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O método da dialética de Platão

No documento Benson, Hugh h. Platão (páginas 140-163)

HUGH H. BENSON

Richard Robinson, em sua obra clássica Plato’s Earlier Dialectic (A Primeira Dialética de Platão, 1953), descreve a seguinte diferença entre os diálogos que ele toma como representando o “primeiro período” de Platão e os diálogos que ele toma como representando o “período médio” de Platão:

Os primeiros dão proeminência ao método, mas não à metodologia, ao passo que os médios dão proeminência à metodologia, mas não ao método. Em outras palavras, teorias do método são menos visíveis nos médios, mas exemplos dele são mais visíveis nos primeiros. Casos de

elenchus se seguem em rápida

sequência nas primeiras obras, mas, quando buscamos discussões sobre o

elenchus, encontramos poucas e não

muito abstratas. Os diálogos médios, por outro lado, abundam em palavras e propostas abstratas a respeito do método, mas não é de modo algum óbvio se estas propostas estão de fato sendo seguidas ou se algum método está sendo de fato aplicado. (Robinson 1953: 61-2).

Na continuação, Robinson

ameniza a distinção entre os dois grupos de diálogos, mas a discussão erudita do método platônico no segundo grupo de diálogos continua a ter mais como foco as propostas explícitas de Platão do que sua prática efetiva nesses diálogos. Sem dúvida, parte da explicação desta tendência é a sugestão feita por Robinson, segundo a qual Platão, nos diálogos do segundo grupo, parece não executar o que apregoa. O método filosófico que Platão faz com que

Sócrates recomende em diálogos como o Mênon, o Fédon e a República não é, aparentemente, o método que

Platão faz Sócrates pôr em prática nesses diálogos. Neste capítulo, vou resistir a uma tal concepção da dialética platônica. Começarei olhando rapidamente as recomendações explícitas de Platão

quanto ao método filosófico em três diálogos-chave médios: o Mênon, o Fédon e a República. Veremos que as diferenças nos métodos recomendados nestes três diálogos são aparentes, enquanto alguns traços centrais permanecem invariantes. Esses traços centrais podem ser reduzidos a dois processos: um processo de identificação e obtenção das consequências das proposições, conhecidas como hipóteses, no

Hugh H. Benson 141 de 711 intuito de responder à questão em

discussão, e um processo de confirmação ou justificação destas hipóteses. Vou sustentar que, em três passagens longas e decisivas nestes três diálogos, Platão faz Sócrates pôr em prática um ou outro destes processos do método que tinha feito

Sócrates recomendar. Tal visão da dialética platônica tem duas consequências imediatas. Primeiro, há maior continuidade e mais coisas em comum com a discussão do método em Platão – sua “metodologia”, para usar o termo de Robinson, do que normalmente se suspeita. Os métodos da hipótese introduzidos no Mênon e, de novo, no Fédon, bem como o método da dialética introduzido explicitamente na República são versões de um único núcleo de método. Segundo, a fim de entender o método filosófico recomendado por Platão nos assim ditos diálogos médios, não devemos restringir-nos às discussões explícitas de Platão sobre este método. Assim como, nos chamados diálogos primeiros, olhamos tanto para as discussões explícitas de Sócrates

acerca do método, como para sua prática efetiva, no intuito de compreender o elenchus (ver o capítulo O Elenchus Socrático), assim também nos chamados diálogos

médios devemos olhar para as discussões explícitas de Sócrates

acerca do método e para sua prática efetiva, no intuito de compreender a dialética. Em suma, devemos olhar tanto para sua “metodologia” quanto para seu “método”, para usar os termos de Robinson. Contudo, veremos que o método filosófico que surge destas duas fontes permanece, à luz do próprio Platão, de certo modo inadequado. Concluirei sugerindo uma explicação desta aparente inadequação – uma explicação que aponta na direção de estudos mais aprofundados.

