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5 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS OBTIDOS

5.1 O PONTO DE PARTIDA: ORGANIZANDO OS PASSOS DA PESQUISA

5.1.4 Delineamentos da pesquisa

Definidos os elementos estruturais da pesquisa, ou seja, o método, o campo, os sujeitos, e as técnicas e instrumentos de coleta dos dados, foi possível traçar a conduta metodológica a ser seguida no decorrer do estudo, classificado como sendo de natureza qualitativa e do tipo exploratório e descritivo, com dados coletados a campo, por meio de observações, entrevistas e outros registros.

O primeiro aspecto deste delineamento diz respeito ao recorte feito para a execução do estudo, a fim de apontar o caminho seguido para a busca de dados. Este roteiro foi traçado a partir das definições da OMS (2002), com relação às práticas de Medicina que mais se destacam no cenário atual e compreende duas vertentes: a Medicina Moderna, Padrão ou Alopática e a Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa.

A Medicina Moderna, Padrão ou Alopática é aquela pautada na prática baseada nas evidências determinadas pelo uso de método científico, buscando o melhor tratamento através de técnicas e pesquisas científicas. Já a Medicina Tradicional, Complementar e Alternativa apresenta práticas pautadas nas necessidades de cada pessoa, priorizando, além dos sintomas físicos, os aspectos sociais e psicológicos, no momento de diagnosticar a doença. Refere-se a várias formas de Medicina, como a chinesa24, ayurveda25 e unani26, e às diversas formas de medicina indígena. Suas práticas incluem terapias com medicação, quando envolvem o uso de medicamentos a base de ervas, partes de animais e/ou minerais, e terapias sem medicação como a acupuntura, técnicas manuais e terapias espirituais. Nossa pesquisa abordará a Medicina Tradicional que faz uso de plantas medicinais, como afirmam Rodrigues e Amaral (2012), os produtos oriundos de plantas medicinais são os mais largamente

24 A Medicina Tradicional Chinesa é um sistema médico desenvolvido e praticado na China há centenas de anos. 25 A Medicina Ayurvedica afirma que tudo no universo é formado pelos cinco elementos básicos da natureza,

chamados panchamaha-bhutas, inclusive o corpo físico, são eles: espaço ou éter, ar, fogo, água e terra. O objetivo desta ciência é estudar as influências destes elementos na natureza e no ser humano, dentro desta filosofia o Homem é um microcosmo do universo, o macrocosmo (http://www.ayurveda.com.br/)

26 Medicina Unani para a saúde é o estado natural, que se manifestou por Hipócrates e Avisena. Esta ciência médica tradicional árabe pretende ser científica e racional, mas acredita que a vida em si é derivada de realidades metafísica (http://www.supernatural.cl/medicina-unani).

utilizados nas medicinas tradicionais, além dos procedimentos e praticantes, ou seja, os detentores do conhecimento.

Na Medicina Tradicional que faz uso de plantas com fins medicinais, buscamos profissionais com formação acadêmica, os quais serão intitulados instruídos, para efeito da pesquisa e usuários da Medicina Popular, sujeitos detentores do conhecimento, mas sem uma formação específica oriunda dos espaços acadêmicos, aqui intitulados não instruídos.

O mapa conceitual da figura 1 expressa abaixo apresenta o caminho seguido para a definição deste espaço de pesquisa:

Figura 1 – Mapa conceitual: contextualizando a pesquisa.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora (2014), com base na OMS (2002).

O segundo aspecto deste delineamento de pesquisa é relativo às etapas de investigação, que resultaram em um trabalho de campo que se estendeu ao longo de 10 meses, ou seja, de julho de 2014 a maio de 2015.

Assim, como primeiro movimento de pesquisa, tratamos de identificar as pessoas que poderiam ser fontes de dados e informações acerca do tema estudado. Para isso, realizamos visitas às pessoas envolvidas com a prática da Medicina Popular, mais especificamente pelo uso de plantas medicinais, bem como, da Medicina Tradicional. Nestas visitas apresentamos os objetivos da pesquisa e fizemos o convite para participar do estudo,

verificando seu interesse e disponibilidade de tempo. Cabe ressaltar que, durante estas conversas iniciais, outros nomes de possíveis sujeitos de pesquisa iam sendo mencionados, definindo assim novos participantes. Essa técnica de identificação dos sujeitos é também conhecida como ―Bola de Neve‖ (BAILEY, 1994), segundo Baldin; Munhoz (2011, p. 332).

