi que não [é] pio.

Aqui temos não somente Substitutividade, mas também o Requerimento de

Explicação (que “forma ela própria pela qual todas as coisas pias são pias”), bem como o Requerimento de Paradigma (“servindo-me dela como um paradigma, o que quer que seja tal como ele é... direi que é pio, e o que quer que não seja tal, direi que não [é] pio”). Porém, tudo o que

Sócrates requer no argumento contra (D^io) é (Nec); ele não faz uso algum desses requerimentos adicionais. Fará isso mais tarde, e eles terão um emprego separado (ver a seguir).

Em outros diálogos, o Requerimento de Substitutividade é empregado sem menção aos outros. No Laques, a primeira tentativa (190e5-6) de definir a coragem como “fincando o pé” fracassa porque há ações corajosas que não envolvem “fincar o pé”, mas, de fato, recuar (191a5-c6); Sócrates quer, diz ele, “o que é o mesmo em todos os casos” (191el0-ll). Aqui o definiens não logra a Substitutividade ao malograr em dar uma condição necessária. A segunda

Hugh H. Benson 126 de 711 tentativa de Laques (192b9-cl) define

a coragem como perseverança;

Sócrates objeta observando que há casos de perseverança que não con- tam como coragem (192c5-d9; o argumento de Sócrates é mais complicado que isso, mas está é sua base). Aqui o definiens não logra a Substitutividade porque não dá uma condição suficiente. Todas as outras tentativas neste diálogo fracassam por uma ou outra destas duas razões, sem o auxílio dos outros requerimentos. O mesmo vale para muitos outros casos em outros diálogos.

Com o Requerimento de Explicação é uma outra história. Consigo encontrar apenas um caso no qual é usado em um contexto que não menciona outros requerimentos. Porém, ele carrega o peso principal em mais de um dos argumentos de

Sócrates contra as definições propostas; por vezes, embora os outros requerimentos apareçam no pano de fundo, eles são irrelevantes para o curso real do argumento de

Sócrates.

É útil considerar a plausibilidade inicial do Requerimento de Explicação. A ideia é que uma definição adequada deve nos dar não

somente um termo substituível uniformemente pelo termo definido, mas também deve explicar a aplicação do termo definido. Porém, isto é inicialmente plausível somente se “explicar” é entendido de modo fraco. Talvez faça sentido dizer que o que explica o fato que isto é uma égua é que se trata de uma fêmea do cavalo, mas esta explicação não é “causai” em nenhum modo óbvio, ainda que possamos reformular a alegação dizendo que isto é uma égua porque é uma fêmea do cavalo: o que é explicado é meramente o que entendemos ao chamá-la de “égua”; estamos meramente explicando o conteúdo da alegação que “isto é uma égua”.

No único contexto em que o Requerimento de Explicação aparece sozinho, o argumento complexo do Euthphr. 9dl-llbl, ele é, no final, tudo o que está em questão. A definição a ser derrubada é:

(Djpio) x é pio = dfxé amado por todos

os deuses (para (D2PÍ0), veja a seguir). A tese decisiva que opera contra isto é a concessão de Eutifro, segundo a qual (CE) o que é pio não é pio porque é amado por todos os deuses; antes, é amado por todos os deuses porque é pio.

Hugh H. Benson 127 de 711 A contestação de Sócrates é que,

se (D3pio) fosse correta, se seguiria

que o que é pio é tal porque é amado por todos os deuses. Isto equivale a dizer que, se (D3pio) fosse correto, se

seguiria que o conteúdo da alegação que “isto é pio” poderia ser desdobrado como “isto é amado por todos os deuses”: não há nada mais ocorrendo aqui do que estava no caso da “égua” e “fêmea do cavalo”. De qualquer modo, não há nenhuma sugestão que alguma entidade super- física etiquetada “o Amado por Todos os Deuses” estaria causando várias ações ou pessoas serem pias.

Uma comprovação completa requereria uma análise detalhada do argumento real de Sócrates, que é bem mais complexo do que indica o esquema anteriormente exposto, mas não há espaço aqui para o fazer.

Frequentemente, o

Requerimento de Explicação surge em conexão com o Requerimento de Paradigma. Vejamo-lo, pois, inicialmente.

A ideia geral é que o que é citado como definindo um termo “F” deve ser um paradigma para “F’ no sentido em que não aceita nenhum compromisso com o termo contrário

“conF’: o que define “belo” não pode conter nada de feio. Para o Sócrates

nos diálogos que estamos considerando, isto não é verdade para uma grande maioria de coisas que são belas; elas são feias em diferentes aspectos, em momentos diferentes, aos olhos de pessoas diferentes e assim por diante. Elas são, neste sentido, somente relativamente belas; elas são belas ou feias relativamente a certos contextos de avaliação, e o belo não pode ser isso.

Há um caso em que o Requerimento de Paradigma é empregado virtualmente de modo isolado, mais uma vez no Eutifro (e, de novo, o argumento é mais complexo que o que indicamos a seguir). Em 6ell- 7al, Eutifro tenta definir o pio como o que é amado pelos deuses, isto é:

(D2PÍ0) x é pio = df x é amado pelos

deuses.

É a revisão de Sócrates disto que

No documento Benson, Hugh h. Platão (páginas 118-140)

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