A DIALÉTICA COM UM “D” MINÚSCULO

Comecemos com o termo “dialética”. Robinson, mais uma vez, sustentou, como é bem conhecido, que

o termo “dialética” tinha uma forte tendência em Platão de significar “o método ideal, o que quer que isso seja”. Na medida em que era assim um título meramente honorífico, Platão o aplicou em todo estágio de sua vida ao que lhe parecia no momento ser o procedimento mais auspicioso... Este uso, combinado com o fato que Platão

mudou uma vez de modo considerável sua concepção do melhor método, tem como resultado que o significado do termo “dialética” sofre uma

Hugh H. Benson 142 de 711 alteração substancial ao longo de seus

diálogos. (Robinson, 1953, p. 70) Pode surpreender, contudo, que o substantivo grego he dialektikê e seus cognatos ocorrem somente 22 vezes no corpus platônico e somente uma vez nos diálogos que Robinson considera como jovens (Euthd. 290c5). Além disso, mais de um terço destas ocorrências estão concentradas em seis páginas Stephani na República (531d9, 534b4, 533c7, 534b3, 534e3, 536d6, 537c6, 537c7). O infinitivo substantivado to dialegesthai ocorre de modo muito mais frequente e pode, por vezes, portar um sentido técnico em contraste com seu uso corriqueiro, em que significa “conversar” ou “discutir”. Porém, é muitas vezes difícil determinar quando o sentido técnico está sendo usado. Mesmo assim, quando o sentido técnico está plausivelmente em uso, Robinson chama a atenção corretamente para sua instabilidade. Por exemplo, por duas vezes no Gorgias Sócrates

parece estar fazendo um contraste quase técnico entre to dialegesthai e a retórica, onde o contraste parece não ser mais do que uma preferência por uma questão e por respostas curtas ao invés de longas exposições de proeza filosófica (Grg. 447b9-c4 e

448dl-449c8; ver Kahn, 1996, p. 303). Na República, porém, Sócrates

contrasta o poder do to dialegesthai com um método aparentemente empregado às vezes pelos matemáticos, onde o contraste parece ser altamente técnico, fazendo uso de noções especializadas como hipóteses, conclusões, primeiros princípios e outros (510b2- 511d5). Todavia, por meio desta ins- tabilidade, um traço permanece invariante: a preferência de Sócrates

pelo método que ele escolhe como to dialegesthai, dialektikê ou seus cognatos (Gill, 2002, p. 150).

Ao discutir o método dialético de

Platão, então, suponho estar discutindo o método filosófico preferido ou recomendado por

Platão, qualquer que ele seja. O método que ele recomenda e põe em prática nos chamados diálogos primeiros já foi discutido em um capítulo anterior – o método do elenchus. O método que Platão

introduz e aparentemente recomenda no Mênon e no Fédon veio a ser conhecido como o método da hipótese. Nos livros centrais da República (VI-VII), Platão recomenda como ápice do processo de educação dos governantes-fílósofos um método aparentemente distinto,

Hugh H. Benson 143 de 711 frequentemente entendido como o

método dialético dito estrito (ver República 531d-537c mencionado anteriormente; “Dialética” com a maiúscula “D”). O método de agrupamento e divisão é introduzido e recomendado no Fed.ro aparentemente seguido no Sofista, no Político e no Filebo. Enquanto o método dialético de Platão (pelo menos “dialético” com um “d” minúsculo) inclui todos estes métodos, meu foco se centrará no método ou nos métodos discutidos e, sustento, postos em prática no Mênon, Fédon e República. Conexões com o elenchus de Platão e seu método de agrupamento e divisão são numerosas e importantes, mas não podem ser examinadas aqui. PLATÃO E A DIALÉTICA NO MÊNON,

FÉDON E REPÚBLICA

As questões deste capítulo são, então: qual é o método que Platão

recomenda nos diálogos centrais do Mênon, do Fédon e da República, e: põe ele em prática este método nestes diálogos? Considere, primeiro, a resposta de Sócrates ao desejo de