Essa técnica é uma forma de amostra não probabilística utilizada em pesquisas sociais onde os participantes iniciais de um estudo indicam novos participantes que por sua vez indicam novos participantes e assim sucessivamente, até que seja alcançado o objetivo proposto.

Cabe salientar que esse universo do trato com plantas para fins medicinais nos levou a estabelecer contato e envolvimento com várias atividades relacionadas ao assunto. Dentre estas destacamos a ―Jornada Catarinense de Plantas Medicinais‖, realizada em agosto de 2014, no município de Criciúma/SC; cursos de Plantas Comestíveis não Convencionais; encontros com grupos da Pastoral da Saúde, bem como a participação no Projeto Interdisciplinar de Plantas Medicinais que acontece mensalmente na Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC) e envolve a mostra dos conhecimentos acadêmicos e populares sobre as plantas medicinais.

O segundo momento da pesquisa aconteceu a partir da escolha dos sujeitos da pesquisa, quando já tínhamos definidos os grupos a serem pesquisados, com a confirmação do interesse e possibilidade de participação dos sujeitos. Nesta etapa, realizamos uma entrevista estruturada, objetivando coletar dados sobre o perfil do entrevistado. Foram colhidos dados como nome, endereço, idade, estado civil, local de nascimento e escolaridade. Em seguida, utilizando a entrevista semiestruturada, o entrevistado foi convidado a falar sobre sua história de vida com uso e indicação das plantas com fins medicinais. Ao relatar, nossas lembranças são capazes de evidenciar nossas memórias, nossos esquecimentos, e estes ―não só nos dizem quem somos, mas também nos permitem projetar rumo ao futuro‖ (IZQUIERDO, 2002, p. 09). Ainda segundo o autor, buscar a memória das experiências vividas, é uma forma de superar o esquecimento, pois, a maioria das coisas que aprendemos, ao longo de todos os dias de nossa vida, se extingue ou se perde (IZQUIERDO 2002).

Dessa maneira, o convite ao relato, além da busca pelas memórias das experiências vividas, reforça ou retoma a narrativa, visto que, o narrador retira da experiência o que conta, tudo é narrado com exatidão, mas o contexto psicológico não é controlado, é cada vez mais raro encontrar pessoas que saibam narrar corretamente (BENJAMIN, 1994; BOSI, 1999).

O narrador é um mestre do oficio que conhece seu mister: ele tem o dom do conselho. A ele foi dado abranger uma vida inteira. Seu talento de narrar lhe vem da experiência; sua lição, ele extraiu da própria dor; sua dignidade é a de contá-la até o fim, sem medo. Uma atmosfera sagrada circunda o narrador. (BOSI, 1999, p. 49).

No ensaio ‗Experiência e Pobreza‘, Walter Benjamin (1994) deixa claro o sentido da tradição como fonte de saber, além de apontar a memória como o modo de transmissão desse saber, ao narrar a parábola27 do tesouro enterrado em suas vinhas; este relato destaca a experiência, a autoridade da tradição manifestada na velhice e sua transmissão de geração em geração. Esse indivíduo pode se considerar sábio, pois adquiriu essa experiência contida na tradição, como também soube transmiti-la, comunicá-la por meio da narrativa.

O exemplo destacado por Benjamin ao narrar a Parábola do Tesouro Enterrado em suas vinhas é pertinente quando nos reportamos à prática da Medicina Popular, sendo esta uma atividade desenvolvida por pessoas em sua maioria de uma faixa etária acima dos 55 anos.

As entrevistas28 foram gravadas com a autorização das entrevistadas e transcritas na íntegra, imediatamente após o término. Cada participante desta pesquisa recebeu e aprovou cópia da transcrição de nossa conversa, autorizando a utilização da mesma por meio da assinatura de um termo de consentimento. Para assegurar o anonimato, os nomes dos participantes foram substituídos por letras do alfabeto.