Mênon em retomar à questão da ensinabilidade da virtude antes de responder à questão da natureza da virtude, aproximadamente a dois

terços do Mênon. Sócrates acabou de responder ao paradoxo do Mênon, segundo o qual ou é impossível ensinar ou é desnecessário tentar

metodicamente adquirir

conhecimento de algo. Ou bem alguém fracassa em conhecer o que está tentando conhecer, caso no qual a tentativa não pode ser iniciada ou concluída com sucesso; ou se conhece o que se está tentando conhecer, caso no qual a tentativa é desnecessária. A resposta de Sócrates consiste, primeiramente, em fazer apelo à teoria de sacerdotes e sacerdotisas, que veio a ser conhecida na literatura como a teoria da reminiscência (ver o capítulo Platão e a Reminiscência), para então exemplificar esta teoria por meio de uma conversa com um escravo a respeito de duplicar a área de um quadrado originalmente com área de quatro pés. Sócrates conclui que, embora não forneça os detalhes de sua resposta, ele assegura que devemos buscar metodicamente o conhecimento que nos falta ao invés de aceitar que uma tal investigação é impossível. Tendo ficado aparentemente convencido, Mênon

exprime seu desejo de retomar à questão com a qual o diálogo começou, a ensinabilidade da virtude. De modo surpreendente e a despeito de certa hesitação, Sócrates se dobra

Hugh H. Benson 144 de 711 a este desejo, sob a condição que

Mênon lhe permita perseguir a questão de acordo com o método dos geômetras, que ele imediatamente explica com o seguinte exemplo:

Se lhes é perguntado se uma área específica pode ser inscrita na forma de um triângulo dentro de um dado círculo, um deles poderia dizer: “ainda não sei se a área tem tal propriedade, mas penso que tenho uma hipótese que serve para o problema, a saber, isto: se a área é tal que, quando se a aplica como um retângulo à linha reta no círculo, falta-lhe uma figura similar à própria figura que é aplicada, então penso que resulta uma alternativa, ao passo que a outra alternativa resulta se for impossível que isto ocorra. Assim, servindo-me desta hipótese, estou pronto a dizer o que resulta quando a inscrevê-la no círculo – ou seja, se é possível ou não”. (86e6-87b2)

Embora os detalhes deste exemplo sejam reconhecidamente obscuros e controversos, a ideia parece ser que o método dos geômetras deve primeiro propor uma hipótese que atribui a uma dada área a propriedade tal que, se a área tiver tal propriedade, a inscrição pode ser feita, e, se não a tiver, então a inscrição não pode ser feita. Assim, se a hipótese for verdadeira, a inscrição pode ser feita; se a hipótese for falsa, ela não pode ser feita. Então, os geômetras se

concentram em investigar se a hipótese é verdadeira ou não. Aqui, então, temos Sócrates propondo um método que consiste em dois processos. Primeiro, consiste no processo de identificar uma hipótese tal que sua verdade é necessária e suficiente para uma determinada resposta à questão em consideração. No caso do exemplo geométrico, a hipótese parece ser que a área é “quando se a aplica como um retângulo à linha reta no círculo, falta- lhe uma figura similar à própria figura que é aplicada”, ao passo que, no caso da ensinabilidade da virtude, a hipótese é que a virtude é um tipo de conhecimento (veja 87b5-c7). O segundo processo consiste em determinar se a hipótese em questão é verdadeira. Busca-se determinar se a dada área é “tal que, quando se a aplica como um retângulo à linha reta no círculo, falta-lhe uma figura similar à própria figura que é aplicada” ou se a virtude é um tipo de conhecimento. O método em duas partes que Platão

faz com que Sócrates proponha aqui no Mênon foi chamado de método da hipótese. (Para discussões ulteriores do método proposto aqui no Mênon, ver Robinson, 1953: cAp. 8; Bluck, 1961; Bedu-Addo, 1984 e Benson, 2003).

Hugh H. Benson 145 de 711 Este assim chamado método da

hipótese surge em um estágio similar no Fédon. Sócrates sugeriu uma série de três argumentos destinados a estabelecer a imortalidade da alma, cada um dos quais tendo encontrado objeções poderosas (ver o capítulo A Alma Platônica). Em resposta à última objeção ao terceiro argumento,

Sócrates explica que uma resposta adequada requereria “uma investigação completa da causa da geração e da destruição” (95e9-96al) e se propõe a relatar sua própria investigação. Em sua juventude, nos diz ele, começou seguindo o método dos cientistas naturais, mas rapidamente se deu conta que, antes de adquirir o conhecimento que lhe faltava, ele de fato perdeu parte do conhecimento que pensava antes ter (96c-97b). Em seguida, voltou-se ao método de Anaxágoras (ver 97b3-7), o qual consistia em tentar determinar o que é melhor (97c-98b). Infelizmente,

Sócrates tampouco foi capaz de obter o conhecimento que lhe faltava por meio deste método, pois era incapaz de descobrir por si mesmo o que era melhor ou de o aprender pelos escritos de Anaxágoras. Consequentemente, ele explica que se pôs a adquirir o conhecimento da causa da geração e destruição – que lhe faltava – por meio do seguinte

método “sucedâneo”:

Pensei que devia me refugiar em discussões [tous logous] e investigar a verdade das coisas por meio das palavras... Comecei deste modo: tomando como minha hipótese em cada caso a teoria que me parecia a mais convincente, consideraria verdadeiro, quanto à causa e tudo o mais, tudo o que concordasse com ela, e como não verdadeiro tudo o que não concordasse. (99e4-100a7)

Sócrates explica em seguida que a hipótese que tem em mente no caso presente é o que veio a ser chamado na literatura a sua Teoria das Formas: “a existência de um Belo, em si por si mesmo, de um Bem e Grande e todo o resto” (100b5-7) (ver também o capítulo As Formas e as Ciências em

Sócrates e Platão). Sócrates indica que esta teoria acarreta que a causa de uma coisa ter uma dada propriedade é a participação desta coisa na Forma em questão. Por exemplo, “é pela Beleza que as coisas belas são tomadas belas” (100e2-3).

Sócrates conclui sua discussão deste método explicando como se deve reagir quando a hipótese é “posta em questão” (echoito; ver Kahn, 1996: 318 n. 35):

Você o ignorará e não responderá até ter examinado se as consequências

Hugh H. Benson 146 de 711 que se seguem dela estão de acordo

entre si ou se contradizem. E, quando você tiver de justificar a sua própria hipótese, você procederá do mesmo modo: adotará uma outra hipótese, a que melhor lhe parecer das que estão acima, até você obter algo aceitável, mas não misturará as duas como fazem os contendores, ao discutirem ao mesmo tempo a hipótese e suas consequências, se você deseja descobrir a verdade. (101d3-e3) Novamente, em um estágio crucial do argumento de um diálogo, Platão faz com que Sócrates proponha um método que empregue hipóteses de modo a continuar a investigação. De novo, ele distingue dois procedimentos do método. Ao descrever o primeiro procedimento,

Sócrates enfatiza o processo de obter as consequências da hipótese proposta no lugar do processo de identificar a hipótese (100a3-7) e, ao descrever o segundo processo,

Sócrates explica mais detalhadamente como se deve levá-lo adiante. Primeiro, deve-se determinar se as consequências da hipótese são consistentes com outras crenças ou informações disponíveis a respeito do tópico em discussão. Segundo, deve- se empregar o método da hipótese na própria hipótese – identificando uma hipótese ulterior cuja verdade é necessária e suficiente para a verdade

da hipótese original e testando a consistência das consequências desta nova hipótese com as crenças e informações disponíveis – até que se alcance uma hipótese que é “aceitável” (hikanon). (Para discussões ulteriores do método proposto aqui no Fédon, ver Robinson, 1953: cAp. 9; Gallop, 1975; Bostock, 1986; Rowe, 1993a; van Eck, 1994 e Kanayama, 2000).

Por fim, nos livros centrais da República, Platão nos brinda com uma longa discussão do método filosófico apropriado. Duas passagens são especialmente importantes. Na primeira passagem, Platão faz com que Sócrates distinga dois métodos. Um é praticado pelos matemáticos e no melhor dos casos pode levar alguém a obter somente pensamento (dianoia). O outro é o que ele recomenda e que leva a pessoa à aquisição do conhecimento (epistêmê ou noêsis). No segundo, Platão leva

Sócrates a descrever explicitamente a disciplina da dialética como o ponto culminante da educação na vida filosófica.

Em 509c-511d, Sócrates pede que interlocutores da República imaginem uma linha dividida em duas partes desiguais. A parte menor, diz

Hugh H. Benson 147 de 711 ele, representa as coisas que

participam nas Formas; por exemplo, as coisas belas; a parte maior, as próprias Formas; por exemplo, o Belo em si. Cada uma destas duas partes é similarmente dividida em duas subseções desiguais. A porção que representa as coisas que participam nas Formas consiste em uma subseção menor que representa as imagens das coisas que participam nas Formas – sombras, reflexos em poças de água, etc. –, ao passo que a subseção maior representa os originais das coisas postas em imagem na subseção menor. A porção que representa as Formas, todavia, não é dividida em função dos objetos, como com as duas subseções inferiores, mas em função dos métodos empregados em cada subseção. De acordo com

Sócrates, na subseção menor da porção que representa as Formas [Al], a alma usa como imagens os originais da subseção precedente, [A2] é compelida a investigar a partir de hipóteses e [A3] vai em direção de conclusões, não a um primeiro princípio (510b4-6), enquanto, na subseção maior, a alma traça “[B1] seu caminho a um primeiro princípio que não é uma hipótese, [B2] procedendo a partir de uma hipótese, [B3] mas sem as imagens usadas na subseção precedente, usando as

próprias formas e fazendo sua investigação através delas” (R. 510b6- 9). Quatro condições da alma correspondem a estas quatro subseções da linha: imaginação (eikasia), crença (pistis), pensamento (dianoia) e compreensão ou conhecimento (noêsis).

Observe que a descrição de Platão dos dois métodos distinguidos nas duas subseções superiores faz apelo a três características que parecem se corresponder como segue: [Al] / [B3], [A2] / [B2] e [A3] / [Bl]. Ou seja, tanto o método que leva à dianoia – o método dianoético – quanto o método que leva ao conhecimento – o método dialético – fazem uso de hipóteses: [A2] e [B2]. Os dois métodos se distinguem não pelo fato de empregar hipóteses, mas pelo modo como empregam as hipóteses. O método dianoético usa os originais da seção precedente ao proceder de suas hipóteses [Al], mas não o método dialético [B3], e o método dianoético procede das hipóteses às conclusões e não a primeiros princípios [A3], enquanto o método dialético procede das hipóteses aos primeiros princípios [Bl]. O detalhamento subsequente de

Sócrates destas características sugere que a primeira diferença se resume a uma diferença entre o uso da

Hugh H. Benson 148 de 711 experiência sensível (pelo método

dianoético: 510d5-511a2 e 511a6-8) enquanto oposto a método a priori da dialética (511b7-c2), ao passo que a última diferença se resume a uma distinção entre tratar as hipóteses como se fossem confirmadas, mas não carecendo de uma justificação ou explicação (pelo método dianoético: 510cl-d4 e 511a3-6) e tratar as hipóteses como passos não confirmados que requerem uma justificação ou explicação até que se alcance “o primeiro princípio não hipotético de tudo” (511b3-7), que é identificado de modo plausível com a Forma do Bem. O que é importante notar para nossos presentes interesses é a continuidade entre os métodos propostos no Mênon e no Fédon e o método da dialética na República. Todos os três consistem em dois processos fundamentais de, de um lado, identificar e obter as consequências das hipóteses e, de outro lado, verificar ou confirmar a verdade das hipóteses. O fracasso do método dianoético reside – em grande parte – em seu fracasso de pôr a atenção no último processo.

As três características da dialética especificadas aqui na República – o uso de hipóteses, a inapelabilidade à experiência sensível e a necessidade

de confirmar as hipóteses empregadas até que se alcance “o primeiro princípio não hipotético de tudo” – são repetidas na última das passagens que analisaremos, embora a última característica seja o centro de atenção. Em R. 531d7-535a2 (que contém cinco das 22 ocorrências de hê dialektikê no corpus platônico),

Sócrates descreve a dialética como a completude de uma vida de educação filosófica (531 d, 534e-535a). Ele diz que “a dialética (hê dialektikê) é a única investigação que trilha este caminho, desfazendo-se das hipóteses (tos hupotheseis anairousa) e dirigindo-se ao próprio primeiro princípio, de modo a estar segura” (533c7-dl). Enquanto a tese que a dialética se desfaz das hipóteses pode ser entendida como indicando que

Platão está aqui fazendo uma recomendação contrária ao uso das hipóteses, é mais plausível supor (sobretudo à luz das passagens que acabamos de examinar) que Platão

No documento Benson, Hugh h. Platão (páginas 140-163)

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